Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Comunique-se

PROJETO DA FENAJ
Carlos Chaparro

Tributo ao obscurantismo, 21/07/06

‘O XIS DA QUESTÃO – Em vez de olhar as complexidades do mundo atual, e entender as perspectivas que ele nos coloca, não apenas ao jornalismo, mas aos saberes e às ocupações da área comunicação, a FENAJ fica olhando para 1969, ano-ápice de um período de amarras do qual o Brasil se libertou há duas décadas. E o aí dito vale, também, para as leis, a argumentação e as práticas policialescas das entidades de Relações Públicas, que ultimamente retomaram, com vigor abusivo, a lógica obscurantista dos tempos em que ajudaram o regime militar a pensar e a elaborar o seu plano estratégico de comunicação, nos idos de 1968.

1. Meu novo celular…

Ontem comprei um novo telefone celular, desses modernos, com câmera fotográfica. Até achei barato, menos de 200 reais. Com o novo celular, passei a fazer parte da crescente multidão de pessoas aptas e livres para fotografar e divulgar acontecimentos ou flagrantes de rua com relevância jornalística. Por coincidência, sou jornalista formado, sindicalizado, convicto, com provas dadas nas habilidades no ofício. Também por coincidência, sou até professor de jornalismo. Estou protegido, portanto, por esse tal projeto de lei assinado pelo já famigerado pastor Amarildo.

Por falar no pastor Amarildo, que a FENAJ usou para dar encaminhamento ao projeto, ele próprio admite: não sabia o que estava fazendo. Jamais teve consciência do mostrengo que lhe puseram nas mãos e ele subscreveu. E que a Câmara Federal e o Senado aprovaram.

‘Eu sou técnico em contabilidade, bacharel em teologia, pastor. Não tenho nenhum envolvimento com o jornalismo.’ – disse ele, em entrevista à revista Imprensa’. E mais: ‘Há muitas coisas a serem solucionadas e corrigidas neste projeto. Eu percebi, depois, que no caso do ensino de jornalismo, também havia problemas, já que o jornalista tem aulas de outras áreas’.

Um homem desses não pode ser levado a sério. Ainda assim, que Deus o ilumine, em futuros projetos…

Melhor será voltar ao meu novo celular. Neste fim de semana estarei nas ruas colhendo flagrantes urbanos. Irei sem medo, protegido por todas as leis, porque sou jornalista legalmente reconhecido. Mas serei uma exceção, entre os milhões que, tão bem quanto eu, e com igual liberdade, poderão captar e espalhar ao mundo informações e imagens da atualidade.

Gabriel, meu neto de 13 anos, será um desses.

O que farão com ele, se o flagrarem no exercício ilegal da profissão? – e agora me lembro que eu próprio, quando tinha a idade do Gabriel, cometi transgressão ainda maior: criei e, durante um ano, com mais dois colegas, escrevi, editei, ilustrei e distribuí um pequeno jornal semanário, com periodicidade rigorosa e leitores fiéis. Imaginem só, sem diploma de jornalista… Ainda bem que o sindicato nem ficou sabendo.

Escrevendo sobre essas coisas, fico aqui pensando na infernal e inútil trabalheira que a FENAJ e os sindicatos terão pela frente, se a lei do pastor Amarildo for sancionada e a quiserem usar para controlar as variadas situações de exercício ilegal da profissão que a própria lei torna possíveis.

2. De volta a 1969

Quem diria, em 1969, ano em que foi criada a obrigatoriedade do diploma, que o mundo chegaria às facilidades tecnológicas de hoje?

Pois a FENAJ, e todos os conselhos de Relações Públicas, o Federal e os Regionais, continuam a pensar e a agir como se continuássemos em 1969.

Quando, quase 40 anos atrás, o saudoso jornalista, professor e deputado federal Freitas Nobre elaborou, e por ela lutou até a aprovação, a lei que regulamentou a profissão de jornalista e estabeleceu a obrigatoriedade do diploma, as circunstâncias e as razões eram outras. Para sentir as diferenças, bastam três recortes da realidade de 1969:

1) Havia uma ditadura feroz, com o AI-5 em vigor e eficazes esquemas de repressão, uns espertos, outros violentos, para o controle governamental da informação jornalística.

2) A profissão de jornalista estava formalmente avacalhada por privilégios imorais de acesso a benefícios públicos, o mais grave deles o direito à isenção de imposto de renda – e, para gozar dela, todos os poderosos, do bispo ao delegado de polícia, queriam e conseguiam ser jornalistas, com carteirinha no bolso.

3) Já estava criado, desde 1967, e com apetites furiosos sobre o mercado de trabalho, o Conselho Federal de Relações Públicas, com leis e operações repressivas que, entre outras coisas, pretendiam impedir ou dificultar a atuação de jornalistas em trabalhos de assessoria de imprensa e até na elaboração de publicações empresariais.

Com a regulamentação da profissão de jornalista, as entidades dos jornalistas e as dos relações públicas passaram a brigar por nacos importantes do mercado de trabalho, cada um querendo a mesma brasa para a sua sardinha. Essa, a briga estúpida que persiste até hoje. Tão velha e tão estúpida, que gerou esse mostrengo filhote da FENAJ, acalentado pela pobreza intelectual do deputado Amarildo.

É surpreendente que a FENAJ, onde supostamente temos mentes brilhantes, continue amarrada às circunstâncias e às razões de 1969, sem perceber que o mundo é outro e a sociedade se democratizou; que o direito de pensar, dizer e saber é universal e não exclusivo dos jornalistas; e que o conhecimento evoluiu, com a destruição de barreiras e paradigmas.

3. O mostrengo

A Federação Nacional dos Jornalistas está amarrada a idéias lamentavelmente obscurantes. Em vez de tentar olhar as complexidades do mundo atual, e entender as perspectivas que ele nos coloca, assume como referência 1969, ano-ápice de um período de amarras do qual o Brasil se libertou há duas décadas.

O aí dito vale também para as leis, a argumentação e as práticas policialescas das entidades de Relações Públicas, que ultimamente retomaram com vigor abusivo a lógica obscurantista dos tempos em que ajudaram o regime militar a pensar e a elaborar o seu plano estratégico de comunicação, nos idos de 1968. São hipócritas, na contestação que agora fazem ao desastrado projeto da FENAJ.

A FENAJ pariu, sim, um mostrengo. E duvido que os próprios diretores da entidade não cheguem à mesma conclusão, se se derem ao trabalho de ler em voz alta o texto da obra criada.

Exigir a obrigatoriedade do curso superior de jornalismo para atividades preponderantemente artísticas ou técnicas (exemplo: ilustrador e processador de texto), e tendo como único argumento a reserva de mercado, é pensar miúdo demais.

Estabelecer como norma e conceito que só jornalistas podem ser professores de jornalismo, para lecionar ‘as disciplinas de caráter profissionalizante, de natureza teórica e prática’, é de uma ignorância que dói. Então o estudante de jornalismo não vai precisar aprender, com bons professores especializados, disciplinas como (por exemplo) filosofia da linguagem e teoria do sujeito, saberes sem os quais não há como entender as razões do bom título ou do bom ‘lead’?

E quem vai aprofundar o aprendizado em História, Antropologia, Lógica, Ciência Política, Geografia, em suas diversas e complexas vertentes? O chefe de redação? Ou será que esses saberes se tornaram desnecessários à formação do jornalista, para lidar com as complexidades do mundo atual?

Ora, senhores da FENAJ e dos Conselhos de RP, acordem, sacudam a poeira do passado que lhes tolda a lucidez. E se entendam, pelas vias claras da inteligência, não pelas veredas do obscurantismo.

(*) Carlos Chaparro é português naturalizado brasileiro e iniciou sua carreira de jornalista em Lisboa. Chegou ao Brasil em 1961 e trabalhou como repórter, editor e articulista em vários jornais e revistas de grande circulação, entre eles Jornal do Commercio (Recife), Diário de Pernambuco, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, Diário Popular e revistas Visão e Mundo Econômico. Ganhou quatro prêmios Esso. Também trabalhou com comunicação empresarial e institucional. Em 1982, formou-se em Jornalismo pela Escola de Comunicação de Artes, da USP. Também pela universidade ele concluiu o mestrado em 1987, o doutorado em 1993 e a livre-docência em 1997. Como professor associado, aposentou-se em 1991. É autor de três livros: ‘Pragmática do Jornalismo’ (São Paulo, Summus, 1994), ‘Sotaques d’aquém e d’além-mar – Percursos e gêneros do jornalismo português e brasileiro’ (Santarém, Portugal, Jortejo, 1998) e ‘Linguagem dos Conflitos’ (Coimbra, Minerva Coimbra, 2001). O jornalista participou de dois outros livros sobre jornalismo, além de vários artigos (alguns deles sobre divulgação científica pelo jornalismo), difundidos em revistas científicas, brasileiras e internacionais.’

Edvânia Kátia

O risco da desregulamentação profissional, 19/07/06

‘Assistimos nos últimos dias a um debate entre a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e empresas de comunicação que reagiram contra a proposta de regulamentação da profissão de jornalista, aprovada no Senado Federal, e que agora vai para apreciação do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. De um lado O Estado de São Paulo publicou editorial sob o título Mais um Golpe da Fenaj e exigiu o veto presidencial. A Fenaj reagiu e, em nota oficial, disse que, ‘ao criticar o projeto de lei aprovado pelo Senado e a proposta da FENAJ de criação do CFJ, o Estadão demonstra, mais uma vez, sua ira pelo fato de os jornalistas brasileiros terem uma profissão regulamentada’.

