Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Carlos Heitor Cony


‘Artur da Távola escrevia diariamente uma crônica sobre televisão, acompanhando capítulo por capitulo as novelas em exibição, que eram umas três só no horário nobre. Uma jornalista perguntou-lhe como conseguia a façanha, se ele assistia a uma e gravava as duas restantes, para estar sempre por dentro da trama e do desempenho de cada artista. Ele disse que não.


Fazia política atuante, tinha um mandato parlamentar, escrevia um livro sobre Ravel, passava cinco, seis dias sem ver determinada novela, mas bastava uma espiada numa delas e ficava entendendo tudo -se as histórias estavam bem desenvolvidas, se os atores estavam dando para o gasto.


Lembrei dele ao passar dez dias sem notícias aqui da pátria, ocupado com outras coisas. E deixara para trás um momento emocionante do grande novelão nacional. Na volta, bastou uma olhadela nos jornais, dois ou três momentos na TV e, sem ter o engenho e a arte do Távola, fiquei mais ou menos por dentro das tramas, a principal e as paralelas que se estão desdobrando por aí.


Tal como as novelas, a impressão é que as nossas crises se repetem no essencial, buscando as mesmas emoções, os mesmos suspenses, mudando apenas os personagens e os atores, a trilha musical e os cenários. No caso atual, o cenário é o mesmo, é a mesma a emoção com que se aguarda os próximos capítulos.


Para desgraça minha, nunca fui de acompanhar novelas, nem mesmo aquelas que produzia numa emissora que não mais existe, talvez por conta do péssimo trabalho que ali fazia, não por gosto ou necessidade, mas por extravagante solidariedade à empresa que me dera emprego quando tinha todas as portas fechadas no mercado.


Não estou me comparando ao Artur da Távola, nem posso chegar a tanto. Há uma diferença básica entre a sabedoria do mestre e a minha burrice. Ele passava dias sem ver as novelas e entendia tudo. Eu passei dez dias sem nada ver, mas deu na mesma: continuo sem entender nada.’



Mônica Bergamo


‘Travesseiro’, copyright Folha de S. Paulo, 30/06/05


‘A informação de que estaria em curso uma ‘Operação Outdoor’, da Polícia Federal, tirou o sono de boa parte dos publicitários de São Paulo.


TRAVESSEIRO 2


Diante da possibilidade de uma devassa no setor publicitário, Dalton Pastore, presidente da Abap, a associação das agências de publicidade, decidiu lançar uma nota apoiando eventuais investigações. ‘A sociedade exige transparência nos negócios que envolvem interesses públicos e recursos provenientes do Estado’, escreveu Pastore, cuja agência, a Carillo Pastore, não tem contas do governo.


Nem todos os publicitários ficaram felizes com o texto.


VERBA


O fato de estatais do governo federal investirem em publicações dirigidas por Luis Leonel, cunhado do ministro Luiz Gushiken, da Secom (Secretaria de Comunicação), não tem nada a ver com o próprio ministro. Pelo menos é o que diz sua assessoria, que afirma que Gushiken não investiu verbas de sua pasta nas publicações do irmão de sua mulher, Elisabeth, nem influiu para que estatais o fizessem. A gestão de verbas da Secom é uma coisa, a das estatais é outra, diz a assessoria.’



Soraya Aggege


‘BB gasta R$ 514 mil a mais em revistas do cunhado de Gushiken’, copyright O Globo, 30/06/05


‘Mesmo sem ter a tiragem de suas revistas verificada oficialmente, o cunhado do ministro Luiz Gushiken (Comunicação de Governo), Luís Leonel, mais que duplicou suas verbas de publicidade estatal no governo Lula. Só do Banco do Brasil, a editora de Leonel obteve R$ 647.248 entre janeiro de 2003 e junho deste ano, além de R$ 1 milhão da Petrobras e um valor não revelado da Caixa Econômica Federal. No governo anterior, o Banco do Brasil aplicou R$ 133.630, entre 2000 e 2002, a quinta parte do gasto no atual. A Caixa Econômica Federal não informou seus gastos com as revistas, mas admitiu, em nota, que eles cresceram.


A Ponto de Vista Editorial, dirigida por Leonel, não é filiada ao Instituto de Verificação de Circulação (IVC). A tiragem de suas revistas não é informada nem na ‘Investidor Individual’, única a circular em bancas. Segundo Leonel, a revista vende, em média, 40 mil exemplares.


