Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Brasil estréia e mídia
não contém o “oba-oba”


Leia abaixo os textos de terça-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Terça-feira, 13 de junho de 2006


COPA 2006
Cristina Padiglione


Difícil é frear o show


‘Hino de oba-oba nunca conspirou a favor do bom senso, mas alguém deve apreciar essa enxurrada de crônicas e clipes que a Globo gosta de aplicar na massa para aquecer a audiência – ou então, essa prática já estaria suspensa há algumas Copas. O clipe sacado ontem da ilha de edição do plim-plim rumo à estréia de hoje do Brasil foi obra bem infeliz. Diz o refrão entoado pelos Titãs que ‘o acaso vai me proteger / enquanto eu andar distraído’. Acaso? Distraído? Na outra ponta da pátria de chuteiras há uma indústria técnica que dispõe dos maiores esforços para frear acasos e distrações.


A mensagem é: não se atenha à letra, qualquer hit popular vale para comover a torcida. Salvo momentos dispensáveis como este, visto logo após o fim de Itália x Gana, a cobertura da TV na Alemanha tem se equilibrado entre bater no peito verde-amarelo e conter, ainda que timidamente, ecos de já-ganhou. Anteontem, ao constatar que um repórter da casa ensaiava uma coreografia com a torcida, o locutor Cléber Machado freou: ‘Não, dança, não’.


Até domingo – os índices de ontem só seriam divulgados hoje – o jogo entre Portugal e Angola fez a maior audiência na Globo: 35 pontos de média na Grande São Paulo (cada ponto vale 54, 4 mil domicílios). É um resultado digno de clássico de Brasileirão aos domingos.


A questão orçamentária também desenha as diferenças. A mesa de Galvão Bueno na Alemanha da Globo levou ao ar uma enquete via 0800 para saber o que mais ameaça o Brasil no Mundial. E a mesa de Milton Neves na Barra Funda da Record deu voz a um ilusionista adivinhador. O sujeito jura ter trancafiado numa urna de vidro (blindado, com direito a merchandising da empresa) um envelope lacrado com o nome do vencedor da Copa. O mimo só será aberto quando o resultado se consumar. Cada um joga com a bola que tem.’


Mario Sergio Conti


Croácia: jóia adriática


‘A Croácia é um Portugal que fala uma língua só de consoantes e tem um litoral deslumbrante. A imagem que se tem dela no Brasil, de um pobre país perdido na Europa, metido numa tremenda encrenca étnica, não corresponde à realidade. A população é homogênea (90% dos 5 milhões de habitantes são croatas), tem um nível de vida razoável (US$ 12 mil de PIB per capita, contra menos de US$ 3 mil no Brasil) e a grande maioria do povo integra a classe média.


A Croácia está na moda. No verão, o país se enche de europeus de todos os cantos. No ano passado, mais de 8 milhões de turistas visitaram o país. O que os atrai é o formidável colar de mais de mil ilhas nos seiscentos quilômetros da costa adriática, a Dalmácia. E, também, os preços: em hotéis e refeições, se gasta na Croácia metade do que se despende em férias de verão em Ibiza, na Espanha, ou na Côte d’Azur, na França.


A vocação turística da Croácia não arrefeceu nem durante a ditadura do marechal Tito, a partir do fim da 2ª Guerra Mundial. O regime incentivava a população litorânea a receber turistas, sobretudo da Itália, em suas casas. Com o fim do comunismo, e da Iugoslávia, muitos dos croatas que abrigavam turistas transformaram suas casas em pousadas. Com isso, o que hoje floresce é um turismo formidavelmente pulverizado, sem grandes hotéis e resorts.


Estive na Croácia há três anos. Lembro do cheiro de lavanda e pinheiros. Do mar calmo e azul translúcido. De mulheres idosas, vestidas de preto, caminhando em vielas, ladeadas por casas de pedra. Das ruas de mármore branco de Dubrovnik. Do labiríntico Palácio de Diocleciano, em Split. Do amargo vinho local, dos sorvetes artesanais e da companhia de barcos, a Jadrolina, cujas balsas ligam as ilhas. De uma bandinha de música tocando marchas iugoslavas numa praça de Vis. Do racionamento de água das 11 da noite às 7 da manhã. De peixes grelhados, cobertos de azeite. De gatos, muitos gatos, extraordinariamente preguiçosos, mesmo para os padrões felinos. De moças nórdicas com os seios à mostra. De ônibus inter-regionais sem ar-condicionado. Aliás, não lembro de ter visto nenhum ar-condicionado, apesar do calor piauiense – amenizado por uma brisa suave e contínua. De sorvetes artesanais deliciosos. De um doce fantástico, vendido no começo da noite, chamado Calça Rasgada – ou pantalona brrrááá, como explicou o vendedor, ao me apontar para a minha calça e fazer o gesto de rasgar. De um hotel com jeitão de colônia de férias stalinista, onde, depois do jantar, cinco rapazes tocavam sucessos de Ray Conniff.


