Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O jornalismo e o capital simbólico

Está aí um artigo que nunca pensei que iria escrever. O diploma para o exercício da profissão de jornalista não é mais obrigatório no Brasil. No que isso vai influenciar daqui para a frente, é difícil de mensurar agora. Mas algumas considerações devem ser feitas.

Tirando o que já se comenta, e muito, a respeito do jornalismo como formação acadêmica, algumas coisas passaram quase que despercebidas na discussão que acabou na lamentável decisão do Supremo Tribunal Federal.

Lembro-me de uma aula que tive com a professora Níncia Teixeira Ribas, ainda na graduação, no curso de comunicação social da Unicentro (Universidade Estadual do Centro Oeste), quando falávamos sobre a formação de um jornalista e sua profissão. A professora, mesmo sem ter formação de jornalista, mas uma das melhores docentes de Letras que conheço e profunda conhecedora e admiradora da área da comunicação, alertava sobre a importância social da profissão de jornalista.

Seu discurso foi coerente e extremamente esclarecedor. Na argumentação ela frisava que se um médico cometesse um erro, ele arruinaria a vida de uma pessoa. Se um professor cometesse um erro em sala de aula, ele iria ‘arruinar’ a vida de 30 alunos, mas e se um jornalista cometesse um erro? A vida de quantas pessoas ele arruinaria? Impossível contar.

Como entender a profissão

O alcance do trabalho de um jornalista é algo que não se pode calcular e me entristece saber que em meio a tanta discussão, pouco ouvi falar sobre o jornalismo enquanto capital simbólico. Praticamente não se levou em conta o fato de que trabalhamos com informações e pessoas e, da forma com que o mundo se encontra hoje, são dois dos mais importantes pilares da sociedade moderna.

A todo momento, na mídia, ícones são criados e destruídos, tudo através da imprensa. Afinal de contas, não é só a morte que acaba com a vida de alguém, mas existem ‘n’ formas de destruir uma vida, e nós, jornalistas, trabalhamos talvez com uma das principais delas, a informação. Que pode ser de caráter pessoal, profissional, coletivo ou de massa. E como saber lidar com isso?

Sem dúvida existem muitos exemplos de bons profissionais que, mesmo sem terem cursado uma faculdade de jornalismo, lidam bem com essa questão, mas uma coisa é certa: somente quem sentou em um banco universitário é que tem o mínimo de compreensão da importância e do poder que a profissão de jornalista possui.

É uma pena que a discussão capitalista tenha superado a discussão simbólica e do conhecimento e pena maior ainda é que as pessoas que tomaram a decisão de acabar com a obrigatoriedade do diploma de jornalismo nunca tenham frequentado um colegiado de jornalismo para entender realmente o que é a nossa profissão.

Informação é coisa séria

Se amparado por um diploma universitário já é difícil controlar esse capital simbólico, imagine agora, sem ele… Para piorar, não podemos esquecer que a categoria não possui qualquer tipo de conselho ou órgão de classe para regulamentar a profissão. Como ficará um dos bens mais preciosos da sociedade moderna sem qualquer tipo de amparo que garanta a sua boa utilização?

Não é possível prever o futuro, mas uma coisa é certa: o tempo deverá fazer com que as mesmas pessoas, entidades e órgãos que defenderam o fim da obrigatoriedade do diploma sintam na pele as consequências de tal decisão. Afinal, a curto e médio prazo, os jornalistas profissionais podem até serem prejudicados, mas quando a responsabilidade começar a cair sobre os ombros de quem detém agora o timão da informação, a coisa poderá se inverter. Informação é coisa séria, já alertava algum slogan que ouvi esses tempos por aí, e com coisa séria não se brinca.

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Jornalista formado pela Unicentro, especialista em mídia e política pela UEPG e assessor de imprensa