Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Adriana Fernandes

‘Celebridades que deram entrevista a revistas de fofocas, jornais e programas de televisão sobre os seus bens e ganhos ao longo do ano precisam se cuidar. Há fiscais da Receita Federal que acompanham esse tipo de noticiário, à cata de sinais exteriores de riqueza. Os cachês milionários, os carrões e as casas bem decoradas são todos indícios úteis na hora de escolher quem fiscalizar. Se a declaração de renda estiver muito diferente do patrimônio, o famoso é sério candidato a uma investigação. Com essa mesma lógica, há fiscais que acompanham leilões de arte e de animais.

Os fiscais também usam as bases de dados de veículos do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), de aeronaves no Departamento de Aviação Civil (DAC) e de embarcações na Marinha, além de informações de imobiliárias, para confrontar com as informações que constam das declarações do Imposto de Renda. A Receita ainda busca informações sobre bens dos contribuintes no exterior.

Muitas fiscalizações são abertas a partir da comparação entre a renda declarada e as despesas que o contribuinte faz com cartão de crédito ou sua movimentação financeira, que a Receita monitora a partir do recolhimento da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF).

‘A Receita utiliza todas as informações disponíveis para verificar se há inconsistências com a renda declarada’, diz o secretário-adjunto da Receita Federal, Paulo Ricardo Cardoso, responsável pela área de fiscalização. Esses ‘desvios de conduta’ podem ser identificados, por exemplo, nos casos em que a movimentação financeira e os gastos de cartão de crédito são maiores do que a renda declarada ou quando o contribuinte não declarou renda de aluguéis. ‘Quando um contribuinte ostenta uma riqueza maior do que a sua renda declarada é sinal de que alguma coisa está errada’, afirma Cardoso.

Um dos grupos preferenciais para fiscalização este ano são artistas, modelos, apresentadores, jogadores de futebol, médicos, advogados, dentistas, jornalistas e todos os profissionais liberais que montaram, nos últimos anos, empresas prestadoras de serviços com o objetivo único de pagar menos impostos. Essas pessoas devem ficar alertas ao apresentarem a declaração desse ano do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).

A legislação tributária não permite que uma pessoa física monte uma empresa apenas para receber salário de uma outra empresa, mas esse é um truque comum para pagar menos tributos. Pelos cálculos da Receita Federal, uma pessoa física que ganhe R$ 120 mil por ano paga aproximadamente 18% de Imposto de Renda. Uma empresa prestadora de serviços com mesmo faturamento paga 13% em impostos federais.

Por razões de sigilo fiscal, o secretário não pode divulgar nomes de famosos que estejam sendo investigados ou já foram autuados pela Receita. Cardoso, no entanto, confirma que tem havido um aumento significativo das autuações em empresas prestadoras de serviços criadas por profissionais liberais. Segundo ele, a criação desse tipo de empresa é cada vez mais comum no Brasil, porque o contribuinte que se ‘reveste’ de empresa acaba tendo uma carga tributária menor do que se declarasse o Imposto de Renda (IR) como pessoa física.

‘Nem sempre o contribuinte pessoa física pode pagar impostos como pessoa jurídica’, alerta Cardoso. É o caso de um profissional que trabalha, na prática, como funcionário para uma companhia e recebe o salário pela sua empresa criada apenas para esse fim.’



LIBERDADE DE IMPRENSA
Agência Estado

‘Associação de imprensa critica Venezuela e elogia Brasil’, copyright Agência Estado, 10/03/05

‘A Associação Interamericana de Prensa (SIP) indicou nesta segunda-feira que na Venezuela se nota um ‘ambiente de autocensura’, produto de uma campanha oficial destinada a acabar com a liberdade de expressão. A SIP, que encerrou nesta segunda sua reunião semestral, condenou o que descreveu como uma ‘conduta do governo venezuelano orientada a cercear as liberdades democráticas, reduzir as garantias do estado de direito e com isso aniquilar a liberdade de expressão e de imprensa’.

A SIP incluiu Argentina e Equador em sua lista de países cujos governos dificultam ou até mesmo fustigam os meios de informação. A lista continua sendo encabeçada por Cuba e Venezuela. Para a SIP, Cuba segue como o país mais repressivo da região, pois detém o monopólio de toda a informação do Estado. A SIP pediu ao governo de Cuba que liberte 25 jornalistas que são mantidos em prisões cubanas.

‘Os presidentes de Argentina e Equador mostraram um irrestrito antagonismo para com os meios de comunicação e uma disposição de recorrer à discriminação econômica para calar as críticas’, indicou um relatório do organismo.

