Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Para todos os ouvidos

O Monitor de Mídia iniciou um novo projeto na semana passada. Agora, além dos diagnósticos da imprensa catarinense e dos textos das seções fixas, também oferecemos parte do nosso conteúdo em arquivos de áudio. A idéia é simples: você pode ler os textos ou ouvi-los. Embora simples, a idéia não foi fácil de ser concretizada. Durante quatro meses, a equipe planejou e desenvolveu as soluções tecnológicas que permitem que você dê alguns cliques e ouça o Monitor onde bem entender.

Os desafios foram vários: que formato adotar? Como disponibilizar os arquivos? Que tamanho esses arquivos deveriam ter? O que poderiam ser oferecidos? Parece pouco, mas não é. Afinal, há leitores do Monitor em diversas localidades, inclusive fora do país. Alguns acessam o site de casa, outros do trabalho ou da escola. Há leitores com conexão de internet discada, outros desfrutam de banda larga. Foi pensando em tudo isso que decidimos oferecer parte do material que semanalmente oferecemos neste site. Geralmente, você poderá ouvir nossos editoriais e os textos que alimentam as colunas do Monitor de Mídia. Sempre na voz dos seus autores: professores e alunos.

Pensamos no público, no usuário. Mas pensamos em mais gente. Pensamos naqueles que não tinham acesso ao Monitor. Não por falta de internet, mas por dificuldades de enxergar. Se é o seu caso e se você, agora, ouve este editorial, seja bem-vindo ou bem-vinda.

Para a equipe do Monitor de Mídia, essa sua chegada é muito importante. Afinal, acreditamos na convergência das mídias, mas com acessibilidade. Mais do que isso, acreditamos na convergência dos públicos, das pessoas.

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Dólar que cai é pauta que sobe

As oscilações do mercado financeiro podem confundir os menos entendidos no assunto. A função da imprensa é aproximar e contextualizar os temas para a maior parte do público. Porém, muitas vezes, as editorias de Economia apresentam assuntos em uma linguagem que mais parece outro idioma.

Nesta semana, com a queda do dólar a índices mais baixos desde 2001, este Monitor de Mídia dedicou sua análise para a valorização do real frente à moeda estrangeira. Para isso, conferiu os três principais jornais catarinenses – A Notícia, Diário Catarinense e Jornal de Santa Catarina –, durante os dias 15, 16 e 17 de maio. Apesar de todos os veículos pertencerem ao mesmo grupo, houve contrastes na cobertura entre eles.

A Notícia: a linguagem também oscilou

Na quarta-feira, 16, a queda da moeda americana foi manchete: ‘Dólar rompe ‘barreira psicológica’ dos R$2,00’. Além disso, foram publicadas as chamadas de capa ‘É a menor cotação da moeda em seis anos’, ‘Câmbio vai cair ainda mais, prevêem analistas’ e ‘A repercussão entre os empresários catarinenses’.

Sob o título ‘Após seis anos, dólar vale menos de R$2,00’, a matéria descreveu como e porque ocorreu a queda da moeda. Além de explicar os motivos, o jornal consultou o economista do Santander Banespa, Maurício Molan. Apesar dos detalhes, o jornal não utilizou uma linguagem tão acessível aos leitores comuns. Além da utilização de infográficos mostrando a cotação do real nos últimos anos, foram publicados dois boxes comparando o que se podia comprar com R$2,00 em 2001 e em 2007. O periódico ainda publicou a opinião de empresários catarinenses diante do fato.

A sub-retranca ‘Câmbio em baixa ajuda a manifestar os hábitos dos consumidores’ mostrou para os leitores em que pontos são beneficiados ou prejudicados com a queda do dólar. A linguagem fugiu um pouco do ‘economês’ e possibilitou um melhor entendimento.

Na edição de quinta-feira, 17, o editorial ‘Porque o dólar cai’ tratou dos reflexos no Brasil, das exportações, do crescimento que será possível no país e, principalmente, explicou de maneira simples, porque a moeda sofre quedas. Uma charge ironizando a desvalorização da moeda americana também foi publicada.

A chamada de capa ‘Dólar em queda’ referiu-se ao abre da editoria de economia ‘Apenas lamentar, não adianta’. A matéria falou da movimentação dos empresários para não perder na exportação. O jornal destacou que, para garantir o verde-e-amarelo lá fora, as empresas têm que investir em produtos diferentes. A matéria veio acompanhada das sub-retrancas ‘Modernização está muito mais em conta’ e ‘Nem o Banco Central consegue segurar o dólar descendo a ladeira’. O jornal fez uso de infográficos explicando de forma simples os efeitos do dólar – ‘Quem ganha’, ‘Quem perde’.

