Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Jornalismo que faz sucesso

Em geral tablóides. Nas páginas, muitas imagens e notícias de relevância relativa. Fofocas de celebridades, títulos chamativos, dramáticos e muito apelo. Por outro lado, matérias de leitura rápida, informando o acontecimento para o cotidiano do leitor de forma clara e próxima de quem não está habituado a ler diariamente. Diante destes fatos, muitos teóricos e práticos, atuantes na área do jornalismo têm se dedicado a discutir sobre o jornalismo popular, seus rumos, qualidades, deficiências e discutir se este gênero jornalístico se utiliza ou não do sensacionalismo.

A professora de Jornalismo Marialva Barbosa, doutora em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), em artigo à revista Verso e Reverso, declarou que no conceito jornalismo popular ‘está contida a idéia de um gosto que coloca como prioritário um tipo de conteúdo que apela ao extraordinário, que foge do comum, que se aproxima do inominável’. Segundo Marialva, estas características dão molde ao que se chama sensacional.

Características do popular

Independente da alcunha popular ou sensacionalista, é inegável o apelo que esta natureza do jornalismo conquista junto ao seu público. Numa sociedade pós-moderna, onde a razão é deixada de lado para a obtenção do prazer, da sensação, o jornalismo popular se adapta como uma luva a essa demanda que busca se sentir representada de alguma forma. É um dos principais fatores que o apresentador do programa popular Brasil Urgente, José Luiz Datena, enfatiza nas suas falas. ‘Nós vamos dar voz pra quem não tem voz nesse país.’ Além disso, a proximidade com o público, pela adoção de elementos do universo cultural do espectador e conexão com o local imediato faz parte da cartilha deste segmento.

A autora do livro Jornalismo Popular, Márcia Franz Amaral, doutora em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), assegura que um periódico popular deve representar as pessoas de forma digna. Publicar notícias num formato didático, sem perder seu contexto e profundidade. A doutora enfatiza que o popular necessita ainda agregar o conceito da responsabilidade social da imprensa (dever de assumir os efeitos sociais das informações que divulga) ao de utilidade social (atendimento aos interesses concretos dos cidadãos). O mestre em Comunicação e Cultura, Alan Barreto, observador de mídia e avaliador dos cursos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep), acredita que a única forma de fazer jornalismo popular é ‘dar voz sem preconceitos aos excluídos’. Dar visibilidade aos carentes, uma vez que fazem parte de uma ‘sociedade invisível’.

No entanto, para que o jornalismo popular alcance o ideal teorizado, alguns desafios precisam ser superados. Segundo Márcia, a ênfase na opinião do repórter à posição do cidadão é um deles, além de saber relatar notícias de interesse público de maneira humanizada, ampliando o conhecimento do leitor sobre o mundo. ‘Compor este cenário sem se tender para o campo do entretenimento e do espetacular é um dos desafios do jornalismo popular’, analisa. Para Barreto, o jornalismo popular sério ‘implica em ter que andar na contra-mão evitando clichês. Conseguir isto é transformar desvantagens em ações positivas’.

De acordo com Márcia, a principal vantagem dos jornais populares é a proximidade com públicos não habituados à leitura de jornais. A conexão feita com uma notícia, empregando-a no cotidiano é um dos diferenciais e contribui para o entendimento do acontecimento. No lugar da matéria sobre o aumento do valor da gasolina nas bombas de combustível, a matéria poderia priorizar o impacto que esse aumento causa nas tarifas do ônibus urbano, por exemplo. ‘Aqui no Rio Grande do Sul, quando ocorre uma grande feira agropecuária, o Zero Hora faz matérias sobre o valor comercializado na feira e sobre os animais premiados. O Diário Gaúcho, publicação popular, pauta os empregos temporários gerados pela feira’, exemplifica Márcia. Já as desvantagens do jornalismo popular podem ser resumidas em dois aspectos: ‘representação das classes populares como ‘destituídas de interesse político, notícias descontextualizadas e a mescla entre informação e entretenimento’, ressalva.

Posicionamento universitário

Com esse crescimento, aumenta também o interesse em discutir o jornalismo popular na academia. Para o jornalista João de Abreu, doutor em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e chefe do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (UFF), popular ‘é um conceito, que deve abranger todas as disciplinas de jornalismo, e não apenas uma’. De acordo com o jornalista, se as disciplinas de Linguagem Jornalística, Planejamento Editorial, Ética, Jornalismo Político, Econômico e outras pensarem e discutirem o objeto e o público-alvo, estarão introduzido o conceito ‘popular’. A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) enfatiza o assunto em oficina sobre jornal popular na semana de jornalismo, além de estudar o tema nas disciplinas de redação, telejornalismo e rádio.

Diferentemente da maioria dos cursos de jornalismo do país, a UniverCidade, instituição de ensino do Rio de Janeiro, oferece um curso de extensão exclusivamente sobre o assunto. Além de aprenderem a produzir textos direcionados ao jornalismo popular, os alunos inscritos estudam temas como sensacionalismo e entretenimento, imprensa e ética, cobertura jornalística em diversas mídias, cultura e imprensa popular.

Popular?

Nada mais correto e justo que denominar estes diários de populares. No levantamento anual do Instituto Verificador de Circulação (IVC), o jornal popular Extra, do Rio de Janeiro, ocupa o terceiro lugar entre os dez que mais circularam no País, à frente de jornais como o Zero Hora e o gigante O Estado de S.Paulo.

O jornalista Eugênio Bucci, em artigo para a Folha de S. Paulo, chama a atenção para como a palavra popular ‘adquire uma conotação preconceituosa’ quando se refere ao jornalismo. No entanto, a longo prazo, não parece existir a perspectiva de que os conceitos formados sobre jornalismo popular mudem no cenário brasileiro. O processo gradativo de renovação de público e conseqüentemente, de seus interesses factuais, são os únicos fatores capazes de fazer com que os últimos resquícios do afamado ‘espreme que sai sangue’ se acabe. Basta esperar e acompanhar os rumos a que essa correnteza guiará.

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Alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Adventista