Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Carta Capital

POLÍTICA

Mino Carta

O jornalismo dos patrões

‘A mídia nativa tem, às vezes, o poder de me espantar. Ou, por outra, me obriga a meditar sobre a serventia do jornalismo e as responsabilidades que daí decorrem.

Leio o primeiro editorial da página 3 do Estadão de terça 11, intitulado ‘Mais um escorregão de Dilma’ (quais foram os anteriores?), a ministra-chefe da Casa Civil que ‘o prestimoso presidente (…) ungiu como sucessora em potencial’. Miram os obuses em Dilma Rousseff, contra Lula, portanto. A ministra teria pedido, ainda em 2008, à então secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, para agilizar a auditoria do Fisco nas empresas da família Sarney.

O editorial foi altamente representativo do comportamento de toda a mídia em relação ao caso e lhe concedo a primazia em nome da antiguidade e da importância das baterias. Decretam os senhores midiáticos que dona Lina era, e é, o rosto da verdade, e o Estadão, naquele texto simbólico, alinhavou à larga as razões do seu veredicto. Atendia às conclusões gerais dos demais integrantes da comunidade jornalística, a bem do pensamento dos frequentadores do privilégio e do ódio de classe.

‘Mais um escândalo, enfim, que o lulismo tentará abafar.’ Últimas palavras, famosas, do editorial do Estadão. A leitura forçou-me a perguntar aos meus insubstituíveis botões: serei eu um lulista ao tentar uma análise isenta do episódio, conforme o dever, creio, de todo jornalista? Por exemplo, uma análise que parta da avaliação honesta das atitudes de dona Lina e de dona Dilma. Era do conhecimento até dos paralelepípedos da antiga rua Augusta, célebre artéria paulistana hoje asfaltada, que quem acusa deve provar.

Ocorre que dona Dilma nega in totum a acusação de dona Lina, e não estamos a lidar com as alegres comadres de Windsor. Proclama o Estadão: ao demitir a secretária da Receita, seu superior, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, teria confessado cumprir ordem que ‘veio de cima’. Disse mesmo? Ou é dona Lina quem diz? E por que, de todo modo, em cima estaria dona Dilma?

A mídia, seus patrões e editorialistas, colunistas, perdigueiros da informação, não se permitiram e não se permitem exames de consciência em ocasiões múltiplas e diversas. Cabe, desde 2003, semear pedras no caminho de Lula e, desde 2007, de sua ungida a ‘sucessora em potencial’. Vale então outra pergunta: a favor de quem?

O governo Lula, na opinião de CartaCapital, não foi aquele que esperávamos, mesmo assim saiu-se melhor do que os demais na pós-ditadura, e bastariam a eleição e a reeleição do ex-metalúrgico para assinalar um divisor de águas na história do País. Não é por acaso que o presidente é o mais popular desde a fundação da República. Aos olhos da maioria pouco importa o que Lula faz, importa quem ele é.

Em contrapartida, dona Dilma não é ex-operária. Se for candidata, os demais concorrentes também não serão. Observem, contudo, como é apresentada a possível, ou mesmo provável, candidatura da ex-ministra e senadora Marina Silva. Ganha o transparente, simpático apoio da mídia, como a incentivá-la a tomar a decisão final. Por quê? Para significar um contraponto à candidatura Dilma e gerar uma profícua confusão na área.

CartaCapital sempre manifestou profundo respeito e apreço pela senadora Marina, e lamentou sem meias palavras sua saída do governo. Trata-se, na nossa opinião, de uma verdadeira dama em luta pelas melhores causas. Na Presidência, inalcançável, acreditamos, nas condições atuais, honraria o Brasil. Não se enganem, entretanto: sua candidatura será trombeteada por quem se empenha pelo retorno do tucanato.

Quanto à presença de um passado mais ou menos burguês (não é o caso da senadora) no currículo dos possíveis sucessores de Lula, este é, para todos eles, um ponderável motivo de preocupação.’

 

POLÊMICA

Redação CartaCapital

Vade-retro, Madonna.

‘Madonna ataca ainda e sempre. Sábado 15, Assunção de Nossa Senhora, apresenta-se em Varsóvia em um dos shows que eletrizam as plateias mundiais. Talvez não contassem, ela e os organizadores, com o espanto

e a resistência da catolicíssima Polônia. Missas de protesto são celebradas em todo o país para exorcizar a endemoniada, com apoio maciço dos crentes e do próprio Prêmio Nobel Lech Walesa.’

 

FOTOGRAFIA

Camila Alam

A alma encantadora da cultura baiana

‘Nascido em Salvador, em 1947, o fotógrafo Mario Cravo Neto fez de suas raízes a marca de seu trabalho. As imagens, quase sempre em preto e branco, refletiam um olhar sobre a cultura baiana, sobretudo, brasileira. Morto dia 9, aos 62 anos, Cravo Neto lutava contra um câncer de pele havia mais de um ano e faleceu na cidade natal.

Ele tinha como inspiração os rituais do candomblé, a devoção católica, a tradição indígena. Ainda adolescente, abraçou a escultura, seguindo os passos do pai, Mario Cravo Junior. Mudou-se para Berlim com a família, onde teve contato com pensamentos artísticos diversos. Em Nova York, no final da década de 60, estudou com Jack Krueger e montou um ateliê onde dava origem a esculturas em acrílico. Dessa época são imagens coloridas como a série On the Subway e outras que remetem à solidão na metrópole.

Atuou como diretor de fotografia em filmes, mas abandonou o ofício por não desejar o estilo de vida que o cinema proporcionava. Em 1975, fraturou as duas pernas em um acidente de carro que o deixou preso à cama por quase um ano. A impossibilidade de andar o distanciou da captação nas ruas. A partir daí, dedicou-se com firmeza ao estúdio, construindo o que hoje é conhecido internacionalmente como seu estilo.

Ao combinar elementos de lembrança religiosa com corpos nus, criou imagens ora sensuais, ora místicas, quase ritualísticas. Peixes, aves, ovos e ossos eram alguns dos objetos que conseguia retratar de maneira poética, sempre em contato com o humano. Fazia do contraste de cores e temas uma presença constante. Gostava de falar sobre seus projetos e, mesmo abatido pela doença, continuava a participar de workshops e mesas =de discussão de fotografia.

Sobre sua arte, costumava dizer que era como cicatriz, repleta de lembranças e significados, na maioria das vezes acidental. ‘Marcas que contam mentiras diferentes’, disse certa vez.’

 

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