O Conselho Federal de Relações Públicas (Corerp) também reagiu e considerou o projeto uma ofensa à democracia, a liberdade de expressão, a ética e outras atividades regulamentadas, ou não, mas que merecem ser respeitadas. O fato é que a tentativa de regulamentação profissional dos jornalistas está mais uma vez sob fogo cruzado. O projeto foi apresentado na Câmara pelo deputado Pastor Amarildo (PSC-TO) com o apoio da Fenaj. Aprovada na semana passada pelo Senado, a proposta amplia de 12 para 23 as funções exercidas por jornalistas.

Antes de tudo, o debate precede de uma ampla discussão sobre a regulamentação profissional e o risco que a falta da regulamentação oferece à sociedade. Em tudo na vida é preciso haver regras. É preciso regularizar, regular para que os conflitos sociais sejam sanados. Se assim não fosse, não haveria a necessidade das leis: da Lei de Trânsito, da Lei de Defesa do Consumidor, das leis que regulamentam as profissões de Relações Públicas, Médicos, Advogados, Engenheiros e tantas outras. Não haveria a necessidade das agências reguladoras. Confiar que vivemos numa sociedade democrática o suficiente, onde a inexistência de regras pode ser substituída pelo consenso entre divergentes, ainda é uma utopia. Prova são os debates travados hoje entre os que são a favor da ampliação das funções de jornalistas. Sem regulamentação, quem terá a razão?

Em particular sobre o capítulo das assessorias de imprensa, questionado pelo Conselho Federal de Relações Públicas, requer uma análise conceitual sobre o termo assessoria de imprensa. Pela própria lei que regulamenta a atividade de Relações Públicas, está assegurado que ‘consideram-se atividades específicas de Relações Públicas as que dizem respeito: a informação de caráter institucional’. Abro aqui um parêntesis só para mostrar o risco da desregulamentação profissional e o faço perguntando: limitar aos RPs a função de dar as informações institucionais também não fere a liberdade de expressão? A lei diz também que é atribuição dos relações públicas ‘o planejamento e supervisão da utilização dos meios audiovisuais, para fins institucionais’.

Para não enveredar pelo campo da teoria da comunicação, busco fundamentação no Aurélio, que diz que imprensa pode ser entendido como ‘os jornalistas, repórteres, etc. Então, se uma assessoria tem o seu Departamento de Relações Públicas, cujas ações se pautam no relacionamento com os diversos públicos. Se há também o Departamento de Publicidade, voltado para criação de campanhas e outras atividades do gênero. Então, que sejam também definidas as atribuições do Departamento de Assessoria de Imprensa, voltado para o Relacionamento com a Mídia e para a produção de matérias jornalísticas.

Se foi bom para os Relações Públicas a primeira das profissões da comunicação que conquistou o direito de ter sua atividade regulamentada, porque não pode ser bom para os jornalistas também? O fato dos Relações Públicas terem a sua atividade regulamentada, com certeza, não implica em dizer que eles estão indo contra a liberdade de imprensa neste país ou que se apoderaram de atividades que poderiam ser desenvolvidas pelos jornalistas ou publicitários ou radialistas.

A questão é que o capítulo específico sobre a atividade da assessoria de imprensa traz à tona um velho debate sobre qual profissional deve atuar nessa atividade. Mas o fato é que é preciso deixar claro as regras para a regulamentação de uma atividade consolidada no mercado de trabalho e que hoje significa postos de emprego para os diversos profissionais da área da comunicação social.

Sem a regulamentação da atividade de assessoria de imprensa parece que o campo de batalha vai continuar sendo o mercado de trabalho e, nesta guerra, por enquanto, quem tem levado vantagem são os jornalistas porque na hora de montar uma assessoria, quer queiram ou não, são os jornalistas que são convidados. Isso é quase uma imposição do mercado.

Que venha a regulamentação para que cada profissional possa atuar de acordo com sua formação acadêmica no mercado de trabalho.

(*) Presidente da Associação Maranhense de Imprensa’

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Advogado afirma que PLC 79/04 é inconstitucional, 21/07/06

‘Fonte: Consultor Jurídico – Segundo o advogado Lourival J. Santos, o Projeto de Lei Complementar 79/04 é inconstitucional. O Projeto foi aprovado no Senado este mês e já foi encaminhado para sanção presidencial. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode sancionar, vetar ou sancionar parcialmente o projeto até o dia 28/07.

Segundo o parecer de Santos, a inconstitucionalidade do PLC 79/04 vem da Lei de Direito de Autor, que qualifica o jornalismo como obra intelectual protegida, portanto livre do impedimento para os que não são portadores de diploma.

Santos é o autor do parecer sobre a matéria encaminhado ao presidente pela Associação Nacional de Jornais e Revistas, Associação Brasileira de Radio e TV e outras entidades patronais de comunicação.

Leia na íntegra o parecer do advogado:

OPINIÃO LEGAL SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE DO PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR Nº 079/04

‘As leis inconstitucionais não são leis.

O ato legislativo é o querer expresso da

legislatura, ao passo que a

Constituição é o querer expresso do

povo. A este cabe a supremacia. Se o

ato legislativo o contradiz, írrito será:

não é lei’. (Rui Barbosa, ‘Obras

Completas’, Vol. XXIV, Tomo III,

Edarte São Paulo, p. 53).

CONSIDERAÇÕES PREAMBULARES

Encontra-se nas mãos do Presidente da República, para apreciação, o Projeto de Lei Complementar n° 079/04, cujo objetivo é a regulamentação da profissão de jornalista. O texto em questão previu, como premissa básica, a obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício das funções nele relacionadas, com o que seguiu o Decreto-Lei n° 972/69, regulamentado pelo Decreto n° 83.284/79, além de ampliar, sobremaneira, em relação a estes dois últimos textos legais, o rol das funções que pretende sejam privativas do profissional de jornalismo.

Tanto pela exigência do diploma, quanto pela invasão preconizada em áreas e atividades sociais que jamais poderão ser controladas por reservas instituídas por imposições legais autocráticas como a pretendida, o projeto agride frontalmente o Texto Constitucional em vigor e discrepa dos valores básicos e fundamentais constitutivos do Estado Democrático de Direito, como adiante será explanado.

INCONSTITUCIONALIDADES QUE IMPÕEM O VETO TOTAL DO PROJETO Nº 79/04

I- Harmonia e independência entre os Poderes – O projeto deverá ser vetado, integralmente, com fundamento nos artigos 2° e 102, § 2° da C.F., porquanto tramitam no Judiciário mais de uma ação judicial discutindo a inconstitucionalidade da obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da função. Uma das ações, que tem a natureza de Ação Civil Pública, foi proposta pelo Ministério Público Federal e encontra-se em grau de Recurso Extraordinário remetido, em 06/07/2006, Guia n° 2006144718, ao Supremo Tribunal Federal.

A eventual sanção do Projeto n° 79 seria fator de forte desequilíbrio dos fundamentais princípios democráticos que consagram a harmonia e a independência entre os Poderes e alicerçam o modelo político adotado pelo País a partir de 88. Ademais, pelo art. 102, § 2° do Texto Fundamental, as decisões definitivas da Suprema Corte produzem eficácia contra todos e efeito vinculante. Logo, a eventual sanção correria o risco de aprovar um Projeto de Lei natimorto.

II- Obrigatoriedade do diploma de jornalista – O Texto Constitucional de 88 não recepcionou o Decreto-Lei nº 972/69 e o seu Decreto Regulamentador nº 83.284/79 no tocante a obrigatoriedade do diploma de jornalista.

Notáveis juristas manifestaram-se a respeito do assunto, em pareceres específicos, entre eles o hoje Excelso Ministro do STF, Dr. Eros Grau, que concluiu que o desenvolvimento da profissão de jornalista independe de diploma, uma vez que o seu exercício prende-se ao estofo cultural e conhecimentos específicos do exercente, sem expor a coletividade a qualquer fator de risco.

A obrigatoriedade do diploma é coerente no caso de outras profissões como a de médico, advogado, engenheiro, farmacêutico, etc., pois a ausência de conhecimentos técnicos adequados, somente adquiridos em cursos especializados, é fator de sérios riscos para a coletividade.

Além desses motivos, a nova Lei de Direito de Autor (nº 9.610/98) qualificou o trabalho jornalístico, de qualquer natureza, como obra intelectual protegida (arts. 5°, inciso XIII, letra ‘h’, 7º, inciso XIII e 17, §§ 1º e 2º, c.c. artº 5º, inciso XXVIII, letra ‘a’ da C.F.), razão pela qual a livre difusão de tais criações jamais poderá ser impedida pela ausência de um diploma, por força do que dispõe a C.F., no art. 5º, inciso IX.

Países de primeiro mundo, como é o caso dos EEUU, onde os cursos de jornalismo são concorridos e de alto nível, não obrigam o diploma.

Acrescente-se a isto o direito constitucional do cidadão de ter assegurado o acesso à informação e às fontes de cultura nacional (arts. 5º, inciso XIV e 215, ‘caput’ da C.F.), sem qualquer embaraço.