Os croatas são amáveis e acolhedores. Quando descobrem que o interlocutor é brasileiro, falam de Pelé e Ronaldo. Também conhecem Paulo Coelho. Quando se pergunta da guerra, vem à tona um ódio formidável dos sérvios, que jogaram mais de duas mil bombas sobre Dubrovnik, destruindo 800 casas da Idade Média e renascentistas. O papo com os croatas flui fácil. Em italiano. Mas não em inglês, que os nativos, equivocadamente, imaginam falar bem.


Outra característica dos croatas é a imobilidade. Ao comprar as passagens, numa agência croata em Paris, o funcionário informou que ninguém, num mesmo dia, ia de uma praia à outra. Por dois motivos: as praias são exíguas, e os croatas preferem ficar em rochedos à beira do mar. Há um motivo adicional: os croatas só se movem de manhã cedo, ou depois que o sol se põe, para evitar o calor.


O grande herói nacional é Marco Polo. Em Korcula (pronuncia-se Korshúla), é possível visitar o museu, a casa e até, supostamente, a pizzaria que o viajante freqüentava. É estranho, já que os italianos, e o mundo inteiro, acreditam que Marco Polo era veneziano, e não croata.


Enfim, vale a pena visitar a Croácia. Só uma advertência é necessária: cuidado com os barbeiros croatas. Ou, ao menos, cuidado com o barbeiro que fica ao lado do único cibercafé de Dubrovnik. Ele o deixará com um topete dez centímetros mais alto que o de Elvis Presley.’


TV DIGITAL
Gerusa Marques


Lei da TV Digital está pronta


‘O presidente Lula recebeu ontem do comitê de ministros que estuda a implantação da TV digital no Brasil a minuta de decreto com as regras de transição do sistema analógico para o digital.


O decreto, segundo uma fonte próxima às discussões no Palácio do Planalto, terá 11 artigos, com regras mínimas para as emissoras de TV, indústria de equipamentos e demais setores envolvidos, além da definição do padrão japonês de TV digital como aquele que será adotado no País.


O detalhamento dessas regras será feito posteriormente por legislação que ainda deverá passar pelo Congresso. O vice-presidente de Novos Negócios da Samsung, Benjamin Sicsú, cobrou ontem uma definição mais rápida das regras específicas para a indústria. ‘Quanto mais cedo forem anunciados os critérios técnicos, mais se acelera a produção’, afirmou. O executivo, que também integra a diretoria da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), acredita que depois do anúncio, previsto para o fim do mês, o governo fará algumas rodadas de negociações com a indústria, para discutir as regras específicas para o setor.


Apesar de o texto do decreto vir sendo trabalhado há cerca de um mês, ontem foi a primeira vez que o presidente Lula tomou conhecimento de seu conteúdo integral. O texto final ainda será fechado até o dia 29, quando chegam ao Brasil os ministros japoneses da Economia, Negócios e Indústria, Toshihiro Nikai, e do Interior e Comunicação, Heizo Takenaka, para assinar um acordo de implantação da TV digital com o governo brasileiro. Fazem parte do comitê os ministérios da Casa Civil, das Comunicações, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, da Fazenda e da Ciência e Tecnologia.


O vice-presidente da Samsung avalia que se o governo anunciar também no fim do mês as decisões sobre a utilização dos avanços tecnológicos desenvolvidos no Brasil, a indústria estará pronta para, em um ano, colocar os televisores digitais no mercado. ‘A indústria quer vender. Mas para vender, tem de produzir, e para produzir tem de saber quais serão as condições de produção’, comentou.


Entre as inovações brasileiras que deverão ser incorporadas ao novo sistema tecnológico, estariam o MPEG 4, usado para comprimir os sinais de vídeo, e os recursos da interatividade, que permitirão usar o televisor ou a caixinha conversora de sinais digitais em analógicos (‘set top box’) como uma espécie de computador com acesso limitado à internet.


‘A interatividade será a grande diferença de negócios para o Brasil’, disse o executivo, lembrando que em outros países esse recurso não foi explorado porque o acesso a computadores é bem maior.’


