Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

“Noveleiros” estão ficando
moralistas, afirma diretor


Leia abaixo os textos de quarta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Quarta-feira, 4 de julho de 2007


TELEVISÃO
Leila Reis


‘O espectador está mais moralista’


‘Jorge Fernando, diretor da novela Sete Pecados, passou o fim de semana em São Paulo para gravar um acidente na Praça Júlio Prestes e fazer uma anja cair no meio da Represa Guarapiranga. Com mais de 30 anos de carreira e de 30 novelas, ele define seu estilo como o diretor do movimento: ‘Você nunca vai ver atores sentados em sofá em novela minha.’ Diz que a maior desgraça de um diretor é o intervalo comercial. Nesta entrevista ao Caderno 2, Jorginho diz que o público está mais exigente e, por isso, uma novela custa R$ 20 milhões.


O telespectador de novela mudou?


As pessoas mudaram, hoje fazem várias coisas ao mesmo tempo. Mais exigente, o telespectador se sofisticou, escolhe mais. As novelas ganharam um público masculino que antes as maldizia. O telespectador das novelas está mais moralista. Acho que como o mundo está um terror, as pessoas querem exercitar a justiça na ficção. Os vilões, que na vida real quase sempre se dão bem, têm de ser punidos na novela.


E as novelas, mudaram?


Elas se tornaram mais complexas. Antigamente os atores principais eram só Regina Duarte, Cláudio Marzo e um vilão. Hoje, 16 atores lideram núcleos dentro de uma novela. Trabalhávamos com um elenco de 40 atores, Sete Pecados tem 76. Eram 26 cenas por capítulo, hoje são 50. Antes, as externas eram usadas para arejar o capítulo, agora mais de 50% da novela são feitos na rua. Isso fez com que encarecessem, o capítulo custa hoje por volta de R$ 110 mil, o preço total de uma novela é R$ 20 milhões.


Qual é o tipo de cena mais difícil?


Com uma lágrima e uma boa luz, a gente faz um bom drama. Fazer comédia é mais difícil, pois envolve muito ensaio, timing. Gravar cenas na rua também é complicado porque não se tem o controle: não dá para gritar silêncio no espaço público.


Para quem você faz novela?


Tentei fazer novela para agradar à mamãe, vizinha, professora e não deu certo. O público é muito diversificado, então faço novela para mim. Se eu gosto, acho que a possibilidade de as pessoas gostarem é maior.


Buscar a audiência é um tormento?


Sete Pecados tem registrado média de 31 pontos no Ibope, audiência maravilhosa em qualquer lugar do mundo. Mas como essa faixa de horário já conquistou índices maiores, passa a ser comparativamente baixa. O problema é que o comportamento das pessoas está mudando. Às 7 da noite, em São Paulo e no Rio, as pessoas estão paradas no trânsito e não na frente da TV. A entrada dos comerciais é uma desgraça, são dois minutos em que você abre os flancos para perder o telespectador.


Como você faz para combater esses problemas?


Utilizo o humor e o movimento. Você não vê, em novela minha, atores sentados no sofá, eles se mexem o tempo todo. Também não gosto de fazer coisas muito realistas, não faço imitação da realidade, minhas cenas de sangue se tornam espetáculo, as lutas viram coreografias.


Você já fez cinema e teatro. O que lhe dá mais satisfação?


Cada um é um prazer diferente. Entrar em cena como ator é um prazer como transar. Estou esperando a novela engrenar para voltar a atuar em O Boom e, em janeiro, estréio Escândalo (as duas peças são de Luiz Carlos Góes). No cinema se tem mais tempo, se estuda mais e quando vai filmar tudo está na cabeça. Ser diretor de TV é saber fazer romance, comédia, drama, realizar coisas dificílimas em poucos minutos. Dirigir na TV é gerir criatividade, ter saída para todos os problemas.


Qual o seu maior sucesso e o maior fracasso na TV?


O que deu menos audiência foi As Filhas da Mãe, em que eu arrisquei muito, eram histórias fragmentadas como várias sitcoms entrelaçadas. Mas o clima não estava para ela, foi ao ar logo depois do bode do 11 de Setembro. Os sucessos são mais numerosos: A Próxima Vítima, Que Rei Sou Eu?, Brega e Chique, Alma Gêmea, Chocolate com Pimenta…


O que nunca te deixaram fazer na TV?


Gostaria de dirigir um show com musical na TV, como o Times Square. Só esse tipo de coisa me tiraria da novela.


Quem gostaria de ter dirigido, mas que não pôde?


Gloria Pires, que foi minha colega de elenco em Água Viva. Como vim do subúrbio (Del Castilho), foi um sonho dirigir Glória Menezes, Tarcísio Meira, Tony Ramos, Fernanda Montenegro. Foram eles que me deram credibilidade no início da carreira.


Qual o tipo de personagem que você prefere?


Os vilões são fascinantes e nos dão chance de realizar grandes cenas. Por isso, tiro o chapéu para os atores que fazem os bonzinhos, porque é sempre mais difícil. A maldade é mais exuberante.


Qual é o seu pecado capital?


A gula é o mais óbvio, mas também a ira. Acho que com essa novela todo mundo começou a pensar nos seus próprios pecados. Aqueles que são perdoados por você mesmo todos os dias.


Desde quando você escala sua mãe para novelas?


