Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A segunda revolução começa a chegar ao Brasil

Baixar música da internet é coisa do século passado. O mercado brasileiro começa a viver a segunda revolução da música online, em que os downloads dão lugar a serviços de streaming, que oferecem ao cliente acesso ilimitado a um portfólio de áudio por uma assinatura mensal. Os arquivos ficam armazenados “na nuvem”, em servidores de internet em algum lugar, sem que as pessoas tenham de baixá-los. O serviço de streaming movimentou US$ 532 milhões no mundo todo em 2011, um volume equivalente a cerca de 8% do mercado de música online, segundo estimativas da consultoria Gartner. Mas, até 2015, o streaming vai mais que quadruplicar. Os serviços de assinatura devem faturar US$ 2,2 bilhões e responder por cerca de 30% do faturamento do setor, que deve chegar a US$ 7,7 bilhões.

O Brasil ainda está atrasado nesse processo. Enquanto no mundo todo os serviços digitais correspondem a 29% do faturamento do mercado fonográfico, no Brasil eles somaram apenas 15% em 2010, segundo a Associação Brasileira de Produtores de Disco (ABPD). “O potencial é altíssimo. Principalmente pelo aumento do número de usuários de internet e pelo o fato de que os maiores serviços de download e streaming de música em escala mundial ainda não iniciaram as operações aqui”, diz o presidente da ABPD, Paulo Rosa.

O pioneiro no streaming de áudio no Brasil é o Sonora, lançado há quase cinco anos pelo grupo Terra e que hoje detém 40% do mercado de música digital no país. O negócio cresceu 40% neste ano e deve se expandir mais 30% em 2012, segundo o diretor-geral do Terra, Paulo Castro. O Sonora tem 5,5 milhões de visitantes únicos por mês e 450 mil assinantes – que pagam uma mensalidade média de R$ 20.

Diferencial para os clientes

“A multiplicação dos dispositivos para ouvir música dá uma vantagem aos serviços de streaming em relação ao download. As pessoas não precisam mais transferir seus arquivos para acessar sua playlist”, afirma Castro. Para ampliar o acesso ao serviço, o Sonora lançou uma versão para tablets e colocará no ar ainda neste ano um aplicativo para TV com internet.

Mas o Sonora deverá enfrentar concorrentes de peso no mercado brasileiro. Grandes players internacionais estudam o lançamento dos serviços no Brasil, muitos deles em parceria com empresas de telefonia móvel.

A Oi saiu na frente e lançou neste mês a primeira parceria com uma empresa estrangeira de música digital, a americana Rdio. Os clientes terão acesso a um portfólio de 12 milhões de músicas a um custo de até R$ 14,90. “A oferta é aberta inclusive para clientes de outras operadoras, mas será um diferencial para a Oi. Poderemos fazer promoções que envolvam esse produto”, disse o gerente de serviços de valor agregado da Oi, Gustavo Alvim.

A GVT também utiliza o streaming de música como um diferencial para oferecer aos clientes. Há pouco mais de um ano, a operadora lançou o serviço Power Music Club, que oferece um portfólio de 700 mil canções e 10 mil vídeos musicais de graça para os assinantes de internet rápida. Dos cerca de 1,5 milhão de clientes da banda larga da GVT, 100 mil são usuários do Power Music Club. A GVT pertence ao grupo francês Vivendi, que também é dono da gravadora Universal Music.

“Uma solução própria”

“O futuro da música digital é o conteúdo por streaming”, afirma Cristiano Salimen, gerente de marketing de produtos da GVT. “Quem tem uma boa conexão de banda larga não precisa ter as músicas na sua máquina.” Salimen vê com bons olhos a chegada dos concorrentes internacionais ao mercado brasileiro, porque eles acabam incentivando a demanda por banda larga.

A popularização dos smartphones vai aumentar a competição no mercado de música digital. Estimativas das operadoras de telefonia apontam que 70% dos clientes usam o celular para ouvir música. Mas, com a banda larga móvel, eles podem baixar músicas ou acessar suas playlists na rede, sem, necessariamente, comprar as faixas da própria operadora.

A TIM ainda não oferece streaming de música, mas estuda parcerias com empresas estrangeiras para lançar o produto no Brasil, segundo o gerente de serviços de valor agregado da TIM, Flávio Ferreira. “O smartphone muda a relação do cliente com o conteúdo. Os serviços das operadoras passam a competir com outras opções oferecidas na internet. Mas, na área de música, queremos lançar uma solução própria”, diz Ferreira. A empresa já é dona da TIM Music Store, uma loja que oferece download de faixas e ringtones – e faturou 39% mais até outubro de 2011 do que em todo o ano passado.

Consertar a indústria

Já a gravadora Som Livre abortou um projeto próprio na área de assinatura para música. Depois de lançar o site Escute em fevereiro, a empresa tirou o portal do ar em maio. “Houve um reajuste na estratégia de música digital da empresa. Preferimos ser fornecedores de conteúdo do que concorrer com os sites que o oferecem ao consumidor”, disse o diretor-geral da Som Livre, Marcelo Soares. A empresa foi consultada neste ano por quatro players internacionais do setor que estudam entrar no mercado brasileiro, segundo ele.

“Para as gravadoras, a assinatura é um modelo melhor. Ela permite ter ganho real com a música online, o que o modelo de download não permitiu”, disse. O grande entrave para faturar com o download é a pirataria, a verdadeira líder neste mercado.

Lançado em 1999, o Napster tornou popular o download de músicas pela internet. Na prática, quebrou a indústria da música, pois esses arquivos eram obtidos ilegalmente. As gravadoras promoveram uma guerra judicial contra o Napster, o que não impediu que surgissem outros serviços que permitiam a troca de arquivos entre os usuários, como o Kazaa.

A iTunes Store, da Apple, foi a experiência mais bem-sucedida de venda de música online, mas surgiu somente em 2003. Os serviços de streaming de música, como o Spotify, estão sendo apresentados como uma forma de vencer a pirataria, já que não há download de arquivos.

Recentemente, o Facebook fechou um acordo com o Spotify. Sean Parker, cofundador do Napster, é hoje um dos investidores do Spotify. Em uma entrevista recente à revista Wired, Parker disse que, com o Spotify, vai consertar a indústria da música, que ele próprio quebrou (sem intenção, segundo ele) com o Napster.

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[Marina Gazzoni e Renato Cruz são jornalistas]