Renato Cruz


Brasil estréia na Copa com TV aberta analógica


‘A seleção estréia hoje na Copa, mas os brasileiros ainda não podem assistir aos jogos com sinal digital pela TV aberta. Desde o começo do governo, quando o ministro das Comunicações era Miro Teixeira, se fala que o presidente Lula gostaria de assistir ao campeonato mundial em digital. O presidente planeja assistir hoje à partida contra a Croácia com a família, no Palácio da Alvorada. No entanto, ainda não existe transmissão comercial de TV aberta em digital.


A Sky e DirecTV, por satélite, sempre foram digitais. A Net e a TVA digitalizaram o sinal nos maiores mercados. A alta definição – em que a imagem é formada por 1.080 linhas, no lugar das atuais 480 – foi lançada pela TVA, com a BandSports. Além da imagem melhor, o áudio é transmitido em 5.1 Dolby Digital (6 canais) e o formato é ‘widescreen’, com proporção de 16:9, no lugar dos 4:3 da TV comum. Para assistir à alta definição, é preciso uma televisão com 1.080 linhas de resolução e um decodificador especial.


A Rede Globo faz uma demonstração da alta definição com jogos da Copa em televisores colocados em shopping centers e outros lugares públicos. A transmissão, entretanto, é via satélite, e somente os decodificadores usados pela empresa conseguem converter o sinal. ‘Não tem nada a ver com a TV aberta’, explicou, no anúncio da demonstração, a diretora de Tecnologia de Transmissão da Globo, Liliana Nakonechnyj.


No fim do mês, o governo deve assinar com o Japão um acordo de TV digital. O padrão japonês ISDB é o preferido das emissoras de televisão. Em abril, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, assinou em Tóquio um memorando para a adoção de um padrão de TV digital baseado no japonês. O documento falava em tecnologia ‘nipo-brasileira’.’


MEMÓRIA / JOSÉ LEITE LOPES
Rodrigo Morais


Morre aos 87 anos, no Rio, o físico Leite Lopes


‘Teórico de projeção internacional, o físico pernambucano José Leite Lopes morreu ontem, aos 87 anos, de falência múltipla dos órgãos, no Hospital Samaritano, em Botafogo, zona sul, onde estava internado desde dezembro. Seu corpo foi velado no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), instituição da qual foi um dos fundadores. Ele será sepultado hoje, às 10 horas, no Caju.


Nascido em 1918, Leite Lopes se tornou PhD em 1946 pela Universidade de Princeton (EUA), estudando com um dos mais importantes nomes da Física, o Prêmio Nobel Linus Pauli. Três anos depois, fundou o CBPF junto com o destacado físico brasileiro César Lattes, entre outros. Nos anos 50, participou da formação da Comissão Nacional de Energia Nuclear e, depois, sugeriu a criação do Ministério da Ciência e Tecnologia.


‘Ele foi fundamental na criação da cultura científica do País’, disse o atual diretor do CBPF, Ricardo Galvão. ‘Como físico, deu contribuições teóricas seminais. Era de esquerda e exerceu forte influência política. Era também um humanista.’


Cassado pela ditadura em 1969, quando era professor de Física Teórica da Faculdade Nacional de Filosofia, Leite Lopes deixou o Brasil. Após nova passagem pelos EUA, se fixou em Estrasburgo, na França, onde viveu até 1986.


Leite Lopes foi autor de obras importantes, como Fondements de la physique atomique (1967), Lectures on symmetries (1969) e Gauge field theories (1981). Entre suas paixões, estavam o time do Botafogo e as mulheres. No livro Idéias e Paixões, escreveu: ‘Depois da mulher é que vêm as outras belezas: a beleza da ciência, das artes, da pintura, da música, (…) a mulher supera tudo isso’.


COLABORARAM FELIPE WERNECK E KARINE RODRIGUES’


TELEVISÃO
Keila Jimenez


Justiça proíbe paródias do dono do SBT


‘Agora é para valer. Tom Cavalcante não pode veicular nenhum tipo de imagem ou som ligado aos programas de Silvio Santos. Por determinação da 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, o humorista deve parar de vez com as paródias do dono do SBT, principalmente dos programas Qual É a Música? e Gente Que Brilha.


Caso Tom se recuse, a Record será obrigada a pagar uma multa de R$ 10 mil por exibição.


O SBT alega pagar pelos direitos autorais do Qual É a Música? e que uma paródia da atração seria uma forma de tirar proveito do formato.


