Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Antonio Brasil

‘Apesar de ser o alvo favorito e constante do noticiário internacional, o polêmico presidente americano George Bush ainda consegue nos surpreender. Nesta última terça-feira, o tablóide britânico Daily Mirror divulgou matéria exclusiva sobre o planos secretos de Bush para bombardear a sede da rede de TV Al Jazira. Logo em seguida, as manchetes dos principais jornais e agências de notícias deram destaque às denúncias:

Daily Mirror: Bush planejava bombardear sede da Al Jazira;

Bush admitiu atacar televisão Al Jazira;

Bush planejou atacar com mísseis a rede de TV Al Jazira.

Mas por incrível que pareça, segundo o mesmo Daily Mirror, temos que agradecer ao ‘bom senso’ do primeiro-ministro britânico Tony Blair pela mudança de planos de Bush: ‘Blair teria dito que praticar um ato destes provocaria uma revolta mundial’. Sábio Tony Blair! Ele provavelmente salvou a vida de inúmeros inocentes, inclusive de diversos jornalistas.

Bush falou sério!

O memorando secreto vazou em maio deste ano para o ex-deputado trabalhista Tony Clarke, segundo o jornal. Em um editorial, o jornal britânico comenta que, como George W. Bush é ‘o homem mais poderoso do mundo, também poderia chegar a ser o mais perigoso’.

O porta-voz das Relações Exteriores dos liberais-democratas, Sir Menzies Campbell, declarou que no caso das acusações serem verídicas ‘demonstra o desespero da administração Bush quando a situação no Iraque está saindo do controle’.

Mas a reação dos governos americano e britânico à matéria-bomba do Daily Mirror também foi imediata e previsível.

Em um primeiro momento, ainda na terça-feira, o gabinete do governo britânico recusou-se a comentar as afirmações. Em seguida, fez questão de diminuir a importância do ‘vazamento’. De acordo com fontes do governo britânico, ‘a ameaça de Bush não tinha fundamento sério e teria sido feita em tom irônico’. Mas outros informes destacam que ‘Bush falou muito sério’.

Calar a imprensa

Mas nesta quarta-feira, a situação mudou radicalmente. Segundo matéria divulgada pelo Globo Online e as agências internacionais, ‘os editores dos principais jornais londrinos foram ameaçados de processo pelo procurador-geral Peter Goldsmith se publicarem mais detalhes sobre as conversas de George W. Bush com Tony Blair sobre as ameaças à emissora de TV Al Jazira’. Para demonstrar a seriedade das ‘denúncias’, essa é a primeira vez que o governo britânico utiliza as leis anti-terroristas para impedir a publicação de notícias.

Por outro lado, os responsáveis pela rede árabe dizem que irão verificar a informação: ‘Se for verdadeira, será chocante e preocupante’. Eles, obviamente, têm razões para estarem preocupados. Há muitos anos os jornalistas da rede árabe denunciam uma relação difícil com o governo Bush e com os militares americanos. Eles foram alvos de diversos ataques ‘acidentais’ contra os seus escritórios em Kabul, no Afeganistão e em Bagdah, no Iraque.

O documentário Control Room da diretora egípcio-americana Jehane Noujaim citado nesta coluna (‘Por uma Al Jazira brasileira’), descreve a morte de um dos seus correspondentes em ataque ‘polêmico’, porém preciso dos militares americanos durante a tomada de Bagdá. O filme também mostra detalhes de sua cobertura considerada ‘diferenciada’ e o evidente ‘desconforto’ das autoridades americanas com o seu sucesso no mundo árabe. As autoridades americanas costumam citar a proximidade dos jornalistas da Al Jazira com ‘terroristas’ e a divulgação indiscriminada de imagens consideradas chocantes. É importante frisar que os jornalistas da rede Al Jazira estão banidos do Iraque.

Apesar das deníncias, o exército dos Estados Unidos afirma que os ataques contra a Al Jazira foram todos acidentais e que seus jornalistas estão banidos do Iraque em decisão específica do governo local. Mas mesmo assim as autoridades americanas costumam sempre acusar a Al Jazira de ter uma certa tendência antiamericana.