III- Arbitrariedade na instituição de reserva de mercado de trabalho – Ao considerar privativas de jornalistas todas as atividades desenvolvidas dentro dos veículos de mídia impressa e eletrônica, incluindo rádio, televisão e internet, o legislador acometeuse contra a Constituição Brasileira, que protege os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, inciso IV, c.c. com o art. 5°, inciso VIII da C.F.), como fatores fundamentais do Estado Democrático do Direito.

A prevalecer o texto, a liberdade do cidadão, independentemente do seu conhecimento técnico e cultural, estaria cerceada para os meios de comunicação em geral, apenas e tão somente pela eventual ausência de um diploma de jornalista, que funcionaria como salvo-conduto para a expressão cultural de qualquer natureza.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Impossibilidade jurídica da obrigatoriedade do diploma jornalístico

Editado sob a constância do regime militar, por Junta Militar formada pelos Ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, no uso das atribuições que lhes conferiam os Atos Institucionais n°s 5, de 13/12/1968 e nº 16 de 01/10/1969, o Decreto-Lei nº 972/69 (art. 4º, inciso V) instituiu a obrigatoriedade do diploma, com o objetivo de exercer o controle sobre a população de jornalistas do País, bem como das publicações da imprensa.

Como se vê, tal obrigatoriedade assenta-se sobre os ditames do AI-5, um dos textos mais censórios e totalitários de que se tem notícia na história política do País. Manter-se hoje a obrigatoriedade do diploma, quando se tem em vigor uma Constituição cidadã, que designa o estado brasileiro como Estado Democrático de Direito (Art. 1°, CF) e confere ao indivíduo o acesso pleno às informações culturais de interesse da coletividade (art. 5º, XIV), significa cercear a liberdade de expressão, a duras penas conquistada pela sociedade, ao ratificar o retrocesso àquele período de triste memória em que a expressão do pensamento constituía séria ameaça ao cidadão.

O saudoso jurista Pontes de Miranda, referiu-se à ausência da liberdade da manifestação do pensamento com as seguintes e precisas palavras: ‘a liberdade de pensar só para si, ocultando o pensamento, de nada valeria na ordem social, tiveram-na os escravos, têm-na os que vivem sob as formas autocráticas’. (‘Comentários à Constituição’ de 1967, Ed. RT, 2ª edição, 1971, p. 158).

Proposta de ampliação das atividades privativas do jornalista

Ampliar a abrangência das funções do jornalista, açambarcando as mais diversas áreas do conhecimento humano, representa a antítese do desenvolvimento cultural, uma vez que é sabido que os meios de comunicação, em razão do constante e notável avanço tecnológico, cada vez mais aproximam os Países e ampliam a possibilidade de intercâmbio cultural.

Neste caso, a sanção presidencial certamente contribuirá para o isolamento da imprensa brasileira, condenando-a a não poder contar com a imprescindível e profícua colaboração de verdadeiros especialistas em determinados assuntos, somente porque estes, independentemente da cultura e da experiência, não são diplomados em jornalismo.

O cientista, o pensador, o regente, o virtuose ou o especialista em futebol, seriam impedidos de dar publicamente sua contribuição cultural, ao contrário do que ocorre em outros Países, apenas por não terem cursado uma escola superior de jornalismo. Isto seria totalmente inconstitucional, pois agrediria a liberdade de expressão das atividades intelectual, artística e de comunicação, que são princípios pétreos consagrados pela Carta Magna.

Tal liberdade é reflexa no sentido de que somente existe e se justifica no direito exercido pelo indivíduo de ter acesso livre às informações de seu interesse, o que também é princípio constitucional básico (Art. 5°, XIV c/c Art. 215, caput da CF).

O ilustre constitucionalista Profº José Afonso da Silva, ao comentar a liberdade de informação e de ser informado, destacou que ‘A liberdade dominante é a de ser informado, a de ter acesso às fontes de informação, a de obtê-la’. (‘Curso de Direito Constitucional Positivo’, Malheiros Editores, 22ª Edição, p. 246).

Pelo exposto, no nosso entendimento o PL 79/04 deverá ser totalmente vetado por manifesta inconstitucionalidade.

São Paulo, 18 de julho de 2006.’



ECOS DA COPA
Tiago Cordeiro

A Copa que ainda não acabou, 21/07/06

‘Parreira só foi demitido oficialmente da Seleção Brasileira esta semana, Cafu ainda não está com vontade de se aposentar e ninguém sabe direito ainda o que Marco Materazzi falou para Zidane. A Copa do Mundo da Alemanha acabou, mas ainda repercute. E, nesse contexto, vários jornalistas ainda têm na memória aquele momento, aquela situação que marcou o evento. Se o hexa não veio, essas lembranças do inusitado, pelo menos, já são um grande título.

‘Acho que todos os jornalistas tiveram dificuldade de se alimentar, porque os restaurantes alemães fechavam cedo. Eu cheguei a dormir com fome’, revela Jonne Roriz, repórter fotográfico, do Estadão. Ele lembra que um restaurante de Leverkussen se manteve aberto além de seu horário, por causa de jornalistas. Roriz cobriu os adversários do Brasil e outros jogos, mas acredita que a grande história da Copa foi mesmo a cabeçada de Zidane em Materazzi. Uma dificuldade que o público não leu, mas que Roriz sentiu muito bem foi a distância. Como cobria jogos em diferentes cidades, muitas vezes passava horas viajando de trem.

Para a jornalista Paula Mello, porém, a viagem não foi nada de inesperado, pelo contrário. Era a única certeza que tinha desde o início do ano. Cobrir a Copa do Mundo foi uma grata surpresa. Passando em um concurso da Globo.com, ela foi uma das torcedoras que assistiu à Copa e colocava suas impressões do evento no blog ‘Torcedores na Alemanha’. ‘Foi uma experiência muito boa, evoluí muito no meu texto’, afirma a blogueira. Ela se surpreendeu com as diferenças na forma de torcer dos outros turistas. ‘Eram torcidas totalmente diferentes, como uma torcida organizada de um time brasileiro. Possuem músicas próprias e são muito mais organizados. Em quase todos os jogos, o Brasil tinha a maioria de torcedores, mas não conseguia se organizar e meter pressão’, recorda. Segundo Paula, boa parte da torcida canarinha era composta por estrangeiros. ‘Havia uma menina turca com uma camisa cheia de fotos do Ronaldinho Gaúcho’, diz.

Apesar da Copa do Mundo começar como uma diversão, jornalistas como Paula acabam transformando o que é lazer em uma oportunidade de trabalho. Jefferson Rodrigues, por exemplo, é jornalista esportivo do Lance. Uma amiga ganhou uma promoção para assistir ao jogo do Brasil contra o Japão e ele conseguiu ir à Copa ficando responsável por cobrir os países das seleções que jogavam. ‘Tive que ir à Inglaterra, França, Holanda e consegui ver o único jogo em que o Brasil jogou bola’, lembra o jornalista.

Para Rodrigues, uma lembrança forte foi a cordialidade entre os torcedores durante a Copa que teve o slogan ‘É tempo de fazer amigos’. Entretanto, o repórter também não esquece que quase não conseguiu assistir ao jogo do Brasil, pois seu ingresso ficou amassado. ‘Já tinham até me dito que eu não ia conseguir, mas a sorte é que a única parte que não amassou foi justamente a que continha o chip que servia para passar o ingresso’, revela.

Fiel revelador de ‘causos’ inesquecíveis do futebol, o jornalista e colunista Renato Maurício Prado, autor dos livros ‘Deixa que eu chuto’ 1 e 2, descreve esta Copa como ‘uma das mais fracas tecnicamente dos últimos tempos’. Para Prado, o excesso de ‘jogos ruins, esquemas exageradamente defensivos, poucos gols e praticamente nenhum grande jogo – daqueles que ficam na memória do torcedor’ foi a grande tônica do evento. ‘Uma pena, já que havia grande expectativa, principalmente em relação ao Brasil e Argentina, que possuíam elencos cheios de craques’, lamenta.

Mesmo assim, o colunista não perde a chance de revelar uma divertida história. ‘Relembro uma com o Júnior, ex-jogador da Seleção e do Flamengo, que trabalhou como observador técnico do Japão. Certo dia, em Berlim, ele resolveu correr para manter a forma. Durante o exercício, passou por jovens alemães que se preparavam para iniciar uma pelada e percebeu que um dos times ficaria com um jogador a menos. Fominha, se aproximou e perguntou se poderia jogar, completando a turma. Aceito, naturalmente, pintou e bordou diante dos amadores e, ao final, um deles, impressionado, quis saber de onde ele era. Foi quando Júnior, sorrindo, disparou, pouco antes de retomar a corrida solitária: ‘Conta aí pra turma que eles jogaram com o Júnior, ex-jogador do Flamengo e das Copas de 82 e 86, pelo Brasil’. A volta ao hotel foi atrasada em alguns bons minutos. Tempo que os alemães o fizeram perder em fotos, autógrafos etc’, conta.

Com ou sem repercussão, a verdade é que para os brasileiros – jornalistas ou não – a Copa não teve um final feliz. Apesar disso, Rodrigo Paiva, assessor de imprensa da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), lembra que após a derrota para o Brasil, a maioria dos jogadores conversou com a imprensa e ‘falou até mais do que os franceses que venceram os jogos’. Segundo ele, o técnico Parreira concedeu três coletivas – de acordo com Paiva, mais do que o técnico da França durante toda a Copa – logo após a derrota.

