Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Carlos Heitor Cony

‘No início do atual governo, insistentemente acusado de partidarizar a vida nacional, falou-se na obrigatoriedade da carteirinha do partido agora no poder para os candidatos a cargos públicos se habilitarem junto aos escalões superiores do partido.

Descontando-se os exageros, a mania prevaleceu e ainda prevalece, mitigada um pouco, porque há que satisfazer a base aliada, que também se julga com direito aos despojos, ao lance de dados com que os soldados romanos, aos pés da cruz, disputaram a túnica de Jesus. É bem verdade que a túnica era pequena e os soldados poucos, ao contrário dos cargos, que são muitos -e os candidatos são muitíssimos.

De qualquer forma, a carteirinha do partido não podia ser oficializada, era coisa doméstica do governo. Agora, com a pretendida criação do Conselho Federal de Jornalismo, o mesmo governo quer controlar as diversas mídias, numa operação que nem chega a disfarçar o caráter totalitário da pretensão dos atuais mandatários do poder.

Uma das verdades mais sovadas da política é que o assalto à democracia não começa com tanques e canhões, que muitas vezes nem são necessários. Começa com o cerceamento da imprensa, apesar dos desmandos que ela comete, tanto no setor da informação como no da opinião.

As leis vigentes no país dão aos prejudicados amplas garantias de reparação nos chamados crimes e abusos da imprensa. Não cabe ao governo ensinar ou policiar aqueles que estão legalmente habilitados ao exercício da profissão.

No caso do rádio e da TV, que são concessões do Estado, o controle já existe em lei e não precisa de um órgão suplementar para controlar ou manipular a informação. No caso dos jornais, que pertencem à iniciativa privada, a interferência do Estado só não chega a ser uma tolice porque pode ser o início de um crime.’

***

‘Baixando o sarrafo’, copyright Folha de S. Paulo, 11/8/04

‘Quando iniciei minha participação neste canto de página, em 1993, atraí a cólera de alguns petistas ao atribuir a certos militantes a tendência de se apoderar do Estado para fins de impor uma regime bem próximo do ditatorial -no pressuposto de serem eles donos absolutos da melhor maneira de administrar a sociedade.

Para uso interno, o PT talvez seja o partido mais democrático de nossa história, democrático pelo menos na aparência, com o assembleísmo circunstancial fazendo às vezes de vontade da maioria permanente.

Atraí também a simpatia de alguns membros do PT, pois, durante os oito anos de governo tucano, defendia a maioria dos ideais petistas e atacava quase diariamente o governo de FHC.

Sem dar a mínima bola para a cólera e a simpatia, acrescento a essa pretensão ditatorial do PT o fato mais recente, que é o Conselho Federal de Jornalismo, destinado a ensinar como se faz a imprensa, quem pode ou não pode integrar as diversas mídias.

Não se trata de uma volta aos tempos do Dip do Estado Novo nem da censura do regime militar. Tanto o Dip como a censura dos diversos atos institucionais, de 1964 em diante, proibiam certos assuntos, na marra. Não se podia mencionar o nome de dom Hélder Câmara nem informar que havia um surto de meningite. E pronto.

O Conselho de Jornalismo agora proposto é mais nocivo, é letal. Procura ensinar, exercer uma didática para a qual não terá competência técnica nem mandato legal.

O país tem uma Constituição, tem leis que regulamentam e punem abusos da mídia. Certas ou erradas, elas estão em vigor e, volta e meia, um órgão ou um profissional pagam o pato, nem sempre merecidamente.

O Conselho Federal de Jornalismo fará o Brasil mais uma vez cair no ridículo diante dos países que se consideram democráticos. Ficará alinhado com aqueles que precisam de conselhos do próprio governo para baixar o sarrafo.’



Clóvis Rossi

‘Pobre argumento’, copyright Folha de S. Paulo, 11/8/04

‘O argumento mais repetido em defesa do tal CFJ (Conselho Federal de Jornalismo) diz que existem conselhos similares para advogados, médicos e outros profissionais e, portanto, deve haver também para jornalistas. Pena que nenhum dos que usam o argumento parou para examinar se os conselhos similares ao CFJ produziram bons efeitos.