Guerra das mídias

O primeiro-ministro britânico Tony Blair pode ter salvado a Al Jazira de um grande desastre, mas os britânicos também resolveram enfrentar o crescente sucesso internacional da rede de TV árabe. Há algumas semanas o noticiário internacional destacava que a BBC, apesar de enfrentar uma de suas maiores crises, com a demissão de milhares de jornalistas, resolveu criar um canal de TV com notícias em árabe. As transmissões devem começar em 2007, inicialmente por 12 horas diárias. No futuro, o canal deve passar a ser transmitido 24 horas por dia. Para arcar com os custos, o Serviço Mundial da BBC também decidiu fechar dez serviços em línguas estrangeiras – a maioria deles do Leste Europeu.

Afinal, a guerra fria já terminou. Mas a guerra das mídias pelos corações e mentes dos árabes só está começando. Há alguns meses, os americanos também tentaram enfrentar a Al Jazira ao criar uma rede de TV alternativa, Al Hurra. Apesar dos grandes investimentos, o projeto é um enorme fracasso. Conquistar a credibilidade da audiência leva muito tempo. E confundir noticiário de TV com propaganda é um erro primário. As redes estatais brasileiras de notícias com programas como a Voz do Brasil que o digam!

Al Jazira na América Latina

O problema, no entanto, é que, apesar dos ataques internacionais, o modelo de gestão da rede de TV Al Jazira se expande pelo mundo. Em matéria recente para o Valor Econômico, intitulada ‘Al-Jazira fala inglês para concorrer com CNN e BBC’, os responsáveis pela rede declaram que seus objetivos são ambiciosos. Eles pretendem atingir 40 milhões de residências em todo o mundo e oferecer uma ‘agenda diferente’ ao público ocidental, cobrindo não apenas países do Oriente Médio e seu relacionamento com os Estados Unidos, mas também as regiões em desenvolvimento, como a América Latina.

A intenção da Al Jazira é cobrir a região com um ponto de vista alternativo – diferente do das grandes potências ocidentais (EUA e europeus) – em assuntos polêmicos como a campanha dos EUA contra o presidente Hugo Chávez, da Venezuela.

Perceberam? Não é a toa que Bush e a BBC – com estratégias e armas diferentes – resolveram enfrentar o poder da Al Jazira.’



PLAMEGATE
Ana Beatriz

‘Jornalismo: Crise E Ironia’, copyright Direto da Redação (www.diretodaredacao.com), 20/11/05

‘O jornal The Washington Post anunciou hoje que seu famoso repórter e agora editor Bob Woodward, que foi também uma das principais figuras no caso Watergate, escondeu deles a descoberta de um segredo de estado por dois anos.

Tudo indica que, 25 anos depois de Watergate, Woodward também teve prioridade de informação num dos casos mais quentes do momento: a revelação da identidade de Valerie Plame, uma agente secreta da CIA, por um alto oficial do governo. Mas dessa vez, Woodward não escreveu artigo nem discutiu o caso com o editor chefe do jornal, Leonard Downie Jr.

No próprio artigo do Post, Downie diz que Woodward cometeu um erro, enquanto outros jornalistas acusam Woodward de ter conchavo com o governo. Recentemente, Judith Miller, a jornalista do The New York Times que passou meses na cadeia por recusar-se a revelar sua fonte no caso Valerie Plame, deixou o jornal ao ser criticada por também não revelar a seus editores o que havia descoberto.

O Times publicou um artigo imediatamente depois do Post, também sobre o assunto Woodward, mas sem entrar muito na situação da própria repórter.

O fato de ambos, Woodward e Miller, terem a informação sobre o caso foi descoberto durante a investigação do promotor Patrick J. Fitzgerald. Woodward pediu desculpas ao Post por ter dito o que sabia a Downie apenas algumas semanas antes de depor na justiça, alegando ter medo de ser acusado junto com outros no escândalo.