O assessor revela que muitas novidades surgiram nesta Copa, dificultando o trabalho da imprensa. ‘Mesmo com a boa vontade dos jogadores, foi muito difícil atender a todos os veículos. Esperávamos 200 profissionais e surgiram quase 700. Tivemos que reformular a zona mista para conseguir atender a todos’, ressalta. O resultado não satisfez. Segundo Prado, ‘a malfadada zona mista e as coletivas acabam pasteurizando a cobertura como um todo e impedem reportagens maiores e mais elaboradas’.

Para Paiva, esta foi a primeira Copa do Mundo da internet. ‘Em 2002 ela não era tão popularizada como agora’, explica. Para ele, a mídia impressa era prejudicada pela mídia online, TV e rádio. ‘A coletiva ficava velha demais no dia seguinte, quando saía o jornal’, relembra o assessor de imprensa que, como 180 milhões de brasileiros, também ficou triste com a eliminação brasileira.

Apesar disso, a Copa do Mundo continua com a mesma força e magia. Esta semana, o colunista Luis Fernando Veríssimo revelou em sua coluna que os ‘ecos da Copa’ continuam repercutindo na sociedade. Até que ponto, essas repercussões deixam de ser lamento do passado para se tornar preocupação com o futuro ainda é difícil de dizer. A certeza é que Copa é Copa. ‘O fracasso do Brasil e a pobreza do futebol disputado não são suficientes para tirar o prazer de cobrir uma grande competição como esta’, revela Prado.’



PCC NA MÍDIA
Eleno Mendonca

Os prejuízos causados pelo PCC, 21/07/06

‘O economista Marcel Solimeo é um dos mais experimentados na área de comércio no Brasil. Foi dele a declaração que sintetizou, na minha opinião, o que aconteceu na economia no dia em que uma facção criminosa fez parar 85% dos transportes em São Paulo: ‘Não tem pra quem vender e não tem quem venda’. O PCC cumpriu seu objetivo. A intenção da facção é, além de levar ao caos a segurança, produzir medo nas pessoas, provocar muito, muito prejuízo. Quando ataca agência de banco, comércio, ônibus, produz uma onda de violência capaz de devastar com qualquer ação da cidade em todos os sentidos, incluindo os econômicos.

A imprensa dá muito bem a questão dos arsenais, fala das ações policiais, dos aparatos de inteligência, mas não se dá conta do bastidor econômico. Até fala das coisas mais evidentes, mas não faz o exercício de mostrar quanto custa para o Brasil um dia de São Paulo parado. E a imagem da cidade que vive do turismo de negócios? Há um esforço muito grande para colocar São Paulo cada vez mais nessa rota e, agora, com a avalanche de notícias que são divulgadas lá fora, o destino acaba comprometido e se terá de começar do zero de novo, de mostrar que a cidade é viável, que tem bons restaurantes, boas casas noturnas e de shows, que tem passeios e tem segurança.

Nessa hora, aliás, cabe tudo, menos política. Mas o movimento do PCC certamente leva isso em conta também. Usando táticas de guerrilha, eles sabem que os ataques em amplo espectro, em várias frentes e em momento de disputa eleitoral é um prato cheio para se criar muita confusão. Se em meio a tudo isso tiver uma São Paulo Fashion Week, então, tanto melhor. Imaginem a situação da cidade lá fora com a presença de 1,5 mil jornalistas do exterior cobrindo o evento?

Mas voltemos à questão política. Como se já não bastassem os problemas, os nossos governantes e postulantes ficam a se digladiar como se tudo não passasse de jogo de empurra. Pois em nome dos paulistanos digo que a culpa é de todos. Um por não fazer repasses nem dar prioridade ao assunto segurança, como fez seu antecessor, o outro porque poderia ter agido de forma mais inteligente em vez de manter apenas atenção a um arsenal absolutamente impróprio para os tempos modernos, além de presídios que são verdadeiras pocilgas, incompatíveis com a palavra regeneração.

No Brasil, tudo só vira prioridade depois que a coisa ferve, que chega ao seu ápice. Está acontecendo com a segurança, daqui a pouco será a saúde ou a educação. A máquina da corrupção dá lugar a novos ricos, mas não permite consertar definitivamente certos problemas; a briga e o gosto pelo poder não faz aos governantes ver que não podemos ter vários modelos e gestões na educação, saúde e segurança, em todas as esferas do governo. Porque não se pode ter uma situação de centralização, com a área federal cuidando de toda a segurança, os Estados da educação e os municípios da saúde?

É só uma sugestão, que envolve abrir mão de um monte de coisa. Mas ninguém quer definitivamente fazer um esforço tão grande e que signifique abrir mão de alguma coisa. Me parece contudo tão claro que se apenas uma área administra determinada uma coisa, comprará produtos em vantagem, poderá formar um grupo gestor melhor, terá funcionários que poderão ser melhor distribuídos, poderão atender melhor e de maneira uniforme a população. Esse tipo de discussão também deveria estar nos jornais.

(*) Também assina uma coluna no site MegaBrasil, é diretor de Comunicação da DPZ e âncora da Bandnews. Ele passou pelo Estado de S. Paulo, onde ocupou cargos como o de chefe de Reportagem e editor da Economia, secretário de Redação, editor-executivo e editor-chefe, Folha de S. Paulo, O Globo e Jornal do Brasil.’



GUERRA NO ORIENTE MÉDIO
Milton Coelho da Graça

Na guerra, a primeira vítima é a verdade, 19/07/06

‘Nem sobre a guerra do Paraguai sabemos até hoje exatamente o que aconteceu. E, depois do advento da televisão e da guerra do Vietnã, os militares se convenceram de que o controle da informação mais do que confirma e justifica o título desta coluna, lead do antológico livro de Knightley sobre os correspondentes de guerra.

Reproduzo abaixo a notícia enviada por Alastair Leithead para a BBC e reproduzida no site da emissora www.bbc.uk.co no dia 15 de julho. Alastair apresenta várias versões sobre o que aconteceu na pequena cidade de Nawzad e nada fica realmente esclarecido.

Notícias anteriores e subseqüentes (também no site da BBC) mostram que algo mais grave está ocorrendo porque os militares britânicos informaram ter sofrido seis baixas, mas o governo britânico anunciou que vai mandar mais 900 soldados e mais helicópteros para o Afeganistão; Nawzad e pelo menos mais uma cidade foram ocupadas pelo Taleban.

Por Alastair Leithead 15 de julho

BBC News, província de Helmand

As forças britânicas no Afeganistão defenderam sua decisão de chamar aviões americanos para lançar bombas de 250 quilos sobre combatentes Taleban numa cidade da província de Helmand.

Testemunhas dizem que há muitos mortos e feridos mas as forças britânicas dizem que não há qualquer prova disso. Civis em Nawsad disseram à BBC que os aviões soltaram pelo menos três bombas, destruindo lojas e uma escola.

Os soldados britânicos vinham protegendo a sede do governo distrital em Nawzad há um mês. Muitas das 150 lojas do mercado local foram reduzidas a escombros e há profundas crateras onde as bombas caíram. Uma escola de dois andares, recentemente construída, recebeu um impacto direto que causou o colapso do teto de concreto.

As tropas britânicas disseram que a escola estava sendo usada pelo Taleban para o lançamento de morteiros.

Moradores disseram que não receberam qualquer aviso do Taleban ou das tropas da coalizão sobre o ataque ou o bombardeio. O lojista Haji Ahmad disse: ‘Não fizemos um número certo dos mortos mas há corpos sob os escombros e não há ninguém aqui para retirá-los. São nada menos de 50.’

A cidade tornou-se campo de batalha entre uma pequena força de soldados britânicos e os talebans que os bombardeiam a uma distância de poucas centenas de metros. É muito perigoso viajar até lá e um repórter local da BBC foi alvejado quando tentava apurar o que acontecera.

Oficiais britânicos disseram que estavam sob constante ataque por duas semanas e que os talebans estavam a ponto de ocupar a base quando foi solicitado o apoio aéreo americano. Há notícias de 25 a 200 pessoas mortas, mas a verificação desse número é praticamente impossível. O governador de Helmand disse que houve 19 mortos e todos eram talebans.

O comandante britânico em Helmand, coronel Charlie Knaggs, disse que não há provas da morte de civis e que a força foi necessária para proteger suas tropas.

As forças britânicas admitem que só implantarão segurança e desenvolvimento através da conquista de corações e mentes. Mas sempre disseram que, se atacadas, responderão com força mortal.

É difícil chegar a esse equilíbrio em meio a uma guerra.

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Quem é responsável por essa doença?

Dengue é doença motivada por falta de informação. Informação ao público, que até hoje não foi adequadamente mobilizado para o combate ao mosquito portador do vírus. E aos médicos, que não recebem informação e treinamento adequados para diagnosticar a doença, especialmente em sua versão mais perigosa, a hemorrágica. Só através de contatos pessoais apurei que, além das duas mortes noticiadas, houve nos hospitais do Rio vários casos de pacientes que só escaparam depois de passarem pela UTI e intervenção de profissionais mais experientes. Imagino, por um rápido cálculo proporcional, que esses casos devem ter atingido algumas centenas.