A briga jurídica envolvendo Tom (Record) e Silvio Santos começou em maio do ano passado, quando SS entrou com um processo contra a emissora e o humorista conseguindo uma liminar para tirar a paródia do Qual É Música? do ar. Na época, o quadro era um dos maiores sucessos do Show do Tom.


Há 20 dias, o SBT mandou notificação oficial para a Record solicitando que a concorrente parasse de imitar os programas da emissora.


Procurados pelo Estado, nem Tom Cavalcante nem Record deram retorno até o fechamento desta edição.’


Cristina Padiglione


Game TV X MTV


‘Diretor-presidente da Game TV, Leonardo Badra Eid pede uma tréplica sobre a comparação entre a audiência alcançada pela programação da produtora na TV Mix e o ibope da MTV Brasil. É que o presidente da MTV Brasil, André Mantovani, ao replicar a tese de que a Mix bateu a MTV de agosto a abril passados, defende que o que pesa, para ele, é o segmento jovem. E no target classe A/B até 29 anos foi a MTV Brasil que bateu a Game TV no período.


Badra, que agora fornece produção para a Rede 21 sob o nome de Play TV, rebate que os números absolutos são o que realmente lhe interessam. ‘Ele (Mantovani) só tem de se acostumar com a concorrência’, fala Badra ao Estado. ‘Estamos numa rede de TV aberta e trabalhamos para todos os níveis sociais’, completa o titular da Game TV.


Mantovani também lembrou que a MTV Brasil tem alcance nacional quatro vezes maior que a outra. ‘Agora, pela Rede 21, estamos cobrindo 30% do País’, replica Badra.


A troca de artilharia entre a empresa do Grupo Abril e a produtora que tem Fábio Lula, filho do presidente, como sócio, é abastecida ainda pela figura de André Waisman, ex-chefão da MTV, hoje a serviço da Game TV.’


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Folha de S. Paulo


Terça-feira, 13 de junho de 2006


MEMÓRIA / JOSÉ LEITE LOPES
Flávio Ferreira Cavalcanti


Morre José Leite Lopes, físico e pioneiro da ciência


‘O físico pernambucano José Leite Lopes, um dos maiores nomes da ciência nacional, morreu ontem no Rio de Janeiro aos 87 anos. Ele estava em coma desde 22 de dezembro, quando foi levado ao hospital Samaritano após sentir-se mal.


Leite Lopes era separado e tinha três filhos. O hospital registrou sua morte às 8h15 por falência múltipla dos órgãos, e o corpo do físico seguiu à tarde para velório no CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas), instituição que ajudou a fundar. O enterro é às 10h de hoje no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju.


Leite Lopes ganhou prestígio tanto por seus trabalhos acadêmicos quanto pela sua atuação na área de política científica. Participou de articulações para criar o CBPF e outras instituições importantes, como a CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear), o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), e a Finep (Financiadora de Estudos e Pesquisas).


Durante o regime militar, entrou em atrito com o governo e se exilou na França. ‘Além de cientista, Leite Lopes era também um humanista excepcional’, afirmam Ricardo Galvão, diretor do CBPF, e Amós Troper, seu antecessor, em comunicado público.


‘Ele foi importante também no estímulo e na formação de cientistas; no livro ‘Ciência e Libertação’, ele mostra a importância do país desenvolver ciência para ser soberano’, diz o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende.


Como pesquisador, Leite Lopes se destacou na área de física de partículas e trabalhou no problema da integração de forças fundamentais da natureza. ‘Por muito pouco ele não chegou à teoria unificada das interações eletromagnéticas e fracas, que deu o prêmio Nobel a Steven Weinberg’, diz Gastão Krein, diretor do Instituto de Física Teórica da Unesp.


Seu principal trabalho na área foi a previsão teórica de um novo tipo de partícula fundamental, o bóson vetorial. ‘Durante muito tempo ele ficou meio aborrecido com o fato de a sua previsão não ter sido levada em conta pelos trabalhos que guiaram Weinberg’, conta o cosmólogo Mário Novello, que foi orientando de mestrado de Leite Lopes. ‘Ele estava discutindo os mesmos problemas, mas por alguma razão de natureza política e social não teve nenhum reconhecimento internacional por essa atividade naquela época.’’


Francisco Caruso


Um homem apaixonado, sobretudo


‘O Brasil se tornou intelectualmente mais pobre na manhã de ontem, com a perda inestimável de um de seus maiores cientistas, o físico recifense José Leite Lopes.


