Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Um falso dilema

Nas últimas semanas, a proposta de criação de um código de conduta para a blogosfera provocou muitos debates na internet. A sugestão veio de dois nomes influentes da web: Tim O’Reilly, editor de livros e criador da expressão Web 2.0, e Jimmy Walles, o pai da Wikipedia, a enciclopédia virtual.

A proposta gerou polêmica pois se apoiava no argumento de que blogueiros deveriam sempre assumir suas posições, e o anonimato deveria ser banido desse universo. Por trás da idéia, estão preocupações com a reputação das pessoas e com a credibilidade de sites e blogs em todo o mundo.

Setores mais inflamados da blogosfera protestaram, temendo pela liberdade de expressão na web. Outros ainda brincaram com a situação, ironizando o controle e a disposição dos blogueiros em seu autoregular.

Mas há um falso dilema nessa história: liberdade de expressão versus fim do anonimato. Na verdade, a proibição de postagem de comentários anônimos não impede que os internautas se expressem, opinem, critiquem, discutam. Alguns blogs podem impedir a inserção de comentários anônimos, mas há outros subterfúgios para mascarar a identidade, como a invenção de e-mails, nomes e perfis falsos. O fim do anonimato não é um atentado à liberdade de expressão, mas traz à tona a discussão sobre os limites que os próprios usuários muitas vezes criam para harmonizar suas relações numa sociedade (mesmo que virtual). Uma pessoa pode atacar outra sem aparecer? Um internauta pode se passar por outro e criar problemas numa comunidade na web? Que critérios os usuários do sistema podem criar para evitar transtornos como esses?

Mas o leitor deve estar se perguntando: o que isso tem a ver com jornalismo? Por que o Monitor de Mídia está se metendo nessa conversa? Ora, as coisas estão ligadas por diversas razões: 1. Os blogs afetam cada vez mais a web e o jornalismo; 2. A definição de critérios de vigilância e auto-regulação na internet deve influenciar as discussões em outros meios; 3. O debate sobre liberdade de expressão interessa à sociedade, mas é estratégico e vital para a sobrevivência do jornalismo.

Essa discussão está apenas começando.

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Clic RBS aqui!

Em fevereiro deste ano, o publisher do New York Times, Arthur Sulzberger, declarou não ter certeza se a publicação continuará a ser impressa daqui a cinco anos e que as apostas agora vão para o portal on-line. Esta afirmação causou um repensar no futuro dos negócios do jornalismo. Mas não é de agora que a imprensa encontra na grande rede mundial um novo meio de propagar sua produção.

O Monitor de Mídia foca sua análise desta semana no portal de informações Clic RBS. Para tanto, comparou a edição de 10/04 de cada um dos três jornais principais do grupo em Santa Catarina – A Notícia, Diário Catarinense e Jornal de Santa Catarina – considerando seu conteúdo a e usabilidade do portal de informações da RBS.

A Rede Brasil Sul (RBS) é a proprietária deste que é o maior portal de informações do sul do Brasil. O Clic RBS disponibiliza em sua página uma grande quantidade de informações: concentra todos os canais do grupo, dividindo-se nas versões gaúcha e catarinense. A plataforma disponibiliza, além da reprodução do conteúdo dos impressos, um serviço básico de informações ‘em tempo real’ – a vantagem da alta velocidade que a internet detém dentre todos os meios de comunicação.

Crtl+C, Crtl+V

A RBS defende a sinergia em seus meios. O material produzido pelos seus profissionais pode ser aproveitado em todos os veículos, sem que se pague ao profissional pela republicação, como a lei exige. A prática é comum em todo o Brasil e é também aplicada no portal Clic RBS.

É comum encontrar na primeira página matérias reproduzidas de seus veículos impressos, como o Diário Catarinense, o Jornal de Santa Catarina e, recentemente, A Notícia. Além disso, tudo que provém de agências externas é publicado sem maiores incrementos, como cópia literal. Os textos são replicados como chamadas e desdobrados em links, que levam o veículo produtor da matéria. O texto é quase o mesmo, com cortes somente em alguns casos.

Memória reduzida

A página principal do Clic RBS não possui arquivo disponível ao leitor. O conteúdo instantâneo recebe, posteriormente, um desdobramento em algum dos outros veículos do grupo. O que existe são as ‘edições anteriores’, que são a transposição integral dos periódicos do grupo nos últimos sete dias. De forma geral, as notícias seguem o padrão de serem lançadas quentes, para depois serem adequadas dentro das devidas categorias.

