Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Intervenções do Estado na Amazônia não são suficientes

Enquanto temos 193 mil militares no efetivo do Exército brasileiro, apenas 13 % estão concentrados no território amazônico. Maior banco genético, a maior floresta tropical do mundo, detentora de um quinto da água do planeta, possuindo aproximadamente um quarto do PIB mundial em riquezas naturais, a Amazônia tem cerca de 16 mil quilômetros de fronteira com saídas terrestres para o mar do Caribe, para o Oceano Atlântico e, em breve, teremos também a Rodovia Transoceânica (que ligará o Brasil, por meio do Acre, aos portos do Oceano Pacífico, no Peru).

Com mais de 42 anos de vida militar, o general Adhemar da Costa, comandante do Comando Militar do Sudeste, em São Paulo, lamenta o descaso com que o Estado ainda trata a região amazônica. Não há intervenções dos Ministérios da Saúde e da Cultura e a Polícia Federal não é suficiente para fiscalizar todo o território.

Em 2004, foi atribuída ao exército a função de combater crimes transfronteiriços, apesar de não ter estrutura ou capacitação para tal atividade. Os pelotões de fronteira costumam ajudar a Polícia Federal com abrigo, combustível, transporte e logística. “Nós somos o instrumento da sociedade. O Exército prioriza a Amazônia, mas se não houver uma consciência nacional seremos apenas um paliativo”, afirma o general Adhemar.

A prioridade do Exército brasileiro é assegurar a integridade do território nacional. No entanto, é necessário diversificar. Os pelotões assumem responsabilidades como levar às comunidades assistência médica, odontológica e até alfabetização. Atualmente, o Exército também atua em obras de engenharia na duplicação da BR 101, na integração do Rio São Francisco e na construção do novo aeroporto em Natal.

“Mato” é sinônimo de área inútil

O general de Divisão Eduardo Dias da Costa Villas Bôas compartilha da mesma opinião: “A fraca presença do Estado tanto causa como potencializa alguns dos principais problemas da Amazônia. Torna difícil o controle da questão ambiental, indígena, dos ilícitos transacionais, dos problemas fundiários etc.”

Está em desenvolvimento o Sistema Integrado de Vigilância e Monitoramento das Fronteiras (Sisfron). Com investimento de 10 bilhões de reais, será implantado pelo Exército brasileiro, em conjunto com o Ministério da Defesa, até 2019. O Sisfron facilitará o monitoramento dos 17 mil km de fronteiras, uma vez que conta com radares e satélites de tecnologia avançada. A quantidade de pelotões para realizar este monitoramento também aumentará de 21 para 38.

Para o professor José Pedro de Oliveira Costa, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e IEA/USP Amazônia em Transformação, os militares são contra a preservação das florestas nas fronteiras, pois contribuiriam para a vulnerabilidade do território brasileiro. “O conceito ou a tradição militar diz que `mato´ é sinônimo de área inútil, improdutiva e, sendo assim, não faz parte do país. O conceito dos ambientalistas é exatamente o contrário: toda área de floresta está produzindo biodiversidade e é uma reserva para as gerações futuras.”

Populações indígenas ameaçadas

Visando à proteção e defesa das fronteiras, a Constituição delimita uma área de aproximadamente 150 quilômetros de largura, que percorre toda a fronteira terrestre e abrange588 municípios, além de parques de preservação e comunidades indígenas. O Projeto Calha Norte foi implantado em 1985, durante o governo do então presidente José Sarney, com o intuito de proteger essa extensa faixa de fronteira da Amazônia contra uma possível invasão estrangeira. Também deveria zelar pelas comunidades indígenas e evitar conflitos entre índios e garimpeiros. A chamada “Faixa de Fronteira” visa à ocupação das fronteiras de toda a região norte do Brasil com a Venezuela, o Peru, o Suriname, a Guiana, a Guiana Francesa e a Colômbia. Do lado do Brasil, desde o município de Oiapoque, no Amapá, até Tabatinga, no Amazonas.

No entanto, com essa “permissão” assegurada pela Constituição, as Forças Armadas têm total liberdade para agir de forma mais direta e um tanto quanto questionável, invadindo propriedades e passando por cima de direitos respeitados em outras partes do território nacional. Segundo informações da Fundação Pró-Yanomamis, as Forças Armadas realizaram, em 2008, um exercício militar em Roraima (que faz fronteira com Venezuela), onde foram utilizados jatos Mirage, blindados e unidades especiais de paraquedistas. As populações indígenas e ribeirinhas se veem ameaçadas pelo autoritarismo utilizado pelas Forças Armadas.