Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Agência Carta Maior

TV PÚBLICA
Eduardo Carvalho

Entrevista – Jorge da Cunha Lima, 4/05/07

O Fórum de TVs Públicas debaterá, mas ‘sem dinheiro federal, não haverá rede pública’

‘Na segunda-feira 7 de maio, o Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta reúne-se para escolher o novo presidente da diretoria executiva, ratificando o nome do jornalista Paulo Markun para o cargo (Leia mais). O Fórum de TVs Públicas começa na terça-feira, 8 de maio. As emissoras comerciais começam a receber as linhas de crédito do BNDES, vedadas às públicas, para a digitalização de sua produção. A respeito desses e outros assuntos, conversamos com Jorge da Cunha Lima, presidente e membro vitalício do Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta, mantenedora da Rádio e TV Cultura. Leia os melhores trechos da conversa:

Carta Maior – Como está a sucessão da presidência da Fundação Padre Anchieta?

Jorge da Cunha Lima – Agora, que se consolidou a candidatura única do Paulo Markun, só depende de haver quorum na sessão da próxima segunda, dia 07, para ele ser o novo presidente da diretoria executiva da Fundação Padre Anchieta. Ele precisa ter a maioria absoluta dos 46 votos dos membros do conselho curador.

CM – Então são favas contadas?

JCL – Não. Não! No passado já houve situações parecidas e, no dia da eleição, não houve quorum. Mas eu acho que, diante de uma eleição com a importância desta, os membros natos e eletivos não deixarão de comparecer e votar.

CM – Quais os motivos da escolha do Markun? Sabemos de sua ligação com a TV Cultura, mas como surgiu seu nome no processo de escolha. Por que foi candidato único?

JCL – Todas as eleições para presidente na história da Fundação foram a partir de candidaturas de consenso. Como é sabido, o governo manifestou o desejo de sugerir nomes, porque eles têm membros no conselho e são responsáveis por boa parte do aporte financeiro da fundação. Assim houve várias rodadas de apresentação de nomes e sucessivas discussões, até que, deste processo, surgiu o nome do Markun, com um perfil bastante aceitável por todos, o que acabou por revelá-lo como um nome que poderia apontar para um consenso entre os membros eletivos, os natos, os representantes do governo etc. Além disso, a candidatura única foi possível porque o Marcos Mendonça não quis se candidatar à reeleição.

CM – Como o Marcos Mendonça sai deste processo? Ele que recebeu tantas críticas por ter encampado o projeto de transformar a Cultura numa TV comercial? Ele sai desgastado?

JCL – Eu penso que ele sai fortalecido, pois ele deixa a televisão em situação financeira boa, capacidade de produção grande, principalmente de programação infantil e educacional, e sentimos o grande reconhecimento do conselho pelo trabalho que ele executou. As coisas que criticaram nele, e criticaram em mim já, foi a transição para um modelo comercial de televisão com publicidade institucional. Mas, com a diminuição de recursos públicos, caso não se buscasse recursos da sociedade, fecharíamos a Fundação.

CM – Com a entrada do Markun, um jornalista, como fica o cargo de ombudsman da TV Cultura que está vago?

JCL – O Oswaldo Martins saiu em junho de 2006, antes de acabar o mandato. Até hoje, estamos definindo qual é o papel de um ombudsman de televisão. Como um ombudsman poderia ficar 24 horas acordado na frente do aparelho de televisão para dar cabo da análise de toda a programação? O cargo está em aberto e a função em discussão.

CM – Além da questão publicitária, houve críticas a respeito do sucateamento da programação. Podemos citar a referência feita pelo Secretário da Diversidade Cultural, em entrevista à Carta Maior (leia aqui), de que há falta de qualidade, ‘a marca registrada da Cultura’ e de que a diversidade cultural e as culturas populares são tratadas insuficientemente em toda a programação da Cultura.

JCL – É muito difícil aceitar, como é muito difícil rebater, porque esta questão é muito subjetiva. Ninguém pode criticar, por exemplo, o Café Filosófico por tratar de uma temática elevada. Pelo contrário, penso que precisamos parar de colocar baixa cultura para o povo. Então, acho que estas críticas são complicadas porque não correspondem. O que é preciso verificar é se houve má qualidade cultural ou desvio das finalidades educativo-culturais. E isso não houve.

CM – E a questão da TV digital? Como a TV Cultura está se preparando para esta transição. Acabamos de ver que o BNDES liberou recursos para o SBT, como a Fundação está se preparando?