Comparado a outras redes de informação, o grupo RBS fica para trás com seu arquivo reduzido. Um ponto falho, que representa a perda do registro histórico de Santa Catarina feito por sua imprensa. A Folha de S.Paulo, por exemplo, possui um acervo on-line com os textos históricos entre 1921 e 1999. Não fica disponível a edição toda, apenas uma seleção de textos considerados mais importantes.

O jornal A Notícia foi prejudicado neste sentido, com a migração para o portal Clic RBS que tirou do ar um arquivo de dez anos de edições completas. O processo, que iniciou em 03/01, já foi evidenciado no editorial ‘Notícias, boatos e as incertezas da mídia local’, em 05/03: ‘De agosto para cá, os leitores viram mais da metade do arquivo on-line de A Notícia em seu portal AN ir pelos ares’. Enquanto o AN ganhou uma nova hospedagem, os leitores/internautas perderam um importante arquivo nesta adaptação aos padrões RBS.

Onde?

Não existe um sistema de busca visível na primeira página do portal Clic RBS. A busca só existe dentro das categorias, escondidas em uma barra superior, dentro dos ‘canais’. Praticamente impossível achar por conta própria. Essa deficiência não possibilita uma usabilidade dinâmica por parte do usuário, que buscaria mais informações no momento do acesso.

Conteúdo reciclado

O conceito de portal de informação implica concentração de conteúdo. Neste aspecto, o Clic RBS acerta, porém, não há inovação com material exclusivo para o site. Tudo o que é disposto vem de algum dos veículos do grupo que já possui um endereço à parte. Isso dá ao portal uma cara de índice, um caráter dependente, não o de uma plataforma autônoma do grupo.

Além do conteúdo jornalístico, marcam presença na página principal o ‘programa de discagem automática do Clic RBS’ e o ‘Hagah’. O primeiro é um sistema gratuito para usuários de internet discada. Já o segundo é um conjunto de classificados on-line, nos moldes do portal de informação. Mais uma vez, percebe-se o monopólio do grupo RBS fortalecendo a estrutura.

Atualizações

O Diário Catarinense e o Jornal de Santa Catarina obedecem a um padrão no portal Clic RBS. A Notícia, que foi adquirida recentemente pelo Grupo RBS, está aos poucos se adequando aos mesmos padrões. Por enquanto, ainda funciona o Portal AN, que já possui a barra do Clic RBS em sua parte superior. 

No link ‘Últimas’, as notícias dos últimos minutos são atribuídas aos veículos que destacaram reportagem para cobrir o fato. A Notícia possui o AN Agora com as últimas novidades – que já é abastecido pelas mesmas fontes dos outros jornais. As atualizações dos portais são postadas a qualquer momento, sem seguir alguma periodicidade, o que é característico dos veículos on-line. O tratamento dos textos no portal é a simples reprodução do que as agências enviam ou do que os outros veículos do grupo publicam. 
Isso impede que haja um padrão, uma vez que as informações vêm de veículos impressos, de emissoras de rádio e de TV. Mas nem sempre a origem consta ao final do texto – por falha ou opção.

Opções ao leitor

É importante que os portais ofereçam opções que facilitem e ajudem o leitor. Fala-se muito em usabilidade na discussão do acesso on-line de conteúdos. A praticidade para os usuários em todos os níveis possibilita agregar um maior público. Alguns autores sustentam que quanto menos cliques, melhor. A inserção de alguns botões, como o que gera uma versão para impressão, são ferramentas fundamentais de função simples e grande auxilio.

Na página do Clic RBS notícias, há a opção de organizar as matérias por assunto ou por data/horário. No fim desta página, há botões que indicam a primeira página, a página anterior, o bloco anterior e o topo. Ao abrir as notícias, embaixo das matérias, encontram-se ferramentas como: imprimir, enviar, corrigir e voltar ao topo.

No site do Diário Catarinense e no do Jornal de Santa Catarina, embaixo dos textos constam os seguintes botões: enviar p/ amigo, imprimir, matéria/coluna anterior, títulos desta seção, próxima matéria/coluna e página anterior. 

O Portal AN, para os textos do AN Agora, havia os botões: envie para um amigo, versão para impressão, comente essa notícia, informe erro de conteúdo e informe erro de link.