IVC diz que governo costuma verificar circulação


As outras três, ‘Investidor Institucional’, ‘Energia & Mercados’ e ‘Gestão Médica’, segundo Leonel, teriam uma tiragem variável entre 10 mil e 12 mil exemplares. O diretor-geral do IVC, Ricardo Costa, afirmou que a verificação da circulação é fonte de informações para agências de publicidade e empresas. O custo de verificação estaria, por mês, entre R$ 259 (tiragens entre 5 mil e 25 mil exemplares) e R$ 518 ( tiragens entre 25 mil e 50 mil), além de taxas semestrais semelhantes para o IVC:


– É mais coerente consultar a circulação antes de investir. O governo costuma fazer isso.


Segundo a assessoria de imprensa do BB, o público leitor das revistas é adequado aos segmentos priorizados pelo banco. ‘Na Investidor Individual, é o investidor pessoa física de média e alta renda. Na Investidor Institucional, são os fundos de pensão, instituições financeiras, seguradoras e empresas de médio e grande porte’. Entre 2000 e junho deste ano, o BB gastou R$ 236.180 com a Investidor Individual. Com a Investidor Institucional, o banco gastou R$ 544.698 no mesmo período. No governo Lula, desde 2003, foram investidos R$ 217.280 na primeira e R$ 429.968 na segunda.


A CEF disse que aumentou seus gastos com as revistas, mas não divulgou valores. Em nota, disse que ‘a Caixa é uma empresa pública exploradora de atividade econômica, sujeita às normas do direito privado, não estando obrigada a fornecer informações estratégicas sobre suas campanhas publicitárias e ações mercadológicas, exceto para os órgãos de fiscalização competentes’.’



Chico Otavio


‘Agência DNA é investigada por evasão de divisas’, copyright O Globo, 30/06/05


‘A DNA Propaganda Ltda, empresa do publicitário Marcos Valério Fernandes, foi uma das favorecidas por um esquema de evasão de divisas descoberto pelo Banco Central em Minas Gerais. O nome da agência consta da relação de clientes da Infotrading do Brasil, denunciada pelo Ministério Público Federal por simular importações e remeter ilegalmente para o exterior US$ 7 milhões entre agosto e dezembro de 2001.


O caso é considerado uma das mais relevantes fraudes financeiras investigadas pelo Ministério Público Federal (MPF) em Minas. Os donos da Infotrading já foram denunciados: o processo tramita em segredo de Justiça na 4 Vara Criminal Federal (MG). A Polícia Federal concentra agora as investigações nos clientes beneficiados com o canal de evasão de dinheiro aberto pela importadora.


BC descobriu fraude ao monitorar mercado de câmbio


A fraude foi descoberta pelo BC ao monitorar o mercado de câmbio em 2001 e verificar que a Infotrading celebrara contratos de câmbio para importações, com pagamento antecipado, de US$ 7 milhões. O montante causou estranheza aos auditores, já que contratos semelhantes anteriores envolviam valores significativamente menores.


O BC constatou que a empresa, com capital social de apenas R$ 20 mil, registrara faturamento anual bruto de R$ 900 mil e que R$ 4,7 milhões estavam depositados na conta corrente para liquidação de operações de câmbio, o que levou o MPF a requerer o seqüestro dos valores e a solicitar à Receita informações sobre eventuais operações de importação da Infotrading, para lastrear supostos contratos de câmbio firmados por ela em 2001. O MPF constatou que a última importação fora em 1998, prova de que as operações foram para evadir divisas.


Para facilitar as operações, a Infotrading teria captado laranjas em Betim, na Grande Belo Horizonte: moradores pobres do município, em 2004, procuraram um jornal local para denunciar que um vizinho recolhera seus CPFs a pretexto de um cadastramento. Mais tarde, surpreenderam-se ao descobrir que eram réus no processo da Infrotrading e apareciam como responsáveis por operações da importadora.


No ofício Diret 2003-858, de 14 de março de 2003, enviado ao então procurador-chefe da Procuradoria da República em Minas Gerais Álvaro Ricardo de Souza Cruz, o BC informa a relação das empresas que depositaram dinheiro na conta da Infotrading no período, portanto clientes do esquema. Na página 3 está o nome da DNA, que depositara R$ 220 mil na conta da falsa importadora. Investigadores suspeitam que os valores representem uma pequena amostra de quantias enviadas ilegalmente para o exterior.


A DNA foi uma das agências brasileiras que mais cresceu em 2004, alavancada por contratos com estatais federais. Marcos Valério assumiu a agência em 1997, em sociedade com Clésio Andrade, hoje vice-governador mineiro, de quem teria comprado a participação em 1998. Oficialmente o nome de Marcos Valério não aparece na composição societária da DNA. Mas uma das sócias da DNA é a Grafitti Participações, que tem como sócia Renilda Maria Fernandes de Souza, mulher de Valério.