Só para dimensionar o problema: em todo o país, no primeiro semestre, houve 198.222 notificações (e ninguém sabe exatamente quantos casos não foram notificados), quase 11% a mais do que no mesmo período do ano passado. Mas, no Estado do Rio, o pulo foi muito maior – acima de 2000% – de 1.283 para 26.712.

Os três níveis de governo – federal, estadual e municipal – gastaram muito pouco em campanhas preventivas, embora advertidos, desde meados do ano passado, de que tudo indicava um verão especialmente propício a uma grande epidemia. Preferiram jogar o peso maior de suas verbas publicitárias já de olho na próxima eleição, divulgando obras que tinham obrigação de fazer e até as que deixaram de fazer.

Vamos refletir um pouco sobre a questão da falta de informação. Os jornais até que deram boa divulgação às medidas aconselhadas para evitar a multiplicação do vírus. Mas a dengue ataca especialmente a população mais pobre, onde o alcance do jornal é muito baixo. Rádio e televisão são o caminho adequado para informar as camadas mais vulneráveis a essa e outras doenças. Mas não creio que esses dois meios – exatamente os que dependem de concessões públicas – tenham dado uma contribuição compatível com as proporções da epidemia de dengue que enfrentamos.

E não se trata apenas de culpar os donos de emissoras. Cada um de nós deve fazer um exercício autocrítico como jornalista-cidadão: estou fazendo todo o possível, sugerindo pautas sobre como enfrentar a dengue?

(*) Milton Coelho da Graça, 75, jornalista desde 1959. Foi editor-chefe de O Globo e outros jornais (inclusive os clandestinos Notícias Censuradas e Resistência), das revistasRealidade, IstoÉ, 4 Rodas, Placar, Intervalo e deste Comunique-se.’



JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

Galvão Bueno!!!, 21/07/06

‘Posso voltar

ao ponto de partida

mas luto

(Nei Duclós, in Outubro/1975)

Galvão Bueno!!!

O considerado Camilo Viana, diretor de nossa sucursal em Belo Horizonte, recebeu de um telespectador atento e pertinaz uma verdadeira antologia do, digamos, modo galvãobuenodista de ser e estar. São cinqüenta frases com a marca registrada desse narrador deverasmente ímpar.

Há coisas assim: Se o Brasil acertar todos os ataques e ficar bem na defesa, ele ganha.

Confira no Blogstraquis.

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O que é Fenaj?!?!

A considerada Bia Moraes envia a sensacional entrevista que o Pastor Amarildo concedeu a James Cimino, da revista Imprensa, na qual o deputado esbanja sesquipedal cultura e mostra que está preparado para, de repente, escrever e publicar uma espécie de Crítica da Razão Jornalística.

Amarildo (PSC-TO) é autor do polêmico projeto de lei 79/2004, aquele que muda as atribuições profissionais dos jornalistas de 11 para 23 e que espera aprovação ou veto do presidente Lula até o próximo dia 28. Em dado momento da entrevista, exclama a criatura: ‘O que é Fenaj?!’.

O Blogstraquis transcreveu a obra-prima.

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Nordeste no buraco

A considerada Mirtes Barbosa de Araújo, de Fortaleza, escreve para lamentar que um certo candidato à reeleição, com 60,8%, continue à frente das intenções de voto em seu Estado:

‘É por isso que o Ceará não sai do buraco; o Ceará e todo o Nordeste. Impressiona a ignorância do povo, que pretende reeleger um presidente com tantos defeitos pessoais e que representa um partido podre.’

Mesmo assim, considerada Mirtes, Janistraquis envia um abraço enorme, capaz de envolver, juntas, as torcidas de Fortaleza, Ceará e Ferrim! E informa aos leitores que censurou a notinha da remetente para cumprir determinação da Lei Eleitoral.

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Tsunamis

O considerado Hélcio Pinheiro Ribas, do Rio de Janeiro, leu na Folha de São Paulo:

MANAUS: DOIS SARGENTOS SE AFOGAM EM PISCINA — Os sargentos do Exército Alexsandro de Oliveira Sales e Antônio Carlos Duarte Angelim morreram anteontem afogados em uma piscina, durante treinamento de rotina do Curso de Operações na Selva, em Manaus. Um inquérito policial militar foi instaurado para apurar as mortes.

Hélcio pensou, pensou e concluiu:

‘Se sargentos do Exército, que são instrutores dos soldados, se afogam numa piscina, talvez não tenham treinamento suficiente para nadar a largas braçadas nesse mar de lama onde o crime organizado deita, rola e surfa, né não?’

Janistraquis concorda, ó Ribas, e ainda lembra que os afogados são de Manaus, onde a lama é fluvial e, por conseguinte, não afeita a tsunamis.

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Doença Celíaca

O considerado Celso Mattos, de São Paulo, veterano e excelente revisor, escreve a propósito da nota do nosso diretor em Brasília, Roldão Simas Filho, que na coluna passada protestou contra exagero nas advertências sobre a presença do glúten até na água e no vinho.

Leia no Blogstraquis. É muito importante!!!

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Blog do Robertão

A coluna recomenda uma visita ao blog do Robertão Porto, botafoguense pra lá de confiável, pois ali o considerado leitor encontrará não apenas histórias e comentários sobre a Estrela Solitária, mas também textos recheados da mais abençoada paixão.

Dê uma chegadinha: http://portoroberto.blog.uol.com.br/.

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Nei Duclós

Leia no Blogstraquis a íntegra do poema cujo excerto é a epígrafe desta coluna.

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Homem certo

O leitor Jarbas Lourenço Dantas, de São Bernardo (SP), envia frase de Aloizio Mercadante, que escutou no rádio:

São Paulo precisa de um governador com ‘firmeza’ para resolver a crise da segurança.

Intrigado, Dantas pergunta, sem nenhuma cerimônia:

‘O considerado, que é puta velha nesses assuntos, pode esclarecer a quem se refere o senador petista candidato ao governo de São Paulo?’

O colunista passou a responsabilidade para Janistraquis, que consultou alfarrábios e responde:

‘Depois de uma análise superficial da história política recente, pode-se garantir que, ao pronunciar a tal frase, Mercadante pensava em Jânio Quadros, atualmente inelegível, como todos sabemos.’

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Professor Pasquale

A considerada Laís Figueira, de São Paulo, pede desculpas pelos erros de digitação, pois está muito nervosa, e conta a Janistraquis:

Domingo, 16/7, versão online de O Globo: na lista de colunistas, aparece duas vezes o nome do Professor Pasquale e em ambas este especialista em língua portuguesa só se refere a problemas ginecológicos, dermatológicos, oftalmológicos, ortopédicos, e ainda trata de direitos de família, com filho bastardo e mulher de olho na herança do amante!

Você não acha que o Professor Pasquale deveria avisar a seus fiéis leitores que mudou de profissão?

Que pena, Laís, que pena! O Mestre nos ensinava tanto, né mesmo? Janistraquis acha que, como neste país de m… até o presidente da República orgulha-se de ser analfabeto, o Professor de Português preferiu diversificar…

A nova coluna do Pasquale estava aqui; digo estava, porque pode ter ocorrido alguma modificação.

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Altos e gordos

Janistraquis adorou este ‘erramos’ da Folha de S. Paulo:

COTIDIANO 2 (24.JUN, PÁG. C1) Diferentemente do publicado no texto ‘Crianças e jovens estão mais altos e mais gordos’, o IMC (Índice de Massa Corporal) é obtido por meio do peso, em quilogramas, dividido pelo quadrado da altura (em metros), e não pelo peso multiplicado pela altura ao quadrado.

É mesmo fascinante. O que sairá se a gente multiplicar o peso pela altura ao quadrado? Meu secretário acha que tal medição resolveria, pelo menos no papel, o problema da fome neste país que não sabe ler, nem escrever e nem contar.

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Boeing DC 3?!?!

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal braziliense, de cujo varandão é possível ver urubus a voar em círculos sobre o Palácio do Planalto, pois Roldão lia a Tribuna da Imprensa quando deparou com a seguinte notícia, que taxiava sob o título Por acaso, cidade compra aeronave reserva de JK:

Uma compra sem maiores pretensões acabou se revelando um negócio de valor histórico, no interior de São Paulo. O prefeito de Araçariguama, Carlos Aymar (PFL), comprou da Varig, por R$ 80 mil, um Boeing DC3 de 30 m e instalou o aparelho numa praça da cidade de 13 mil habitantes, que nem sequer tem aeroporto.

A foto da aeronave, que Roldão também encontrou no Correio Braziliense, mostrava um depenado quadrimotor a hélice. Então nosso Mestre estranhou:

Sabe-se que o DC 3 era um velho bimotor fabricado pela Douglas Corporation, daí as iniciais. A Boeing é outra fábrica estadunidense de aviões. Logo, não pode existir um ‘Boeing DC 3’. E a matéria foi preparada por uma agência de notícias, tanto que Tribuna e Correio incorreram no mesmo erro… Afinal, que avião é esse?

Boa pergunta, Roldão, boa pergunta.

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Nota dez

A Folha de S. Paulo perguntou: O combate ao crime organizado requer um endurecimento da legislação penal?