Ao mesmo tempo, a SIP elogiou os progressos obtidos na Colômbia, no Panamá e no Brasil, ressaltando os fatos positivos que ampliam a liberdade de imprensa nesses três países.’



COTAS EM DEBATE
O Estado de S. Paulo

‘Efeitos nefastos das cotas’, Editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 14/03/05

‘Ao obrigar as universidades públicas a adotar o sistema de cotas, a fim de democratizar o acesso ao ensino superior e promover a inclusão social, o Ministério da Educação (MEC) converteu os exames vestibulares em objeto de litígio judicial e levou os reitores a tomarem iniciativas incompatíveis com os padrões éticos que devem reger a vida acadêmica.

Dois fatos recentes, ambos ocorridos em Curitiba, refletem o tumulto jurídico e político que a substituição do sistema de mérito nos vestibulares por critérios de origem racial e escolar começa a causar.

O primeiro fato foi a decisão do titular da 3.ª Vara da Justiça Federal dessa cidade em favor de uma jovem que, apesar de seu desempenho no vestibular para o curso de zootecnia da Universidade Federal do Paraná (UFPr), foi preterida por duas candidatas beneficiadas pelo sistema de cotas, mas com pontuação bastante inferior. O segundo fato foi a sentença do titular da 7.ª Vara da Justiça Federal em favor de outro jovem na mesma situação. Tendo obtido 611,3 pontos na disputa de uma das vagas do curso de engenharia química na UFPr, ele foi preterido por candidatos ‘cotistas’ que alcançaram apenas 489,3 pontos.

Nos dois casos, o Judiciário obrigou a UFPr a matricular os candidatos excluídos da lista de aprovados em razão da política de cotas. Com isso, o que mais se temia infelizmente começou a ocorrer. Ou seja, a manifestação de tensão social e racial num espaço escolar que sempre foi marcado pelo convívio acadêmico. Como esperar que esses estudantes, os favorecidos pelas cotas e os que tiveram seus direitos garantidos por via judicial, possam manter um bom relacionamento ao longo do curso? De que modo seus professores poderão lhes dispensar o mesmo tratamento e fazer as mesmas exigências, já que sua formação escolar é desigual? Tão grave quanto a criação de um explosivo sistema de castas no corpo discente foi o comportamento dos atuais dirigentes da UFPr nesse episódio. Como a Constituição é clara quando afirma que todos são iguais, ‘sem distinção de qualquer natureza’ e ‘sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação’, desde o início eles sabiam que os tribunais acolheriam os recursos dos vestibulandos prejudicados pelo sistema de cotas. Por isso, além de retardar a remessa das listas de aprovação solicitadas pelo Judiciário, eles as enviaram sem a pontuação alcançada pelos aprovados, dificultando assim a ação da magistratura. E, por fim, pediram que o processo tramitasse em ‘segredo de Justiça’.

O primeiro desses expedientes resultou numa multa de R$ 60 mil por dia de atraso, aplicada ao reitor Carlos Moreira Júnior. Já o segundo culminou numa humilhante advertência. ‘A publicação da lista de aprovados unicamente por ordem alfabética, sem menção à classificação obtida por eles, atenta contra a transparência que se espera’, afirmou o juiz Mauro Spalding, da 7.ª Vara da Justiça Federal. Quanto ao pedido de que a discussão judicial ocorra em sigilo, foi sumariamente rejeitado. Se o vestibular é público, por que dúvidas quanto aos seus resultados não podem ser de conhecimento público? Esses são apenas alguns dos efeitos desastrosos da política de cotas que pretende instituir a violação de direitos líquidos e certos. Além disso, na prática ela abre caminho para a discriminação e para o aparecimento de um problema que, apesar de todas suas perversas desigualdades sociais, o País jamais teve. Ou seja, o ódio racial. Ao cindir a Universidade pública entre brancos e negros, sob a cândida e altruísta justificativa de corrigir distorções seculares, o MEC desprezou a miscigenação de que o Brasil sempre se orgulhou.

O mais grave é que, desde a ascensão do PT ao poder, em nenhum momento ele enfrentou aquele que é o principal fator de reprodução da pobreza: a má qualidade do ensino público fundamental e médio, que priva os seus alunos da escolaridade de que necessitam para se classificar em um vestibular e ascender profissionalmente. Após dois anos de gestão, o governo ainda não se deu conta de que a causa da desigualdade no acesso ao ensino superior é a oferta de uma educação pública de segunda categoria patrocinada por autoridades que se acostumaram a tratar os segmentos mais pobres da população apenas com favores e paternalismo.’