JCL – O Marcos Mendonça conseguiu fazer uma boa aquisição de equipamentos para a produção de programação digital. Agora, o que está em questão é a transmissão digital que evidentemente não se resolverá com o dinheiro destes orçamentos magros que temos. Precisaremos de algum financiamento externo que será feito ou a fundo perdido pelo Governo Federal para todas as emissoras públicas ou, então, com financiamentos de fontes privadas. Este financiamento do BNDES, por enquanto, é destinado apenas às emissoras comerciais. Não se criou um mecanismo ainda de tomada de financiamento pelas TVs públicas que dependeriam do aval dos governos estaduais que, muitas vezes, já estão com os limites de endividamento esgotados, assim, mesmo que o BNDES quisesse dar o dinheiro, os estados não poderiam tomar. Estas questões serão discutidas no Fórum de TVs Públicas, que acontece agora em maio em Brasília.

CM – A respeito do Fórum, tendo em vista a propositura do Franklin Martins pela formação de uma Rede Pública de Televisão – e até onde conseguimos apurar a Fundação Padre Anchieta se alinha a este propósito-, quais são as perspectivas para o debate que se aproxima.

JCL – Olha, este alinhamento aí é o seguinte: nós estamos de acordo que exista uma programação nacional de televisão feita pelas televisões públicas. Uma programação que seja o reflexo do Brasil. Concordamos com isso, mas precisamos discutir em que formato se dará este acordo. O fórum tem que discutir o formato e as condições de adesão de todos os membros de uma rede pública. A principal condição é que haja dinheiro para fazer produto, por que rede não se cria por decreto. Quando houver condições de se produzir conteúdos, a rede surge!

CM – Isso significa que o Governo Federal terá que dar uma grande injeção de verba para a concretização desta proposta?

JCL – Sim, um aporte de verba para que as produções regionais possam ser realizadas pelas Tvs estaduais e pelos produtores independentes regionais.

CM – Então, sem dinheiro não há rede pública de televisão?

JCL – Não há condições de haver rede sem produção de conteúdos e produção depende de verbas. Não dá para se fazer rede só a partir de uma vontade, ou de um decreto.’

GOVERNO LULA
Gilson Caroni Filho

O apagão da imprensa, 5/05/07

‘O tom é de comedimento. A CPI do Apagão Aéreo parece não ter empolgado jornais e revistas semanais. Os meios de comunicação limitam-se a denunciar sua composição como expressão de farsa. Há um visível desencanto com o comportamento da oposição parlamentar. O pragmatismo de setores do PSDB não é compatível com o tipo ideal editado ao longo dos dois últimos anos? Talvez possamos, simplificando tema caro ao pensamento freudiano, falar em um luto midiático. Reação à perda de uma generalização abstrata, a um ente que seria o braço político de devaneios editoriais. Investimento libidinal sem contrapartida. Páginas e tempos perdidos.

Em tom de lamento, o jornalista Fernando Rodrigues registra, em seu blog, o ar nebuloso que marca o início da mais recente CPI instalada na Câmara Federal. Assinala que ‘A oposição ficou de mãos abanando. A base lulista tem 16 das 24 vagas da comissão.Houve uma patética tentativa do PSDB, que quis lançar um candidato para a presidência da CPI. Perdeu. O PFL desejava ir ao Supremo para dar uma embananada no processo, mas os tucanos foram contra. Por enquanto, a CPI está servindo para mostrar e explicitar mais uma vez o apagão da oposição no Congresso’.

A tristeza de Fernando é partilhada pela jornalista Eliane Cantanhêde, em sua coluna, na edição de sexta, 4 de maio, da Folha de S. Paulo. ‘Foi-se o tempo em que as CPIs eram lugar de honra para investigar e produzir efeitos’ O choro prolonga-se por quase todos os articulistas da grande imprensa. Editoriais já não reproduzem o frenesi de outrora, quando tudo era contado com som e fúria, Embora o significado do esforço fosse ocultado com presteza.

O que será que não aprenderam com a história? Vamos tentar, nesse pequeno artigo, lançar luz sobre o passado recente. Iluminar o norte dos considerados ‘formadores de opinião’. Pessoas de hábitos refinados e ética fluida precisam perceber que a realidade também escorre liquefeita.

Já deveríamos saber que, quando o senso comum da mídia se confunde com a opinião de setores supostamente esclarecidos, a lucidez está perdida. Se todo o processo histórico é reduzido à folhetinização de escândalos, ao espetáculo de comissões parlamentares e acareações sem sentido, a trama não guarda qualquer relação com moralização de costumes públicos ou preocupação efetiva com os rumos da política econômica.

