Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Compramos o que produzimos

A rede mundial de computadores, a internet, por si só não pode e não deve ser classificada, de um modo geral, como informação, como sendo a maior divisora de águas da humanidade. Muito se tem questionado e debatido acerca dos usos – amadores ou profissionais – no âmbito ético, no que diz respeito ao conteúdo publicado e como a web vem sendo utilizada pelo homem.

A web não é pior do que ontem e não será melhor do que amanhã. Essa liberdade e autonomia ficcionais de que nós dispomos ofusca – propositalmente, na maioria das vezes – o que realmente queremos como a maior inovação tecnológica da história. Conectar milhões de computadores, em uma rede instantânea e com capacidade de armazenamento além-limite do pensar humano é, de fato, uma revolução.

Porém, ter acesso a essa nova mídia não significa a certeza de ter acesso a informações de qualidade ou ‘consumir cultura’ de um novo modo. A web nos dá aquilo que nós procuramos, o que nós desejamos, só que de uma maneira facilitada, barata e anônima.

Criticamos a TV de hoje, com seus canais espúrios e sua programação inescrupulosa e de baixa qualidade. O que não paramos para pensar é que a TV dá aquilo que os próprios espectadores querem, aquilo que os próprios telespectadores compram. Caso contrário, não haveria tanto sangue nos noticiários e nos jornais impressos.

Com a internet é a mesma coisa. Falamos de anonimato, de conteúdos obscenos e decadentes. Falamos em uma bagunça generalizada e de uma falta de autocontrole por parte dos internautas. Afirmamos que o sonho idealista que a rede mundial de computadores trouxe, como o pluralismo cultural a conhecimento de todos, por exemplo, estava acabando. Só não paramos para analisar que para cada página ‘normal’ na internet, existem cinco sites com conteúdo pornográfico. A web, assim como a TV, o rádio ou o jornal impresso nos dá aquilo que queremos, aquilo que nós, os usuários, compramos.

Ativos produtores de conteúdo

A web deixou de ser uma mídia revolucionária para ser uma mídia de massa. Uma mídia ao alcance de todos e para todos. Traz, consigo, o maior acervo fotográfico da humanidade, a maior enciclopédia aberta da história e a proposta de digitalizar todos os livros do planeta (Google Books). A grande diferença está em quem consome as informações lá publicadas: todos nós.

Os jornais impressos, assim como a TV, detinham o papel de pautadores da sociedade. Noticiavam aquilo que convinham ser interessante e lucrável. A única revolução (leia-se, nova maneira de construir algo) foi no dado momento em que a web, agora 2.0, possibilitou que todos aqueles que consumiam informações e dados dos meios tradicionais e que colaboraram para que imperasse um comércio de produtos midiáticos com qualidade ínfima, pudessem, com a internet, produzir tudo aquilo que ajudavam a consumir.

Se a internet mudou de ontem para hoje, não podemos deixar de observar que seus usuários também passaram de meros passivos espectadores, ontem, a frenéticos e ativos produtores de conteúdo e informação, hoje. A internet não é pior do que ontem e não será melhor do que amanhã. Se for, nós estamos intrinsecamente ligamos a essa não evolução qualitativa. Nós compramos o que nós mesmos produzimos.

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Jornalista, blogueiro, pós-graduado em Assessoria de Imprensa, Gestão da Comunicação e Marketing, São Paulo, SP