Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Crítica ao desconstrucionismo da objetividade jornalística

Pesquisa organizada por Antonio Hohlfeldt, professor de Teoria da Comunicação no Programa de Pós-Graduação da Famecos-PUCRS, investigou, em 21 publicações, entre manuais de redação e livros de autores brasileiros, norte-americanos e espanhóis, os principais critérios utilizados na construção do texto jornalístico. Esses critérios constituem o que se convencionou denominar de categorias jornalísticas. Deste levantamento, a categoria ‘Objetividade’ se coloca como a mais citada. Todavia, reconhece Hohlfeldt, a objetividade jornalística, apesar de ser a mais referida, ao mesmo tempo, é crescentemente contestada, ‘relativizada em favor de outros conceitos, como a imparcialidade e/ou a ética’, chegando a ser negada em alguns livros didáticos e em manuais de redação, como o da Folha de S. Paulo, que afirma categoricamente: ‘não existe objetividade em jornalismo’.


Desde sua criação, ainda no século 19, e mais intensamente a partir da década de 1980, a objetividade jornalística vem sendo questionada, em particular sobre a possibilidade dos jornalistas, dos meios de comunicação, dos governos, das elites em manipular a verdade e distorcer a realidade. No entanto, não é mencionado que, dentro dos fundamentos da objetividade jornalística, existem mecanismos capazes de controlar tais ímpetos, como a checagem das notícias, passando a falsa impressão a leitores e estudantes de que, ao se questionar a objetividade, está se tomando uma atitude de vanguarda, condicionando os novos jornalistas a contestar de imediato o que vêm dando certo no jornalismo.


Na bibliografia pesquisada para este artigo, não foi localizada com exatidão se essas contestações e questionamentos nasceram no ambiente acadêmico ou nas redações dos veículos de comunicação ou, talvez, em ambas. O que se pode afirmar, analisando as ementas dos Cursos de Jornalismo da UFSC, Unisul, USP, Unicamp, UFRGS, UFSM, UFPR e outras oito universidades particulares pesquisadas, é que há uma proposição, orquestrada pelos conselhos acadêmicos, para o questionamento da objetividade Jornalística dentro das universidades. A afirmação baseia-se no fato de que os autores recomendados por essas universidades como bibliografia básica para a ementa da disciplina ‘Teoria do Jornalismo’ Perseu Abramo, Fernando Correia, Barros Filho, Cláudio Abramo, Nelson Traquina, Adelmo Genro Filho, Nilson Lage, Eduardo Meditsch, Antonio Hohlfeldt – todos, em certa medida, mais ou menos contundentes, criticam ou desconstroem definições, conceitos, postulados e métodos, ou seja, a epistemologia da objetividade jornalística. Exceção a Michael Kunczik, que define os Conceitos de Jornalismo de forma isenta e didática, e a Jay Rosen que, mesmo criticando, apresenta soluções práticas e alternativas para uma nova leitura da objetividade.


Marca identificadora


Este artigo não pretende mitificar a objetividade jornalística, por entender que ela é um método, um formato ou uma técnica, ou como queiram chamá-la, que pode ser defendida ou contestada, elogiada ou criticada, que pode e deve ser adaptada à realidade das redações e até, por que não dizer, adaptada aos interesses corporativos dos donos do negócio e também dos jornalistas, porém jamais torná-la inexistente. São exageradas, inaceitáveis, incoerentes e perturbadoras as afirmações de que objetividade em jornalismo não existe, principalmente ao se analisar os textos dos autores que assim afirmam. Nota-se claramente que as críticas estão fundamentadas num modelo Desconstrucionista, filosofia ligada ao Marxismo, criada por Jacques Derrida e repercutida por Michel Foucault, que preconiza que não existem fatos, verdades, lógica, racionalidade, nem ciência, que as palavras não têm significado; que não há nada no mundo exceto um construto subjetivo dado pela sociedade (capitalista) opressora. Para os desconstrucionistas, provas e não-provas não importam. Eles aceitam axiomaticamente (sem demonstração) que a estrutura do poder social controla tudo no mundo, incluindo todas as narrativas, literatura e arte, vistas como reflexos dos protestos contra tal poder e opressão. Para Carlos Reis, mestrado em História e Ciências Políticas na UFRGS, ‘Derrida foi um dos principais ícones das esquerdas. Morreu em 2004, por isso vem sendo pranteado nas universidades e nas mídias, onde se cultua a ‘desconstrução’ do pensamento, da cultura, do logos‘. Ironias à parte, o fato é que, na França e nos EUA, o Desconstrucionismo não é mais levado a sério, visto à carga de incoerências que carrega, a começar pela descabida, desmesurada e insistente afirmação de que as palavras carecem de significado.