Em sua vasta obra científica, Leite Lopes teve muitos interesses, dos quais destacam-se o estudo do elétron e suas interações -tema que lhe foi oferecido por Mario Schenberg no início de sua carreira e a tentativa de unificar as interações fracas responsáveis pela radioatividade e as eletromagnéticas.


Em 1958, publicou na prestigiosa revista ‘Nuclear Physics’ a primeira avaliação correta da massa dos bósons vetoriais. Nesse artigo, apresenta a hipótese de que existiria uma partícula neutra 40 a 60 vezes mais pesada do que o próton a mediar as interações fracas, assim como o fóton é o mediador das interações eletromagnéticas. Essa conjectura, orientada, segundo seu próprio testemunho, pela busca da beleza nas leis da natureza, estava muito além de seu tempo e foi um passo muito importante para a unificação das forças eletrofracas, lembrado na palestra dada pelo físico norte- americano Steven Weinberg por ocasião de seu Prêmio Nobel, em 1979.


Leite doutorou-se em Princeton com Wolfgang Pauli e, cerca de uma década depois, trabalhou com Richard Feynman, ambos Prêmios Nobel de Física. O reconhecimento acadêmico de sua obra é evidente pelos títulos honoríficos concedidos por instituições do governo francês, que lhe concedeu a Ordem Nacional do Mérito em 1989, e a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), que lhe deu o Prêmio Unesco de Ciências em 1999.


Entretanto, a verdadeira dimensão da perda não está aqui. Lembrei-me, então, das palavras de Icilio Guareschi a propósito do grande Amedeo Avogadro: ‘Os grandes méritos de um homem não devem tanto ser medidos pelo valor intrínseco de sua obra, quanto pela influência que tiveram sobre seus contemporâneos e, sobretudo, sobre o futuro da ciência’.


Se devesse defini-lo com apenas um adjetivo, escolheria apaixonado. Sua paixão era transcendente; ultrapassava em muito as fronteiras da ciência, espalhando-se pela educação, pela cultura, pela arte e, por que não dizer, pelas mulheres e pela vida. Foi essa paixão que sempre nutriu seu intelecto vivaz e contagiante. Foi ela o motor da dedicação integral de toda sua vida à criação de um ambiente propício ao desenvolvimento científico no Brasil, à criação de um país mais justo, muitas vezes opondo-se ao poder de forma contundente.


Nesse sentido, Leite tinha um espírito bruniano. Assim como o pensador italiano Giordano Bruno, não media palavras para combater as autoridades constituídas, as arbitrariedades, a manutenção do status quo, tampouco as poupava para defender a verdade, o pensamento científico, a mudança.


Seu humanismo refletiu-se em tudo que fez: na sua permanente preocupação com o papel ético e social do cientista, na formação dos jovens, na sua pintura ou falando de amor.


Leite foi um daqueles jovens que tiveram a sorte de encontrar um ótimo professor durante sua formação básica. Seu grande mestre Luiz Freire, por quem tinha grande admiração e respeito, talvez sem saber, marcou aquele rapaz com seu espírito de educador, de tal modo que o tempo não foi capaz de apagar essa influência.


Durante toda sua carreira universitária, iniciada aos 27 anos com sua nomeação como Professor de Física Teórica e Superior da Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro, Leite sempre esteve preocupado com a qualidade da formação dos alunos. Para ele, ensino e pesquisa eram realmente indissociáveis. Por exemplo, em 1960, organizou a 2ª Escola Latino-Americana de Física no Rio e sugeriu ao Ministério das Relações Exteriores e à Unesco a criação de um Centro Latino-Americano de Física, que acabou se concretizando. Entre 1962 e 1964, foi organizador e coordenador do Instituto de Física da Universidade de Brasília, aceitando o desafio de implantar uma nova universidade, diferente de tudo o que havia sido tentado no Brasil, mas tristemente interrompida pelo golpe militar.


Preocupou-se sempre com a educação e com o papel social do cientista, como atestam suas publicações. Deixou 22 livros, entre muitos livros-texto e livros com suas reflexões sobre Ciência, além de uma centena de artigos sobre educação e política científica.


Outra preocupação constante de Leite, que influenciou muitos colegas e futuros cientistas, foi a de colocar o país na vanguarda da pesquisa científica. Neste sentido, em 1949, juntamente com César Lattes e outros, e com o apoio do Ministro João Alberto Lins de Barros, de Nelson e de Henry British Lins de Barros, fundou o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas.


