Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Uso frequente de mídias sociais pode estimular endividamento

Gabriela Bustelo não aguentava mais o Facebook. A jornalista de 52 anos filiada a uma agência de notícias com sede em Londres, na Inglaterra, escreveu para a Vogue espanhola durante seis anos. Muita gente em seus círculos de mídia social trabalhavam na indústria da alta moda. Sempre que Gabriela entrava no Facebook, ela deparava com uma série de imagens cinco estrelas: férias de luxo, roupas de grife, restaurantes com estrelas Michelin. “O Facebook é uma grande fábrica de inveja”, diz a jornalista. “É relacionado com revistas de moda, com a exibição visual de vidas, casas, roupas e bens.”

Gabriela não tinha nenhum interesse em gastar e gastar até ficar pobre, só para se manter atualizada em seu feed de notícias. Então, um dia, ela se desligou do site para sempre.

Isso pode ser uma boa notícia para o bolso e a bolsa dela. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Pittsburgh, nos EUA, descobriram que os usuários frequentes do Facebook tendem a ter níveis mais elevados de endividamento com cartões de crédito e menor pontuação de crédito.

Por que isso acontece? As mídias sociais podem desencorajar o autocontrole financeiro, diz Andrew Stephen, um professor assistente da Universidade de Pittsburgh e coautor do estudo.

Afinal de contas, inveja é uma reação natural a fotos de seus contatos em férias em Mustique, com seus filhos se divertindo na praia. Particularmente vulneráveis são os pais ansiosos por dar a seus filhos o melhor que a própria vida tem a oferecer. “Se seus amigos estão fazendo todas essas coisas legais e curtindo suas férias divertidas, você pode achar que para que você possa continuar a fazer parte do grupo social, você também tem de participar desses tipos de atividades”, afirma Stephen.

Basta ver como os sites de mídia social têm efeito estimulador de gastos. A cada 30 segundos, o Facebook gera surpreendentes US$ 5.483 em vendas, seguido pelo Pinterest, com US$ 4.504, de acordo com a Merchant Ever, empresa de Nova York especializada em análise de e­commerce.

O Pinterest, em particular, como plataforma visual e focada em compras, parece aguçar o apetite dos consumidores por produtos caros. A compra média por clique em 2012 foi de US$ 179,36, mais que o dobro do Facebook, segundo dados compilados pela Fast Company.

Presença reduzida

Não é de se surpreender que a mídia social pareça afrouxar a resistência a gastar dinheiro. A pesquisa da Universidade de Pittsburgh, verificou, por exemplo, entre os entrevistados, que os participantes de um leilão online de um iPad e que tinham acabado de sair do Facebook deram lances mais altos do que outras pessoas que apenas estavam navegando na internet.

Então, como você pode resistir a esse profundo instinto humano de tentar igualar, ou superar, as postagens exibicionistas de amigos nas redes sociais? Uma dica: lembre­se de que o que você vê no Instagram, Facebook ou Pinterest não é uma representação completa e verdadeira da vida das pessoas. “[A exposição em mídias sociais] é basicamente um clipe de seus melhores momentos”, diz Tonya Rapley, educadora financeira da MyFabFinance.com, baseada no Brooklyn. “Seu amigo pode ter estado em Dubai nesta semana e na Tailândia na semana passada, mas você não vê os sacrifícios para realizar as viagens ou o endividamento assumido.”

Ponha seus acessos a mídias sociais em banho­maria, aconselha Tonya. “Pode ser por um dia, uma semana ou um mês”, diz. “Mas isso proporciona um distanciamento e podemos refletir: ‘O que estou fazendo aqui?’”

A vida não é uma corrida armamentista de experiências. Manter postagens mais modestas na mídias sociais não vai fazer de você menos interessante do que alguém postando sobre uma casa em St. Bart, no Caribe. “Busque outras opções”, sugere a educadora financeira. “Por exemplo, você pode não ter condições para tirar uma semana de viagem com todas as mordomias na República Dominicana, como alguns de seus amigos. Mas você talvez possa acomodar um fim de semana no litoral mais perto de sua cidade em seu orçamento.”

Outra dica: Stephen, da Universidade de Pittsburgh, sugere manter relacionamentos fora das mídias de comunicação social. Telefonar, enviar e­mail ou sair para jantar com amigos vai lhe dar uma imagem muito mais completa do que realmente está acontecendo nas vidas deles.

Quanto a Gabriela Bustelo, ela não desistiu totalmente das mídias sociais. Ela continua no Twitter, por exemplo, que não encara como sendo uma orgia de consumo conspícuo tão extremada. Mas a jornalista especializada em moda não se arrepende de ter reduzido sua presença na mídia social.

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Chris Taylor é colaborador da Reuters. Este artigo reflete as opiniões do autor e não as da Reuters ou do jornal Valor