Segundo Kovach & Rosenstiel (2003), existem certas idéias duradouras no jornalismo que podem ser identificadas. Essas idéias vão e voltam e têm sido mal compreendidas, geralmente por aqueles que se dizem donos delas. Mesmo assim, essas idéias não podem ser consideradas criações artificiais.




Os elementos do jornalismo foram forjados e temperados em trezentos anos de experiência e testados no mercado das formas competitivas de informação. Eles nascem da função que as notícias exercem em nossas vidas. Aqueles que produzem jornalismo devem usar esses elementos para conferir um sentido ético ao seu trabalho. Se sairmos desse caminho, será por nossa conta e risco.


Kovach & Rosenstiel apóiam essas afirmações sustentados em nove princípios minuciados em seu livro, ‘Os Elementos do Jornalismo’. Se destacados os títulos dos capítulos, que compõem os noves princípios, praticamente formam um tratado em defesa da objetividade jornalística. No entanto, os autores abrem brechas para suposições, o que coloca em dúvida se a objetividade é um método positivo ou negativo para o jornalismo, propugnando um relativismo cognitivo entre teoria e prática que, ao final, não chega a lugar algum.


A teoria do jornalismo consagra a definição clássica de Schneider (1984), citado por Kunczik (2001), para objetividade jornalística: 1) Distingue entre opinião e notícia; 2) Fica com os fatos, os quais: 3) Não muda, não suprime e não publica ‘de favor’; 4) Cada notícia deverá conter um mínimo de equilíbrio. Segundo Kunczik (2001), a qualidade central dos procedimentos para se alcançar a objetividade seria a revisão da verdade das afirmações, mediante questionamento dos testemunhos.


Bentele (1982) in Kunczik (2001) enumera outros procedimentos:


1) Informar sem emoções; 2) Informar de modo desapaixonado; 3) Selecionar palavras neutras para descrever o contexto; 4) Empregar citações diretas; 5) Citar fontes contraditórias; 6) Observar evidências adicionais; 7) Relatar na seqüência apropriada; 8) Precisão, interesse, verificação, veracidade e neutralidade são qualidades obrigatórias.


Tuchman in Correia (1997) enumera os seguintes procedimentos:


1) A necessidade de ouvir as partes interessadas; 2) A apresentação de provas auxiliares e fatos suplementares que fundamentem o essencial da notícia; 3) A utilização de citações entre aspas, enquanto demonstração de que se ouviram as pessoas e se lhes deu a palavra; 4) A estruturação da notícia segundo a técnica da pirâmide invertida, de modo a que o jornalista possa argumentar, em abono da sua objetividade, que procurou chamar atenção do leitor para o que era mais importante.


La Roche in Kunczik (2001) oferece as seguintes normas para a representação objetiva da realidade: 1) Todos os fatos devem ser corretos; 2) A informação duvidosa deve permanecer visível como tal; 3) À precisão correspondem interesse e equilíbrio; 4) Não expressar as opiniões do autor; 5) Evitar as expressões floreadas – adjetivos, advérbios etc; 6) Identificar como tal a expressão de opinião dentro da reportagem; 7) Não acrescentar fatos ornamentais ou complementares.


Na prática cotidiana do jornalismo, os EUA foram os primeiros a adotar as definições, normas e procedimentos da objetividade jornalística. Esta contribuiu decididamente para a evolução do jornalismo, ao introduzir: a) a figura do repórter que passa a fazer cobertura in loco dos acontecimentos; b) a técnica do lead, em que toda notícia deve informar, obrigatoriamente, quem fez o quê, a quem, quando, onde, como, por quê e para quê; c) a pirâmide invertida, que destaca no primeiro parágrafo os dados mais importantes e depois os de menor importância. Pode-se incluir também a separação do noticiário do editorial, notadamente nos jornais impressos. Segundo Rosen in Traquina (2001), ‘a objetividade é uma das marcas identificadoras do jornalismo nos EUA, e é talvez a maior contribuição do jornalismo americano para o resto do mundo’.


Afirmação e realidade


A pergunta imediata é: se a Teoria do Jornalismo define objetividade e ela é entendida, assimilada e aplicada, como podem afirmar que a objetividade jornalística não existe?