As fraturas éticas e o aliancismo equivocado do Partido dos Trabalhadores serviram, nos dois últimos anos do primeiro mandato de Lula, como pretextos para a ofensiva de forças conservadoras a um governo que, apesar da agenda adotada, conseguiu reduzir a miséria de forma expressiva. Em 2004, segundo a FGV, a redução teria atingido 8%. Comparemos esses números com os obtidos pelo neoliberalismo que, por oito anos, balizou corações e mentes de tucanos e demos do ex-PFL. Não há registros dessa comparação em editorias de economia.

O triste foi ver a grita moralista unir reacionários conhecidos a esquerdistas combativos nas páginas de política. O que o método separou, o discurso uniu. O que os últimos ignoraram foi que ação política movida a ressentimentos e balizada pela moral privada não educa politicamente. Constrói atalhos para o retrocesso. A práxis de holofote é a única possível em tempos do que, com rara precisão, Zygmunt Bauman definiu como modernidade líquida? Essa é uma indagação que precisa ser respondida por atores que ocupam inequívoca centralidade no mundo contemporâneo. E não há como respondê-la sem definir a imprensa como lugar epistemológico.

Como destacou, à época, Marilena Chauí, ‘não é digno politicamente não colaborar com um governo que está sob ataque’. No centro da peroração de seus detratores não havia qualquer preocupação com a qualidade institucional.

O móbil da burguesia patrimonialista e seu colosso midiático não era outro senão a velha luta de classes, a preservação de estruturas arcaicas que impedem a promoção da cidadania em uma sociedade fracionada.

Ser portador de uma agenda republicana é compreender a complexidade do momento. Render-se aos clamores de segmentos médios, expressos nas páginas dos jornais, não revela inteireza ética, mas oportunismo político e atração inequívoca pela ética do consumidor. Assim morrem as mariposas. E se reproduzem editores.

Não é nosso objetivo propor que se passe uma borracha em todos os erros cometidos. O transformismo da direção partidária, seu deslocamento das bases e alianças com legendas de direita foram um balde de água fria na militância forjada ao longo de 25 anos de luta. Mas não joguemos a criança fora junto com a água suja da bacia. Nesse período, o Partido dos Trabalhadores e suas bases sociais fizeram o país avançar politicamente como nenhuma outra força de esquerda havia logrado antes.

Seria sensato ignorar tal massa crítica e, por decreto, tal como fizeram tantos articulistas, falar em ciclo encerrado? Os críticos deveriam seguir as simplificações do discurso jornalístico ou buscar outros caminhos? Não seria mais correto tentar recompor a base de centro-esquerda do atual bloco de poder? Ao furor inquisitório não é prudente exercer a crítica dialética? Ainda mais quando sabíamos que, naquele estágio, a crise antecipou o processo sucessório. Um jornal não pode ser lido com o mesmo órgão que produz seus relatos: o fígado. Isso é elementar.

O oligarca e o publisher não estavam preocupados em apurar o ‘valerioduto’ até as últimas conseqüências, muito menos financiamentos ilegais de campanha. Se o fizessem, veriam expostas suas próprias entranhas. O que o incomodava de fato, e acirrava seus ataques, eram números como os que o IBGE divulgou em meados de 2006. Dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) registravam recuperação do rendimento médio da população, em queda desde 1997. Não deu chamada em dobra superior.

O nível de ocupação atingiu 56,3%, o maior desde 1996. O Índice de Gini demonstrava queda na concentração de renda, com metade da população que ganhava os menores rendimentos obtendo ganho real de 3,2%.O melhor resultado nos últimos 24 anos. Adicionemos a isso o Bolsa-Família, programa de renda familiar básica, que atende a oito milhões de famílias. Notemos, ainda, que esse não era, como continua não sendo, um governo de esquerda, até por sua composição de origem. Por injunções várias, além do transformismo, não pôde assumir plenamente as velhas bandeiras. E, no entanto, desesperou, e ainda desespera, as forças conservadoras. Por que será?

A realidade mostrou como a persistência e o acirramento da crise levaram ao vazio político. Ocioso dizer quem pode dele se beneficiar. Basta lembrar quem lucrou com aumento de tiragem e/ou de audiência.

Aos lúcidos sobrou uma saída. Abandonar palavras de ordem vazias e adotar uma postura crítica. Bem distante do socialismo de salão. Bem longe dos distintos colunistas e seu público alvo: os inconformados da classe média que, perplexos e espumantes, vêem o país mudar, incorporando novos atores. Eis o filão ao qual se apegam Fernandos, Elianes, Mervais, Noblats, Doras e Josias. Uma trilha tão desgastada como repetida. Uma total ausência de plano de vôo.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, e colaborador do Jornal do Brasil, Observatório da Imprensa e La Insignia.’

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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