A ideia de quarto poder surgiu a partir de meados do século 19 como recurso no meio de sociedades democráticas: um órgão responsável por fiscalizar os abusos dos três poderes originais (Legislativo, Executivo e Judiciário). Esse poder, representado pela imprensa, teria como dever denunciar violações dos direitos nos regimes democráticos – o que ocasionalmente não acontece – nos quais as leis são votadas “democraticamente” e os governos são eleitos pelo sufrágio universal.
Por muitos anos, o quarto poder recebeu o título de “voz dos sem vozes” e seus representantes sofreram grandes retaliações por diversos segmentos, o que não impediu que se mantivesse como forte contrapeso na balança social com os demais poderes. A mídia, com suas ferramentas de alcance e representatividade, seria “os olhos e ouvidos” da humanidade, a vontade e opinião do povo. Inclusive, as informações produzidas/veiculadas pelo quarto poder são o meio pelo qual a opinião pública se expressa. Ou seria o contrário?
O quarto poder hoje é orientado por um feixe de grupos econômicos e financeiros planetários e de empresas globais. A revolução midiática agrupa uma imprensa centralizadora e por vezes totalitária, imprensa que já possui autonomia e autoridade e controla o fazer jornalístico, cinematográfico, editorial, como um tentáculo sem fim. Sendo assim, como um quarto poder poderá não alcançar e construir uma opinião pública nivelada?
Umademocracia de faz de conta
A informação surge, se desenvolve e limita-se às fronteiras de interesses comerciais dessas organizações. Mas o ponto positivo do cenário pós-moderno é que aos poucos os cidadãos enxergam mais claramente com olhos desconfiados as ações das grandes mídias – exemplo mais vivo são as últimas manifestações desencadeadas em junho no país. Até as ações do quarto poder foram questionadas.
A desconfiança do povo surge do momento em que a contingência de informação põe em dúvida a sua autenticidade. O fenômeno é denominado por Ignacio Ramonet como uma “censura democrática”. Contrariamente ao que se pensava, a censura não é uma arma exclusiva de regimes autoritários, que agem por supervisão e amputação constante das informações. O quarto poder do século 21 instala entre a informação livre e o espectador obstáculos comunicacionais compostos por circulação de mais e mais informação, o chamado “bombardeio informativo”, recheado de novas roupagens que desviam a atenção e/ou superficializam o conteúdo, em uma espécie de “manobra” para que o receptor não perceba quais outras informações lhe são ocultadas e dissolvidas pela “censura”.
Dessa forma, o amplo recebimento de numerosas informações limita o acesso à informação. Esse mecanismo atrofia inclusive o desenvolvimento intelectual da “massa”, bloqueando o caminho e a construção de uma opinião pública realmente formada e consistente.
O quarto poder não representa mais – não em sua totalidade – o conceito de fiscalizar os poderes e nortear os cidadãos. Por ele agora passam filtros que são geridos por interesses particulares, amputando informações, direcionando olhares, minando o funcionamento intelectual, em uma verdadeira democracia de faz de conta.
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Reynaldo Carilo Carvalho Netto é graduado em Rádio e TV pela Universidade Estadual de Santa Cruz