Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

As origens da crise da dívida gaúcha

O estado do Rio Grande do Sul tem uma estrutura econômica semelhante a da Nova Zelândia, mas enfrenta agora uma situação financeira parecida com a da Grécia. Tem muito potencial de desenvolvimento, mas tem também uma dívida impagável com o governo federal. O 0professor e doutor em economia Carlos Agueda Naguel Paiva, da Fundação Economia e Estatística (FEE) contextualiza a crise gaúcha e oferece argumentos históricos para entender a situação atual do estado no artigo As Origens da Crise Fiscal Gaúcha e o irresponsável discurso do “dever de casa” , recomendado por Jorge Alberto Benitz .

Reproduzimos os três primeiros parágrafos do artigo, cujo texto integral pode ser acessado em http://carta.fee.tche.br/article/as-raizes-da-crise-fiscal-gaucha-e-o-irresponsavel-discurso-do-dever-de-casa/ :

Na crise em que vivemos hoje, muitos se perguntam se ainda faz sentido ter “orgulho de ser gaúcho”. Venho, provocativamente, afirmar que os motivos do tradicional e justificado orgulho são, de certa forma, os mesmos da crise e se encontram lá atrás, na transição republicana. Com o fim do Império, cada estado federado ganhou ampla autonomia. A partir de uma das guerras civis mais sanguinárias da história da humanidade — a Revolução Federalista —, criamos um estado moderno muito antes das demais unidades da Federação. O estado positivista de Júlio de Castilhos foi desenvolvimentista e redistributivo e deu as bases do programa industrialista de Getúlio Vargas, de Juscelino Kubitschek e dos próprios militares entre 1964 e 1980.

A precocidade do RS, contudo, teve um preço alto: a burocracia gaúcha, constituída da década de 10 à de 30 do século passado, ampliada e consolidada entre os anos 40 e 60 do mesmo século, acabou por se aposentar e onerar, também precocemente, o nosso Tesouro. Esse peso não seria opressivo se a arrecadação pública crescesse a uma taxa superior à do passivo representado pelos inativos, mas a economia gaúcha apresentou uma discreta perda de dinamismo na segunda metade do século XX. Parte dessa perda se deveu à dificuldade em definir uma estratégia clara de desenvolvimento. O RS nunca curou plenamente as feridas da Revolução Federalista, e os custos disso são uma estrutural falta de unidade de ação.

O potencial de desenvolvimento do RS é enorme. O Estado é uma espécie de “Nova Zelândia latino-americana”. Tem o mesmo tamanho, as mesmas características edafoclimáticas, produtivas, científico-tecnológicas e de inserção na divisão internacional do trabalho. Há, contudo, uma diferença importante: não temos unidade política! Aqui, a cada mudança de governo, tudo começa de novo. Não nos falta apenas projeto, mas, acima de tudo, confiança na possibilidade de um projeto baseado: (a) na nossa matriz produtiva; e (b) na continuidade de ações, construções e planos dos governos (usualmente opositores) anteriores……..