Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O julgamento da década

Enquanto o Brasil se aquece para o julgamento do mensalão, outra disputa judicial que pode mexer com a vida de muitos de nós teve início esta semana. Foi na segunda-feira (30/7): é a briga entre Apple e Samsung, numa corte da Califórnia. No limite, não teremos mais iPhones à venda. Ou celulares e tablets Samsung. Ultrapassando o limite do razoável, uma série de tecnologias pode simplesmente deixar de ser desenvolvida por medo de que um novo modelo de tablet ou celular seja proibido por quebra de patentes. É uma briga global. Está sendo disputada simultaneamente em cortes de EUA, Alemanha, França, Itália, Holanda, Austrália, Reino Unido, Japão e Coreia do Sul, além da Organização Mundial de Comércio.

O processo começou em abril de 2011 justamente nesta corte californiana. A Apple afirma que, ao desenvolver seus tablets e celulares, principalmente no caso da linha Galaxy, a Samsung quebrou inúmeras patentes. Umas envolvem aparência: o paralelepípedo negro coberto de vidro com linhas curvas emana os primeiros modelos de iPhone. Outras questões são funcionais. Por exemplo, o pinch, gesto no qual o polegar e o indicador se encontram no centro da tela e se afastam para aumentar a imagem. A lógica, enfim, de como uma interface de toque funciona.

De sua parte, a Samsung contra-ataca. Em seu pacote de patentes há uma lista de funcionalidades da tecnologia 3G de banda larga móvel e outras mais genéricas que vão da tecnologia para tocar arquivos de música em aparelhos móveis a “terminais de comunicação” que funcionam como celular e câmera e podem trocar arquivos de imagem.

As mais inovadoras do Vale do Silício

Tanto no caso de uma quanto da outra, há muito de pouco razoável. A maior inovação do iPhone não é sua forma física. Inúmeros celulares têm e já tinham aquele jeitão. Assim como, em alguns casos, ideias são óbvias. Imaginar a união entre player de mp3 ou câmera com celular não requer brilho. Muitas vezes, o difícil é integrar todas essas funções de forma simples, intuitiva, elegante.

Neste ponto, entra a parte mais complexa do julgamento. A maneira de se relacionar com uma tela de toque, por exemplo. Hoje, nos parece evidente que para um zoom é preciso fazer o movimento de pinch. Mas é óbvio porque alguém dentro da Apple assim imaginou.

A vida fica melhor para todos se, não importa a marca do celular, todas as interfaces funcionarem mais ou menos igual. Para nós consumidores, talvez. A Apple argumenta que esta é uma diferença que a deixa mais competitiva e deveria ter o direito de monopólio sobre suas inovações.

A briga é mais profunda. A Samsung é a principal desenvolvedora de aparelhos que rodam o sistema Android, do Google, concorrente do iOS, da Apple. Tanto de um lado, quanto de outro, estão tentando resolver no tapetão uma briga que atenderia melhor ao consumidor se ocorresse nos laboratórios, entre engenheiros. As duas, Apple e Google, são as empresas mais inovadoras do Vale do Silício. Quem perde é o usuário.

Uma feira de hackers

Em teoria, a Defcon, feira cuja vigésima edição se encerrou no domingo, reúne especialistas em segurança de sistemas. Em teoria. Porque jornalistas que cobrem o evento são também aconselhados a deixar seus computadores em casa. Em uma grande tela no centro do salão de conferência são projetadas senhas, fotografias, e tudo o mais de comprometedor que os hackers presentes encontram nos computadores de bobeira. Todo computador pendurado na rede é bombardeado por ataques. Se defender desses ataques e violar laptops superseguros é o passatempo favorito da garotada por lá. São os melhores hackers do mundo. E jornalistas são as vítimas favoritas.

A novidade este ano foi a conferência do general americano Keith Alexander. “Nós sabemos que vocês vão hackear”, disse ele aos rapazes. “Então venham ser hackers do governo.” A era da ciberguerra, enfim, começou.

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[Pedro Doria, do globo.com]