Desde 77, quando meu pai morreu e ela ficou superdeprimida. Louise Cardoso colocou a minha e a mãe dela para fazer curso de teatro. Escalei as duas como figurantes, no papel das aias da rainha, em Que Rei Sou Eu?. Ela foi melhorando, galgou um espaço merecido e é uma atriz. Hoje ela é Corina, uma ex-vedete de teatro de revista, uma mistura de Luz Del Fuego e Dercy Gonçalves.


Quando se tem certeza de que a novela pegou?


Quando vira moda, é notícia nas revistinhas e nas revistonas, o pessoal comenta. Às vezes acontece um fato que desperta o público. O telespectador não havia entendido que por trás da capa e espada de Que Rei Sou Eu? havia uma crítica. Em fim de semana prolongado, quando os cavalos do reino de Avilan começaram a pagar pedágio e a receber um selo na testa, o público descobriu a novela e percebeu a sátira, porque estava começando a cobrança de pedágio no Brasil. Foi um estouro.’


Shaonny Takaiama


Globo encontra cabo Anselmo


‘Amanhã, o Linha Direta Justiça, da Globo, leva ao ar um episódio marcante. O programa irá tratar da história do Cabo Anselmo, considerado o maior traidor da esquerda no Brasil durante a Ditadura Militar.


José Anselmo dos Santos foi um marinheiro que fez treinamento de guerrilha em Cuba e esteve exilado no Chile e no Uruguai durante o Regime Militar. Voltou do exílio em 1970, e, preso pelo delegado Fleury, do Dops de São Paulo, foi cooptado pelo regime e passou a trair seus companheiros, atuando como agente duplo da repressão. Ele fingia ser um guerrilheiro, marcava encontros com companheiros de luta armada e os entregava aos agentes do Dops.


No programa, o ator Caio Junqueira interpreta o Cabo Anselmo e Antônio Calloni vive o delegado Fleury. Diretor do Linha Direta, Milton Abirached conta que esse episódio da história recente do Brasil foi muito difícil de ser retratado.


‘É um programa mais específico porque se localiza em uma minoria, o pessoal que era contra o regime. Mas há uma outra visão que se pode ter desse programa, mais universal, que é sobre lealdade e traição. Cabo Anselmo delatou até uma mulher que estava esperando um filho dele’, conta o diretor.


Anselmo ainda está vivo e, depois de muito esforço da produção, deu entrevista por telefone à Globo. Ele vive sob a proteção de ex-agentes do Dops, que resguarda sua identidade e está na clandestinidade há mais de 30 anos.


‘Ele se defende da acusação de traição, diz que viu como era o regime socialista em Cuba e não queria isso para o Brasil. Diz que foi uma conversão ideológica, mas, na verdade, ele foi convencido pela grana mesmo’, opina Abirached. Entre as pessoas que dão depoimentos ao programa estão ex-companheiros de militância na esquerda.


Entre-linhas


Agora é para valer: Patrícia Maldonado, ex-Record, já é a mais nova contratada da Band.


Upgrade no Pânico. Depois de Vesgo e Ceará irem à caça de Silvio Santos em Los Angeles, Sabrina Sato está com as malas prontas para ir para a África do Sul gravar matérias especiais.


Zilu, mulher de Zezé di Camargo, fechou contrato com a Band para fazer parte do júri do concurso do programa Terra Nativa, que vai lançar uma cantora country no estilo Shania Twain. O produtor musical Rick Bonadio também está na lista. As inscrições ainda estão abertas.’


CASO PLAME
O Estado de S. Paulo


Bush estuda perdão total a Libby


‘WP, NYT, Efe e AP, Washington – A Casa Branca não descarta a possibilidade de um perdão total a Lewis Scooter Libby, ex-chefe de gabinete do vice-presidente Dick Cheney. ‘Com relação ao futuro, não descarto nada’, disse ontem o presidente George W. Bush, um dia após livrar Libby de dois anos e meio de prisão.


Na segunda-feira, Bush comutou a sentença de Libby. Diferente do perdão, a comutação apenas evitou sua prisão. O perdão presidencial, caso seja concedido, significa a extinção do processo e a limpeza da ficha corrida de Libby, que continuaria réu primário. Do jeito que está, o processo contra o ex-assessor de Cheney continua correndo, ele segue tendo de pagar uma multa de US$ 250 mil e ainda ficará dois anos em liberdade condicional.


No mês passado, Libby tornou-se o mais alto funcionário da Casa Branca a ser sentenciado desde o caso Irã-Contras, nos anos 80. Ele foi considerado culpado de perjúrio, obstrução da Justiça e falso testemunho durante as investigações sobre o vazamento da identidade de Valerie Plame, uma agente secreta da CIA.


A decisão de livrá-lo da prisão foi criticada pelos democratas e pela imprensa. ‘O presidente colocou a si mesmo e a seus assessores, especialmente o sr. Cheney, acima da lei’, disse em editorial o New York Times. ‘A comutação da pena envia uma mensagem errada sobre a seriedade do crime’, publicou o Washington Post.


Diante da decisão, a imprensa oficial cubana aproveitou para ironizar o que chamou de ‘circo da democracia’ nos EUA. ‘Pisotearam o princípio da Justiça de que todos são iguais perante a lei’, afirmou o Juventud Rebelde. A mesma impressão teve William Schneider, analista político da rede de TV CNN. ‘O que aconteceu foi um caso de tratamento especial dado a alguém bem relacionado. Há milhares de pessoas nos EUA cumprindo pena por obstrução da Justiça que não terão sua sentença comutada’, afirmou Schneider durante o programa do âncora Anderson Cooper.