De maneira geral, viu-se que o AN contextualizou, aproximou e ofereceu informações aos seus leitores.

Diário Catarinense ‘investiu’ na queda

Na edição do dia 15, houve pouco conteúdo sobre a queda do dólar, tendo apenas uma ocorrência. Porém, essa matéria foi o destaque da página 12, Economia, dividindo espaço com o Porto de Navegantes e o superávit.

Intitulado ‘Dólar cai mais e chega a R$2’, o conteúdo do texto se restringiu a enfocar sem regionalidade, ou seja, não trouxe o assunto para o âmbito local. Tendo em vista que temos alguns pólos turísticos no Estado, dentre eles Florianópolis e Balneário Camboriú, trazer esse tema para uma visão catarinense seria interessante.

Por outro lado, a matéria trouxe um bom infográfico, que mostrou o sobe e desce do dólar de julho de 1994 a agosto de 2005. Para completar, o DC publicou um box no estilo ‘saiba mais’, apresentando aos leitores quem ganha e quem perde com a queda da moeda norte-americana.

Na edição do dia 16, a mudança cambial foi chamada de capa: ‘Consumidor mira produtos importados’. O desdobramento do tema apareceu na editoria ‘Economia’ com o título: ‘Dólar cai mais e fica em R$ 1,98’. A matéria mostrou os efeitos da desvalorização do dólar no Brasil e trouxe um box apontando os efeitos negativos e positivos para a população, com linguagem clara e acessível ao leitor.

O enfoque local só apareceu na matéria: ‘Preço baixo atrai consumidores’ que apresentou como a queda influenciou alguns setores, como supermercados e carros importados da região. Além disso, mostrou a opinião do presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas (FCDL) de SC, que alertou que ‘a curto prazo a desvalorização do dólar é benéfico para o consumidor e para o comércio, mas a indústria vem sofrendo com o desemprego, o que interfere no poder aquisitivo e acaba refletindo de forma negativa no comércio’.

Ainda nesta edição, o DC trouxe a posição do ministro da Fazenda, Guido Mantega, com ‘Mantega descarte aventura’, tratando o assunto em âmbito nacional. A queda do dólar rendeu apenas uma página da editoria do jornal neste dia. O assunto apareceu também na charge de Zé Dassilva.

Esta edição merece destaque e elogios com relação à cobertura sobre a queda do dólar. Logo na capa, o assunto foi manchete, apontando sob o título de ‘Dólar caí mais e inibe economia catarinense’, que este fato seria destaque no periódico. O tema ganhou status de Reportagem Especial e duas páginas de espaço. Não bastasse isso, o DC atirou pra muitos lados e acertou em cheio.

A matéria que abriu a editoria ‘Especial’, intitulada ‘SC paga a conta’, trouxe o assunto para o âmbito estadual. Citou exemplos de setores, em diferentes locais do estado, que sofrem com a queda da moeda norte-americana. Foram feitas referências a setores prejudicados em Lages (setor madeireiro), Blumenau (setor têxtil), São Bento do Sul e Rio Negrinho (setor moveleiro), sul do Estado (setor cerâmico) e oeste (suinocultura). Além disso, o DC deu voz a pessoas ligadas a alguns desses setores, para que comentassem sobre a desindustrialização, termo usado para definir a atual situação de alguns segmentos comerciais.

O assunto foi complementado por outra matéria relacionando a queda do dólar aos impostos. O texto trouxe a tentativa dos técnicos do Ministério da Fazenda em apressar medidas de redução de impostos para as empresas prejudicadas com a queda do dólar. Além dessa segunda matéria dentro do especial sobre a moeda norte-americana, o jornal publicou uma pequena entrevista (apenas duas perguntas) com Paulo Francini, diretor de economia da Fiesp.

O DC ainda foi além e veiculou três boxes. O primeiro relatava os efeitos da desvalorização do dólar nas empresas têxtil, de metal mecânico, madeireiras, setor mobiliário, pecuário e cerâmico. O segundo box, intitulado ‘Eletrônicos têm forte procura’, tratava do poder aquisitivo da população com relação aos aparelhos eletrônicos, que com a queda da moeda norte-americana tendem a cair de custo também. O último box serviu para explicar os motivos do enfraquecimento do dólar no país. O jornal também publicou um infográfico com alguns pontos relevantes na trajetória da moeda norte-americana de 2004 até agora.

