Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Agência Carta Maior

ENTREVISTA – PERE-ORIOL COSTA
La Vanguardia

O papel da internet na campanha de Barack Obama, 8/11

‘Para o espanhol Pere-Oriol Costa, especialista em campanhas eleitorais, uso da internet foi uma das peças-chave da vitória de Barack Obama. ‘Esta campanha’, defende, ‘redimensionou o papel da internet nas campanhas eleitorais, confirmando sua importância brutal e amplificando muitas coisas que já estavam inventadas, como arrecadar fundos para a campanha e construir uma poderosa rede de voluntários.’

Em entrevista ao jornal La Vanguardia, de Barcelona, Pere-Oriol Costa, especialista em campanhas eleitorais, analisa algumas das principais causas do sucesso da campanha eleitoral de Barack Obama. Entre elas, destaca o papel que a internet desempenhou na caminhada do candidato democrata, desde o início da disputa das primárias, quando superou Hillary Clinton.

‘Esta campanha’, defende, ‘redimensionou o papel da internet nas campanhas eleitorais, confirmando sua importância brutal e amplificando muitas coisas que já estavam inventadas, como arrecadar fundos para a campanha e construir uma poderosa rede de voluntários’. Uma parte expressiva do dinheiro da campanha de Obama veio de pequenas contribuições feitas pela internet, o que garantiu maior poder de fogo ao candidato, especialmente na reta final.

Os principais trechos da entrevista:

Quais foram, do ponto de vista da estratégia eleitoral, os fatores-chave para a vitória de Obama?

Pere-Oriol Costa – Nas primárias, Obama percebeu que Hillary Clinton levava dois anos reposicionando-se ao centro, deixando um flanco à esquerda do Partido Democrata. Hillary falava de Deus, da fé e do exército, esperando conseguir um voto mais conservador, mas os blogueiros e a juventude do Partido Democrata a trituraram, acusando-a de trair o partido. Obama aproveitou esse espaço e encontrou eco dentro do Partido Democrata. Ainda que todo seu discurso seja progressista, não representa exatamente um discurso de esquerda ou de direita, mas sim de caráter geracional.

Essa estratégia era destinada a atrair o voto dos jovens?

POC – Buscava atingir mais o Partido Democrata e os jovens e blogueiros o impulsionaram. No voto das primárias, os mais velhos votaram em Hillary e os jovens em Obama. As primeiras análises que nos chegam das eleições presidenciais mostram que cerca de 70% do voto jovem foi para Obama.

Em que sentido a campanha de Obama foi melhor que a de McCain?

POC – A campanha de Obama foi retilínea e os acontecimentos permitiram que ele seguisse uma linha claramente identificável: equiparar McCain a Bush. Com esta linha, ele desgastou a McCain, que seguiu na campanha sofrendo vários tombos.

A mensagem de mudança, de novidade, defendida por Obama, é uma típica estratégia de marketing?

POC – O slogan marca o eixo de toda campanha. Hillary escolheu como eixo sua experiência e Obama percebeu que o fator da vitória residia em explorar o grande sentimento de mudança que existia na sociedade. Enquanto McCain adotou o slogan ‘o país primeiro’, uma referência à guerra do Iraque, o slogan de Obama permitiu-lhe assumir e tirar vantagens da mudança de sinal na campanha, provocada pela crise financeira. Quando a campanha deixou de estar centrada no Iraque e passou a focalizar o crack financeiro, McCain ficou fora do jogo.

Nas campanhas atuais, é preciso agarrar-se a uma idéia e repeti-la constantemente?

POC – A comunicação política extrai do marketing a idéia da unique selling proposition (algo como proposta de venda única): para que uma idéia sobre um produto encontre eco na opinião pública é preciso dizer uma única coisa, é preciso ter foco. O marketing político utiliza este sistema e tenta enviar uma só mensagem. Se conseguimos englobar tudo o que queremos em uma só mensagem há muito mais chances de que as pessoas recepcionem essa mensagem.