Woodward deu depoimento à justiça mas não recebeu autorização da fonte para discutí-la em público. A fonte teria lhe apontado o nome da Valerie Plame numa conversa algum tempo antes de oficiais do gabinete como Lewis Libby e Karl Rove terem falado com Miller, Robert Novak e Matthew Cooper, os jornalistas inicialmente envolvidos no caso e chamados para prestar depoimento.

Woodward e Miller nunca escreveram nada sobre Plame, que também é mulher do diplomata Joseph Wilson. A identidade da agente foi revelada na mídia por Novak, depois de Wilson ter escrito um artigo no Times criticando a administração Bush por ter acusado erroneamente o Iraque de tentar comprar urânio da África. Wilson fora enviado numa missão especial pela CIA para investigar o urânio na África, e o que foi encontrado não servia para fabricação de armas nucleares.

Com tudo isso, o caso Valerie Plame tomou várias dimensões. Além de ser crime revelar a identidade de uma agente secreta, pergunta-se o porquê de oficiais do governo terem feito isso, que muitos afirmam ter sido uma retaliação a Wilson. Com o envolvimento dos repórteres no escândalo, entra em cena também o relacionamento entre a mídia e o governo. Não discutir o caso com editores foi por medo da justiça, conchavo com o governo ou o simples desejo de preservar fontes? E as fontes, será que ficarão daqui em diante mais relutantes em revelar segredos a jornalistas, com medo de serem descobertas pela justiça mesmo que os jornalistas tentem omitir seus nomes?

Enquanto isso, a história se repete com Bob Woodward e sua habilidade em atrair grandes informações. Só que agora, ironicamente, ele é personagem ativo dentro do escândalo que poderia ter revelado.’



Antonio Tozzi

‘A Queda De Uma Estrela Do Jornalismo’, copyright Direto da Redação (www.diretodaredacao.com), 21/11/05

‘Bob Woodward e Carl Bernstein são ídolos da maioria dos jornalistas do mundo inteiro, sobretudo os que começaram a atuar na profissão após terem desvendado o famoso caso Watergate, que provocou a renúncia do então presidente Richard Nixon, quando repórteres do Washington Post, na década de 70.

Três décadas depois, Bob Woodward continua a trabalhar no Washington Post, onde é editor assistente, mas o grosso de seu faturamento advém dos seus livros, uma vez que ele é hoje uma grife do jornalismo mundial. Entretanto, o episódio Valerie Plame pode manchar sua reputação como jornalista investigativo e escritor.

Talvez a mistura das duas atividades é que tenha provocado uma escorregada que certamente compromete sua biografia. Na semana passada, a estrela do jornalismo americano revelou que, em 2003, uma fonte ligada ao governo Bush lhe havia revelado a identidade de Valerie Plame como agente secreta da CIA. Para quem não sabe, ela trabalhava para a agência americana de espionagem e, ao mesmo tempo, é casada com o diplomata Joseph Wilson.

Revoltados com a divulgação do relatório de Wilson, que desmentia a existência de armas de destruição em massa no Iraque (esvaziando o principal argumento favorável à invasão do país e à deposição de Saddam Hussein), auxiliares da Casa Branca ligaram para alguns jornalistas bem conectados para vazar a informação que visava claramente prejudicar o desafeto.

Ao confessar a seu editor Leonard Downie ter segurado a informação – Downie qualificou sua atitude como ‘um erro’ -, Woodward cometeu mais do que um erro. Ele foi, no mínimo, conivente com a atual administração e vinha tentando evitar envolver-se no escândalo que já vitimou I. ‘Scooter’ Lewis Libby Jr, chefe de pessoal do vice-presidente Dick Chenney, e está ameaçando Karl Rove, chefe de pessoal de George W. Bush. Além deles, Judith Miller, repórter do New York Times, também foi punida por não revelar sua fonte à justiça americana e ficou cerca de três meses presa.

