Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Uma reflexão metodológica

Depois da discussão em torno da não obrigatoriedade do diploma do curso de Jornalismo, outorgada pelo STF em junho deste ano, relembrei um episódio interessante, que timidamente, mas sem perder a dignidade, ilustrou os meus primeiros dias de aula.


A pauta em uma das salas da UFPB, numa manhã de julho de 2005, era a epistemologia do jornalismo para cada um de nós. Mesmo que não entendêssemos direito, começávamos o curso muito bem, pela essência e pela individualidade.


Os alunos presentes e interessados na discussão sentaram no famoso círculo das ciências humanas e cada um pôde, livremente, expor o que o motivou a escolher aquele curso… ou não, já que muitos negaram a pretensão de levá-lo até o fim, ou mesmo até o final do semestre.


Uma atividade banal, num primeiro momento, foi marcante para delimitar a trajetória daqueles ingressos, chamados carinhosamente de ‘ferinhas’ por onde passavam.


A turma era homogênea no seu interesse fundamental, o jornalismo, mesmo poucos admitindo que tivessem a vocação como primeiro requisito ao ter prestado vestibular. Esse, na verdade, deveria ser um dos últimos pretextos caso houvesse demasiada timidez ou pretensão na sua escolha.


Miscelânea de gostos


A pergunta que não queria calar era: E então, quem pretendia ser jornalista? Silêncio e falta de atitude marcavam aqueles rostos. O cansaço e a desilusão, penso eu, não existiria só naquela sala, mas em qualquer outro curso da instituição. A falta de apóio era regra e não exceção, antes de passar no vestibular, era o que se ouvia sobre o ensino no país.


Os que gostavam de política discutiam veementemente o que estava por trás da necessidade do diploma por um viés político, óbvio. Os que preferiam cultura enfatizavam a necessidade de um jornalismo mais engajado, humanizado. Tinham os das bandas de música, que no futuro, gostariam de se afiliar a projetos voltados ao estudo do radiojornalismo e, no geral, eram mais despretensiosos.


Entre os editoriais híbridos estava o dos esportes, onde não só homens demonstravam interesse; e ainda os alunos mais experientes que compartilhariam o Jornalismo com outra graduação, normalmente Letras ou Ciências Sociais.


Enfim, sobravam os que não gostavam de nada em especial, apenas informar, comunicar, do jornalismo como meio, como linguagem, e são esses os que atualmente ocupam bons espaços na imprensa local.


Na verdade, entre vinte e trinta alunos presentes nesta atividade só eu e outro afirmamos estar em jornalismo por vontade própria. Os demais, apesar de trajetórias distintas e bem específicas, não enxergavam a unicidade nessa miscelânea de gostos que era refletida no ingrediente necessário a qualquer jornal: a diversidade.


Especialização na bagagem


No passado, a obrigação dos mais jovens começava tão cedo quanto hoje, não numa precocidade banal, mas para abastecer a própria família. As cidades eram menores, o estudo especializado não era requisito para a maioria das profissões, jovens do sexo masculino queriam ser jornalistas.


Fazer uma graduação nas décadas de 60, 70 e mesmo 80 no norte ou nordeste, era privilégio da classe média ou alta e a profissão de jornalista era exercida por aqueles que tinham, de fato, vocação, bons relacionamentos e os famosos contatos, enquanto a parte opinativa, em artigos ou crônicas, estava destinada aos detentores da saúde, do direito e da literatura. Ou seja, juízes, literatos e médicos, como ainda hoje, demonstravam seus saberes em prol do jornal e da população.


A sociedade mudou, não sei se para melhor, mas hoje a universidade já faz parte de uma etapa educacional não mais pensada como superior, mas fundamental, tanto quanto as outras, na formação dos indivíduos.


No início do meu curso pude perceber que a maioria dos ali presentes já trazia na sua bagagem individual o que o jornalismo pedia: especialização, formada e formalizada nas etapas ante e pós-universitária, ou seja, em toda vida. E é disso que se precisa até hoje.


Pesquisa, teoria e prática


Começar o ano seis meses atrasada, numa época de reafirmação política e econômica foi complicado, e ainda mais para nós, adolescentes. Digo isso porque àquela altura já havíamos dito nossas idades e a maioria não passava dos 20, na verdade entre 16 e 20. Posto que, ir à universidade, para um ou outro, foi realmente uma primeira experiência encantadora.


A verdade é que em jornalismo, assim como na maioria dos cursos superiores, a nossa escolha começou cedo. A prioridade foram os estudos, a profissionalização, o aprendizado do maior número possível de línguas. A ânsia por ter estabilidade num lugar aparentemente instável era o pensamento primordial dos nossos pais.


Minha pergunta foi: como ter auto-estima, autenticidade e assumir o seu desejo por jornalismo num meio onde a obrigatoriedade do diploma sempre estava posta em xeque? Essa discussão diminuía ainda mais o nosso interesse, o que era um agravante perante os outros cursos da instituição.


Postulo que começar por jornalismo é realmente difícil. Qualquer aluno sonharia em entrar naquela sala com o ímpeto de pesquisar, estudar teoria e praticar. Mas quatro anos parecem insuficientes para dar o respeito que qualquer ser humano sadio gostaria de gozar em sua profissão.

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Graduada em Comunicação Social – Jornalismo pela Universidade Federal da Paraíba. Participante do GRUPECJ, Grupo de Pesquisa sobre o Cotidiano e o Jornalismo, coordenado pelo professor Wellington Pereira do Decom / UFPB, João Pessoa, PB