Obama fez isso e McCain não?

POC – Exatamente. Obama utilizou a mensagem da mudança. Yes, we can (Sim, nós podemos). Esta foi a idéia com a qual ele jogou.

Quais foram os erros de McCain?

POC – A escolha de Sarah Palin como número dois foi um erro gravíssimo. McCain representa a ala mais centrista do Partido Republicano e isso era bom para ele porque fazia fronteira com Obama. Mas ele pensou que podia perder votos mais à direita, sucumbiu às pressões e indicou Palin. Ela representa a ala mais fundamentalista do partido, mas, na verdade, a direita mais religiosa teria votado nos republicanos de qualquer forma. Com esse gesto, ele se situou mais à direita e deixou mais espaço para Obama no centro.

Obama também soube aproveitar ao máximo as possibilidades da internet…

POC – Esta campanha redimensionou finalmente a internet dentro dos processos eleitorais. Ela ganhou uma importância brutal e teve amplificadas muitas coisas que já estavam inventadas, como recolher dinheiro e captar voluntários pela rede. Praticamente todo o dinheiro da campanha de Obama chegou por meio de pequenas contribuições via internet.

O que significa isso?

POC – Creio que será transcendente para o mandato de Obama. O fato de ter recolhido a imensa maioria do dinheiro pela internet através de pequenas contribuições converte-o no primeiro presidente que não depende de lobbies, de pressões nem dos interesses daqueles que habitualmente financiam as campanhas. Bush recebeu dinheiro da Exxon Mobil e agora esta empresa está a ponto de perfurar as costas e o Alaska. Recebeu dinheiro das indústrias armamentista e de abastecimento e inventou duas guerras. Recebeu dinheiro das seguradoras e das empresas farmacêuticas e criou uma lei para rebaixar as responsabilidades das mesmas, freando a difusão de um seguro mais barato. Enfim, há uma dependência direta entre quem financiam a campanha e como atua o presidente. Este é um presidente que, em princípio, não deve nada a ninguém.

A internet também pode servir para regenerar o debate político?

POC – Na televisão, é preciso simplificar muito a mensagem e dizer apenas uma coisa, enquanto que a internet, por sua estrutura, permite a recuperação do discurso e do debate político. Para mim, esta campanha começou quando os blogueiros do Partido Democrata passaram a encurralar Hillary. Foi a internet que permitiu isso. Só com a televisão, não teria sido possível. Tem se dito que o efeito da televisão agora é fundamentalmente o debate entre os candidatos. No caso da internet, ainda que seja um debate virtual, o que ocorre é que este debate é muito mais rico.

Os cidadãos também podem participar mais, não?

PCO – A televisão tinha se convertido no cenário onde ocorria a ação política, usurpando, inclusive, o papel do Parlamento. A internet, sem usurpar o papel de ninguém, converteu-se em um novo meio que traz para a política um debate mais rico e um intercâmbio de mensagens.

Tradução: Katarina Peixoto’

 

DEBATE ABERTO
Marcelo Salles

Ocupar as redes de rádio e tevê, 10/11

‘A mídia, hoje, é a instituição com maior poder de produzir e reproduzir subjetividades. O dia em que os movimentos sociais organizados se derem conta disso, a primeira ocupação será nos centros de produção e reprodução de textos e imagens encarregados de sustentar o sistema.

Revejo ‘Jango’, brilhante documentário de Sílvio Tendler, que foi exibido na madrugada deste sábado (8/11/08) pela TV Brasil. Deveria ter ido ao ar mais cedo, em horário nobre, tamanha a sua importância. O filme mostra os atores envolvidos no golpe de Estado cometido contra o povo brasileiro em 1964. No ato lembrei do título do livro de René Dreifuss: ‘1964: a conquista do Estado’. O termo escolhido pelo escritor não poderia ser mais preciso. Tanto em sua obra quanto na de Tendler fica evidente que não houve apenas um golpe estanque no Brasil; ele não surgiu da noite para o dia. O movimento foi preparado durante anos e contou com apoio do governo dos EUA, de corporações privadas e de veículos de comunicação de massa.