Woodward foi até mesmo a um programa de TV para criticar o promotor público Patrick Fitzgerald, que está exigindo dos repórteres que revelem a fonte (ou fontes) que divulgou a identidade secreta de Valerie Plame. Na ocasião, porém, nem os telespectadores nem os leitores sabiam que ele também conhecia os detalhes do caso, mas não os divulgou. Os outros jornalistas que receberam a dica foram Tim Russert, do NBC News, Matt Cooper, da revista Time, Judith Miller, do New York Times, e Robert D. Novak, veterano jornalista que edita uma coluna publicada em vários jornais do país – e que foi o primeiro a revelar a identidade de Valerie Plame em julho de 2003.

Agora, Woodward está sendo convocado a depor por Fitzgerald, coisa que ele não queria, e terá, como os outros, de revelar sua fonte. Evidentemente, que a decisão do promotor é contestável porque se isto se tornar rotina nenhum jornalista receberá informações confidenciais, até porque seus autores terão de ser conhecidos e ninguém quer ser demitido ou perseguido por ser informante.

O duro é desconfiar que o famoso jornalista pode ter retido a informação para usá-la como material para um de seus próximos livros. Woodward precisa decidir, de uma vez por todas, se quer continuar sendo jornalista ou prefere dedicar-se à carreira literária e às palestras para as quais vem sendo convidado. E este episódio canhestro pode prejudicá-lo e conspurcar sua imagem, com a qual conquistou prestígio e dinheiro.’



O Estado de S. Paulo

‘Uma jornalista da ‘Time’ também vai testemunhar no caso Plane’, copyright O Estado de S. Paulo, 28/11/05

‘Uma segunda jornalista da revista Time, Viveca Novak, aceitou prestar depoimento no chamado caso Plame, que investiga o vazamento para a imprensa da identidade da agente da CIA Valerie Plame – um crime federal. A repórter terá de testemunhar sob juramento a respeito das conversas que teve, em maio de 2005, com Robert Luskin, o advogado de Carl Rove, o principal assessor do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush.

Viveca Novak colaborou na redação de artigos relacionados com o caso. Pelo mesmo motivo, o colega dela, Mattew Cooper, foi chamado a prestar declarações em julho. Na ocasião, ele negou-se a revelar sua fonte de informações à Justiça Federal, sendo acusado de desacato e ameaçado de prisão.

Dias depois, Cooper aceitou cumprir a determinação judicial que o obrigava a testemunhar, declarando aos juízez que recebera um telefonema de última hora de suas fontes liberando-o do compromisso de confiabilidade. O advogado de Carl Rove, o principal conselheiro de Bush, Robert Luskin, confirmou posteriormente que a fonte de Cooper era Rove ( além de assessor esperial do presidente, ele pe considerado nos meios políticos americanos o arquiteto da vitória eleitoral de Bush).

A primeira vítima política desse escândalo foi Lewis Scooter Libby, chefe de gabinete do vice-presidente americano, Dick Cheney. Ele foi acusado de obstrução da Justiça, perjúrio (mentir perante juri) e falso testemunho. Libby alegou inocência e prepara sua defesa, mas teve de renunciar ao cargo.

O escândalo estourou em julho de 2003 – data em que o nome de Plame apareceu nos jornais como agente da CIA.

O vazamento da identidade dela teria sido uma vingança da Casa Branca a artigos publicados na mídia pelo marido da agente, o diplomata Joseph Wilson, criticando o governo por ter-se valido de fatos inverídicos para justificar a invasão do Iraque. Wilson havia sido enviado ao Níger para verificar informações de que Saddam Hussein adquirara minério de urânio no país africano para utilizar em seu programa nuclear. O diplomata constatou que as informações eram inverídicas. Mesmo assim, elas foram usada pelo presidente Bush para obter a aprovação da guerra pelo Congresso .

O caso Plame também arrastou o famoso jornalista Bob Woodward, do escândalo Watergate. Woodward ficou mal ao revelar que sabia sobre o vazamento desde 2003, mas não contou a seus superiores do Washington Post.’