Não é preciso muita esperteza para perceber que os resultados não são bons, para dizer o menos. No caso dos advogados, basta lembrar que a grande maioria dos formados não passa no Exame da Ordem, o que significa que as escolas estão despejando no mercado profissionais com imenso déficit de formação.

Pior ainda: alguém aí é capaz de dizer que a administração de justiça no Brasil é minimamente eficiente, elogiável, louvável? Ou, posto de outra forma, a existência de um conselho semelhante ao proposto CFJ nem chegou perto de defender a sociedade no seu direito à justiça.

No caso dos médicos, já está entrando em debate a criação de um exame similar ao feito pela Ordem dos Advogados do Brasil, o que evidencia que há desconfianças também em relação à qualidade da formação desses profissionais.

E, de novo, é escandalosamente óbvio que o direito à saúde não é exatamente uma característica do Brasil. Ou, posto de outra forma, a sociedade não está sendo defendida pelo fato de existir um conselho que supervisiona os médicos.

Seria preciso um grau de presunção fenomenal para supor que, no caso do jornalismo, o CFJ faria o que os conselhos das outras profissões não fizeram ou, no mínimo, não puderam evitar.

Tanto quanto o direito à saúde ou à justiça, o direito a uma informação veraz só será alcançado se e quando a própria sociedade for vigorosamente atrás de cada um deles.

Estruturas burocrático-corporativas podem até ter a melhor das intenções, mas os fatos provam que não defendem nem os profissionais nem a sociedade.’

***


"Processo às intenções", copyright Folha de S. Paulo, 17/08/04


"Em 1975, a Itália preparava-se para a primeira eleição em que o Partido Comunista parecia ter reais chances de chegar ao poder, justamente num país membro da Otan, a aliança militar anti-comunista.


O PCI liderara a primeira revisão dos dogmas, batizada à época de ‘eurocomunismo’, ao lado do PC francês e do espanhol. Como é óbvio, a eleição atraiu quilos de jornalistas do mundo todo à Itália. Um dia, Enrique Berlinguer, então secretário-geral do PCI, deu uma entrevista coletiva à mídia internacional.


Foi crivado de perguntas sobre a credibilidade da conversão do PCI às regras da democracia até então dita burguesa. Respondeu com firmeza uma e outra vez, até que, na undécima pergunta a respeito, acusou os jornalistas de estarem promovendo um ‘processo às intenções’.


Um processo similar parece estar agora em curso em relação ao PT. Nada contra gritar ‘falta’ agora, quando estão sendo lançadas iniciativas questionáveis do ponto de vista do apego ao jogo democrático, até porque, quando esse é perdido, aí não dá mais para gritar.


Mas um pouco de perspectiva vai bem. O partido pode ter personalidades e correntes inteiras presas a uma raiz ideológica pouco democrática, mas a sua história -a sua vida real, portanto- é democrática, quaisquer que sejam as intenções (não postas em prática) de João, Pedro ou Antônio do PT.


O risco que se corre em qualquer processo às intenções é beatificar a parte oposta. No caso, permitir que dêem lições de democracia políticos e partidos que, estes sim, passaram das intenções à prática e participaram de governos que violaram todas as regras democráticas, inclusive impondo censura à imprensa.


O único processo de fato autoritário levado a cabo pelo PT até agora foi, convenhamos, contra os mal chamados radicais do próprio partido.


Aí, sim, deu-se um clássico expurgo stalinista. Mas pouca gente reclamou. Talvez porque radicais incomodam muita gente, de boas e de más intenções."



Elio Gaspari

‘A essência da LulaPress é a empulhação’, copyright O Globo, 15/8/04

‘Aqui vão dois pares de textos. Relacionam-se com noções de ética e disciplina dos jornalistas. Estão separados pelo tempo, pelo propósito e pela origem.

O primeiro diz o seguinte:

‘As notícias devem ser precisas, versando apenas sobre fatos consumados. Não permitir informações falsas, supostas, dúbias ou vagas.’

