Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Um mapeamento dos elementos de convergência

O presente artigo propõe uma reflexão acerca das estratégias utilizadas pelo programa Fantástico, veiculado pela Rede Globo aos domingos, sob as perspectivas dos recursos convergentes entre televisão e internet. Com o formato de uma revista eletrônica semanal, o Fantástico mescla fatos jornalísticos com entretenimento e prestação de serviços. O ambiente online permite a reconfiguração da narrativa televisiva, oferecendo ao internauta uma infinidade de possibilidades textuais, o que tem proporcionado, entre outras coisas, o crescimento e a propagação das novas tecnologias digitais no mundo atual. Além de disponibilizar na internet trechos de reportagens que serão veiculadas posteriormente, o programa possibilita a interação entre apresentadores, entrevistados e telespectadores através de chats e redes sociais, a exemplo do Facebook e Twitter. Existe ainda a possibilidade de baixar aplicativos e enviar vídeos, inclusive pelo iPhone. Desta forma, intentou-se realizar um mapeamento descritivo dos elementos de convergência empregados pelo programa Fantástico, a partir da utilização de recursos interativos no ambiente online.

1. Introdução

As novas tecnologias digitais têm ganhado espaço no mundo atual por se mostrarem eficazes na divulgação de informações. Inúmeros veículos jornalísticos têm-se utilizado dos novos meios, a exemplo de sites e redes sociais, para fortalecer o nome no mercado e atrair anunciantes. O que há pouco tempo parecia impossível, hoje se mostra imprescindível para as empresas que querem vender seus produtos ou, simplesmente, investir na divulgação de fatos relevantes para a sociedade, na tentativa de formar vínculos entre emissor e receptor.

Com o slogan O Show da Vida, o programa Fantástico estreou no dia 5 de agosto de 1973 e foi rapidamente ganhando espaço nas casas dos brasileiros. Pensado incialmente por José Bonifácio de Oliveira, com a participação de Armando Nogueira, Manoel Carlos, Augusto César Vannuci e Ronaldo Bôscoli, o programa produzido e veiculado pela maior emissora de televisão do país, a Rede Globo, surgiu com um formato de revista eletrônica onde, ainda hoje, é possível rever os principais fatos ocorridos durante toda a semana.

Diante das novas tecnologias, o Fantástico invadiu a internet com a inserção nas redes sociais e a criação de um portal onde o internauta pode assistir todos os quadros do programa, além de rever edições anteriores. É fato que umas das questões mais atuais discutidas por estudiosos da comunicação gira em torno da convergência midiática, na qual um determinado veículo de comunicação adota diferentes suportes para divulgar o mesmo conteúdo. Com o produto televisivo analisado não é diferente. Além das notícias apresentadas na televisão, o Fantástico convida o internauta a mergulhar nas redes sociais, a exemplo do Orkut, Facebook e Twitter, o que garante ao leitor poder de intervenção, através do envio de comentários ou de informações.

“As novas mídias procuram novas formas de apresentação de informações. As potencialidades hipertextuais e interativas das redes digitais exigem dos meios um esforço para desenvolver formatos informativos que se aproveitam destas utilidades. Isto requer engenho e criatividade em jornalistas, mas também espírito inovador e investimento por parte da mídia. A juventude de hoje – e depois, os leitores de amanhã, estão acostumados ao consumo de conteúdos audiovisuais e interativos de caráter lúdico, e é lógico deduzir que se os meios procuram atrair a atenção deverão desenvolver formatos que de alguma forma incorporem essas características no discurso informativo” (SALAVERRÍA, 2008, p.5).

Uma característica importante no site do Fantástico é a possibilidade de interação entre telespectadores e apresentadores durante a veiculação do programa ou, ainda, após a exibição do mesmo, através de chats e bate-papos online. Para Jenkins (2008), a convergência midiática permite que as pessoas interajam entre elas, discutindo determinados temas abordados nos veículos, o que o autor chama de modos de audiência comunitários.