LEGISLATIVO NA MÍDIA
Carlos Heitor Cony

‘Outros tempos’, copyright Folha de S. Paulo, 14/03/05

‘Passamos duas semanas discutindo se os congressistas devem ter seus vencimentos aumentados. A mídia e a opinião pública estão esculhambando a pretensão, com argumentos mais do que manjados e repetidos à exaustão sempre que o tema entra em debate.

Não fui ouvido nem cheirado sobre a questão, nem por isso deixarei de dar meu palpite. Sou a favor de um brutal, um colossal aumento de vencimentos não apenas dos congressistas, mas de todas as autoridades de alto escalão, que na realidade ganham um salário quase simbólico.

Para compensar o salário que todos admitem ser simbólico, foram criadas dezenas de vantagens que representam, em alguns casos, cinco, seis vezes o valor básico. Sinceramente, não sei como foram criadas as mordomias atuais, acho que com o advento da era Brasília, quando a nova capital exigia algumas compensações.

Lembro que JK, quando foi deputado federal (durante a Constituinte de 1946), morava com a família no Hotel Flórida, que existe até hoje, é um modesto três estrelas, na rua Ferreira Viana, no Catete, bairro mais do que classe média. Não tinha carro para se deslocar até o Palácio Tiradentes, ia trabalhar de ônibus e muitas vezes de bonde.

Não tinha auxílio-moradia, nem franquia postal, nem viagens para consultar suas bases em Minas Gerais, nem um batalhão de assessores, secretários, seguranças e aspones.

Uns pelos outros, de acordo com as posses de cada um, todos viviam modestamente aqui no Rio. Cansei de ver, no bonde Itapiru-Barcas, que passava na Praça 15, onde ficava a Câmara, o deputado Segadas Vianna, que era careca, morava não sei se na Tijuca ou no Rio Comprido, chegou a ser ministro do Trabalho no segundo governo de Vargas.

E havia um deputado, creio que do Espírito Santo, que ia para a Câmara de bicicleta, morava perto, na rua do Riachuelo, ex-Mata-Cavalos, famosa pelos ‘rendez-vous’ ali existentes e pelas reminiscências sentimentais de ‘Dom Casmurro’.’



PROGANDA & MÍDIA
Carlos Heitor Cony

‘Anúncios e reclames’, copyright Folha de S. Paulo, 10/03/05

‘No tempo dos bondes, além da paisagem, que corria lenta e paralela pelo lado de fora, havia os anúncios, que eram chamados de reclames, espalhados pelas cantoneiras laterais do veículo. Pelo menos um deles tornou-se famoso, com a quadrinha atribuída por uns a Olavo Bilac, por outros a Bastos Tigre: ‘Veja, ilustre passageiro, o belo tipo faceiro etc. etc.’.

Nunca tomei o peitoral recomendado pelo reclame, tampouco quase morri de bronquite como o belo tipo faceiro que tinha a meu lado. (Geralmente, não era tão faceiro assim). Mas havia um anúncio que me causava horror. Um sujeito desesperado, com a pistola apontada para a própria cabeça, estava prestes a se matar. Um amigo aparecia de repente e gritava: ‘Não faça isso!’. E receitava um tal de Elixir 914, que era tiro e queda para acabar com a sífilis, que era mais terrível na ortografia antiga, ‘syphilis’.

Não me lembro se já tentei algum dia acabar com a vida. De qualquer forma, não foi por culpa da sífilis que nunca tive, mas por causa das mulheres que tive. E que, por pérfida maquinação do destino e de mim próprio, deixei de ter. Pulo para os anúncios, que agora não são mais reclames, e sim publicidade eletrônica.

Por mais que me ensinem como me livrar deles, toda vez que abro o notebook vem a enxurrada que me ensina a encompridar o pênis dois centímetros por mês (precisaria de um carrinho de mão para carregá-lo), a tomar viagra com a antecedência certa e, o mais inútil de todos, a deixar de fumar em apenas 7 dias.

Em respeito aos bons costumes e por questão de decência, não devo comentar os dois primeiros. Quanto ao terceiro, não pretendo deixar de fumar nem em 7 dias nem em 7 eternidades. Agora mesmo encomendei duas caixas de Cohiba pirâmide e os deliciosos ‘Romeo y Julieta’, enrolados em capinhas de cedro. Já que não posso viver satisfeito, espero morrer satisfeitíssimo.’