Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O uso do diploma na parede do quarto

Entre 2008 e 2009, o Supremo Tribunal Federal julgou ser desnecessária a formação superior para o exercício da profissão de jornalista. Na última semana, em primeira votação, o Senado votou favorável à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 33/2009 a favor da exigibilidade do diploma, o que me parece mais sensato. De fato, ter um diploma não é sinônimo de ser um bom profissional, que entende as técnicas da profissão e exerce o código de ética. Mas não ter um diploma é sinônimo de menos que isso. Não que todos os profissionais do jornalismo sem curso superior sejam os piores do mercado, o que, em muitos casos, é justamente o contrário. É só uma questão de ordem, controle.

Quando se fala em controle não se quer dizer censura. O maior argumento daqueles que são contra a exigência do diploma é que, aqueles que são a favor querem apenas uma reserva de mercado, ou seja, diminuir o número de profissionais para obter um bom emprego. Óbvio que há quem pense assim. Há também aqueles, como no voto do ministro do STF Gilmar Mendes, vê o fato como uma censura aos demais cidadãos que estariam “inaptos” a escrever em jornais. No entanto, acredito que o maior problema é a falta de entendimento da profissão. Jornalismo é uma profissão técnica e nada mais que isso.

No entanto, acredita-se que se trata de algum tipo de arte, que necessita de talento e “saber escrever”, ou algo teatral do qual se tem o “dom” do improviso ao falar em público. Isso não é jornalismo e, se dizem que é, é enganação. O exercício de qualquer profissão é algo técnico que, obviamente, há a possibilidade de se aprender na prática ou na universidade, como em qualquer profissão. Se alguém for exercer a medicina na prática, em um hospital, com os demais médicos ajudando, uma hora ele vai saber fazer. Mas ninguém pensa em tal possibilidade e pode achar absurda determinada comparação.

Aprendi nas salas e corredores

Fala-se, em contraponto, que a medicina é uma questão de saúde, de vidas, e o jornalismo não passa por isso. Há quem diga que o jornalismo também interfere na vida, na democracia, na reputação das pessoas e da sociedade. Pode ser ou não. Depende de qual jornalismo se faça. Ou melhor, depende se se faz ou não jornalismo. E, para isso, há de se saber o que é o jornalismo, qual o seu papel e como se faz para realizá-lo. E mais: jornalismo não é só determinada coisa, há especialidades diferentes, métodos e técnicas. Ouso chamá-lo de ciência, embora muitos jornalistas, até pesquisadores, são contrários a tal.

A questão é que para debater, discutir e compreender toda a relevância e o exercício do jornalismo convém algumas (muitas) horas de estudo. Daí, a ideia da necessidade de uma universidade. Em contraponto, vão dizer que ninguém estuda na universidade (podem até falar que vão ao local para fumar maconha e beber cachaça), que os cursos são ruins e por isso o jornalismo feito é ruim. Bem, aí não é um problema da falta de exigência de diploma e, sim, da falta de competência dos cursos. Que até não nego que possa existir. Mas, até onde me lembro, as coisas mais importantes da profissão eu aprendi mesmo nas salas e corredores de um curso de jornalismo.

Conselho de Jornalismo

No entanto, é como se disserem: como a polícia é ineficiente, qualquer um vai passar a ser polícia a partir de agora. Aí, os que desejam, compram armas, viaturas, coletes e saem por aí colocando em prática a Justiça que mais lhe apetecem. Nesse caso, podem aparecer policiais bem melhores do que os que já estão. Como aparecem jornalistas melhores do que os que já estão. Mas quem quer correr esse risco? Parece alto demais, não é? Sim, é muito alto. Ou seja, ter um diploma não é garantia de se ter um bom profissional, mas não ter também não é. Para que o diploma seja um certificado de competência, há de se melhorar os cursos, a capacitação e, além disso, ter um controle externo da profissão.

Sim, sou favorável à existência de um Conselho de Jornalismo, em consonância com a Ordem dos Advogados do Brasil ou o Conselho Federal de Medicina. Há a possibilidade de se tornar apenas um jogo político para atender os interesses de alguns? Há. Mas este não é o problema da existência do Conselho, e sim, da inabilidade de seus membros e de sua alçada. O que só pioraria se qualquer um pudesse fazer parte. A priori, o Conselho conteria excessos e faltas, seja na estrutura de trabalho dada aos profissionais (que é reconhecidamente falha) ou mesmo no trabalho desses profissionais, sejam eles quais for e para quem trabalham ou beneficia. Não é a solução do mundo. É a melhora de um serviço social, como o é o jornalismo.

***

[Vandré Abreu é jornalista, Goiânia, GO]