Lista tem empresas já envolvidas com a polícia


O artifício de simular importações e antecipar o pagamento, constatou a investigação, foi usado pela Infotrading para enviar dinheiro de procedência duvidosa de empresas que já tinham problemas com a polícia. Como a pernambucana Strada Ltda, envolvida em contrabando. Também aparecem como clientes a Duagro Participações, do advogado paulista Laodse Duarte, a Valmat do Brasil e a Yahweh Nissi Importações e Exportações, já investigadas por câmbios ilícitos.


O Ministério Público já ofereceu denúncia contra Bruno Corrêa Lopes, Vagner Barros de Oliveira e Elvis Barbosa da Costa, representantes legais da Infotrading, pelo crime evasão de divisas. O caso foi desmembrado e a PF rastreia o destino do dinheiro – provavelmente Estados Unidos – e outras operações feitas pelas empresas favorecidas, entre as quais a DNA. O Ministério Público pediu ao juiz Jorge Gustavo Serra de Macedo Costa a quebra do sigilo fiscal dos envolvidos.’



TODA MÍDIA


Nelson de Sá


‘De passagem’, copyright Folha de S. Paulo, 30/06/05


‘Marcos Valério baixou na capital cercado por advogados e câmeras. Apresentação da Globo, à tarde, logo na chegada:


– O empresário, acusado de ser o operador do ‘mensalão’, está em Brasília.


Eram depoimentos fechados, um na Polícia Federal, outro na Câmara, mas a cobertura acompanhou passo a passo. Da rádio Jovem Pan:


– Valério chega à sede da PF… Entrou pela porta da frente… Ele não quis responder às perguntas.


E assim prosseguiu, com entradas como ‘Valério está prestando depoimento’, mas a notícia surgiu longe dali.


Foi manchete na Folha Online e outros sites por algumas horas, até a goleada do Brasil sobre a Argentina:


– CPI dos Correios quebra sigilos de Valério.


Depois, antes dos sorrisos patrióticos sobre o jogo, o enunciado se repetiu no ‘Jornal Nacional’ e demais.


As andanças de Valério por Brasília e a quebra dos sigilos tornaram cansativas as horas de depoimento de José Múcio, atração do dia nos palcos dos canais de notícias.


Até porque a transmissão do Congresso trombou, por mais de duas horas, com aquela do jogo, na Globo.


Mas para hoje Globo News e Band News têm Roberto Jefferson na CPI, na boca de cena.


INTERVALO ‘Pesadelo’ na Argentina e ‘show’ nos sites brasileiros, o jogo fechou com nova apoteose de Galvão Bueno: – É bom ser brasileiro!… Esta é a alma, a cara do Brasil. Que tem seus problemas, que são sérios, tantos… É bom ser brasileiro!


JUDY E MATT


Judith Miller, repórter do ‘New York Times’ ameaçada de prisão por não revelar fontes, ganha ares de símbolo mundial. Chegou ao blog brasileiro de Tiago Dória, que encampou movimentos semelhantes no Irã e outros, a campanha que toma por base um site criado pela própria jornalista e com ‘link’ para a Comissão de Repórteres pela Liberdade de Imprensa.


De resto, após a decisão de segunda da Suprema Corte dos EUA, que não quis ouvir o recurso de Miller e de Matthew Cooper, da ‘Time’, o próprio ‘NYT’ saiu em campanha. Anteontem, fez editorial criticando o ‘golpe na imprensa livre e sem medo’. Ontem foi a vez de William Safire, o lendário colunista aposentado há pouco, ressurgir num artigo em que comparou ‘Judy e Matt’ a Henry David Thoreau.


Mais CPI


No dizer da Globo, à tarde, ‘para surpresa do governo, a sessão atingiu o quórum e está oficialmente criada a CPI dos Bingos’. Na escalada da Record, Boris Casoy parecia anunciar o fim de uma novela:


– A oposição consegue instalar a CPI que vai investigar Waldomiro Diniz.


Mas o próprio âncora não se mostrou animado, comentando que a oposição perdeu o ímpeto depois da queda de José Dirceu -e que a CPI é hoje pouco mais que um instrumento de pressão sobre a outra CPI.


E mais CPI


Na escalada de manchetes do ‘Jornal Nacional’:


– A oposição instala CPI dos Bingos e o governo contra-ataca tentando criar outra CPI sobre compra de votos, para investigar desde o primeiro mandato de Fernando Henrique.


Folha Online, outros sites e blogs acompanharam o caso o dia todo, sublinhando a entrada em cena de Lula, que ‘revogou medida provisória que trancava a pauta -e atrasava a CPI da Compra de Votos’.’