Tendo sido aposentado compulsoriamente da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1969, por decreto governamental baseado no AI-5, foi professor visitante na Universidade de Pittsburgh (EUA) durante o ano acadêmico 1969-70. Demitido mais tarde do CBPF, ainda durante a ditadura, foi professor visitante da Universidade de Strasbourg 1, Université Louis Pasteur, de 1970 a 1974 e, no ano em que lá chegou, fundou, com Michel Paty e outros, os seminários sobre Fundamentos da Ciência, que, mais tarde, deram origem à revista ‘Fundamenta Scientiae’.


Até 1981 fez uma carreira brilhante na França e voltou ao Brasil para o centro que havia fundado, mas não em definitivo. Somente em 1986, após ser convidado pelo então Ministro de Ciência e Tecnologia, Renato Archer, para dirigir o CBPF, retornou de vez ao Brasil.


Terminado seu mandato, Leite ocupou-se de dar conferências, pintar e escrever suas memórias. Mais sobre sua obra pode ser encontrado na sua Biblioteca Virtual (www4.prossiga.br/Lopes/).


Leite nos deixa também um dos mais importantes arquivos sobre a história da ciência no Brasil; mas deixa, mais do que tudo, no coração de cada um que o conheceu, seu exemplo e saudades de um homem honesto, generoso, crítico, perspicaz, irônico, inquieto e, sobretudo, apaixonado.


Francisco Caruso é pesquisador CBPF e da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), e editor do livro ‘José Leite Lopes: Idéias e Paixões’ (1999)’


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


A bola é redonda


‘Da Reuters, no site do ‘Washington Post’ e outros, ‘quando entrar em campo, este país continental de 185 milhões vai ranger até parar’. Bancos, escolas, Bolsa, Justiça, tudo vai parar a caminho do hexa ou ‘On our way to the sixth’.


Quase parando, o ‘Fantástico’ destacou de Carlos Alberto Parreira, ‘focado na Copa, fixado, pronto’, o que a emissora chamou de ‘filosofia’:


– A bola é redonda… O que significa? A bola não tem destino, não tem lado, nada. A vitória pode sorrir para vocês, como pode sorrir para nós.


Mas não demorou muito e, na Globo, William Bonner surgiu tenso, com a ‘notícia bombástica’. Na manchete do ‘SBT Brasil’:


– Na véspera da estréia, Justiça italiana pede a prisão do capitão Cafu. Parreira fala em desestabilização.


Antes, na Folha Online, as manchetes começaram com a notícia, ‘Promotoria italiana pede prisão de Cafu’; depois o outro lado, ‘Advogado diz que não vai dar em nada’; e por fim, ‘Querem desestabilizar seleção, diz Parreira’.


Sites, transmissão do jogo da Itália, canais esportivos, rádios: eram ‘milhões em ação’, de novo, contra o golpe italiano.


Saudado como ‘O homem dos recordes’, em longo perfil ontem no ‘Le Monde’, Cafu apenas sorriu e brincou, no relato do blogueiro Eduardo Vieira da Costa:


– Já pensou? Em vez de participar da Copa, ter que ver na… em outro lugar?


RAÍZES


Como o mundo todo, a revista Slate, do ‘Washington Post’, destaca o Brasil de Ronaldinho -e especula por que brasileiros de ‘raízes’ pobres são tratados por um nome só. Diz que vem da ‘escravidão’.


A mesma Slate posta três longos despachos do Mato Grosso, de um acampamento, sob o título geral ‘Dentro do Movimento Sem-Terra do Brasil’. Acompanhando uma ‘occupation’, chama os sem-terra mortos de ‘mártires’.


QUILOMBOLAS


Pelé no comercial, programado também para o intervalo da estréia do Brasil, hoje


Semanas atrás, segundo site Carta Maior, o Tribunal Permanente dos Povos, organização engajada, aceitou na Áustria uma denúncia do MST e outras entidades contra a Aracruz Celulose por, entre outras acusações, ‘ações violentas contra quilombolas’.


E desde o fim de semana está no ar, nos intervalos da Copa, um comercial da Aracruz com Pelé, Seu Jorge, Daiane dos Santos e até canção de Gilberto Gil. O Valor Online, explicando a campanha, diz que ‘a companhia tem atraído pressões de líderes indígenas e sem-terra que afetam sua imagem tanto no Brasil como no exterior’.


INSTITUCIONAL 1


Marco Aurélio Mello surgiu na propaganda institucional do TSE, em defesa do voto. Na blogosfera lulista, o Bué de Bocas se revoltou:


– Uns políticos de quinta encostaram o TSE na parede até que vergonhosamente desse um passo atrás. Falar mais o quê?


