Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

A expansão para além do mundo tech

Ferramentas on-line que mapeiam, em tempo real, a letal epidemia de ebola na África. Plataformas digitais que permitem a estudantes um aprendizado mais personalizado. Exemplos reais, essas aplicações demonstram como as técnicas de captação e análise de dados em volume massivo, e em grandes velocidades e variedades – o chamado big data – vêm se expandindo para novos campos. Crescente, essa tendência acena com novas possibilidades, mas, no Brasil, ainda esbarra na falta de profissionais qualificados para alcançar todo o seu potencial.

Divulgada em abril pela empresa de soluções de big data EMC, o estudo Universo Digital ajuda a dar um panorama do crescimento do volume de dados no mundo: entre 2013 e 2020, o volume de informações digitais saltará de 4,4 trilhões de gigabytes para 44 trilhões. Apesar do aumento, apenas 5% dos dados considerados úteis foram de fato analisados em 2013.

Para a pesquisadora da Coppe/UFRJ Luciana Sodré, ainda que o Brasil acompanhe a tendência mundial na produção de dados, o aproveitamento dessas informações por aqui ainda é muito aquém do seu potencial. Essa situação, ela afirma, se reflete em segmentos como a administração pública:

– Esse é um setor que apresenta um grande potencial, porque é capaz de reunir uma quantidade imensa de informações, mas cujo uso ainda é insatisfatório – afirma Luciana. – Isso acontece porque muitos dos nossos gestores ainda tratam o digital com uma cabeça analógica, o que tem a ver com uma questão cultural e com uma carência de profissionais qualificados.

A perspectiva vai ao encontro com a de Alexandre Evsukoff, coordenador do curso de big data analytics da FGV-Rio.

– Ainda temos um gargalo enorme de profissionais para lidar com o tema. É uma área que exige formação multidisciplinar: envolve matemática, estatística, análise de negócio etc. Os centros educacionais já despertaram para essa questão, mas ainda vai levar algum tempo para minimizá-la – acredita.

Na saúde, mapa do ebola

Apesar desses desafios, o big data já dá exemplos das suas possibilidades de uso em novos setores. Esse fenômeno, afirma Karin Breitman, cientista-chefe do centro de pesquisa e desenvolvimento de big data da EMC no Rio, tem a ver com os mesmos fatores que resultaram na popularização do termo:

– O custo do armazenamento de dados, por exemplo, caiu exponencialmente nos últimos anos, permitindo o seu uso em grande escala – diz Karin. – Também surgiram tecnologias mais acessíveis capazes de processar quantidades exorbitantes de informações. Paralelo a isso, passamos pela revolução da tecnologia móvel e ubíqua, que gera a constante produção de dados a partir de objetos inteligentes.

Criação do pesquisador Clark Freifeld, do departamento de Engenharia Biomédica da Universidade de Boston, a ferramenta on-line HealthMap é um dos exemplos de aplicação do big data no segmento da saúde. A partir da análise de milhares de fontes na internet, o site disponibiliza mapas que ilustram, em tempo real, a ocorrência de determinadas doenças ao redor do planeta.

– Usamos algoritmos de inteligência artificial para filtrar grandes volumes de dados em um pacote de informações fácil de usar – explicou Freifeld ao GLOBO recentemente.

Devido à sua eficiência na coleta e tratamento dessas informações, o site foi capaz de emitir um alerta sobre a disseminação do ebola no continente africano antes mesmo que a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Ensino personalizado

Na educação, o big data tem dado mostras do seu potencial pelo desenvolvimento do chamado ensino adaptativo, que se ajusta às características individuais dos alunos. É o caso da plataforma digital Knewton, que chega ao Brasil este ano.

– Criamos aplicações para conteúdos didáticos que registram o seu uso pelos estudantes e coletam informações sobre seus desempenhos. Esses dados são processados pelos nossos algoritmos, que recomendam o que eles devem estudar – explica Jose Ferreira, diretor executivo da plataforma. – Assim, os estudantes não só aprendem melhor, como mais rápido.

Apesar da carência de profissionais qualificados, empresas e instituições brasileiras também já se beneficiam do big data. A empresa de localização e roteirizarão em vias MapLink , por exemplo, é capaz de receber informações em tempo real de mais de 700 mil veículos por dia, processar esses dados e determinar aos seus clientes as condições do trânsito, rotas mais utilizadas e o uso de vias em locais e períodos específicos. Armazenados, esses dados podem ainda servir como subsídios para estudos sobre o trânsito para prefeituras.

– Isso só se tornou possível há cerca de três anos. Antes, esse tipo de trabalho seria inviável, devido aos elevados custos – afirma Caio Gomes, diretor de pesquisa e data mining da empresa.

Executivo de big data analytics da IBM para a América Latina, Marco Lauria afirma não ter dúvidas de que essas técnicas devem permear toda a sociedade futuramente, em áreas diversas:

– Exemplos dessa realidade já podem ser vistos acontecendo em áreas como educação, saúde, marketing, serviços etc. Por aqui, há desafios, mas já se procura vencê-los.

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Thiago Jansen, do Globo