‘A divulgação da informação, precisa e correta, é dever dos meios de comunicação pública, independentemente da natureza de sua propriedade.’

A segunda frase está no Código de Ética que servirá de base para a definição da alma do projeto que Lula mandou ao Congresso para ‘normatizar, fiscalizar e punir as condutas inadequadas dos jornalistas’. Esse Código, aprovado num congresso da classe em 1987, é muito mais um manual de conduta. Acoplado ao projeto de Lula resultará num regulamento disciplinar dos jornalistas.

A primeira afirmação é do general Silvio Correa de Andrade, chefe da Polícia Federal em São Paulo, no Manual de Censura que distribuiu aos jornais em dezembro de 1968, horas antes da edição do Ato Institucional n 5.

O problema está na coincidência

O Código de Ética do aparelho sindical diz que ‘é dever do jornalista prestigiar as entidades representativas e democráticas da categoria.’

Outro manual de censura, de junho de 1969, avisava que não se podia ‘publicar notícias ou comentários tendentes a provocar conflitos entre as Forças Armadas, ou entre essas e o poder público, ou entre esse e o povo.’

No mundo dos generais considerava-se desprestígio dizer que em alguns de seus quartéis praticavam-se a tortura e o extermínio como política de Estado.

No mundo dos companheiros, os jornalistas têm o dever de ‘prestigiar’ os sindicatos e a Federação Nacional dos Jornalistas, a Fenaj. Seria desprestígio lembrar a maracutaia das aposentadorias de falsos perseguidos políticos, promovida em 1995 pelo Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro?

Qualquer semelhança entre os manuais de censura e a visão autoritária e aparelhada que acompanha o projeto de criação do conselho federal do ofício é mera coincidência. Quando uma iniciativa de Lula, associado à Fenaj, guarda semelhanças retóricas com o palavrório dos censores, algo de ruim está acontecendo.

O projeto enviado por Lula ao Congresso ficará alguns anos na gaveta, rosnando. É um documento pedestre, mal intencionado. Na exposição de motivos o ministro Ricardo Berzoini diz o seguinte: ‘A sociedade tem o direito à informação prestada com qualidade, correção e precisão, baseada em apuração ética dos fatos.’ Sabendo-se que em 1968, durante a reunião em que se decidiu baixar o Ato Institucional n 5, louvou-se 19 vezes a democracia e condenou-se 13 vezes a ditadura, pode-se perceber como palavras bonitas (‘qualidade, correção e precisão’), escondem o bornal do controle ( ‘disciplina’, ‘advertência’, ‘censura’, ‘suspensão’, ‘cassação’).

O projeto confunde deliberadamente um elemento essencial à profissão (a correção e o zelo pela precisão da notícia) com uma obrigação legal submetida à fiscalização, ao julgamento e à disciplina de um braço sindical sustentado pelo confisco de uma parte da renda dos profissionais.

A imprensa tem horror à fiscalização

Depois de se dizer tudo isso contra o projeto, pode-se argumentar que os jornalistas querem publicar grampos telefônicos obtidos ilegalmente, violar o sigilo bancário dos outros, defender o controle externo dos poderes alheios e escrever mentiras. Quando se fala em fiscalizá-los, esperneiam, cantam a ‘Marselhesa’ e se escondem debaixo da alegoria da liberdade de imprensa. Quem achar assim estará muito mais certo do que errado.

O pior é que essa pessoa pode achar mais. Ela pode achar que há órgãos de imprensa que vendem reportagens, entregando-as aos leitores como se fossem produto daquela tal atividade protegida pela Constituição. Pode também suspeitar que os governos federal, estaduais e municipais gastam o dinheiro da patuléia e das empresas estatais com publicidade geralmente associada à simpatia do noticiário. Pode amaldiçoar jornalistas que escrevem belezas sobre eventos aos quais foram convidados a custo zero. São as chamadas ‘bocas-livres’. Em suma: há corrupção, e muita, na imprensa. Essas práticas não atingem a todos os jornais, revistas e emissoras, mas as maracutaias do mundo das comunicações são menos noticiadas no Brasil do que pedofilia de padre no Observatore Romano.

