Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Cientistas brasileiros rastreiam e-mail para prova digital

Nestes últimos anos a internet teve uma enorme popularização. Somente no Brasil, aproximadamente 68 milhões de internautas acessam diariamente e-mails, redes sociais, sites, blogs, e outros inúmeros portais. Somos o 5º país com o maior número de conexões. Segundo estudo da União Internacional de Telecomunicações, o número de internautas no mundo dobrou nos últimos cinco anos e deve ultrapassar a marca de 2 bilhões em 2011, se aproximando de um terço da população mundial.

Mas a procura pelo espaço cibernético não trouxe apenas benefícios, ao contrário, elevou também os crimes digitais, conhecidos como cibercrimes, que atualmente vêm se proliferando por todo o mundo e afetando dezenas de países. Este tipo de crime vem causando sérios danos como o aumento da pedofilia, ciber-bulling, desvio de dinheiro, prospecção de crimes, espionagem e até mesmo falsidade ideológica (perfil falso em rede social). Em face do exposto, surge a necessidade de proteger a sociedade deste tipo de problema trazido pelas novas tecnologias.

Buscando minorar a incidência dos crimes digitais, novas pesquisas vêm sendo realizadas com o intuito de rastrear os criminosos virtuais com mais rapidez e eficiência. Uma delas é a pesquisa realizada pela equipe do Programa de Pós-Graduação em Informática (PPGIa), da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), que mediante a identificação e rastreamento de e-mails busca produzir provas digitais que comprovem a ligação do cibercrime cometido com o seu autor.

O projeto, apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCT), iniciou suas pesquisas em 2008 e segundo a coordenadora do grupo de pesquisa, Cinthia Obladen de Almendra Freitas, já vem mostrando bons resultados.

‘A pesquisa visa à aplicação de mecanismos de agrupamento e classificação das conversações por e-mails. Os resultados ainda são experimentais, mas já atingem taxas próximas a 98% e demonstraram que é possível usar o rastreamento em relacionamentos por e-mails para a produção de provas digitais’, afirma Cinthia. Os testes realizados tiveram por base 179 e-mails, totalizando mais de 120 mil palavras, com uma média de 670 palavras por e-mail.

Rastreamento

A escolha do grupo de rastrear informações textuais no corpo dos e-mails não foi aleatória, mas porque o e-mail é uma das aplicações de rede mais antigas, e também devido ao uso desta ferramenta ter crescido ao longo dos anos. Uma pesquisa feita pelo Group 2009 registrou que existem aproximadamente 1,4 bilhão de usuários de e-mails, com mais de 245 milhões de mensagens enviadas por dia.

‘Além da grande utilização da ferramenta eletrônica e-mail para uso convencional, observa-se também o aumento de crimes realizados por meio de serviços virtuais, ou seja, as denominadas condutas criminosas no cyber espaço. Um exemplo é a propagação de crimes de pedofilia na Internet e casos de assédio sexual, que lideram as denúncias’, diz a coordenadora.

Neste sentido, o projeto vem trabalhando na implementação de um mecanismo eficaz para auxiliar os peritos na produção de provas digitais a partir do e-mail, haja vista o grande esforço e tempo que estes profissionais despendem na realização deste tipo de trabalho.

‘Quando um crime virtual ocorre e é denunciado, os órgãos competentes o tipificam de acordo com a legislação onde ocorreu. Após a tipificação, normalmente é necessário que um profissional especializado realize uma perícia nas evidências do crime, para que seja comprovada a ligação do cibercrime cometido com o seu autor. Geralmente esse processo é demorado por ser manual. É aí que nosso mecanismo se torna extremamente relevante, pois é capaz de identificar com rapidez se os e-mails são classificados como criminosos ou não’, pontua.

Como funciona

De acordo com Cinthia, o mecanismo de rastreamento funciona com base na aplicação de diferentes técnicas de agrupamento e classificação das informações. ‘Realizamos o rastreamento de informações textuais no corpo dos e-mails para identificar contextos de palavras criminosas (sentenças) nas conversações. Em seguida, mediante a identificação e análise destes agrupamentos, buscamos colher provas digitais que constituam o nexo causal no Processo Judicial, ou seja, que comprove a ligação do cibercrime cometido com o seu autor’, explica a doutora.

Segundo Cinthia, este projeto de pesquisa está ligado a outro projeto que tem por objetivo o estudo e identificação de assédio moral em e-mails, bem como das emoções associadas aos e-mails com traços de assédio moral.

No Brasil

De acordo com o site Safernet, especializado em prevenção de crimes virtuais, apenas no 1º semestre de 2010 foram registradas mais de 30 mil denúncias, envolvendo intolerância religiosa, neonazismo, racismo, tráfico de pessoas, pornografia infantil, maus tratos com animais, xenofobia, apologia e incitação de crimes contra a vida e homofobia. O site de relacionamentos Orkut foi o mais citado, com mais de 40 mil denúncias, com 9.376 casos de pornografia infantil. A incitação a crimes contra a vida teve 6 mil denúncias e homofobia, 3 mil.

Hoje, no Brasil, há poucas delegacias especializadas em crimes virtuais, mas as já instaladas estão habilitadas a receber denúncias de qualquer parte do Brasil. Estados que possuem divisões próprias para investigações de cibercrimes: Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Espírito Santo, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Pará e Paraná.

Pesquisas como essas e outras tecnologias de ponta na área da Computação Forense mostram que aquela premissa de que a internet ‘é uma terra sem lei, um mundo virtual, paralelo ao nosso, na qual os atos não têm consequências’ está completamente equivocada. ‘A internet não é uma terra sem leis. Pelo contrário, quem utiliza tal ferramenta para se relacionar pela ‘Rede’ inegavelmente deve responder sobre seus atos com base na Constituição Federal e nos Códigos Civil e Penal’, finaliza Cinthia.