Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Todos podem ler este artigo, até a Luiza

Vamos imaginar uma cena pitoresca. Você acorda, vai ao trabalho, volta e vai dormir para começar tudo de novo no dia seguinte. Algo tipo “todo dia ela faz tudo sempre igual”, da personagem de Chico Buarque. Até aí nada demais. Pois bem. Outra situação. Você acorda no dia seguinte, quando para no semáforo as pessoas ao seu lado acenam como te conhecem por todas as manhãs. O segurança do trabalho te dá um largo sorriso e pede um autógrafo e assim vai. Essa cena parece estar se tornando tão pitoresca quando não deveria ser.

Em artigos anteriores já falei do poder das redes sociais. É fato e fica cada vez mais latente que essa rede está transformando vidas, até da Luzia, que estava no Canadá! Para quem estava em outro planeta nos últimos dias, explico: uma construtora lançou um empreendimento na Paraíba e o personagem mostrava sua família, exceto a Luiza, que estava no Canadá. Uma empresa concorrente quis explorar (desqualificando), mas conseguiu efeito contrário e o comercial virou hit na internet. Todo mundo só fala da Luiza.

Além da Luiza, há outros “clássicos”, pessoas comuns que do dia para a noite viraram fenômenos e conhecidos. A Banda Mais Bonita da Cidade fez um vídeoclip com a música “Oração”. Colocou o vídeo no YouTube e no dia seguinte se tornaram celebridades e com uma agenda cheia de shows. Também viraram “famosos” a “sandwich wich” (sic), o “Morre Diabo”, e tantos outros.

Personagens reais de um espetáculo interativo

Assim como nos filmes e novelas, há famosos do “bem” e do “mal”, porém nas redes sociais não estamos falando de atores que vestem personagens, e sim, de pessoa reais que são vistas (e conhecidas) da forma como são expostas. Exemplo recente. O modelo Daniel está sendo acusado de ter estuprado uma colega do BBB. O caso tomou a repercussão nacional e internacional por força das redes sociais. A emissora escondeu parte das cenas, mas os internautas divulgaram e cobraram providências. Se realmente aconteceu ou não, o fato é que Daniel agora é do “mal”. E ponto. Será que algum pai deixaria sua filha acampar em companhia do rapaz? Outro caso: a enfermeira de Goiânia. Se ela fez caridade a vida inteira ou não, não importa. O que importa é que ela foi condenada pelas redes sociais (e justamente, diga-se de passagem, tendo em vista as imagens divulgadas). Não terá mais sossego o resto da vida.

As redes sociais vieram para ficar. A sua forma elimina o antigo preceito comunicacional de “um para muitos” para “muitos para muitos”. Somos emissores e receptores. Assistimos e somos assistidos. Estamos sujeitos a virar celebridade ou marginais do dia para a noite. Nossas vidas são personagens reais deste espetáculo interativo. Nós todos, inclusive a Luiza, que por força das redes sociais ficou conhecida, voltou para o Brasil e vai ganhar um belo cachê!

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[Fabricio Mazocco é jornalista, mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade, doutorando em Ciência Política e professor universitário do curso de Jornalismo e Design Digital da Uniara]