Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Vencendo o ufanismo com goleada

Para quem acompanhou a transmissão das duas partidas das oitavas-de-final da Liga dos Campeões da Uefa entre Manchester United e AC Milan pelo canal ESPN Brasil, este texto fará um pouco mais de sentido. É incrível como a imprensa esportiva brasileira se porta como torcedora, em determinados momentos. E aí, me refiro especificamente à ênfase dada a Ronaldinho Gaúcho como a grande esperança do time de Milão. O craque teve seus bons momentos na Europa, principalmente jogando pelo Barcelona. Ultimamente, no campeonato italiano, o jogador vem tendo algumas boas atuações, mas nada fenomenal. A forma excessiva com que ouvi falar dele nas semanas que antecederam as partidas decisivas do Milan contra o Manchester United me deixaram atordoado. E pensar que tudo isso se deve à tão esperada convocação dos 23 jogadores para a Copa do Mundo da África do Sul…

Em primeiro lugar, não tenho nenhum tipo de aversão ao jogador brasileiro, muito menos ainda pelo Milan. Inclusive, observava com mais calma o desempenho do time italiano na época em que Kaká estava arrebentando por lá. E em segundo lugar, com a difusão da transmissão da Liga dos Campeões da Europa pelas emissoras no Brasil, torna-se, hoje, muito comum, ver brasileiros por todo o país, torcendo fortemente por equipes européias, como o Real Madrid, que acabou obtendo muito sucesso com seu time de galácticos. Ou, quem sabe, pelo Chelsea, que até alguns anos atrás era um mero coadjuvante na liga da terra da rainha. Ou talvez o Liverpool, que cresceu com o título em cima do Milan em 2005 e posteriormente chegou às fases finais do torneio. O que dizer do veloz e ofensivo Barcelona, que garantiu o título em 2009? Ou o próprio Manchester United, com o título em 2008 e o vice em 2009? Enfim, estas são só algumas das principais forças do momento, na Europa.

Desânimo nas vozes

Em um primeiro momento, aqueles que não conhecem tão bem o futebol europeu são normalmente atraídos exclusivamente pelas estrelas brasileiras que jogam por lá. E a equipe de Milão tem uma tradição antiga de ter muitos jogadores do nosso país. Ainda por cima, com jogadores top de linha, ao contrário do Manchester United, que não tem se dado tão bem com nossos craques. Então, de certa forma, é natural essa preferência pelo time italiano em vez do inglês. Mas isso não pode ser generalizado pela mídia. Eu, por exemplo, tinha uma admiração pelo Milan quando o Kaká estava lá. Mas nunca torci fortemente pelo time. A imprensa esportiva brasileira não deve escolher um favorito na hora de narrar uma partida e produzir notícia. É bem verdade que usar os jogadores brasileiros como gancho, em parte, não representa problema algum, mas quando isso se torna obsessivo é um desrespeito com o telespectador, que não tem nada a ver com a história.

Por admirar o time dos diabos vermelhos, quando vejo uma partida dessa equipe pretendo ver uma transmissão isenta de favoritismo por um dos lados. Como telespectador, acredito ter esse direito. Mas não foi isso que ocorreu nos dois jogos contra o Milan. Sem contar a atuação dos jornais on-line, com uma enxurrada de notícias produzidas ou ‘copiadas’ de veículos internacionais e agência de notícias sobre Ronaldinho Gaúcho e seu desejo de ser convocado para a próxima Copa do Mundo.

Mas vamos a um breve histórico da partida, para chegar ao cerne da questão. O Milan começou vencendo a primeira partida das oitavas-de-final com um gol dele, desviado pela zaga. Ainda assim, o mérito pela tentativa é de Ronaldinho. A imprensa esportiva brasileira adorou, mas aos 28 minutos do segundo tempo, o panorama havia mudado completamente. O Milan tinha sofrido três gols, sendo dois deles de Wayne Rooney. Este, sim, vinha sendo muito mais decisivo para sua equipe há um bom tempo. E os locutores, especificamente da ESPN Brasil, mudaram a forma de narrar o jogo. Quando o Manchester dominava a partida parece que havia uma espécie de ar desanimador em suas vozes.

Panorama não é muito animador

E quase no fim, com um passe dele, Ronaldinho, Seedorf diminuiu o placar, amenizando o que seria um desastre para os milanistas, por estarem jogando em casa. Ronaldinho teve uma boa performance, e ponto. Mas, novamente tentando repercutir a idéia de que o showman (assim chamado por alguns locutores esportivos) deve ir à Copa do Mundo, a avaliação sobre a atuação do jogador passou a ser exagerada, inclusive por veículos internacionais.

Bom, e sobre a segunda partida, na Inglaterra… não há muito o que falar. Dessa vez, o Milan estava desfalcado. Uma ótima desculpa para Ronaldinho também não render o esperado pela imprensa esportiva brasileira. O jogo, que possivelmente levaria o ‘R80’ à Copa do Mundo 2010, segundo a previsão da mídia, e dele mesmo, fugiu ao controle. Mas venhamos e convenhamos: 4 a 0 para os ‘Red Devils’ foi um pouco pesado, não?!

A vitória do Manchester United, além de ter sido uma ótima exibição, de como um time deve usar do oportunismo nos momentos certos, é uma goleada em cima do ufanismo de nossa terra. Talvez isso ainda seja comum para algumas pessoas, se tratando de transmissões de jogos como os da seleção brasileira narrados por Galvão Bueno. Mas com Liga dos Campeões da Uefa, isso não funciona. O time de Old Trafford pode até ser desclassificado na próxima fase, o que não seria desastroso, pois o elenco possui alguns problemas e tem vencido na base da vontade, raça e superação. Mas se a cobertura esportiva pretende ser vencedora, que trate a nós, telespectadores, com o devido respeito.

É bom lembrar que a seleção brasileira ainda fará mais dois amistosos antes do torneio mundial. Até lá, a mídia vai explorar um pouco mais das atuações do camisa 80, dessa vez, por meio da luta milanista pelo título do campeonato italiano. De uma coisa, nós já sabemos: com a amarelinha, o panorama não é muito animador. Quantas vezes Ronaldinho Gaúcho foi decisivo vestindo o uniforme do time canarinho? Sinceramente… Dá para contar nos dedos de uma única mão.

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Estudante de Jornalismo do Unasp, Engenheiro Coelho, SP