“Contudo, nem todo consumidor de mídia interage no interior de uma comunidade virtual, ainda; alguns apenas discutem o que veem com amigos, com a família e com colegas de trabalho […]. Fóruns online oferecem uma oportunidade para os participantes compartilharem conhecimentos e opiniões” (JENKINS, 2008, p. 53).

De acordo com Dalmonte (2009), “de forma mais recente, o webjornalismo, ou o jornalismo praticado na Internet, por usar recursos como bases de dados, áudio e vídeo num só ambiente, além da participação do leitor, permite que um mesmo fato seja narrado por vários ângulos, o que em tese, possibilita uma evolução na estruturação daquela narrativa” (p. 6).

Dentro deste contexto de midiatização tão atual, a proposta do presente artigo é fazer um mapeamento descritivo dos elementos de convergência utilizados pelo programa Fantástico, observando as estratégias utilizadas para a aproximação com seu público através dos recursos interativos. Para tanto, optou-se por analisar os programas veiculados nos meses de outubro e novembro de 2011, num total de nove (02, 09, 16, 23 e 30 de outubro e 06, 13, 20 e 27 de novembro).

2. O show da vida

Atualmente apresentado por Zeca Camargo e Renata Ceribelli, o Fantástico mescla jornalismo e entretenimento, o que, consequentemente, o configura como uma revista eletrônica e o torna diferente dos telejornais veiculados pela Rede Globo de Televisão, emissora que há 39 anos veicula o Show da Vida. Apesar de já possuir um público consolidado, o Fantástico aderiu as novas tecnologias de informação e passou a disponibilizar na internet os programas exibidos, além de abrir espaço para a participação dos internautas através de chats e redes sociais. De acordo com Henry Jenkins (2009), a convergência perpassa as questões tecnológicas.

“A convergência altera a relação entre as tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o entretenimento. Lembrem-se disto: a convergência refere-se a um processo, não a um ponto final” (p.43).

O portal do Fantástico, na plataforma da Rede Globo, possui muitas imagens e ferramentas de comunicação na home page, o que possibilita uma maior interação entre os apresentadores e os telespectadores. Barbosa (2008) afirma que dos mecanismos de busca, depois com os provedores de acesso e de conteúdo, o conceito de portal ganha força no Brasil, sobretudo pelo potencial para convergir grandes audiências e, com isso, visibilidade para o seu conteúdo e serviços, atraindo publicidade e gerando possibilidades para o comércio eletrônico (p. 47).

Na página principal do portal do Fantástico (Fig. 1), o internauta encontra as cinco principais matérias que serão exibidas no domingo seguinte, além de cinco manchetes veiculadas no domingo anterior. Na parte superior, divididas em barras, estão as editorias do portal, a saber: Últimas Edições; Princípios Editoriais; Vídeos; Quadros; Canal F; Bola Cheia, Bola Murcha; Fale Conosco; Denuncie; Redação; Telejornalismo.

 

 

Nas editorias analisadas foi possível verificar que existem canais que conduzem o internauta aos aplicativos disponibilizados pela equipe responsável pelo site. Na editoria “Últimas Edições”, o usuário pode navegar pelo calendário e assistir a matérias antigas, além de poder compartilhá-las através do Twitter, Facebook, Orkut, Google + (Fig. 2), ou até mesmo enviá-las a um amigo. Além disso, o site disponibiliza a versão encurtada do link de cada matéria, o que facilita o trabalho dos internautas na hora da divulgação.

Ao clicar em “Princípios Editoriais” (Fig. 3) o internauta é automaticamente direcionado para o portal G1. Já em “Vídeos” é possível assistir aos vídeos da edição anterior, além dos que estão disponíveis no “Canal F”, “Brasil sem cigarro” e “Repórter por um dia”. Nesta editoria existe, ainda, um canal apenas para os assinantes da Globo.com.