No documentário há um depoimento muito importante de um militar, que chama a atenção para a ‘provocação’ que representou o comício de 13 de março, na Central do Brasil. Ele fala que o povo trazia cartazes subversivos. Aí lembrei de toda a preparação psicológica, de todos os cursos financiados pelos EUA para os militares brasileiros de que fala Dreifuss. IPES e IBAD à frente. Ao longo de anos associaram comunismo à barbárie e à desordem, até chegar ao golpe. Depois dele, a tropa de choque foi retirada da linha de frente (Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, cassados) e os homens de confiança assumiram a liderança. Brizola diz em seu depoimento que este foi o golpe dentro do golpe. Castelo Branco assume e imediatamente revoga a lei de remessa de lucros e garante a manutenção dos latifúndios improdutivos. O que vemos hoje?

Em meio à tal crise, que as corporações de mídia já não mais explicam por que, como e onde, o Banco Central divulga que montadoras de automóveis enviaram nada menos que US$ 4,8 bilhões às matrizes no exterior. Somando os outros setores da economia, a sangria alcança absurdos US$ 20,143 bilhões/ano. O Globo deu matéria sem nenhum destaque na página 22 da edição do último dia 6, cuja capa lambia as botas do novo comandante pró-forma do imperialismo. Eis aí a natureza do golpe de 1964 e da ditadura que seqüestrou, torturou e matou milhares de brasileiros.

Seu maior objetivo é garantir que o país mais rico da América Latina seja mantido sob a dominação imperialista. Nenhum governo sério do mundo permite que sejam enviados para o exterior tantos recursos produzidos com o suor do seu povo. Existem leis que obrigam que esse dinheiro seja reinvestido no país, isso sem falar na tributação às grandes empresas, que deveria ser maior. Não dá pra aceitar calado o envio de tantos bilhões pra fora enquanto existe gente passando fome aqui dentro. Isso sim é uma ditadura, devo dizer àqueles que se prendem aos paradigmas da mídia grande.

Apesar da flagrante pilhagem, não se vê resistência. Nem quanto às indecentes remessas de lucro, nem contra a entrega do nosso petróleo, nem contra a ausência de uma auditoria na dívida pública, nem contra a absurda concentração fundiária, nem contra a falta de regulamentação do artigo 153 da Constituição, que determina a cobrança de impostos sobre grandes fortunas, nem contra o salário mínimo de R$ 415,00 e, pior, nem contra o oligopólio dos meios de comunicação social. Pior porque é este oligopólio o maior responsável pela manutenção desse estado de coisas, que de um lado explora o cidadão brasileiro e de outro entrega nossas riquezas para empresas estrangeiras e seus testas-de-ferro.

A mídia, hoje, é a instituição com maior poder de produzir e reproduzir subjetividades. Ou seja, é ela quem vai determinar formas de sentir, agir, pensar e viver de cada pessoa e, por extensão, de toda a sociedade. O dia em que os movimentos sociais organizados se derem conta disso, a primeira ocupação será nos centros de produção e reprodução de textos e imagens encarregados de sustentar o sistema. Uma vez ocupadas as redes de rádio e tevê (cujas principais representantes, a propósito, estão com as concessões vencidas), o povo será informado sobre as razões da falta de médico para o filho que sente dor, da falta de escola para quem precisa estudar, da falta de trabalho para quem quer produzir, da falta de terra para quem quer cultivar e etc. Uma vez que isto aconteça, a justa indignação não mais poderá ser contida.

Marcelo Salles é jornalista e editor do jornal Fazendo Media (www.fazendomedia.com)’

 

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