INSTITUCIONAL 2


Assinando com o logo da Fundação Padre Anchieta, um ‘gerente’ da TV Cultura defende a troca pela estatal do software Linux (grátis) pelo Windows (pago), em uma propaganda da Microsoft nas revistas do mês.


Os blogs de mídia já estão em campo para o combate.’


CENSURA NO PIAUÍ
Folha de S. Paulo


Site no Piauí é proibido de citar secretário


‘O juiz da 3ª Vara Cível de Teresina, Teófilo Rodrigues Ferreira, proibiu o portal 180graus.com de citar o nome do secretário de Comunicação do Piauí, Sílvio Leite, e de sua empresa em reportagens referentes ao contrato firmado entre ele e o Banco do Estado do Piauí. Há suspeitas sobre o contrato.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


Audiência da Globo cresce 19% com Copa


‘A audiência da TV Globo, única emissora que transmite a Copa do Mundo em TV aberta no país, cresceu 19% nos três primeiros dias do evento. Na média diária (das 7h às 24h), a Globo subiu de 21 para 25 pontos no Ibope da Grande São Paulo entre sexta e domingo, em comparação com os mesmos dias da semana anterior.


Apesar do crescimento substancial da Globo, o impacto na audiência da TV aberta foi pequeno. O total de televisores ligados cresceu apenas um ponto percentual entre sexta e anteontem, de 46,3% para 47,3%. Isso indica que para o telespectador que só vê TV aberta, a Copa só começa para valer hoje, com a estréia do Brasil.


A Globo tirou mais audiência de suas concorrentes (3 pontos na soma de todas elas juntas) do que atraiu novos telespectadores (1 ponto por dia) por causa da Copa do Mundo.


O maior crescimento da Globo sobre as demais redes abertas ocorreu no período vespertino (das 12h às 18h). Nesse período, a Globo cresceu cerca de 50% sobre os dias ‘normais’.


Sem considerar os jogos de ontem, Angola x Portugal, às 16h de domingo, foi a partida mais vista na TV aberta. Deu 35 pontos, pelo menos cinco a mais do que o futebol ‘comum’ (Campeonato Brasileiro) costuma registrar no mesmo dia e horário. Argentina x Costa do Marfim (32 pontos) e Alemanha x Costa Rica (30) também foram muito bem no Ibope.


‘PÁGINAS’ EM FESTA 1


Será no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 3 de julho, a concorrida festa de lançamento de ‘Páginas da Vida’, próxima novela das oito da Globo. O evento reunirá todo o elenco da novela (serão 110 atores até o final) e convidados VIPs (cuja lista está a cargo da promoter Liège Monteiro).


‘PÁGINAS’ EM FESTA 2


Entre as atrações da festa de lançamento de ‘Páginas da Vida’, haverá um arranjo sinfônico para ‘Wave’, de Tom Jobim, tema de abertura, e uma apresentação de dança de Ana Botafogo (que atuará na novela).


TRILHA SONORA


‘Páginas da Vida’ deverá ter três CDs. Serão todos independentes um do outro (e não um duplo e um simples). A novela terá ao todo 45 músicas.


BICHOS EM FÚRIA


Ao exibir um cão pit bull arrastando um carro, o ‘Domingo Legal’ do último dia 4 deixou os protetores dos animais em fúria. Eles entupiram as caixas postais do SBT em protesto contra o que consideraram abuso contra os bichos.


FORÇA ANIMAL


Resultado: anteontem, o programa de Gugu Liberato continuou apostando no poder de audiência dos animais, mas evitou ‘atrações’ que pudessem ser vistas como maus-tratos.


BAND NOTÍCIAS


A Band estréia no próximo dia 19 um minitelejornal, com dez minutos de duração, a ser exibido todos os dias entre 15h45 e 16h. O programete se chamará ‘Notícias da Redação’ e será apresentado por algum âncora do jornalismo da rede.’


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O Globo


Terça-feira, 13 de junho de 2006


CANADÁ
O Globo


Morre o homem mais rico do Canadá


‘TORONTO. O magnata da imprensa canadense Ken Thomson morreu ontem de manhã de enfarto, em seu escritório. Thomson, de 82 anos, era o homem mais rico do Canadá e o nono no ranking global, segundo a revista ‘Forbes’, com uma fortuna de US$ 19,6 bilhões.


A principal publicação da Thomson Corp. é o jornal canadense ‘Globe and Mail’, que Ken Thomson chamava de ‘a jóia da coroa’. Ele assumiu a empresa, que faturou US$ 8,7 bilhões ano passado, em 1976, após a morte de seu pai.