A resposta para essa questão tem início exatamente na tentativa de alguns autores em desconstruir aquilo em que a objetividade jornalística mais contribuiu no jornalismo, ou seja, o lead. Adelmo Genro Filho (1987), falecido em 1988, professor da UFSC, marxista militante, que não viu a queda do Muro de Berlin, a elevação do capitalismo como ideologia hegemônica e dominante e o fenômeno da globalização, ataca ferozmente a objetividade jornalística, chamando-a de ‘ideologia da objetividade’. Para Genro Filho:




Não há dúvida que a chamada ‘objetividade jornalística’ esconde uma ideologia, a ideologia burguesa, cuja função é reproduzir e confirmar as relações capitalistas. Essa objetividade implica uma compreensão do mundo como um agregado de ‘fatos’ prontos e acabados, cuja existência, portanto, seria anterior a qualquer forma de percepção e autônoma em relação a qualquer ideologia ou concepção de mundo. (…) O lead permite que através da natureza lógica e abstrata da linguagem, constituída pela generalidade intrínseca dos conceitos, seja retomado o percurso que vai do abstrato ao concreto, não pela via da ciência, mas pela reprodução do real como singular-significativo. (…) Os fatos jornalísticos são um recorte no fluxo contínuo, uma parte que, em certa medida, é separada arbitrariamente do todo. Nessa medida, é inevitável que os fatos sejam, em si mesmos, uma escolha. Mas, para evitar o subjetivismo e o relativismo, é importante agregar que essa escolha está delimitada pela matéria objetiva, ou seja, por uma substância histórica e socialmente constituída, independentemente dos enfoques subjetivos e ideológicos em jogo. A verdade, assim, é um processo de revelação e constituição dessa substância.


Segundo Mário Messagi Júnior, doutorando em História Social da UFPR, Genro Filho constrói sua crítica incorrendo numa contradição: ao mesmo tempo em que nega a objetividade, reafirma sua relação com os fatos. Para entender toda a complexidade das ilações de Genro Filho, seria necessário escrever um tratado sobre objetividade. Mas, a julgar e considerar somente a ótica da epistemologia da objetividade jornalística, se um jornalista adequadamente treinado não tem a capacidade de descrever um fato como ele aconteceu, o jornalismo não teria razão de existir. Afinal, é isso que o público, o cidadão espera dos jornais: ter contato com a realidade. Segundo o professor Josenildo Guerra, o jornalismo não é obra de ficção. Sem a objetividade, seria difícil explicar o jornalismo a partir da relação que público e profissionais estabelecem cotidianamente entre si, isto é, tendo os fatos reais como objeto da notícia (site Observatório da Imprensa). Ademais, as críticas de Genro Filho e as divagações de outros autores marxistas, de certa forma, ao verbalizarem suas teorias carregadas de preconceitos anticapitalistas, perderam substância intelectual, já que o comunismo como força política deixou de existir como ideologia representativa e utópica, com a China adentrando mais e mais no mundo capitalista, agregando fundamentos do mercado de capitais, e Cuba, que aguarda passivamente a morte de Fidel Castro para aliar-se aos EUA.


Atribui-se à objetividade jornalística a responsabilidade de não permitir ou vedar ao jornalista o direito à opinião, o que não é verdade. O que a definição de objetividade jornalística diz claramente é que opinião e notícia são composições distintas, que o contraditório deve fazer parte da notícia com citações diretas, que em caso de opinião do autor, a opinião deve ser identificada como tal, que o jornalista deve relatar os fatos com precisão, verificação, veracidade e neutralidade. Cláudio Abramo (1988: 109,115) criticava essa postura de neutralidade, ao dizer que ‘o jornalista não pode ser despido de opinião política. A posição que considera o jornalista um ser separado da humanidade é uma bobagem’. Abramo (1988: 117) afirmava que ‘não existe jornalismo objetivo. Isso é uma ilusão que se tenta passar para os jornalistas e deve ser expurgada’. Abramo se contradiz nas páginas 35 e 37:




Introduzimos no Estado um tipo de cobertura (protegida pela eficácia operacional e pela precisão das previsões) absolutamente neutra e totalmente distante dos editoriais do jornal. De 1956 a 1961 o Estado se tornou, talvez, um dos jornais mais bem feitos do mundo. (…) Essa foi a grande reforma do Estado, a maior reforma já feita num jornal brasileiro porque mudou tudo e conseguiu manter, durante anos, um noticiário o mais possível ‘objetivo’, ao lado de editoriais absolutamente antediluvianos.


Quer dizer, para os outros, a objetividade deve ser expurgada, mas, por ele, a objetividade jornalística foi empregada, que resultou em reconhecimento e sucesso pessoal (para Abramo) e editorial (para o jornal O Estado de S. Paulo). No entanto, Cláudio Abramo é um exemplo para o jornalismo brasileiro. Prestou uma grande contribuição à profissão, exercitando uma autocrítica desprendida, sem preconceitos, verificadas em seu livro A regra do jogo.


