Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Um jornalismo pouco criativo

Sim, o efeitismo e o kitsch fazem parte do jornalismo atual. Mas antes de definirmos o efeitismo, vamos falar primeiro sobre kitsch. Afinal o que é kitsch?

Bem, kitsch é um termo alemão que é usado para categorizar algo distorcido de valores. Enfim, para estimar algo não tão importante. Mas esse é só um dos significados de kitsch, pois ele pode ter outras várias definições; a melhor que encontrei depois de tantas pesquisas é que kitsch é tudo aquilo é brega. Se traduzirmos ao pé letra do alemão para o português, kitsch significa brega mesmo. Mas não é só isso, o kitsch também pode ter o sentido do brega copiando o chique, ou até daquilo que é cultura popular e cafona se tornando erudita e intelectualizada.

Encontramos um grande exemplo de kitsch nos desfiles de moda, onde o brega vira elegante, o feio fica bonito e o cafona vira tendência. Enfim uma frase que simboliza bem o kitsch é um chavão irônico que todo mundo conhece que é: ‘Na vida nada se cria, tudo se copia’, (sátira de ‘Na vida nada de se cria, nada se perde, tudo se transforma’) e essa frase é só um dos aspectos em que faz com que o jornalismo entre no kitsch, ou o kitsch no jornalismo. Porque afinal, o que mais falta no jornalismo atual é originalidade. Pronto, achei mais um conceito para kitsch, a falta de originalidade.

Kitsch e sensacionalismo

Mas, enfim, voltando ao jornalismo, hoje o que vemos é muito meio de comunicação imitando um ao outro. Nos jornais impressos, por exemplo, as matérias são muito parecidas, não há muita diferença ao lermos a Folha de S.Paulo e o Estado de S. Paulo, pois os dois só informam notícias do dia-a-dia. Falta criatividade para buscar matérias diferentes e até as fotos são as mesmas, pois são colhidas das mesmas fontes, por exemplo Reuters e EFE. Lembro de uma vez, no primeiro ano da faculdade de Jornalismo, em que fiquei impressionado quando um professor levou uma Folha e um Estadão do mesmo dia e, pasmem, as capas eram idênticas. Até as posições em que colocaram as matérias e as fotos eram as mesmas. A única diferença era o nome do jornal escrito no alto da página.

Na internet, TV e rádio há o mesmo problema. O único meio que se salva do conceito de falta de originalidade é a revista. Mas as revistas não fogem do kitsch, pois muitas se enquadram perfeitamente em outro conceito kitsch que é o brega se passando por chique. Quer maior exemplo disso do que as revistas de fofoca? Aliás, o kitsch praticamente serve com pauta para as revistas desta área do jornalismo. Porque não há nada mais brega do que a ilha de Caras, mesma ilha que é passada como lugar chique para quem sai fotografado nela. O mesmo conceito, claro, se enquadra também aos programas deste segmento marrom de jornalismo na TV.

Ainda neste conceito, e continuando na TV, vemos o kitsch nos programas sensacionalistas, onde notamos o popularesco se tornando exemplo de vida e ganhando força como ditame de regras da sociedade. Tanto que programas como o antigo Aqui Agora, do SBT, apresentado por Gil Gomes, ou Cidade Alerta, da Rede Bandeirantes comandado por José Luiz Datena, e os atuais Brasil Urgente, liderado pelo o mesmo Datena, e Balanço Geral, da Rede Record, bem ou mal, são alvos de comentários de pessoas de todas as classes sociais.

Exemplo de efeitismo

Dependendo da matéria, até meios de comunicação que não têm o hábito do sensacionalismo caem na espetacularização, como vimos claramente no caso da própria garota Isabella Nardoni. Neste episódio da infeliz garota, com o pai e madrasta assassinos, notam-se claramente vários conceitos de kitsch. Primeiro a cópia, foi um meio imitando o outro, nenhuma novidade, nenhuma apuração diferenciada, o que o rádio noticiava, a TV informava igual, e no jornal, revistas e internet as notícias sobre o caso eram as mesmas.

Mas um conceito do kitsch visto claramente neste caso é que, mesmo sendo a mesma noticia informada igualmente, o status era diferente dependendo do meio de comunicação que informava. O que era tosco e sensacionalista no Brasil Urgente se tornava dramático e comovente no Jornal Nacional.

Ainda sobre caso da garota Isabella Nardoni, conseguimos retratar um exemplo de efeitismo, que nada mais é que o efeito e as sensações que causam nas pessoas, algumas situações momentâneas, superestimadas por alguém, mas quando nos deparamos com as mesmas ou outras mais chocantes situações no dia-a-dia, damos pouca importância.

Culpa dos problemas da sociedade

No episódio de Isabella, houve uma comoção nacional. Pessoas se sensibilizaram e acompanharam todos os dias os acontecimentos, assistiram passo a passo às investigações na TV e as que não se contentaram com as informações de um só meio, procuravam em outros veículos de comunicação como jornal, rádio e internet. Mensagens de apoio para mãe foram enviadas pelo Orkut e até comunidades foram abertas em homenagem a Isabella. Além de camisas com fotos do rosto da menina.

Tudo isso com o apoio e o sensacionalismo da mídia, a maior culpada por essa comoção superestimada da população, pois ambos (população e mídia) esquecem que casos como da Isabella acontecem todo dia, e até piores. Não há nenhuma comoção de nós ao vermos um garoto morto de fome pedindo comida na rua. Ninguém se sensibiliza com o caixa de banco assassinado por ladrões como acontece diariamente nas grandes cidades do país.

Claro que a mídia não tem culpa de todos os problemas da sociedade e nem tem como noticiar tudo de ruim e absurdo que acontece no país porque tem outras notícias a passar sobre os demais temas que também fazem parte do jornalismo.

Informar sem cair na mesmice

Mas o jornalismo ultrapassa suas funções quando começa a extrapolar, divulgando as mesmas noticia só com comentários sem base alguma. E os meios de comunicação fazem isso, usando uma matéria para ganhar audiência, vender mais, enfim, se importar pura e somente com o lucro.

Para isso alguns meios desrespeitam e enganam o público, com imagens e fotos de pessoas aos prantos, outras fazendo protestos, entre outras coisas. Enfim, dramatizando uma notícia, quando sua obrigação era somente informar.

O jornalismo usa, ainda que indiretamente, o kitsch e o efeitismo juntos para causar sensações às pessoas, o kitsch sendo usado para informar algo já noticiado por outro meio e o efeitismo para sensibilizar as pessoas.

Todavia nem sempre este ‘algo’ tem realmente um real valor. Assim como no kitsch brega vira chique, no jornalismo mal feito há circunstâncias em que a mentira vira verdade.

Mas existe jornalismo sem kitsch e efeitismo. O segredo é fazer o jornalismo da maneira mais simples, sem exageros e sensacionalismos. Fazer o que é o dever de todo jornalista, que é só informar a população do que acontece, sem exageros e com criatividade, não caindo na mesmice.

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Estudante de Jornalismo da UniFIAAFAAM, São Paulo, SP