O jurista Adílson Abreu Dallari, professor da PUC-SP, respondeu sim:

(…) as mudanças necessárias são sempre bloqueadas por uma concepção desmedida e facciosa dos chamados direitos humanos, do que resulta formidável proteção aos facínoras, como se fossem os únicos titulares de direitos humanos ilimitados. Mas não existe direito absoluto, ilimitado. Os direitos humanos, exatamente por serem direitos, são necessariamente limitados. Além disso, não é possível ignorar que cada cidadão tem também deveres sociais, cujo descumprimento deve gerar sanções.

Leia no Blogstraquis a íntegra do excelente e oportuno artigo.

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Errei, sim!

‘LOCAL DO CRIME – Título da página de polícia do Diário Popular, de São Paulo: Agente leva seis tiros na padaria. Meu secretário teve pena: ‘Considerado, coitado do agente; não vai poder sentar por muito tempo’. Resolvi ler detalhes do infausto acontecimento e lá estavam: ‘O agente (…) recebeu seis tiros em várias partes do corpo – fígado, barriga, rins e perna esquerda – numa discussão por motivos banais’. A tal padaria, no caso, era apenas o local do crime.’ (maio de 1993)

Colaborem com a coluna, que é atualizada às quintas-feiras: Caixa Postal 067 – CEP 12530-970, Cunha (SP) ou moacir.japiassu@bol.com.br).

(*) Paraibano, 64 anos de idade e 44 de profissão, é jornalista, escritor e torcedor do Vasco. Trabalhou no Correio de Minas, Última Hora, Jornal do Brasil, Pais&Filhos, Jornal da Tarde, Istoé, Veja, Placar, Elle. E foi editor-chefe do Fantástico. Criou os prêmios Líbero Badaró e Claudio Abramo. Também escreveu oito livros, dos quais três romances.’



INTERNET
Mario Cavalcanti

O fenômeno YouTube.com, 18/07/06

‘Quem diria que um site lançado há cerca de um ano e meio e sem grandes pretensões se tornaria em pouco tempo um dos serviços mais aclamados da Internet. Fundado em 14 de fevereiro de 2005 com a deliciosa proposta de ser um portal social de vídeo alimentado pelos próprios usuários – filosofia, aliás, gravada na chamada Web 2.0 (que coloca usuário/leitor e informação em primeiro plano) -, o YouTube.com – com seu slogan ‘Broadcast yourself’ (algo como ‘Transmita você mesmo’) – é considerado hoje um fenômeno no meio online e já chama a atenção das mídias.

No último fim de semana, Chad Hurley, co-fundador do YouTube, foi uma das atrações em um evento anual organizado pelo banco Allen & Co e que tem por objetivo, segundo o site Blue Bus, reunir a elite da mídia americana para discutir tendências. Hurley fez uma apresentação no encontro, que contou com a presença de cerca de 250 grandes bandeiras de mídia e de tecnologia, incluindo altos executivos de empresas como News Corp e Time Warner e nomes como Bill Gates e Rupert Murdoch.

Não é à toa o interesse dos gigantes da mídia pelo serviço. Ainda esta semana, o YouTube declarou servir 100 milhões de vídeos por dia, ou seja, são assistidos em média 100 milhões de vídeos diariamente através dele. Além disso, segundo a agência de notícias Reuters, os vídeos postados no serviço já representam 60% do total de vídeos assistidos online. Números assustadores, que, ainda de acordo com a agência, já tornam o YouTube o maior site desse segmento nos Estados Unidos, com 29% do mercado multimídia daquele país.

Quem tem tais números em mente são a NBC e o New York Times. Recentemente, os dois deram passos que mostram a importância do YouTube – e não só dele, mas também de outras redes sociais de informação, como o Digg.com, o Overmundo e o Google Video – para o novo cenário do meio online. Há cerca de uma semana, o NYTimes.com – que vem fazendo uma grande aposta em coberturas multimídia -, por não ter vídeos da famosa cabeçada dada pelo atacante francês Zidane no zagueiro italiano Marco Materazzi na final da Copa do Mundo, o diário virtual criou um link para um vídeo da agressão que havia sido postado no YouTube. A manobra chamou a atenção dos que cobrem mídia. Tanto quanto o acordo da NBC assinado com o portal de vídeos para armazenar clipes promocionais da emissora. O curioso na questão da NBC é que esta, em fevereiro deste ano, havia forçado o YouTube a retirar vários dos programas televisivos dela que haviam sido transferidos por usuários sem permissão. O acordo parece ter sentido o cheiro do sucesso do portal.

Apesar de já ser uma febre no mundo todo, o YouTube – junto com suas possibilidades e utilidades – ainda está sendo descoberto por muitos. Mas ele já carrega aquilo que se espera dos novos serviços digitais. Em sumo, mais que um ‘simples’ entretenimento, o serviço está se tornando uma grande fonte de informação, um bom recurso a ser explorado por parte dos veículos online. Até a próxima!

(*) Trabalha com conteúdo online desde 1996 e já passou por empresas de renome na Internet. Foi editor do AQUI!, extinta revista virtual do Cadê?, editor do canal Digital do portal StarMedia e coordenador de operações do Prêmio iBest. Realizou seminários e ministrou diversas palestras sobre jornalismo digital. Em fevereiro de 2000, criou o site Jornalistas da Web(JW), primeira publicação virtual brasileira sobre jornalismo online e cibercultura. Em 2005, criou e implantou a Biblioteca de Comunicação Digital e Cibercultura (BCCD) no campus 3 das Faculdades Integradas Hélio Alonso – FACHA, no Rio de Janeiro. Atualmente, Cavalcanti é pesquisador de mídias digitais e editor de conteúdo do JW.’

A mídia spam

José Paulo Lanyi, 20/07/06

‘Um amigo jornalista me escreve para pedir que comente um texto interessante que recebeu por e-mail. Politicamente incorreto, diz ele. Desses que nenhum veículo tradicional publicaria ou leria no ar. A conversa deriva para a mídia spam. Sim, uma mídia. Um e-mail é apenas uma mensagem. Centenas, milhares de mensagens têm o que se chama de audiência, e significativa. Não se esqueça, portanto: spam é uma mídia.

Em tempos de eleição os marketeiros levam-na a sério. Exemplo: é piadinha pra cá, outra pra lá, sempre com segundas intenções. Ridicularizar é transferir votos, no mínimo subtraí-los.

Feita a ressalva, meu colega faz uma defesa do famigerado e injustiçado spam- esse que tantos desprezam: é também, sublinha ele, uma forma de divulgar o que o establishment não gostaria de que fosse dito.

Texto corrido, nada de links, como os das gostosas, ou da amiga que faz tempo que você não vê, ou do seu nome no Serasa, ou do CPF inválido, ou do comunicado da Receita, ou do título eleitoral cancelado- todas essas formas de engambelar, com o único fito de chegar à senha da sua conta bancária.

Spam também pode ser cult. Impopular ele já é, o que ajuda. Quanto ao conteúdo, você sabe, tem de tudo- e sem filtro de editor. Dos lampejos de gênio aos soluços da mediocridade. Humano, demasiado humano.

Aí vai o texto apócrifo que o jornalista me mandou. Está circulando há tempos- não sei quanto (anos, talvez?). Concordo em parte, discordo em outra. Nem sim, nem não, muito pelo contrário. Mas faz pensar.

Divirta-se, chore ou faça as duas coisas.

‘Mentiras institucionalizadas

1 – ‘Brasileiro é um povo solidário’- Mentira!

O brasileiro é um povo trouxa. Pagar 40% de sua renda em tributos e ainda dar esmola pra pobre na rua ao invés de cobrar do governo uma solução pra pobreza; aceitar que ongs de ‘direitos humanos’ fiquem dando pitaco na forma como tratamos nossa criminalidade; não protestar cada vez que o governo compra um colchão pra um presidiário que queimou o dele de propósito não é coisa de gente solidária. É coisa de gente trouxa (e burra).

2 – ‘Brasileiro é um povo alegre’. Mentira!

Brasileiro é bobo alegre. Fazer piadinha com as imundícies que acompanhamos todo dia é o mesmo que tomar bofetada na cara e dar risada. Depois de um massacre que durou quatro dias em São Paulo, ouvir o José Simão fazer piadinha a respeito e achar graça é o mesmo que contar piada no enterro do pai. Brasileiro tem um sério problema. Quando surge um escândalo, em vez de protestar e tomar providências como cidadão, ele ri como um cavalo.

3 – ‘Brasileiro é um povo trabalhador’. Mentira!

O brasileiro é vagabundo por excelência. O brasileiro tenta se enganar, fingindo que os políticos que ocupam cargos públicos no país surgiram de Marte e pousaram lá, quando na verdade eles são oriundos do povo. O brasileiro, ao mesmo tempo que fica indignado ao ver um deputado receber 20 mil por mês pra trabalhar 3 dias e coçar o saco o resto da semana, também sente inveja e sabe – lá no fundo – que se estivesse no lugar dele faria o mesmo. Um povo que se conforma em receber uma esmola do governo de 90 reais mensais pra não fazer nada e não aproveita isso para alavancar sua vida (realidade da brutal maioria dos beneficiários do ‘bolsa família’) não pode ser adjetivado de outra coisa que não vagabundo.

4 – ‘Brasileiro é um povo honesto’. Mentira!