 

 

  

O espaço “Quadros” apresenta vídeos com depoimentos de internautas que, aproveitando os aplicativos disponíveis para iPhone, iPad e tablet, conseguiram melhorar a saúde. No “Canal F” os usuários podem assistir a episódios e quadros antigos, disponibilizados numa tabela. “Bola Cheia, Bola Murcha” apresenta os vencedores da semana e oferece um espaço para o envio de vídeos caseiros. Além dessas editorias, existem o “Fale Conosco”, onde os internautas são direcionados para a Central de Atendimento do Telespectador, e “Denuncie”, um espaço reservado para a denúncia. Já em "Telejornais" é possível acessar os principais jornais da Rede Globo, a saber: Bem Estar, Bom Dia Brasil, Jornal Hoje, Jornal Nacional, Jornal da Globo, Globo Repórter, Globo Rural, Profissão Repórter e Globo News.

Outro ponto a ser destacado no site do Fantástico é o canal “interatividade” (Fig. 4), onde o internauta encontra o aplicativo “Brasil sem cigarro”, voltado para quem pretende parar de fumar; além do “Medida Certa”, um aplicativo que visa ajudar as pessoas interessadas em perder peso com saúde. De acordo com Bianco (2005), “a comunicação, em particular, está em meio a uma revolução que diz respeito ao modo como a informação é gerada, processada, armazenada e manipulada […]. Nesse momento de transição, os meios de comunicação tradicionais também se renovam” (p. 38).

 

 

O portal do Fantástico conta, ainda, com um dispositivo de busca e com uma lista, na home page (Fig. 5), com as matérias mais lidas nas últimas horas. Entretanto, Franciscato (2002) avalia que

“as inovações tecnológicas possibilitam novas formas particulares (individuais ou grupais) de construção de temporalidades, pois as mídias tendem a disponibilizar conteúdos que se referem a tempos sociais diversos (como no caso dos jornais online, que oferecem tanto a edição diária com notícias do ‘dia anterior’ quanto ‘notícias em tempo real’ ou links para edições anteriores), permitindo que os ‘leitores’ façam seus próprios recortes e relações temporais” (FRANCISCATO, 2002, s/p).

 

 

3. Novos suportes

Com o desenvolvimento, cada vez mais rápido, de novas tecnologias digitais, tem se tornado imprescindível a utilização de novos suportes na divulgação dos próprios veículos de comunicação e dos conteúdos veiculados por estes. Os novos formatos conseguem agregar diferentes elementos, a exemplo de áudio, vídeo, fotografias e textos, além de permitir a interação entre o público e os veículos. Entretanto, essa adaptação a diferentes suportes requer uma adequação na linguagem utilizada. Conforme Salaverría,

“a convergência multimídia tem aberto novas possibilidades para a linguagem jornalística. Até o advento da internet, não havia nenhuma plataforma que iria divulgar mensagens informativas que combinam códigos textuais e visuais, e que, além disso, o usuário poderia interagir. A revolução digital tem aberto neste sentido novos horizontes para a expressão jornalística: tem suscitado o desafio de criar uma nova retórica jornalística” (SALAVERRÍA, 2008).

No ambiente online a notícia é selecionada e hierarquizada de maneira diferente dos veículos televisivos. Um exemplo dessa hierarquização diz respeito à hipertextualidade, no qual o discurso fragmentado permite que o internauta acesse diferentes blocos de informação. Segundo Palácios (1999), “cada leitor, ao estabelecer sua leitura, estabelece também uma determinada ‘linearidade’ específica, provisória, provavelmente única. Uma segunda ou terceira leituras do mesmo texto podem levar a ‘linearidades’ totalmente diversas, a depender dos links que sejam seguidos e das opções de leitura que sejam escolhidas, em momentos em que a história se bifurca ou oferece múltiplas possibilidades de continuidade”.

Ao longo das edições analisadas no portal, percebe-se que o Fantástico imprime a noção de “tempo real” em suas matérias e links, processando em sua página uma possibilidade de construção diversa do tempo. Isto pode ser exemplificado através dos links para acompanhamento e entendimento de casos passados, mas que ainda estão sendo debatidos pela sociedade, a exemplo da matéria sobre as cirurgias plásticas realizadas em outros países. Neste contexto, pode-se notar o que Dalmonte (2009) citando Agostinho (2006), chama de “triplo presente” (p. 206). O presente das coisas presentes, ou seja, o acontecimento em si; o presente das coisas futuras, referindo-se aos desdobramentos deste fato e o presente das coisas passadas, um revisitar histórico dos episódios que auxiliam no entendimento dos últimos acontecimentos. Essas construções temporais são possíveis graças a um banco de dados no qual se constroem os hipertextos.