Depois que os advogados de Libby esgotaram as possibilidades de apelação, o destino do ex-assessor parecia mesmo a cadeia – ele até já havia ganhado um número de identificação carcerária – quando Bush decidiu resgatá-lo.


A decisão surpreendeu até membros do governo. O Departamento de Justiça e o porta-voz Tony Snow não sabiam de nada. Analistas acreditam que o perdão, tomado de maneira isolada, reflete um presidente que não tem mais nada a perder. ‘Bush não vai incomodar ninguém que já não o odeie e conseguirá oferecer certo ânimo aos que o apóiam’, afirmou o cientista político Whit Ayres, que não acredita em graves conseqüências políticas paro presidente.


Em defesa de Bush está o histórico de indultos, que tornou-se um procedimento de praxe entre ex-presidentes. Bill Clinton distribuiu 456 indultos. Ronald Reagan, 406. Até agora, o placar favorece a Bush, que concedeu apenas 113 perdões e 4 comutações.


O único inconveniente é que o hábito de assinar os indultos, historicamente, surge no apagar das luzes, nos últimos dias de mandato, e ainda faltam 18 meses para Bush despedir-se da Casa Branca.’


PUBLICIDADE
Andrea Vialli


Atitude da empresa valoriza sua marca


‘Foi-se o tempo em que bastavam investimentos vultosos em propaganda e marketing para se construir um nome forte: a sustentabilidade das empresas é fator cada vez mais importante para a valorização de uma marca. É o que aponta um estudo realizado pela consultoria BrandAnalytics, especializada em gestão de marcas.


‘Quando uma empresa é percebida pelo mercado como estável, isso se reflete na projeção de lucros a longo prazo. Hoje, podemos dizer que o valor da marca se calcula a partir da percepção da sustentabilidade, um dos ativos intangíveis mais importantes de uma empresa’, explica Eduardo Tomiya, diretor da BrandAnalytics e responsável pela pesquisa.


O valor de mercado de uma empresa é calculado a partir da soma de seus ativos tangíveis, como fábricas e estrutura logística, e dos intangíveis, como reputação, marca, governança e motivação dos profissionais. O estudo conduzido pela BrandAnalytics mostra que as marcas brasileiras mais valiosas são aquelas que têm demonstrado valores como respeito ao consumidor, preocupação ambiental e disposição em ser transparentes. A pesquisa teve como base as 50 maiores empresas brasileiras de capital aberto e suas informações financeiras prestadas até dezembro de 2006.


O Bradesco foi considerado pela pesquisa como a marca brasileira mais valiosa atualmente: US$ 3,71 bilhões. Em 2005, a marca Bradesco valia US$ 2,48 bilhões, segundo o mesmo levantamento. Trata-se de uma valorização de 49% no período de um ano, justamente quando o banco reestruturou sua área de relações com investidores e passou a investir na comunicação de suas ações socioambientais.


Para Milton Vargas, vice-presidente do Bradesco, ações como a segmentação dos clientes, os investimentos sociais na área de educação e inovações tecnológicas contribuíram para aproximar o banco da sociedade, o que se traduziu na valorização da marca. ‘O valor da marca reflete a trajetória da empresa ao longo dos anos e a percepção de que a organização é capaz de gerar ativos no futuro’, diz. ‘Temos nos empenhado em tornar essas atitudes mais conhecidas do público.’


O Itaú aparece em segundo lugar no ranking de marcas mais valiosas da BrandAnalytics, com valor de US$ 3,6 bilhões. Em terceiro vem o Banco do Brasil, com US$ 2 bilhões, e em quarto a fabricante de cosméticos Natura, cuja marca vale US$1,9 bilhão.


‘São empresas que têm se posicionado como duradouras a longo prazo. Isso é expresso por compromissos com questões sociais e ambientais’, diz Tomiya. ‘Algumas, como a Natura, incorporaram esses itens à sua identidade.’ No entanto, as metodologias atuais ainda não permitem avaliar, em termos porcentuais, quanto a sustentabilidade representa nos valores intangíveis da empresa.


De acordo com Fábio Niccheri, sócio da área de fusões e aquisições da consultoria PriceWaterhouseCoopers e especialista em análise de ativos intangíveis, o mercado brasileiro ainda carece de métodos precisos para essas avaliações.


‘Em países europeus e nos Estados Unidos, as empresas são obrigadas por lei a prestar conta de seus ativos intangíveis quando ocorrem fusões e aquisições’, diz. ‘Aqui, isso ainda não é regulado por lei. Os cálculos são feitos com base no fluxo de caixa de cada um dos ativos – no caso de uma marca, medindo-se o quanto ela agrega de valor a um produto’, diz Niccheri.


CONSUMIDOR-ACIONISTA


Segundo Eduardo Tomiya, a consolidação do mercado de capitais brasileiro – com a Bovespa chegando a 55 mil pontos – colocou o acionista no centro das preocupações empresariais. ‘Trouxe a visão de que a empresa está inserida em uma cadeia’, diz.


Com a popularização do mercado de capitais, as empresas devem estar mais atentas ao modo como tratam os clientes e o meio ambiente. ‘Aos poucos, o Brasil caminha para seguir a tendência dos EUA, que tem forte presença de pessoas físicas no mercado de capitais. Esse acionista-consumidor exige uma postura mais responsável das empresas’, diz Tomiya. No Brasil, os chamados ‘investimentos socialmente responsáveis’ movimentaram R$ 607 milhões em 2006, em sete fundos com esse perfil.


FRASES


Eduardo Tomiya


Diretor da BrandAnalytics


‘Quando uma empresa é percebida pelo mercado como estável, isso se reflete na projeção de lucros a longo prazo. Hoje, podemos dizer que é da percepção da sustentabilidade que se calcula o valor da marca, um dos ativos mais importantes’


Milton Vargas


VP do Bradesco


‘O valor da marca reflete a trajetória da empresa ao longo dos anos e a percepção de que a organização é capaz de gerar ativos no futuro. Temos nos empenhado em tornar essas atitudes mais conhecidas do público’’


Marili Ribeiro


Ações de época para vender cerveja


‘A concorrência no segmento de cervejas premium – marcas com preço em média 20% mais alto do que a média do mercado – está se acentuando. E como se trata de uma área em expansão no Brasil, capaz ainda de dar maior rentabilidade à indústria cervejeira, o setor busca demarcar território na área.


Nessa linha, para manter a liderança na categoria para a marca Bohemia, a AmBev aposta na campanha que acaba de pôr no ar. Apelou para recursos de cross media – ou seja, ações que acontecem paralelamente em vários canais de comunicação.


Centrada em São Paulo e desenvolvida pela agência DM9DDB, a ação teve início ontem com uma sobrecapa no jornal O Estado de S Paulo, remontando à sua primeira edição, quando ainda se chamava A Província de São Paulo: a edição é de 4 de janeiro de 1875. A intenção era valorizar o fato de que a cerveja Bohemia mantém a mesma fórmula e qualidade desde sua fundação.


Como parte da campanha, o jornal foi distribuído em vários pontos da cidade por atores circulando em um bonde e trajados ao estilo do final do século XIX. Tratava-se de um ‘bonde de aparência’, já que rodou em cima de um chassis de ônibus. ‘Mas causou o impacto’, diz a diretora de mídia da DM9BBD, Mônica Carvalho. ‘À noite, os consumidores puderam ver os comerciais na televisão.’


A Bohemia é a líder no segmento premium, como ressalta Cristiano Schenardi, gerente de marketing da Bohemia. ‘Hoje, as cervejas premium representam quase 7% do mercado total de cervejas. Porém, em 2001, quando a Bohemia foi relançada pela AmBev, esse segmento era apenas de 2% do mercado total.’ Apesar do consumo ascendente, o consumo ainda deixa a desejar. ‘Há muito espaço para avançarmos. O consumidor quer opções’, acredita Schenardi.’


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Folha de S. Paulo


Quarta-feira, 4 de julho de 2007


MÍDIA & RELIGIÃO
Lucas Pacheco


Farinha pouca, meu pirão primeiro


‘ESTÁ PARA ser debatido no Senado o projeto do senador e pastor evangélico Marcelo Crivella (PRB-RJ), um dos fundadores da Igreja Universal do Reino de Deus, que contempla a construção e a reforma de templos, bem como o pagamento de religiosos, com a renúncia fiscal de empresas -ou seja, abatimento no Imposto de Renda.


A proposta abre uma guerra fiscal com os representantes das artes e da cultura brasileira, pois o mecanismo para tanto tem como fundamento a Lei Rouanet, criada em 1986 e aprimorada ao longo dos anos, que, por meio do Pronac (Programa Nacional de Apoio à Cultura), tirou da lama a produção cultural do país.


Mal ou bem, essa lei funciona e faz acontecer na cultura brasileira. É triste ver artistas e produtores da cena brasileira passando o chapéu por várias empresas para conseguir realizar peças de teatro, filmes, editar livros, gravar discos e promover eventos culturais. Mas, sem isso, estariam quase todos na rua da amargura e do miserê.


De acordo com dados do IBGE e do Ministério da Cultura, existem hoje no Brasil perto de 290 mil empresas culturais, que são responsáveis por uma massa salarial acima de R$ 18 bilhões. A receita líquida que as atividades culturais movimentam beira os R$ 170 bilhões anuais, o que leva a cultura ao quarto lugar como item de consumo do brasileiro, superando os gastos com educação e abaixo só de habitação, alimentação e transporte.


Desde a criação da Lei Rouanet, a produção fonográfica de artistas brasileiros cresceu mais de 66%, nosso cinema ressurgiu das cinzas e, hoje, mais de 300 filmes estão em andamento, entre o processo de captação de recursos, a produção e a exibição. Enquanto isso, o ‘market share’ de público espectador de produções nacionais subiu de 7% para quase 22%. A captação de recursos para a realização de atividades culturais está perto de R$ 1,5 bilhão por ano.


Esses são alguns indicadores ainda modestos se comparados aos de outros países da Europa e aos dos Estados Unidos, mas que, sem a lei de incentivo, jamais seriam alcançados. Claro que o cenário não é totalmente perfeito. Existe muito lixo cultural sendo produzido por aí, com o lobby mau de alguns produtores, de um lado, e a prestação de contas fraudulenta, de outro, mas experimentamos um grande avanço que não admite retrocesso -a não ser que imaginemos cair em uma política cultural ao estilo chavista.


Dessa forma, e por todos os motivos citados, soa como disparate e cheira mal a proposta do pastor Crivella, que pressupõe empresas abatendo do seu, do meu, do nosso dinheiro, não importando nossas crenças religiosas, verbas ainda mais polpudas das renúncias fiscais que já têm essas igrejas, para patrocinar aventuras religiosas universais.


Será que já não chega o que esses religiosos arrecadam diariamente dos fiéis nos gigantescos e faustosos templos mundo afora?


Essas organizações religiosas originadas no Brasil ultrapassaram fronteiras e, em países da África, em Angola, por exemplo, já arrebanham mais adeptos do que a Igreja Católica. Você tropeça com um templo em cada esquina, e existem milhares de pastores pregando e convencendo incautos a contribuir com dinheiro em troca da redenção.


O que está por trás da ‘Lei Crivella’ é muito mais do que uma ameaça à nossa produção cultural: é a mistificação, o engodo e a má-fé. Religiosos conscientes e bem-intencionados têm mostrado indignação com tal propositura, que demonstra, mais uma vez em nossa política, como a esperteza, apresentada em forma de projeto de lei, é colocada em debate no Congresso, tudo empacotado, maquiado de forma angelical.


O senador-pastor diz que sua idéia não irá prejudicar a cultura no país, já que o limite de renúncia fiscal estabelecido pela Lei Rouanet -4% do total do Imposto de Renda devido- nunca foi alcançado. Uma defesa frágil e um argumento pífio de quem não está nem aí para pessoas sérias, como exemplos mais ilustres Paulo Autran e Fernanda Montenegro, que, depois de representar por décadas e décadas a nossa cultura, ainda hoje têm que correr atrás de incentivos fiscais para realizar seus produtos culturais.


Senador Crivella, volte para os templos com seus pastores, use o gordo dízimo -arrecadado da gente simples brasileira- com bom senso e deixe nossa sofrida cultura na paz celestial dos incentivos fiscais. É uma questão de sobrevivência.


LUCAS PACHECO, 54, é jornalista, publicitário e consultor de marketing político. Já atuou como produtor e diretor de cinema e voltou, após 27 anos, a dirigir filmes.’


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


A desilusão


‘Na Folha Online e demais, ‘manobra gera revés’, ‘tentativa de retardar fracassa’. Já a Reuters dizia que ‘a Mesa não arquiva, mas dá mais tempo a Renan’.


Enquanto isso, Hebe recebia Demóstenes Torres, Arthur Virgílio e a Miss Brasil para expressar sua ‘desilusão’, levantando perguntas como ‘é verdade que ele quer chantagear os pares?’. Ecoou frases tipo ‘se for investigar todos os senadores não sobra um’, de outro senador, e constrangeu os convidados.


A desilusão é dela e do espanhol ‘El País’, ontem em texto do correspondente Juan Arias sobre as ‘cifras arrepiantes: 32 senadores são processados’. E Lauro Jardim avisa na Veja On-line que tem mais no grampo ‘que detonou Joaquim Roriz’, Brasília ‘vai explodir’.


O SENADOR E A MISS


No meio do debate, Hebe Camargo corta: ‘Você queria falar, menina?’. E a Miss Brasil fala: ‘Eu acho isso um enorme desrespeito com o brasileiro…’. Demóstenes Torres corta: ‘Enorme desrespeito, desrespeito maior com o brasileiro foi você não ter ganho’ como Miss Universo. Risos, palmas.


ÉTICA E O MERCADO


O ‘Financial Times’ destacou pesquisas do Goldman Sachs e da McKinsey que dizem que ‘empresas éticas têm desempenho acima da média de mercado’. Os estudos são voltados ao evento Global Compact, da ONU, que reúne ‘3.000 empresas, mais da metade dos países emergentes, como China, Índia e Brasil’. Por ética, ‘FT’ e os estudos compreendem o respeito aos ‘direitos humanos, padrões trabalhistas, meio ambiente e o combate à corrupção’.


NO PALCO MUNDIAL


A Anistia Internacional, na véspera da cúpula Europa- Brasil, cobrou dos europeus ‘discussão franca de direitos humanos com seu parceiro, o Brasil’. Questionando os 19 mortos no Rio, a organização diz que, ‘conforme o perfil do Brasil cresce no palco mundial, também cresce a obrigação do governo brasileiro de defender direitos humanos no mundo, regionalmente -e em casa’.


Por outro lado, o ‘Guardian’ saudou, desde o título, o ‘impulso multimilionário para favelas’ dado por Lula.


ESTATURA E RETÓRICA


Lula chega à Europa com despachos sublinhando que ‘cresce a estatura do Brasil’ etc. Mas também com Peter Mandelson, o comissário de comércio, questionando-o por afirmar que a UE só ‘fala, fala, fala’. Dele, à BBC Brasil, ‘mais que retórica, devemos entrar na negociação séria’.


‘LAMENTAVELMENTE’


Foi manchete da Agência Bolivariana e daí para os sites brasileiros a ameaça de Hugo Chávez de que a ‘Venezuela poderia retirar a solicitação de inclusão no Mercosul’. Na frase destacada na ABN, se o Senado daqui ‘não completar a adesão, lamentavelmente’ ele vai sair, ‘definitivamente’.


DOCE ATRAÇÃO


Com tradução e destaque no UOL, o ‘Financial Times’ noticiou ontem a ‘doce atração dos biocombustíveis do Brasil’. O correspondente abre a longa reportagem com entrevista por telefone com o presidente do grupo Noble, da China, se vangloriando de ter se adiantado aos também gigantes ADM e Bunge -e entrado no mercado do etanol de cana, disputado ainda por Cargill, Odebrecht etc.’


INTERNET
Folha de S. Paulo


Vendas pela internet têm alta de 49% no primeiro semestre


‘No primeiro semestre deste ano, as vendas pela internet totalizaram R$ 2,6 bilhões, com crescimento nominal de 49% sobre o mesmo período de 2006. A pesquisa da e-bit, que acompanha o comércio eletrônico nacional, não inclui as vendas de passagens aéreas, automóveis e sites de leilão.


Um dos motivos foi o maior volume de vendas, que teve crescimento de 45%, impulsionado pelos novos consumidores. No final do ano passado, 7 milhões de pessoas já tinham feito pelo menos uma compra pela internet. Até o mês passado, já eram 8 milhões.


Pedro Guasti, diretor-geral da e-bit, afirma que a confiança no canal vem aumentando, e a indicação de amigos influencia nessa percepção. Outro fator importante foi o aumento da freqüência de compras pelos consumidores usuais, que também passaram a escolher produtos mais caros. A média do valor gasto nas lojas virtuais no semestre foi de R$ 296, 3% a mais do que em 2006.


Maio aparece como o melhor mês do período, por causa do Dia das Mães, respondendo por 19% do faturamento.


Para todo o ano, a projeção é que a movimentação chegue a R$ 6,4 bilhões, com alta de 45% sobre 2006. No segundo semestre, está concentrada a maioria das vendas, em parte por causa do Natal. No ano passado, o período de 15 de novembro a 23 de dezembro respondeu por 18% do faturamento.’


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Pais devem acessar a rede junto com filhos


‘As crianças não devem ter, desde pequenas, a liberdade de acessar a internet sem supervisão, dizem os especialistas ouvidos pela Folha.


No começo, os responsáveis devem acompanhar a criança e direcionar sua navegação, orientando e tirando dúvidas.


‘Aos três ou quatro anos, as crianças já começam a chegar perto dos pais quando eles estão no computador, a mexer no mouse’, relata Maria Angela Barbato Carneiro, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP.


Ela diz que os pais devem colocar limites ao tempo que a criança fica on-line, que aumenta conforme a idade.


Carneiro diz ainda que os pais devem ficar junto com a criança no computador, ajudando-a. Com o tempo, podem deixar os filhos mais tempo sozinhos, diz ela.


A especialista também é contrária a que crianças menores de 12 anos acessem sites com muita publicidade. ‘A criança é pouco reflexiva, não tem discernimento’ afirma.


Sergio Suiama, procurador da República, acha que os pais devem informar os filhos sobre os perigos da internet e não permitir que o computador fique no quarto da criança.


Ele acredita também que é melhor que as crianças não coloquem informações pessoais nem fotos em sites ou no MSN.


Suiama diz que os principais crimes que acontecem na internet são os contra a honra, os de ameaça, incluindo o ‘bullying’, e a exploração sexual.


Outro problema é a exposição a conteúdo indesejado que não foi procurado, diz ele, como no caso de sites com conteúdo sexual acessados a partir de links aparentemente inocentes. Suiama diz ainda que há casos de crianças que foram vítimas de assédio sexual após contato feito pela internet. (PL)


BABÁ ON-LINE


O NetNanny (www.netnanny.com), que controla o acesso das crianças à internet, lançou a versão 5.5. O programa bloqueia pornografia e filtra resultados em sites de busca. O soft pode ser usado com o Windows Vista, que tem ferramenta para permitir que a criança use o PC só em alguns horários do dia.’


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Sites oferecem universos virtuais infantis


‘Atentas ao sucesso dos universos virtuais, em que o usuário, representado por um avatar, passeia por um cenário conversando com outros e cumprindo missões, empresas criaram sites que são uma espécie de Second Life mirim.


O Habbo Hotel (www.habbo.com.br) e o Club Penguin (www.clubpenguin.com) são dois desses sites, que têm algumas similaridades, mas são voltados a públicos diferentes.


Único com versão em português entre os sites testados pela reportagem, o Habbo Hotel é recomendado para maiores de 13 anos. Ao entrar no jogo, porém, percebe-se que há muitos usuários que se dizem um pouco mais novos, na faixa entre 10 e 12 anos. Os avatares que representam os usuários no Habbo Hotel podem ter cabelos, rosto e roupas alterados para ficar com a ‘cara’ do dono.


Uma vez montado o personagem, o jogador entra no hotel, onde pode andar pelas áreas públicas, como recepção, jardins e piscina, ou entrar nos quartos criados por outros usuários.


Entre as atividades mais divertidas estão nadar na piscina, dançar, explorar os quartos e as áreas públicas ou simplesmente conversar com outros usuários pelo caminho.


Os avatares também podem criar seus próprios quartos e decorá-los com mobílias, além de obter bichos de estimação como jacarés.


O principal porém do Habbo Hotel está no mecanismo de compra de itens. Para obter moedas do jogo, é preciso gastar dinheiro de verdade, e não há mecanismos dentro do próprio jogo que permitam obter dinheiro virtual.


Cinco moedas do jogo custam R$ 3; 30 moedas, R$ 13. Para comprar cada item de mobília é preciso ter, geralmente, de uma a cinco moedas.


Segurança


Os quartos criados pelos usuários podem ser fechados, permitindo o acesso só de avatares que são ‘amigos’ no jogo.


Outro recurso de segurança do jogo é o filtro aplicado às mensagens trocadas entre os usuários; palavras consideradas inapropriadas são substituídas por ‘bobba’.


Apesar do filtro, porém, nos testes da reportagem foi possível presenciar algumas conversas de conteúdo maduro ou sexual dentro do jogo.


Os pais devem ter em mente, também, que o Habbo Hotel tem publicidade no site (no qual se faz o login para entrar no ambiente do jogo) e marketing dentro do hotel, como em espaços que são patrocinados por marcas do mundo real.


Pingüins


Voltado a crianças menores, a partir de oito anos, o Club Penguin tem similaridades com o Habbo Hotel. O usuário também é representado por um avatar, que nesse caso é um pingüim colorido.


Os pingüins passeiam por um mundo virtual, que tem, além de espaços públicos, iglus criados por cada usuário.


A principal diferença em relação ao Habbo é que, no Club Penguin, as crianças ganham dinheiro virtual participando de jogos e brincadeiras. Não é possível comprar o dinheiro virtual com dinheiro de verdade.


Pode-se comprar uma assinatura do site, que dá direito a roupas para o pingüim e a alguns itens especiais; custa US$ 5,95 por mês. Mesmo sem a assinatura, porém, é possível usar todos os recursos do site.


O Club Penguin também oferece muitos jogos e atividades nas áreas públicas do mundo virtual, que vão de jogos de tabuleiro e de agilidade à leitura de pequenas histórias.


A reportagem verificou que os avatares passam mais tempo entretidos com as atividades do que conversando entre si.


Privacidade


Para aumentar a proteção das crianças menores, alguns servidores do Club Penguin funcionam só com o chamado Ultimate Safe Chat, em que as mensagens instantâneas dentro do jogo não podem ser digitadas; o usuário deve escolher uma frase em um menu.


Aqueles que escolherem o chat normal estarão sujeitos a um filtro mais tradicional; o site diz ainda ter moderadores 24 horas por dia.’


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Webkinz tem versão on-line de bichinho


‘O Webkinz (www.webkinz.com) é um mundo virtual em que as crianças cuidam de versões eletrônicas de bichinhos de pelúcia.


Para entrar na página é preciso comprar brinquedo da marca; cada um vem com um código único que dá direito a entrar no site.


Os bichos de pelúcia custam a partir de US$ 10 e estão à venda nos EUA e Canadá. No site, é preciso cuidar do bichinho, alimentando-o e brincando com ele. O Webkinz é indicado para maiores de seis anos.


Além de cuidar do amigo virtual, os usuários do Webkinz também podem participar de brincadeiras, nas quais ganham dinheiro virtual com o qual compram itens para os bichos. Não é possível comprar dinheiro virtual com dinheiro real.


Os usuários podem também conversar entre si na área pública. A página tem dois tipos de chat: um para crianças menores, no qual têm que escolher entre frases prontas, e outro só com palavras que constam de um dicionário interno.’


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Páginas apostam em bonecas para vestir


‘No universo dos sites infantis, existem alguns voltados a públicos específicos, como as garotas pré-adolescentes -caso do Stardoll (www.stardoll.com) e do Cartoon Doll Emporium (www.cartoondollemporium.com).


Atentos à predileção das meninas por roupas e por celebridades, as páginas oferecem bonecas virtuais que os usuários podem vestir e cujo visual pode ser alterado. Os sites estão abertos a garotos, mas a maioria dos usuários são meninas.


No Stardoll, as bonecas de celebridades, como Avril Lavigne, vestidas pelo visitante podem ser salvas em um álbum pessoal.


O usuário também pode criar uma MeDoll, boneca que vai representá-lo e cuja aparência pode ser similar à do dono. Essa boneca pode ser vestida com roupas e sapatos.


O Stardoll oferece também uma página pessoal a cada usuário, em que ele pode colocar informações sobre seus gostos pessoais e sobre amigos, no estilo site de relacionamentos.


O dinheiro virtual do site, que pode ser comprado com dinheiro de verdade, dá direito a itens especiais, mas não é preciso dele para brincar de vestir as dezenas de bonecas do site.


Desenho animado


Concorrente do Stardoll, o Cartoon Doll Emporium também aposta nas bonecas virtuais para atrair as pré-adolescentes.


Apesar de contar com algumas bonecas de celebridades, o forte do site é que as bonecas são desenhadas por artistas e se parecem mais com personagens de desenho animado.


Já as bonecas do site Stardoll têm uma aparência um pouco mais ‘robótica’.


Alguns personagens de filmes infantis, como Sininho e Pikachu, estão entre as bonecas oferecidas no Cartoon Doll Emporium.


O site não oferece página pessoal aos usuários, mas tem um fórum no qual eles podem conversar. Cada usuário é identificado por um nome de usuário e por uma imagem nos posts.


Os usuários do Cartoon Doll Emporium ganham dinheiro virtual participando do fórum, ao escrever posts e ao comentar os posts de outros.


Com o dinheiro virtual, podem comprar itens especiais.


Há também uma assinatura do site, que custa US$ 6,99 ao mês e dá direito a itens especiais e a participar de promoções.’


CRÔNICA
Marcelo Coelho


Cultura da explicação


‘FICO TENTANDO entender o que leva um grupo de delinqüentes de classe média a espancar, tarde da noite, uma mulher parada num ponto de ônibus, como aconteceu há poucos dias no Rio de Janeiro. Parece que faziam isso habitualmente; funcionários de um posto de gasolina contam tê-los visto mais de uma vez comemorando o sucesso de suas expedições.


Fala-se em ‘intolerância’: organizavam-se para atacar prostitutas. Só que desta vez atingiram uma empregada doméstica. Se o caso fosse ‘apenas’ isso, uma mania de perseguir prostitutas, haveria sem dúvida uma linha de interpretação possível. Acho-a insuficiente, mas vamos ver até onde vai.


Tudo poderia ser entendido como uma forma doentia de repressão sexual. Imagino que, há um século, certos assassinos famosos de prostitutas buscassem matar quem expusesse em público um desejo sexual de que tinham vergonha e que não conseguiam satisfazer.


Ainda que evidentemente genérica, essa interpretação teria algum sentido em épocas remotas. Não tenho certeza se atualmente se vive uma era de total liberdade sexual entre os jovens, mas em todo caso a repressão não é, por certo, o forte do nosso sistema educativo.


Mais provável, então, que a ‘intolerância’ seja de outra natureza. O que a classe média brasileira não mais suporta -haja vista as iniciativas de controlar a mendicância em São Paulo- é o contato com gente pobre. Você mora num condomínio bem-cuidado, freqüenta um colégio particular, passeia num shopping center, e tudo vai às mil maravilhas.


Só que existe a rua, o trânsito, o sinal vermelho, e quando você olha para o lado lá estão eles. À noite, parada na rua, uma mulher pode ser prostituta, mas pode estar apenas esperando um ônibus. Pouco importa: não é ‘tudo a mesma coisa’? Havia uma comunidade no orkut (devem ser contadas às centenas, mas não tenho estômago para procurar) chamada ‘Odeio pobre’. O idealizador dessa pequena organização dava seus motivos: eles falam alto, o carro deles, no fim de semana, encrenca na estrada e atrapalha a nossa vida, eles se vestem mal, usam aqueles guarda-chuvas que não funcionam, não entendem o que a gente diz…


Uma vez que não há perspectivas de ver o Brasil tornar-se um ‘país de primeiro mundo’ pelos mecanismos normais do desenvolvimento econômico, começam a surgir sinais de fantasia genocida. A ‘limpeza’ não se limitaria à remoção de favelas ou de bancos habitáveis nas praças públicas, mas precisa recorrer a medidas radicais, como incendiar mendigos ou, no mínimo, espancar quem não tiver a roupa certa, a cor certa, o carro certo.


‘Intolerância’? Não acho que seja este o termo. A questão não se resume, evidentemente, a ‘tolerar’ os pobres (embora seja isso o que muita gente acaba defendendo). Já é sintoma de nossa patologia social falar no ‘respeito ao diferente’ quando se pensa em proteger quem faz parte da maioria da população. Bem, mas eles pensavam que estavam atacando prostitutas. O motivo dessa escolha, entretanto, é certamente mais odioso do que o da pura ‘intolerância’ com relação à atividade dessas mulheres. É que a prostituta não vai dar queixa na polícia.


Seja como for, o ódio aos pobres não leva tanta gente assim a cometer a barbaridade que se viu na Barra da Tijuca. Será que esses ‘meninos’, esses ‘garotos’, esses ‘adolescentes’ (quanta ilusão nessas palavras!) tiveram uma educação excessivamente liberal? Acostumaram-se à ‘cultura da impunidade’ que predomina no país? Pode ser. Mas isso não explica tudo. Poderiam drogar-se sozinhos, dedicar-se a pichações, depredar caixas eletrônicos na calada da noite. Só que seria pouco. Tentando achar uma explicação para o caso, concluo que o erro está na minha própria pergunta. Fala-se muito na ‘cultura da impunidade’, mas existe também uma ‘cultura da explicação’. Para cada absurdo que acontece, há sempre um repórter pedindo explicações a algum especialista.


Entrevistar os próprios delinqüentes não daria certo tampouco: ouviríamos aquele tipo de adolescentês desarticulado que se encontra em toda parte. Foi pra zoar, mó legal, foi só de sarro, sei lá, tá ligado? De tanto serem ‘explicados’, de tanto que as pessoas se esforçam por entendê-los, é que nossos ‘jovens’ acabam fazendo essas e outras proezas. Querem ser inexplicáveis; querem ser irracionais. Trata-se de um desejo bastante comum, aliás, na espécie humana.’


TELEVISÃO
Elvira Lobato


Dificuldade de crédito pode atrasar TV digital


‘A dificuldade de crédito por parte das pequenas empresas de radiodifusão pode inviabilizar a implantação da TV digital em todo o território nacional no prazo de dez anos estabelecido pelo governo federal.


Segundo diagnóstico do Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital, à exceção de alguns grupos -como Globo, Record, Bandeirantes e SBT-, os radiodifusores não se enquadram nos critérios para aprovação de crédito exigidos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).


Os radiodifusores esbarram em dois problemas objetivos: falta de garantias e nível de risco acima do admitido pelo banco. A pedido do Fórum da TV Digital, o banco fez ontem uma reunião com representantes de emissoras de vários pontos do país para discutir o problema.


Segundo o conselheiro do fórum Jakson Sosa, as empresas enfrentam uma ‘burocracia gigantesca’ quando vão ao BNDES consultar a possibilidade de empréstimo, porque esse é o primeiro programa de crédito específico para o setor.


‘Não vemos problema para a implantação da TV digital nas grandes capitais. O grande desafio está nas demais cidades e no interior’, afirma Sosa.


O BNDES anunciou ontem a redução da taxa de juros de 6% para 4,5% ao ano para o financiamento a inovação e desenvolvimento tecnológico dentro do programa de TV digital.’


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