Já foi, hoje é uma qualidade em baixa. Se você oferecer a um policial europeu 50 euros para ele não te autuar, provavelmente irá preso. Não porque poderá ser pego, mas porque é errado. Na minha profissão, convivo com pessoas de diversos países da Europa e também com americanos. Tenho que provar sempre que sou diferente do brasileiro pq todos têm uma história de pilantragem de brasileiro cometida lá fora. O brasileiro, ao mesmo tempo em que fica indignado com o mensalão, pensa intimamente, o que faria se arrumasse uma ‘boquinha’ dessas, quando na realidade isso não deveria sequer passar por sua cabeça.

5 – ‘90% de quem vive na favela é gente honesta e trabalhadora’.

Mentira! Já foi. Historicamente, as favelas se iniciaram nos morros cariocas quando os negros e mulatos retornando da Guerra do Paraguai ali se instalaram. Naquela época quem morava lá era gente honesta, que não tinha outra alternativa e não concordava com o crime. Hoje a realidade é diferente. Muito pai de família sonha que o filho seja aceito como ‘aviãozinho’ do tráfico para ganhar uma grana legal. Se a maioria da favela fosse honesta, já teriam existido condições de se tocar os bandidos de lá pra fora porque podem matar 2 ou 3 mas não milhares de pessoas. Além disso, cooperariam com a polícia na identificação de criminosos de forma que eles não sentissem segurança de montar suas bases de operação nas favelas.

6 – ‘O Brasil é um pais democrático’.

Mentira! Num país democrático a vontade da maioria é lei. A maioria do povo acha que bandido bom é bandido morto, mas sucumbe a uma minoria barulhenta que se apressa pra dizer que um bandido que foi morto em uma troca de tiros foi ‘executado friamente’. Em um país onde todos têm em direitos mas ninguém tem obrigações não existe democracia e sim anarquia. Em um país em que a maioria sucumbe bovinamente a uma minoria barulhenta, não existe democracia, mas um simulacro hipócrita. Se tirarmos o pano do ‘politicamente correto’, veremos que vivemos em uma sociedade feudal. Um rei que detém o poder central, seguido de duques, condes, arquiduques e senhores feudais (ministros, deputados, senadores, prefeitos, vereadores, etc)… todos sustentados pelo povo que paga tributos que tem como único fim o pagamento de seus privilégios. E ainda somos obrigados a votar…

Que democracia é essa?’

Como o Google está aí para ser usado, dei uma fuçada e deparei com a suposta autoria dessa pensata: um engenheiro brasileiro chamado José Starling, residente em Long Island, Estados Unidos. Será…?

(*) Jornalista, escritor, ator, é autor de quatro livros, um deles com o texto teatral ‘Quando Dorme o Vilarejo’ (Prêmio Vladimir Herzog). No jornalismo, tem exercido várias funções ao longo dos anos, na allTV, TV Globo, TV Bandeirantes, TV Manchete, CNT, CBN, Radiobrás e Revista Imprensa, entre outros. Tem no currículo três prêmios em equipe: Esso e dois Ibest. Nascido em Brasília, filho de um oficial do Exército e de uma artista plástica, é paulistano de coração e torcedor de um clube do Rio de Janeiro: o Vasco da Gama – time que escolheu aos sete anos, quando morava no Rio Grande do Sul.’



MERCADO DE TRABALHO
Eduardo Ribeiro

A semana em destaque, nas redações, 19/07/06

‘Enquanto o pau come solto entre os que são a favor e os que são contra o novo Projeto de Lei Complementar (PLC) 079/2004, que atualiza as funções privativas de jornalistas, o mercado segue o seu curso com muitas novidades, seja no campo do vaivém profissional, seja nos lançamentos e também com notas tristes, como veremos.

No campo do vaivém, tivemos nos últimos dias mexidas que envolvem alguns nomes muito conhecidos dentro do jornalismo. Um deles é o de Paulo Totti, que vai deixar no próximo dia 31 de julho o cargo que ocupa na Comunicação do BNDES para regressar às redações, como repórter especial do Valor Econômico, trocando o Rio por São Paulo. Antes, cumpre uma quarentena voluntária de um mês. Será sucedido no cargo por Paulo Braga, atual correspondente do Valor em Buenos Aires, que chamado pelo jornal para voltar ao Brasil foi interceptado no meio do caminho pelo convite do Banco. A vaga dele, na capital argentina, será ocupada por Janes Rocha, que cobre a área financeira no jornal.

Outro que está de trabalho novo, fresquinho, é Luiz Carlos Ramos, que todos aprendemos a ler no Estadão, onde esteve por cerca de 36 anos, ocupando as mais diversas funções. Luiz Carlos aceitou convite da Rádio Capital e assumiu a Direção de Jornalismo da emissora, cargo que não o impedirá de continuar lecionando Jornalismo na PUC-SP nem de permanecer como professor de outros cursos, como o de Focas, no Estadão, e de Jornalismo Esportivo, no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo.

Na seara da televisão, uma das mudanças de maior repercussão foi a saída de Celso Zucatelli da TV Cultura, onde estava desde março de 2002, para integrar-se à equipe de jornalismo da Record, onde terá múltipla atuação (nem todas ainda conhecidas). Com sua saída, Márcia Dutra, que com ele dividia a bancada do Jornal da Cultura ganhou a companhia de José Donizete, experiente repórter que volta a atuar como apresentador, a exemplo do que já havia feito na própria Cultura entre 1995 e 2000, quando apresentou programas como Plantão Cultura, Opinião Nacional e jornal 60 Minutos. Da mesma equipe da Cultura, que semanas atrás foi reforçada com a contratação de quase 20 profissionais, vindos em sua maioria da TV Gazeta, saíram vários profissionais, dentro do processo de reformulação realizado pelo novo diretor de Jornalismo Albino Castro. São esses os casos do ex-diretor de Jornalismo Pola Galé, do apresentador Éderson Granato, dos editores Leandro Dizziolli e Maria Emília e dos repórteres Bruno Mascarenhas, Cláudia Picchi, Alessandra Descenso e André Ribeiro (do Esporte).

Tivemos ainda a extinção da editoria Suas Contas, do Estadão, e a conseqüente saída de cinco dos sete profissionais que ali trabalhavam (Tom Morooka, Andrea Botelho, Cássia Carolinda, Érica Polo e Paulo Pinheiro); a saída do Carlos Franco, repórter especializado em Comunicação, Propaganda e Marketing, do mesmo Estadão, onde, em duas passagens, ele trabalhou por cerca de 12 anos; a ida de Suzana Barelli para a revista Prazeres da Mesa, como redatora-chefe; o acerto de Cassiano Elek Machado, redator-chefe da revista Trip, com a nova revista Piauí, o que o obrigará a trocar São Paulo pelo Rio de Janeiro, em agosto, mês em que a revista será lançada.

Na internet o destaque é o lançamento do site Revista de Automóvel, tendo como diretores-fundadores os experientes Mário Pati (ex-Diário de S.Paulo) e Caio Moraes (ex-Autoesporte).

Outra boa notícia vem da Editora Bregantini, de Daisy Bregantini, que edita a revista Cult. A empresa venceu a concorrência para editar a revista De mulher para mulher, das Lojas Mariza, que será bimestral, com tiragem de 500 mil exemplares.

As notas tristes ficaram por conta de quatro mortes registradas nos últimos dias: a do designer gráfico italiano Vincenzo Scarpellini, aos 41 anos, e do assessor de imprensa Éder de Lima Pinto (da Edelman), aos 42 anos – ambos em São Paulo; a do assessor de Comunicação Antônio Beluco Marra (da Câmara dos Deputados), aos 66 anos, em Brasília; e a do presidente do Sindicato dos Jornalistas de Roraima, Humberto Constantino de Andrade e Silva, aos 50 anos.

(*) É jornalista profissional formado pela Fundação Armando Álvares Penteado e co-autor de inúmeros projetos editoriais focados no jornalismo e na comunicação corporativa, entre eles o livro-guia ‘Fontes de Informação’ e o livro ‘Jornalistas Brasileiros – Quem é quem no Jornalismo de Economia’. Integra o Conselho Fiscal da Abracom – Associação Brasileira das Agências de Comunicação e é também colunista do jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, além de dirigir e editar o informativo Jornalistas&Cia, da M&A Editora. É também diretor da Mega Brasil Comunicação, empresa responsável pela organização do Congresso Brasileiro de Jornalismo Empresarial, Assessoria de Imprensa e Relações Públicas.’



TELEVISÃO
Antonio Brasil

TV ao vivo é muito perigoso, 17/07/06

‘Sempre acreditei no poder da TV. Mas também sempre fiz questão de dizer que TV de verdade é TV o vivo. VT é TV ao contrário. Pode aprimorar a qualidade técnica de som e imagem, mas não garante conteúdo e muitas vezes compromete sua principal característica: a imediaticidade. Ou seja, a televisão pode e deve mostrar o mundo ao como ele é de verdade. Mas TV ao vivo também pode ser muito perigosa. Sem censura, manipulação ou edição pode revelar uma realidade que desagrada os poderosos. Uma realidade com mais erros do que acertos.

No esporte, por exemplo, frente às câmeras de uma TV ao vivo, em uma fração de segundos, dribles mágicos e consagradores se transformam em cabeçadas vexatórias e eternas. Sem o controle da edição, estrelas e heróis se tornam vilões ou traidores.