‘Sentiremos muita falta de seu apoio e companheirismo’, disse em nota seu filho mais velho, David Thomson, atual presidente do conglomerado.


Ken Thomson deixou a presidência da empresa em 2002, devido à sua idade, mas ia regularmente ao escritório, no Centro de Toronto.


O conglomerado foi criado em 1930 pelo pai de Ken, Roy Thomson, com uma estação de rádio. Em 1934 ele comprou um diário canadense e, 25 anos depois, 15 jornais britânicos. Em 1967 Roy comprou o tradicional ‘The Times’, de Londres, que acabou vendido a Rupert Murdoch em 1981. A partir de 1996, a Thomson começou a investir em outros setores.


Thomson era conhecido por seu estilo discreto. Segundo o escritor Peter Newman, ele vivia como ‘um caixa de banco à beira da linha da pobreza’.’


MEMÓRIA / JOSÉ LEITE LOPES
Obituário


José Leite Lopes, um ícone da ciência brasileira


‘Um dos maiores expoentes de uma geração de cientistas comprometida com o desenvolvimento científico e tecnológico, mas também com aspectos sociais e políticos do país. Dessa forma, amigos, colegas de profissão e ex-alunos descreveram José Leite Lopes, um dos maiores nomes da ciência brasileira e um físico internacionalmente reconhecido. Fundador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e primeiro presidente da Sociedade Brasileira de Física, o pernambucano Leite Lopes foi uma das figuras centrais da ciência brasileira nas últimas cinco décadas.


Não só, como apontaram os colegas, por suas pioneiras contribuições na física e por sua participação determinante na estruturação de um sistema de ciência e tecnologia do país, mas também por sua luta política contra o regime militar – o que acabou levando-o ao exílio.


– Ele é um dos ícones da ciência brasileira nos últimos 50 anos – afirmou o presidente do CBPF, Ricardo Galvão. – Sobretudo no estabelecimento de uma cultura científica no país.


O secretário do Ministério da Ciência e Tecnologia, Luis Fernandes, faz coro:


– Ele consolidou a visão de que a pesquisa deveria estar no coração da atividade científica no país.


Galvão destacou ainda o caráter humanista de Leite Lopes que, segundo ele, era um dos últimos representantes de um tipo de cientista cada vez mais raro hoje em dia, em que a especialização reina absoluta.


– Ele sempre teve uma preocupação muito forte com a desigualdade social no Brasil. Ele falava sempre comigo sobre a dificuldade do acesso das classes mais pobres à ciência. Ele achava que isso era absolutamente necessário ao país – disse Galvão. – E era um homem de cultura ampla, que pintava, gostava muito de música.


Leite Lopes teve também uma atuação importante na criação da Comissão Nacional de Energia Nuclear e do Ministério da Ciência e Tecnologia. Crítico severo da ditadura militar, Leite Lopes foi cassado pelo AI-5 em 1969. Nos anos de exílio, morou nos Estados Unidos e, posteriormente, na Europa, onde deu aulas.


– Quando era estudante, eu e meus colegas seguíamos com muito interesse suas manifestações em prol da democracia e do desenvolvimento científico e tecnológico do país – relembrou o físico Luis Davidovich. – Ele denunciava o sistema autoritário. Para nós, era um paradigma de ação, mostrava que a boa ciência e o bom cientista devem estar preocupados também com a justiça social.


O físico Luis Pinguelli Rosa, coordenador do Programa de Planejamento energético da Coppe e ex-aluno de Leite Lopes, destacou a contribuição do físico para a ciência nacional e internacional.


– Ele foi pioneiro na proposta de unificação das forças nucleares fracas com as forças eletromagnéticas, uma solução até hoje consensual na física.


O trabalho mais importante de Leite Lopes para a Física, ao qual se refere Pinguelli, data de 1958. Ele propôs, pela primeira vez, a existência de uma terceira partícula componente da chamada força fraca (uma das duas forças que atuam no interior do núcleo atômico).


De acordo com Leite Lopes, além das partículas W+ e W-, atuaria ainda a partícula Z0 – sem carga elétrica. A existência dessa terceira partícula acabou sendo confirmada cerca de duas décadas mais tarde, contribuindo para a maior compreensão de diversos tipos de radioatividade.


Leite Lopes passou mal pouco antes do Natal e foi internado no Hospital Samaritano, no Rio. Ao ser submetido a uma endoscopia, ele entrou em coma e foi transferido para a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do hospital. Morreu ontem de manhã, aos 87 anos.’


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