Ao afirmarem que é impossível desvincular a opinião de uma narrativa objetiva, que não se pode tirar um fato do contexto histórico e transformá-lo em notícia sem que haja a interferência direta do observador naquele momento, os desconstrucionistas recorrem a uma figura de retórica da semiologia, no qual alegam que a enunciação é um fator decisivo no processo narrativo, que o sujeito da enunciação é responsável pelo sentido, que nenhuma escrita é inocente, gerando assim uma não-objetividade dos textos jornalísticos. Tais alegações caem por terra quando observado que a objetividade é própria do procedimento científico e define a possibilidade de verificação intersubjetiva. Essa definição da objetividade pode aplicar-se também ao jornalismo, o que quer dizer que deve ser abandonada a noção freqüentemente discutida na literatura de que a objetividade esteja ligada à relação existente entre afirmação e realidade. Essa definição faz da objetividade uma marca da investigação e da informação profissional sempre e quando se procura separar a notícia de comentário de modo desapaixonado, imparcial e não-manipulador (KUNCZIK, 2001).


Responsabilidade compartilhada


Em entrevista ao Grupo de Pesquisas em Engenharia Biomédicas, o jornalista Orlando Tambosi deixa mais clara essa questão, ao responder à seguinte pergunta: ‘Em seus textos, o Sr. argumenta que conceitos fundamentais à ciência, como ‘realidade’, ‘objetividade’ e ‘verdade’, estão sendo hostilizados pela filosofia pós-moderna. O que isso significa de fato e que riscos essa filosofia apresenta para a pesquisa e o desenvolvimento científico?’




Tambosi – Esse modo de pensar, hoje tão comum em algumas áreas das ‘ciências sociais’ e humanidades, manifesta ojeriza às ciências, propugnando um relativismo cognitivo e cultural que não distingue o conhecimento científico das fabulações mitológicas. Nesse sentido, o ‘real’, a ‘objetividade’, os ‘fatos’, não passam de meras ‘construções intelectuais’. As ciências seriam apenas uma outra forma de ‘narrativa’. Daí certas vertentes radicais repetirem ad nauseam que a ciência não só é ideológica, mas ‘branca’, ‘eurocêntrica’, ‘machista’, ‘heterossexual’ e assim por diante. Passa-se a privilegiar o intuitivo, o mágico, o místico, o irracional. Esse pensamento é regressivo, reacionário, obscurantista. Faz as pessoas verem com desconfiança a pesquisa e o pensamento científico, conformando-as às superstições e as pseudociências. E, particularmente nas universidades, difunde o ressentimento contra as ciências naturais. Diante disso, repito sempre, não é de estranhar que universidades de prestígio tragam ao Brasil sociólogos delirantes como o francês Jean Baudrillard, que, a cada três meses, vem nos advertir que ‘a realidade não existe’.


Segundo Jay Rosen in Traquina (2003), a objetividade não está funcionando como antes, havendo, entre os jornalistas, uma confusão em torno do termo. Um dos pontos abordados por Rosen é que a objetividade é um gênero de contrato entre um grupo de profissionais, os jornalistas, e as pessoas que lhes fornecem as instalações e o equipamento para cumprir o seu trabalho. O contrato postula que ‘vocês, editores, dão-nos o direito de relatar as notícias de uma forma independente, e em troca não causaremos demasiados incômodos por introduzir a nossa política nas notícias’. Esse contrato foi quebrado pelas corporações ao não mais autorizar os jornalistas a sair e relatar notícias de uma forma independente porque estão muito mais interessados em reduzir custos e transformar as notícias num instrumento de marketing.


Então, pergunta-se: o que a objetividade tem a ver com esse contrato? Nada! A questão é que os jornalistas se vêem como seres especiais e, segundo Abramo (1988), não tem muita formação moral, é fraco como todo ser humano, e não é muito confiável. O jornalista julga ser um gênero em si mesmo, e quando não atendidos seus interesses corporativistas, acredita poder mudar as regras da forma de lidar com a notícia. Por outro lado, nas redações de jornais e TV, a tendência é de haver uma relação de absoluta subordinação e total conformidade dos jornalistas às normas, e não necessariamente à linha do jornal. Para Abramo, os jornalistas não podem ter opinião, mas os jornais têm suas opiniões sobre as coisas e estão ligadas aos interesses daquela classe que pode manter a grande imprensa. O equívoco que existe entre os jornalistas é considerar que essa grande imprensa possa ir além daquilo que é seu papel histórico, e aí reside a origem do conflito, pois os donos do negócio sempre considerarão a notícia um produto vendável.