A imprensa brasileira precisa de algum tipo de fiscalização crítica independente. Uma forma simples, pública e bem-sucedida de fiscalização é a figura do ombudsman, adotada em 1989 pela ‘Folha de S. Paulo’. Depois de passar por memoráveis vexames, o ‘New York Times’ criou o seu ombudsman no ano passado. Pode-se achar que é pouco.

Devem existir instâncias de fiscalização além do Poder Judiciário? Para médicos, advogados e arquitetos, elas existem.

Essas instâncias devem se misturar com o Estado ou devem se confinar ao universo do prestígio profissional? De um lado ficam os conselhos como o que Lula quer criar. São organismos de alistamento e arrecadação compulsória. De outro, entidades como as associações de jornais, revistas ou emissoras. Como as instâncias fiscalizadoras dos agrupamentos patronais freqüentemente não fiscalizam coisa alguma, a bola poderia rolar para a Associação Brasileira de Imprensa?

Essas são questões a respeito das quais cada um deve formar a sua opinião, pronto para mudá-la a cada duas semanas. Debate bonito é assim.

Notícia e verdade não são a mesma coisa

Vale voltar às duas primeiras afirmativas lá de cima. Pode-se sustentar que o Código de Ética dos jornalistas e o Manual de Censura do general dizem coisas parecidas porque dizem coisas verdadeiras. É aí que mora o perigo. Toda vez que se fala em notícias necessariamente precisas, verdadeiras, seguras e claras, o que se quer é embaralhar o debate. Coisa do tipo enquanto-houver-fome-não-haverá-democracia.

A confusão entre notícia e verdade é uma falácia. Ela foi desmontada há quase um século por Walter Lippmann, um dos maiores jornalistas do seu tempo:

‘Quem acredita que notícia e verdade são duas palavras que designam a mesma coisa, não vai a lugar algum. A função da notícia é sinalizar um acontecimento. A função da verdade é trazer à luz fatos ocultos, formando um quadro da realidade dentro do qual as pessoas possam agir. (?) Nós não entendemos a natureza limitada das notícias e a complexidade ilimitada da sociedade; nós superestimamos nossa capacidade de resistir, nosso espírito público e nossa competência.’ Ele se divertiu lembrando que os cidadãos pagam bom dinheiro pelos seus lugares no teatro e pelas passagens de trem, mas querem comprar a verdade, todos os dias, pagando com a menor moeda em circulação (Em 1921 os jornais custavam um centavo de dólar).

‘Precisas e corretas’ mistificações

Em 1964 num memorável julgamento da Suprema Corte dos Estados Unidos, o juiz William Brennan Jr. redigiu a sentença que assegura à imprensa americana o direito de cometer erros factuais no noticiário relacionado com personalidades públicas. Brennan sustentou que se os jornalistas forem colocados debaixo do medo de punições legais caso não contem histórias ‘precisas e corretas’, quem perde é a sociedade, por ficar menos informada. Nada a ver com licença para mentir. O jornalista obriga-se a demonstrar que não sabia da falsidade da notícia e que não agiu como se pouco lhe importasse o fato de ela ser verdadeira ou falsa. Se alguém acha que a Corte Suprema é leniente com a imprensa, vale informar que, pelos seus critérios, algumas dezenas de jornalistas brasileiros teriam passado pela cadeia por conta da publicação de grampos. As casas impressoras ou transmissoras onde trabalhavam teriam corrido o risco de falir.

O comissariado que produziu o projeto de LulaPress promete ao público um regime de informações ‘precisas e corretas’, sabendo que esse tipo de doce não existe. Às vezes essa empulhação parte dos jornalistas. Outras vezes parte daqueles que pretendem controlar os jornalistas. Em todos casos, o que se quer é empulhar a patuléia.’



Maílson da Nóbrega

‘Stalinismo cultural’, copyright O Estado de S. Paulo, 15/8/04

‘O malsinado projeto de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) teria sido inspirado em idéias de artigo do secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães ou com elas coincidiria. Cacá Diegues, Miriam Leitão, Merval Pereira, Arnaldo Jabor criticaram a proposta e seus contornos stalinistas. O mesmo se viu nos editoriais do Estado, da Folha de São Paulo e do Globo de domingo passado.