“No futuro próximo, a convergência será uma espécie de gambiarra – uma amarração improvisada entre as diferentes tecnologias midiáticas – em vez de um sistema completamente integrado. Neste momento, as transformações culturais, as batalhas jurídicas e as fusões empresariais que estão alimentando a convergência midiática são mudanças antecedentes na infraestrutura tecnológica. O modo como essas diversas transições evoluem irá determinar o equilíbrio de poder na próxima era dos meios de comunicação” (JENKINS, 2009, p.45).

Com certa frequência, os apresentadores referem-se ao portal, estimulando os internautas a conhecerem e participarem enviando conteúdos que poderão ser veiculados. Com relação às redes sociais, 3. 055.498 pessoas seguem o Fantástico no Twitter. A página do programa no Facebook já foi curtida por 589.232 e no Orkut existem inúmeras comunidades com o nome do programa.

Diante do exposto, pode-se perceber que, assim como outros sites jornalísticos, o Fantástico tem como finalidade informar, levando em consideração o emissor e o receptor, ambos com objetivos diferentes. O primeiro funciona como uma fonte “oficial” de informações. O segundo, entretanto, quer se manter informado. Conforme Neto, “esta comunicação procura fazer uma reflexão mais focada em torno de alguns elementos que, resultando do próprio ambiente da midiatização, repercutem em operações que constituem o trabalho de produção de sentido do jornalismo” (p. 1).

4. Conclusão

A partir estudiosos do termo Convergência Midiática, intentou-se realizar um mapeamento descritivo sobre as estratégias de convergência entre televisão e internet utilizadas pelo Fantástico. O estudo permitiu observar que as múltiplas possibilidades ofertadas no ciberespaço estimulam o leitor a ser produtor direto ou indireto de conteúdos que vão ser veiculados nos canais. Nota-se a preocupação do portal em estabelecer trocas entre produtores e consumidores da informação. Observa-se, ainda, no portal do Fantástico o estímulo constante para que o leitor saia da sua “zona de conforto” de mero “receptor”. Há um esforço para que ele se torne produtor da informação quer seja através de vídeos, fotos, ou outras inserções, possibilitando que as construções possam ser feitas em conjunto. Neste contexto, verifica-se também a questão da “atualização”, pois o leitor alimenta o canal com demandas imediatas e de forma constante.

5. Referências

BIANCO, Nelia Rodrigues Del. Convergência e interatividade; a tecnologia a favor do diálogo – Desafios do rádio no século XXI. Salvador: IRDEB, 2005.

DALMONTE, Edson Fernando. “Narrativa jornalística e narrativas sociais: questões acerca da representação da realidade e regimes de visibilidade”.

FRANCISCATO, Carlos Eduardo. A atualidade no jornalismo. Disponível em: http://

www.crisluc.arq.br/A%20atualidade%20no%20jornalismo.pdf. Acesso em 20 de fevereiro de 2012.

JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. 1ª edição. São Paulo: Aleph, 2008.

NETO, Antônio Fausto. Contratos de Leitura: entre regulações e deslocamentos. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2007/resumos/R1528-2.pdf.

Acesso em 20 de fevereiro de 20121.

PALACIOS, Marcos Silva. Hipertexto, Fechamento e o uso do conceito de não-linearidade discursiva. Lugar Comum, Rio de Janeiro, n. 08, p. 111-121, 1999.

SALAVERRÍA, Ramón e NEGREDO, Samuel. Periodismo integrado – convergencia de médios y reorganización de redacciones. Barcelona: Sol 90, 2008.

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[Sara Maria Cardoso Gomes é jornalista, Salvador, BA]