Em suma, o Diário Catarinense se dispôs a tratar o assunto em diferentes aspectos e explicar para o leitor o que provocou a queda do dólar, como está o cenário atual e as possíveis conseqüências caso a moeda continue desvalorizando. O jornal fez uma cobertura madura e pés-no-chão, quer dizer, trouxe para a maior parte dos catarinenses o assunto e como ele os afeta.

Jornal de Santa Catarina foi protocolar

Em 15/05, o jornal evidenciou em uma pequena nota que o ‘Dólar beira R$ 1,98’. Descritivo, o texto foi escrito no ‘economês’ – linguagem cheia de números e porcentagens, com pouca tradução para o cotidiano. O mesmo teor foi apresentado no dia seguinte, na matéria ‘Dólar cai mais e fica em R$ 1,98’. Além da opinião de operadores de bolsa e outros envolvidos no processo, junto com o material estava o box ‘Desvalorização’. Nele, foram apresentados os produtos compráveis com R$ 2,00 em fevereiro de 2001 e abril de 2007. Já no dia 17/05, o Santa relacionou e aproximou a queda do dólar com a realidade catarinense em ‘Bateu o desespero’. Nesta matéria, o foco foi medo dos exportadores catarinenses por uma ‘desindustrialização’. O assunto foi abordado no ponto de vista das indústrias têxteis.

Nestes quatro dias, o Jornal de Santa Catarina ficou somente no relato da situação do dólar. Os textos foram descritivos e distantes do leitor comum. Apenas nos dois últimos dias que a repercussão apareceu, porém, com pouco destaque.

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Os jornais educam no ciberespaço?

Laura Seligman # professora e pesquisadora do Monitor de Mídia

Essa pergunta é feita a todo o momento e sob diversas abordagens por pais, professores e pesquisadores. O que aprende o sujeito que aperta a tecla de ligar do computador e se conecta a um mundo de informação e de conhecimento? Mais do que isso, como aprende o sujeito conectado?

Para alguns autores, sem mesmo questionar o jornalismo, é possível uma pedagogia crítica no ciberespaço, apesar do reconhecimento de que nele, tudo cabe. O ofertório de temas e abordagens com reconhecida credibilidade se misturam a um mar de construções frágeis, cheias de falhas. Para o israelense Ilan Gur Ze’ev, professor da Universidade de Haifa, há conflito entre os dois conceitos. Pedagogia crítica é uma construção moderna que objetiva o Esclarecimento. O ciberespaço é totalmente pós-moderno, descentrado, múltiplo.

Apesar do pessimismo de Ze’ev, outros frankfurtianos vêem com bons olhos as possibilidades do virtual como oportunidades para que o ato de aprender ganhe novas configurações. É o caso de Douglas Kellner, estudioso da Escola de Frankfurt, e de Lankshear e Peters, todos citados por Ze’ev no artigo ‘É possível uma educação crítica no ciberspaço? (disponível aqui).

Para Pierre Levy, no livro Cibercultura, a rede mundial de computadores muda a relação que temos com o mundo e com os fatos. Na web, as informações circulam num fluxo ininterrupto – muda também o conceito de proximidade. ‘Cada conexão suplementar acrescenta ainda mais heterogeneidade, novas fontes de informação, novas linhas de fuga, a tal ponto que o sentido global encontra-se cada vez mais difícil de circunscrever, de fechar, de dominar’.

Para a maioria, as multiplicidades da web são vistas como uma panacéia. Um novo mundo tecnológico onde homens são servidos por máquinas em nome de um bem comum não é exatamente um quadro novo. Durante todo o século XX a filmografia tratou de imaginar como seria a nossa relação com as máquinas. O medo de que elas nos dominassem esteve presente em muitas personagens. Talvez a mais fantástica delas tenha sido o computador HAL 9000, de Kubrick em 2001 – uma odisséia no espaço.

O que mudou realmente nas relações sociais com as tecnologias? Como o jornalismo passa a ser visto pelos que têm acesso à Internet? No processo de construção da notícia, pouco ou nada mudou. Na forma como lemos as notícias, quase nada mudou além da velocidade com que elas se apresentam e se retiram.

Talvez a maior mudança seja a diferença física que destacava as diferenças entre jornalismo e conhecimento acreditado deixa de existir na web. O jornal de papel, que suja as mãos e se deteriora perde em credibilidade para os livros, elaborados fora do processo estonteante do jornalismo, publicados após longas revisões e em qualidade para durar uma vida.

