Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Twitter não dá dinheiro. Conseguirá sobreviver?

É incomum uma postagem em blog corporativo, cheia de linguagem burocrática, causar alvoroço na internet. Mas foi exatamente isso que ocorreu na semana passada, quando o Twitter publicou um item com sua chamada de aparência inócua: “Mudanças chegando na Versão 1.1 da API do Twitter”. Nenhuma das mudanças que o Twitter menciona, tomada isoladamente, parece grande coisa. No conjunto, porém, elas são vistas como uma medida agressiva contra colaboradores antes tratados amistosamente – os desenvolvedores que usam a interface de programação de aplicações do Twitter para escrever aplicativos como Tweetbot ou Twitterrific para acessar o serviço. Os desenvolvedores que escrevem os aplicativos e seus amigos na comunidade sentem-se traídos.

Em sua defesa, o Twitter só está fazendo o que tem de fazer para construir um negócio bem-sucedido. No fim das contas, esse é o problema real. Nem toda grande ideia rende um grande negócio, e o sucesso todo da internet é construído nas costas de padrões técnicos abertos que não são absolutamente negócios – os protocolos que permitem o e-mail, a web e o resto – e, para atingir seu pleno potencial, é isso que o Twitter teria de fazer.

O alvoroço todo sobre o Twitter se resume ao fato de que a companhia tem um grande problema. Como produto, ele é um enorme sucesso, com milhões de usuários e conexões com tudo que existe em baixo do Sol. Como negócio, porém, praticamente não tem receita. E, no entanto, manter todos aqueles servidores funcionando é uma proposta bastante cara.

Um recurso óbvio

Capitalistas de risco desejam financiar a operação porque o serviço básico é muito atraente e popular, mas, obviamente, em algum ponto, o objetivo é lucrar. E como até agora o Twitter rejeitou a estratégia de saída de se vender a uma empresa mais estabelecida, como o Google, por exemplo, seus investidores estariam olhando para a possibilidade de um grande lucro.

A abordagem mais óbvia para a companhia seria uma publicidade mais agressiva. Mas, nesse caso, os aplicativos desenvolvidos por terceiros para acessar o Twitter são um grande problema. Nos primeiros tempos do Twitter, o serviço era construído principalmente em torno da ideia de enviar e receber mensagens via SMS, com uma interface de internet bastante tosca como empecilho.

Mas o serviço veio com uma Interface de Programação de Aplicativo (API, na sigla em inglês) aberta, que permite que pessoas escrevam aplicativos para computadores e smartphones capazes de acessar o fluxo do Twitter. Foi essa capacidade que permitiu ao Twitter se modernizar. O popular cliente multiplataforma Tweetie acabou sendo adquirido pelo Twitter e se tornou o cliente primeira parte “oficial”. O problema aqui é que, se aplicativos de terceiros podem acessar dados do Twitter e depois exibi-los do jeito que quiserem, então retirar anúncios publicitários parece um recurso óbvio a oferecer.

Carrinhos de comida

De mais a mais, diferentemente do próprio Twitter, os desenvolvedores terceiros na verdade têm um claro modelo de lucratividade – eles vendem software a usuários. Mas, se o Twitter quiser entrar no negócio de aplicativos pagos, parece provável que ele vai querer limpar o campo de competição.

Portanto, apesar de os parafusos estarem sendo apertados aos poucos, os entendidos em tecnologia veem isso como um sinal e estão reagindo com pânico e indignação. Marco Arment diz que é “uma burrice da parte do Twitter”, enquanto Dan Wineman diz que eles estão “no caminho do Prodigy e da CompuServe”. A questão vai além do domínio estreito de aplicativos de terceiros, com o corte do acesso do Tumblr ao encontro de amigos e especulações de que o Flipboard será barrado em breve. O sentimento de traição é fácil de entender. De um lado, a realidade básica do status quo é que os fornecedores de aplicativos mais bem-sucedidos estavam ganhando dinheiro e o Twitter, não. E não são apenas os desenvolvedores de aplicativos.

Muita gente está ganhando com a plataforma do Twitter. Políticos o usam para enviar suas mensagens, grandes companhias usam o Twitter como parte de sua estratégia de promoção de marca, o Twitter tem sido uma tecnologia capacitadora chave do boom dos carrinhos de comida, e cada publicação na internet do planeta usa o Twitter para dirigir tráfego.

Berners-Lee não ficou bilionário

Todos estão ganhando alguma coisa aqui, exceto as pessoas que pagam as contas para manter o serviço funcionando. O Twitter precisa fazer alguma coisa para recapturar esse valor. Uma importante alternativa é o novo projeto de Dalton Caldwell, App.net, que propõe simplesmente cobrar dos usuários US$ 50 por ano por um serviço tipo Twitter. Como medida comercial, isso – como os esforços do Twitter para se fechar – faz todo sentido. Mas, de uma perspectiva mais ampla, fragmentar a audiência em múltiplas plataformas rivais (Twitter, App-net etc.) é destrutivo. A mídia social é valiosa em parte pelos “efeitos de rede”. Você quer usar um serviço que todo mundo está usando.

Mas a diversidade também é valiosa, o que é exatamente o que tornou tão utópico os dias de API aberta do Twitter – é um serviço centralizado único, com um conjunto potencialmente ilimitado de pontos de entrada. Ele apenas não funciona financeiramente. Infelizmente, o espaço de formação das redes sociais é a recriação da era efêmera de redes muradas – CompuServe vs. Prodigy vs. AOL – que antecedeu a popularidade de massa da web.

Mas a web, como o e-mail, tem mais a ver com padrões abertos do que com um negócio. Seu principal criador, Tim Berners-Lee, recebeu um título de cavaleiro por seu esforço e um tributo na cerimônia de abertura da Olimpíada de 2012, mas não ficou bilionário nem ganhou retorno para seus investidores.

Uma decepção após outra

Não é razoável esperar que o Twitter ou seus inventores adotem de repente ideais utópicos, ideais que eram com certeza mais fáceis de manter no tempo em que ninguém tinha expectativas realistas de ganhar fortunas imensas. Mas esses ideais eram realmente parte integrante da internet que hoje conhecemos.

A crescente decepção com o Twitter não reflete um erro comercial de sua parte, e ele não será corrigido por algum novo serviço concorrente com um modelo diferente. É um elemento integrante da ideia de construir utilidades básicas como negócios, e não como padrões técnicos abertos.

E, menos que uma enorme mudança cultural, isso significa que estamos fadados a uma decepção após outra à medida que despontem novas tecnologias.

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[Matthew Yglesias, da Slate]