O projeto mostra os contraste deste governo. A banda ‘A’ conduz de forma responsável a gestão da economia, enquanto a banda ‘B’, saudosa da era Vargas, é anticapitalista, despreza a importância da propriedade privada e assim por diante. O ministro Gilberto Gil associou seu nome ao projeto e à banda ‘B’, o que não faz justiça ao seu passado de lutas pela democracia.

Deve ter comprado gato por lebre.

Tais contradições resultam da inacabada transição do PT. Lula reproduz por estas plagas a trajetória dos socialistas europeus do pós-guerra, mas diferentemente deles teve que escolher um atalho para chegar ao poder. Lá, a convergência às novas idéias e à moderação levou muitos anos para angariar o apoio da convenção partidária. Aqui, a Carta ao Povo Brasileiro, a boa nova, foi aprovada pelo diretório a quatro meses das eleições.

Daí a convivência conspícua do velho e do novo no governo. A crença na democracia e em uma economia orientada pelo mercado se mistura com visões autoritárias e devaneios estatizantes.

O artigo de Guimarães impressiona pelo seu antiamericanismo. Segundo análise de Merval Pereira, ‘todo seu raciocínio vai no sentido de conter a indústria audiovisual americana e estimular meios de comunicação brasileiros a colaborar para a criação de uma ‘cultura nacional’, sem a qual se ‘enfraquece a capacidade do Estado de promover a defesa dos interesses nacionais’’.

Incorporadas no projeto, essas idéias criaram um monstrengo de inspiração autoritária, que se transformado em lei submeteria a produção audiovisual a um pequeno grupo de burocratas. A Ancinav teria também o poder de tributar e assim aumentar o preço dos ingressos de cinema e de outros canais de lazer.

Para Miriam Leitão, basta começar a ler o projeto para concluir o quanto ele é abusivo.

Outro aspecto impressionante do artigo, que busca desqualificar ações de governos passados, é a crítica à importação de modelos institucionais (americanos, provavelmente), como as agências reguladoras, a autonomia do Banco Central e o regime de metas de inflação, que constituiriam exemplos de ‘mentalidade e atitudes miméticas’.

A crítica se aplicaria, por extensão, aos outros países que adotaram esses modelos. Agências reguladoras autônomas, uma invenção americana do século 19, existem onde houve privatização (que o autor condenaria) de serviços de infra-estrutura. A idéia de autonomia formal dos bancos centrais nasceu nos EUA, mas o Reino Unido, o Japão e os membros da zona do euro a adotaram nos anos 1990. O regime de metas de inflação, da Nova Zelândia, vigora em mais de 50 países. O que é bom se copia sem preconceitos ideológicos.

A rigor, seria de condenar nossos republicanos por imitarem a democracia americana, que como se sabe foi uma revolução das mais profundas da História. Para Bernard Bailyn, ‘as reformas sociais e políticas que marcaram a Revolução Francesa já estavam parcialmente em vigor na América muito antes’: a separação entre o Estado e a Igreja, a igualdade perante a lei, a abolição dos privilégios e a proteção dos indivíduos contra o poder coercitivo do governo. Por isso, lá não existe Ancinav.

Como disse Jean-François Ravel, referindo-se aos franceses, ‘o mistério do antiamericanismo não é a desinformação – a informação sobre os EUA é muito fácil de encontrar – é a vontade de estar desinformado’.

Um exemplo para contrapor os argumentos de Guimarães é a nossa privatização das telecomunicações em 1998 e a criação da agência reguladora, a Anatel. De lá para cá, a densidade telefônica saltou de 14 para 100 acessos por habitante. Mais de 50 milhões de brasileiros puderam comprar telefones cada vez mais baratos. Passamos de 24 para 94 milhões de telefones celulares e fixos em serviço.

Se as idéias por trás da Ancinav valessem, deveríamos esquecer Graham Bell, o americano inventor do telefone, e usar tambores soberanos.’