Já o professor Perseu Abramo (2003) acredita que toda a imprensa está envolvida numa grande manipulação conspiratória. Critica abertamente o que ele chama de ‘falsa objetividade’ da imprensa comercial burguesa, colocando o jornalismo praticado pelo mercado como um instrumento de controle político das elites, contrário aos interesses maiores do povo brasileiro, dando a entender que toda a vida inteligente no jornalismo é manipulada, ou seja, caindo nas armadilhas do desconstrucionismo. Entretanto, Abramo (2003) admite, em teoria, ser possível fazer jornalismo com o máximo possível de objetividade. ‘Mais ainda, é desejável fazê-lo porque essa é a única forma de reduzir ao máximo o erro involuntário e impedir a manipulação deliberada da realidade’. E continua o professor Abramo:




O reino da objetividade é a informação, a notícia, a cobertura, a reportagem, a análise, assim como o reino da tomada de posição era a opinião, o comentário, o artigo, o editorial. É fundamental separar e distinguir informação de opinião, indicar as diferenças de conteúdo e forma dos gêneros jornalísticos, e apresentar toda a produção jornalística ao leitor/telespectador de forma que ele perceba imediatamente o que é exposição da realidade e o que é ajuizamento de valor.


A objetividade jornalística é uma técnica regida por normas e procedimentos. Por conseguinte, sofre as limitações dessas normas, devendo ser entendida dentro dessas limitações. A grande verdade é que os críticos desconstrucionistas, todos marxistas, dão uma dimensão muito maior à objetividade jornalística do que ela realmente tem, no qual atribuem valores e ideologias subjetivas desconectadas com o que a técnica propõe, visando, com isso, atacar o poder, as grandes corporações jornalísticas e as elites do sistema capitalista, manipulando os meios acadêmicos para atingir seus objetivos.


A objetividade deve ser debatida no campo da prática jornalística, não simplesmente eliminá-la porque não atende à ideologia de intelectuais/jornalistas de esquerda, mas discuti-la, como propõe Jay Rosen, para adaptá-la à luz de uma nova realidade:




Segundo a velha teoria, a objetividade advém da imparcialidade e da distância. É-se credível porque não se está envolvido, não se está interessado, não se tem benefícios diretos. Segundo a nova teoria da objetividade, a credibilidade é alcançada porque se está preocupado, porque se está interessado, porque se importa com o que se passa na comunidade.


A objetividade é irmã gêmea e se confunde com democracia. No Brasil, estamos convivendo com essa enxurrada de denúncias (mensalão, correios) que só existe porque a democracia brasileira pode funcionar mal, mas funciona cada vez melhor. Têm-se cada vez mais mecanismos de apuração, a começar de uma imprensa investigativa e independente, que abre espaços para denunciantes e denunciados, réus e vítimas, buscando em primeiro lugar a verdade. Agora, se há alguma falha na precisão, na veracidade, na neutralidade dos fatos publicados, a responsabilidade é do jornalista, dos editores e dos donos do negócio, pois a objetividade jornalística tem por princípio que a liberdade de expressão e de imprensa, própria de regimes democráticos, seja usada com responsabilidade, ética e honestidade.


Pensamento crítico


Conclui-se, portanto, que a objetividade jornalística existe, tem nome, sobrenome e endereço, e pôde até ser filmada, como no caso de Todos os homens do presidente (1976), de Alan J. Pakula, e O informante (1999), de Michael Mann.


Assim sendo, é necessário que os dirigentes acadêmicos se rendam e as universidades aceitem a realidade de que jornalismo é negócio, ligado a grandes corporações de mídia que operam por lucros, que notícia é produto, interligada num mundo globalizado e a cada dia mais competitivo, e que precisam revisar seus currículos, ementas e bibliografias.


Isso não significa dizer que as universidades devam abrir mão de formar cidadãos críticos, agentes de transformação social. Mas esta visão crítica não pode estar condicionada exclusivamente ao marxismo ou a outras ideologias e filosofias atreladas ao marxismo, pois pensamento crítico não significa necessariamente pensamento de esquerda. Por sua vez, professores, intelectuais e jornalistas que não aceitam a nova ordem, que buscam subterfúgios em filosofias delirantes, que se abastecem de ideologias utópicas que não reflitam a nova realidade, devem trocar de profissão.

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Aluno do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina