Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

‘O mundo da tecnologia está paralisado’

As coisas estão ficando muito engraçadas aqui nos Estados Unidos enquanto nos dirigimos para o terceiro ano de Depressão da era moderna. Ninguém quer chamar isso de Depressão, mas se não for assim, o cenário será realmente assustador quando uma vier.

O mundo da tecnologia está paralisado e se consolidando com umas das mais estranhas ideias de todos os tempos. A campeã deste mês foi a ideia de que a AOL e o Yahoo! estariam preparando uma fusão. Este artigo não confirma nem nega o rumor. Mas independentemente do desfecho, seria um casamento feito no inferno por diversos motivos, entre os quais se inclui o fato de terem culturas corporativas muito diferentes. Você até pode casar um cachorro com uma gata e esperar que eles tenham filhos; mas esteja ciente de que haverá problemas.

Enquanto isso, a Microsoft tenta tirar vantagens da sua parceria com o Facebook. É divertido assistir à Microsoft atuar como um entusiasmado adolescente que corteja a bela moça da turma. Parece uma atitude ingênua, tratando-se de uma situação que inclui o Facebook. A gigante do software acredita que se unindo ao Facebook poderá, de alguma forma, aprimorar seu mecanismo de busca. Ela aposta que a combinação de informações sociais com os resultados de busca desejados entregará aos internautas aquilo que estão buscando, de uma maneira mais eficiente do que a oferecida pelo Google. É ridículo; mas eles vão testá-la mesmo assim.

Uma decisão inacreditavelmente idiota

O assunto do momento é o novo sistema operacional móvel da Microsoft, chamado Phone 7. Esse produto segue a desastrosa estreia e o rápido cancelamento do smartphone Kin, da companhia. Suspeito que o novo aparelho se sairá melhor do que o Kin, mas não será um sucesso. Duvido que algum dos leitores desta coluna que não vivem nos Estados Unidos já ouviu falar do Kin. Não se preocupem; vocês não perderam nada importante, garanto.

O sistema operacional Phone 7 é algo entre um celular simples e um smartphone, como o iPhone ou um Android. A única maneira de torná-lo um sucesso é vendê-lo por um preço ofensivamente baixo, sugestão que a Microsoft dificilmente aceitará. Portanto, o Phone 7 não passará de um dispositivo comum. Para piorar a situação, a Microsoft decidiu que a próxima geração dos tablets que desenha não usará o Phone 7, e sim, uma variação do Windows 7.

Então, vamos entender isso direito. Por quase 20 anos houve tentativas de criar um tablet que utilizasse um sistema operacional desktop. Na verdade, a mais recente (pré-iPad) tentativa de abrir esse mercado foi iniciada pela Microsoft, e falhou. De repente, a Apple decide que o modelo sensível ao toque em que se baseia o sistema operacional do iPhone pode mudar o jogo e fazer com que os tablets efetivamente atraiam consumidores. E assim surge o iPad materializando esta ideia inédita. A consequência é um best-seller cujas estimativas de vendas para 2010 beiram as 20 milhões de unidades. A Microsoft assiste a esse dramático desdobramento e pensa: ‘Hummm, vamos voltar ao antigo modelo com o nosso tablet.’ É uma decisão inacreditavelmente idiota.

A Microsoft não é uma empresa fashion

Já o outro assunto que me fascina em relação ao Phone 7 é que ele é exatamente o que todos esperávamos que seria: um Zune Phone. Ele usa um derivante do Zune HD OS e simples e racionalmente poderia ter sido chamado de Zune Phone. Na realidade, ele deveria ter sido nomeado Zune Phone. Obviamente isso nunca aconteceria porque um ano depois da estreia do iPhone, todos previam um Zune Phone da Microsoft e os executivos da empresa de Redmond negaram copiosamente a possibilidade de estarem trabalhando em um Zune Phone. Por isso, o que basicamente vemos agora é um Zune Phone. A Microsoft vai argumentar que não é um Zune Phone porque não se chama Zune Phone…

A grande piada de tudo isso é o fato de que (e eu já o testemunhei várias vezes) o produto em si pode ser excelente. O celular poderia ser um sucesso, mas agora é um pouco tarde. Ele pode até ser melhor do que os outros, mas e daí? Muitos especialistas acreditam que o Zune é um mp3 player melhor do que o iPod. E contam com evidências para fundamentar sua opinião. Mas elas são inúteis. É tarde demais.

E qualquer coisa que a Microsoft faça nunca será vista como algo tão bacana quanto o que for feito pela Apple. A Microsoft simplesmente não é uma empresa fashion. Por isso ela é incapaz de obter sucesso com bons produtos que competem com a Apple.

Público prefere pagar para evitar confusões

Outra ironia é que a Microsoft liderou relevantes inovações muitas vezes. Entretanto, a companhia tem dificuldades para que os consumidores a sigam com essa expectativa. Embora a Apple esteja promovendo a Apple TV e o Google agora tenha a Google TV, a Microsoft tinha a Microsoft TV anos antes da existência desses produtos ‘inovadores’. E, além disso, a Microsoft havia comprado a WebTV, um produto também de vanguarda. Porém, a companhia estava tão à frente de si mesma que não sabia como atrair os consumidores a esses produtos. Tanto a WebTV como a Microsoft TV já não existem. Seus remanescentes são os inúmeros centros de mídia para PC e as conexões do Xbox para PC e TV, todos subestimados pelo mercado. Tornou-se um problema recorrente para a Microsoft lidar com um papel de líder em vez de seguidor. Ela simplesmente não tem ideia de como fazer.

Felizmente, ainda não existe um rival de peso para a Microsoft em sistemas operacionais para desktops. Há certa preocupação sobre o feito de a Apple ter superado os 10% de participação nesse mercado. O Linux também possui uma pequena participação. Mas por enquanto são porcentagens insignificantes. Sou daqueles que acreditam no Linux como um eventual vencedor desse jogo. Mas quem sabe quando? Junto com o problema do Linux aparecem as disputas relacionadas com a suíte Open Office, atualmente propriedade da Oracle. Escrevo esta coluna com o processador de texto OpenOffice Writer. Ele é tão bom quanto o Word, e é grátis. Mas parece haver uma cisão no programa completo. Não sei ao certo qual é a razão, mas projetos Open Source sempre vão por esse caminho. O problema é que o público não consegue entender o mecanismo e prefere pagar pelo Microsoft Office para evitar confusões.

Como disse no início, esse panorama está engraçado. Só espero que não se espalhe.