Para as matérias transpostas dos jornais para o site, o AN não mostrou opções ao leitor. Em nenhum dos sites havia algum ícone para a visualização do texto em PDF – formato de arquivo que transforma o arquivo do texto em imagem para que não seja alterado.

Uma grade que agrade

Um dos atrativos da internet é a interação do usuário com o conteúdo. De fato, o ser humano tem por instinto a necessidade de deixar a sua marca. Somos seres que modificam o ambiente para deixá-los mais ao nosso agrado. Pensando nesse sentido, a web foi equipada com ferramentas que interagem com o internauta a fim de prendê-lo. Os portais de informação também arrumaram um ‘jeitinho’ de tornar seu conteúdo atrativo aos usuários.

O Clic RBS disponibilizou uma série de atrativos com o pretexto de saber o que o usuário pensa. É importante descobrir o que se passa na cabeça dos leitores de um portal, porém esse não é o único motivo de se investir em interatividade. Há também a necessidade de prender o internauta, uma vez que ele navega sem sair do site.

Seja o motivo um pretexto ou não, o certo é que essas ferramentas são importantes como instrumentos de medida da repercussão do conteúdo publicado. O Clic RBS traz algumas plataformas interessantes, porém há muito tempo usadas, como o ‘Comente essa matéria’, enquetes e o ‘Mural’, que serve como fórum. Nesse mural, a interatividade fica prejudicada, pois é o portal que levanta as questões a serem debatidas.

Ponto positivo é o espaço para que os leitores possam comentar as matérias publicadas na página. Mesmo que essa ferramenta não esteja disponível para 100% das matérias, isso é um atrativo para que os leitores interajam com o meio e repercutam seu conteúdo. O Clic RBS não disponibiliza um grande leque de ferramentas interativas e é aqui que a RBS pode melhorar, pois assim como a tecnologia evolui, as pessoas exigem cada vez mais da web.

Detalhe relevante é o fato de que não há um e-mail para se corresponder com os autores das matérias, o famoso ‘fale com’; importante para que haja um link direto entre usuário/jornalista.

Nem tão multi assim

Apesar de ter um espaço exclusivo para conteúdo multimídia, o Clic RBS traz logo na página inicial alguns itens desse gênero. Tratam-se dos links para streaming (audição on-line) das rádios CBN Diário, Atlântida e Itapema. Além disso, há um link para acessar, também on-line, câmeras que monitoram as pontes Pedro Ivo e Colombo Salles, ambas no acesso a Florianópolis. Ao clicar numa matéria específica, o internauta pode se deparar com fotos e vídeos relacionados ao assunto, produzidos pela RBS TV.

A surpresa ficou para a seção Multimídia, específica para arquivos do gênero, que não traz nada mais que streaming das rádios de propriedade do grupo. Ou seja, se o internauta quiser assistir a um vídeo de algum determinado assunto, ele terá que procurar no sistema de busca e torcer para que aquele esteja lá.

Conteúdo on-line é idêntico ao impresso

Quem compra o jornal perde, pois o conteúdo é disponibilizado de graça no on-line, e o site fica sem atrativos, traz apenas uma repetição de conteúdo. Espera-se um público diverso, mas nenhuma novidade é oferecida. A página poderia, por exemplo, trabalhar com uma interação das mídias, deixando o jornal mais exclusivo e o site mais interessante.

Jornal de Santa Catarina e Diário Catarinense

As versões on-line do Diário Catarinense e do Jornal de Santa Catarina são totalmente fiéis às versões impressas: apresentam as mesmas manchetes, destaques, fotos, matérias, colunas e demais textos. O diferencial é a seção ‘Destaques on-line’ que traz algumas perguntas aos internautas – o que contribui com a interatividade do site – além de informações adicionais sobre algumas editorias como Esporte, Geral e Lazer. Além disso, na edição analisada, essa seção possibilitou a visualização de trailers de filmes como também trouxe a versão on-line da Rádio Itapema FM.

A Notícia

Se depender do A Notícia, a previsão do fim dos jornais impressos pode mesmo se concretizar. Pelo menos é o que parece, já que os leitores podem encontrar todo o conteúdo do periódico na versão eletrônica do NA, com direito a capa, contracapa, cadernos, anexos, notas e colunas. O jornal ainda passa pelo processo de migração, por isso mantém muito dos aspectos do portal anterior à compra do jornal pela RBS.

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Monitor de Mídia