Na web todos parecem obedecer a um mesmo estatuto e quanto à aparência física, os jornais saem desta vez na frente, com recursos múltiplos – fotos, imagens, sons, figuras que piscam, se movimentam, levam o leitor para todo o lugar.

A aclamada democratização do acesso e da construção do conhecimento na Internet e a multiplicidade que lhe é característica pode ter reafirmado o estatuto de verdade dos jornais em vez de lhes marcar com a crítica esperada. Quem tem mais credibilidade para o internauta – a instituição ou o indivíduo?

A cada passo que se dá em direção à popularização de novas mídias se reafirma a necessidade de educar para que sua leitura seja crítica. Nossos 15 milhões de internautas brasileiros, expostos a bilhões de unidades de informação por navegação, não podem ser educados criticamente se os parâmetros educacionais forem os de uma concepção moderna de aprendizagem. É fisicamente impossível fazê-lo sozinho, há que ser educado para tanto. Se há uma nova ordem da informação e da comunicação, protagonizada pela construção da Sociedade da Informação, a nova ordem educacional deve deixar os documentos de papel e ganhar a prática pública. Talvez assim, não só os jornais eduquem dentro ou fora do ciberespaço, mas o conhecimento possa ser alcançado em toda a parte.

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Metamorfose binária

Joel Minusculi

Na internet, assim como na natureza, nada se perde e tudo se transforma, ou melhor, se configura. Os dados que transitam pelas redes são voláteis, não seguem um modelo tradicional e podem se apresentar na forma mais atraente aos usuários. A sociedade ainda dá seus primeiros passos nessa estrada pavimentada por seqüências numéricas e se deslumbra com as possibilidades disponíveis.

Antigamente, na visão dos já imersos na praticidade da grande rede mundial, para cada meio específico a informação tinha uma cara diferente. Nos impressos, o texto era predominante. O rádio surgiu com o áudio como plataforma exclusiva. Já a televisão apresentou através de imagens e movimentos a iniciativa mais precursora na conjugação dos modelos anteriores. Mas ainda faltava a interatividade.

Hoje, com a expressão ‘convergência de meios’ na moda, a internet concentra a mídia e os bancos de dados em um único lugar, acessível de qualquer ponto com uma conexão. Mas não pára por aí, pois a internet desenvolveu seu sistema ao ponto de uma segunda versão, a 2.0, que incentiva a participação e a construção coletiva. Além disso, já é discutida a terceira geração. desse meio, que surge como uma extensão dos gostos e vontades humanas dentro do mundo virtual.

É como se a internet fosse um cérebro da grande comunidade virtual, em que cada usuário faz o papel de um neurônio e a conexão dos impulsos elétricos entre as células. Esse sistema produz e absorve informações em larga escala, através das plataformas que atuam como os sentidos humanos. A internet se consolida como um sistema de processamento e armazenagem. E, diferente dos outros meios, a informação contida neste espaço pode ser trabalhada de acordo com a vontade do internauta.

Os textos não precisam ser lineares. As idéias podem ser apresentadas de forma resumida, com o desdobramento de termos ou complementos através dos hyperlinks. Até a criação e manipulação desse tipo de conteúdo é dinâmica na internet, já que em poucos cliques, por exemplo, alguém pode copiar informações em um verbete da Wikipedia, colar em seu blog, cortar algumas sentenças que julga desnecessárias, mudar a ordem de outras e adicionar comentários pessoais. Neste processo, há a preservação da essência, mas não do estilo.

Sons e imagens servem de complemento e alternativa de expressão ao conteúdo do texto. Graças ao desenvolvimento da velocidade das redes, hoje é possível compartilhar com todo o mundo, praticamente em tempo real, um flagra de uma modelo famosa com o namorado na praia, por exemplo. E, depois disso, entrar em fóruns de discussão e trocar gracejos sobre a situação.

Graças à capacidade de replicação do conteúdo da rede, através de downloads e o famoso ‘ctrl+c e ctrl+v’, a informação é de certa forma eterna na rede. Além de poder estar hospedada em algum servidor, os próprios usuários podem ter cópias, sejam elas legais, ilegais ou open surce. Tudo para disponibilizar mais tarde na melhor forma que o usuário precisar.

Esse panorama parece caótico sob qualquer ótica, já que a evolução geral corre a passos mais largos do que o reconhecimento científico de cada detalhe. Para o pleno aproveitamento das possibilidades variáveis, as pessoas que manipulam a informação com e na internet necessitam mais do que habilidade, precisam de consciência e perspectivas de sua aplicação para o mundo real.