Na política não é muito diferente. Durante as campanhas eleitorais, a TV ao vivo pode consagrar candidatos desconhecidos e crucificar políticos poderosos e até derrotar candidatos considerados favoritos. TV ao vivo é muito poderosa. Mas ainda guarda segredos. Consegue surpreender atém mesmo aos maiores especialistas do meio. Cria e destrói mitos com enorme facilidade.

Para o bom observador, a TV ao vivo pode revelar o caráter e até mesmo os mais profundos segredos da alma de políticos ambiciosos. É só uma questão de atenção e oportunidade. Qualquer deslize condena ou consagra. TV ao vivo é muito misteriosa. Não é a toa que muitos profissionais temem o enorme poder dessa TV sem controle.

O ‘vivo’ vicia

Fazer TV ao vivo é muito difícil. Infelizmente, deveria, mas ainda não se aprende na escola. Há muitos anos tento ensinar como fazer TV ao vivo. Nada é mais excitante do que uma entrada ao vivo. Mas é muito difícil sem ter uma televisão. Aqui no Rio, por incrível que pareça, após quase 10 anos no ar, nenhuma das TVs dita universitárias transmite sequer um segundo ao vivo. Dizem que não têm condições. Mas nós sabemos que TV ao vivo é muito perigoso. Principalmente, uma televisão ao vivo na mão de professores ou alunos.

Mas também há quem adore e não consiga viver longe. Dizem que fazer TV ao vivo é adrenalina pura. Outros dizem que o ‘vivo’ vicia. Requer talento ou instinto. Não tenho certeza. Pode ser. Mas, certamente TV ao vivo consagra ou condena.

Essa forma de fazer televisão de verdade também é responsável por muitas mentiras, erros e injustiças. Mas quando acerta TV ao vivo é simplesmente imbatível e insuperável. Nada se compara ao poder de mobilização ou de transformação uma frase de efeito transmitida ao vivo para milhões de telespectadores. Promessas se transformam em contratos e mentiras garantem derrotas. Muitos políticos gostariam de simplesmente eliminar ou pelo menos controlar esse enorme poder da TV ao vivo.

Esta semana, destaco algumas notícias nacionais e internacionais que representam grande ameaça ao poder da TV de transmitir o mundo ao vivo.

Multas e obcenidades

Nos EUA, o FCC, a central de controle das telecomunicações, anunciou esta semana punições e medidas ainda mais rigorosas contra as redes de TV americanas que transmitam ‘obcenidades’ ou meros palavrões em suas transmissões ao vivo. Eles exigem o direito de vasculhar os tapes das transmissões ao vivo para verificar o conteúdo e responsabilizar as TVs americanas. Isso significa que nem mesmo os gritos espontâneos das torcidas ou os comentários dos narradores estariam livres de punições. Muitos acreditam que isso é só o começo de uma caça às bruxas nas transmissões ao vivo das TVs americanas. A desculpa oficial é a proteção dos valores da família americana durante os eventos esportivos. Mas os analistas americanos já perceberam que o verdadeiro alvo dessas novas medidas são os programas jornalísticos ao vivo. Há muitos anos, as autoridades do governo americano exigem maiores restrições na programação ao vivo das redes de TV e ameaçam os telejornais ao vivo. Principalmente em relação a noticias ou vazamento de notícias que comprometam a ‘segurança nacional’, ou seja, a segurança do próprio governo ou a luta contra o terrorismo internacional. Ou seja, qualquer notícia. A TV ao vivo pode ser uma grande ameaça para os governo autoritários.

No Brasil, já vivemos algo muito semelhante durante os anos de chumbo da ditadura. Na época, o Jornal Nacional ‘parecia’ ao vivo. Mas era pré-gravado e censurado pelos militares. O público não percebia ou sequer era avisado de que o telejornal não era ao vivo. Os americanos têm até mesmo um nome para essa técnica de transmissão ao vivo de mentirinha: ‘look live’, ‘parece ao vivo’ ou algo semelhante. Tanto faz. A verdade é que é uma mentira televisiva.

Debates presidenciais

A outra notícia sobre as ameaças da TV ao vivo ficam por conta da cartilha ou decálago para esfriar a campanha divulgada pelo O Globo desta segunda-feira.

‘Com medo de expor o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a campanha eleitoral, o comando do PT recomenda uma verdadeira lei da mordaça ao candidato:

A destacar:

– Não expor o candidato a situações de risco

– Evitar dar entrevistas e fazer coletivas

– Só falar com a imprensa quando tiver um tema específico e definido pela campanha

E o mais importante…

– Não participar de debates.

TV ao vivo é muito perigoso

A explicação ou desculpa dos marqueteiros do PT é de que o ‘outro’ presidente, o FHC teria feito exatamente a mesma coisa na última campanha. É, novamente, pode ser. Nada muda ou mais do mesmo. Talvez essa fosse a hora de revermos os debates na TV durante a última campanha para conferirmos os protestos dos candidatos pela ausência do presidente. A memória da TV, principalmente de uma TV ao vivo durante as campanhas eleitorais seria uma arma política poderosa para evitarmos cometer os mesmos erros do passado. Não é a toa que os políticos americanos e brasileiros temem tanto o poder da televisão.

Querem mais um exemplo do poder e das ameaças da TV ao vivo?

Destaque do noticiário da FSP:

Após acusação de exagero, TV adota tom ‘light’

‘As TVs, acusadas pela polícia de ajudar a criar o clima de pânico em São Paulo nos ataques de maio do PCC, adotaram ontem um tom mais ‘light’ na cobertura da nova onda de atentados. Desta vez, não alteraram suas programações para manter repórteres ao vivo horas a fio. A Record decidiu cancelar em cima da hora um programa especial sobre os atentados que seria levado ao ar no fim da tarde’.

Além das nossas fronteiras, nos intermináveis conflitos do Oriente Médio, o poder da TV ao vivo é enfrentado com bombas. Segundo noticias das agencias internacionais publicadas no Estadão (ver aqui)

‘Sede da TV do Hezbollah é destruída, mas canal segue transmitindo’.

‘A sede do canal de TV Al-Manar, órgão do grupo radical xiita Hisbolá, no sul de Beirute, foi destruída, disseram testemunhas à rede de televisão Al Jazira. O diretor da Al Jazira em Beirute, Ghassan binYedou, viu o edifício da TV em chamas após ser atingido por um ou vários mísseis israelenses. Segundo ele, o prédio ficou ‘completamente destruído’.Aparentemente, o canal Al-Manar tem estúdios subterrâneos para continuar com suas transmissões.’

Ou seja, em qualquer lugar do mundo, fazer TV ao vivo, assim como viver ou simplesmente dizer a verdade, mais do que nunca, é muito perigoso.

(*) É jornalista, professor de jornalismo da UERJ e professor visitante da Rutgers, The State University of New Jersey. Fez mestrado em Antropologia pela London School of Economics, doutorado em Ciência da Informação pela UFRJ e pós-doutorado em Novas Tecnologias na Rutgers University. Trabalhou no escritório da TV Globo em Londres e foi correspondente na América Latina para as agências internacionais de notícias para TV, UPITN e WTN. Autor de diversos livros, a destacar ‘Telejornalismo, Internet e Guerrilha Tecnológica’ e ‘O Poder das Imagens’. É torcedor do Flamengo e não tem vergonha de dizer que adora televisão.’



VIDA DE JORNALISTA
Cassio Politi

Sem credencial, repórter cobre Guga em Paris, 21/07/06

‘O jornalista conseguiu comprar um ingresso. O desafio era, então, entrar no complexo de Roland Garros, onde Gustavo Kuerten, o Guga, jogava bem.

– Que aparelho é esse? – perguntou o segurança, no portão de entrada, em inglês.

– É um gravador.

– Mas gravador não pode entrar.

– Por que não?

– Porque você não tem credencial de jornalista.

– Olha aquele monte de gente entrando com máquina fotográfica.

– Sim, e daí?

– Alguns gostam de bater fotos. Eu gosto de usar meu gravador para captar o som da torcida. Faço sempre isso: ligo o gravador para ouvir o som dos aplausos e do jogo.

O segurança pensou um pouco e autorizou a entrada. Era junho de 2000, em Paris. Horas depois, Sérgio Patrick entrava no ar na Rádio Bandeirantes, com direito a entrevista do tenista brasileiro, que só ele e a TV Globo conseguiram. Seria, aliás, a primeira de uma série de façanhas em apenas três dias.

* * * * *

A chefia escalou Patrick para acompanhar, a partir dos estúdios da Bandeirantes em São Paulo, o torneio de Roland Garros, um dos quatro mais importantes do tênis mundial. Nas oitavas-de-final, Guga passou por Nicolas Lapentti, do Equador, por três sets a zero. O Brasil começava a acreditar que o catarinense pudesse repetir a façanha de 1997, quando foi campeão do mesmo Grand Slam da França.

A determinação veio do diretor de Jornalismo, José Carlos Carboni, diretamente ao repórter.

– Se o Guga vencer o próximo jogo, você vai para Paris hoje à noite.

O próximo jogo era entre Guga e o russo Yevgeny Kafelnikov. O brasileiro venceu o primeiro set e perdeu os dois seguintes. O jornalista quase teve um enfarte. No quarto set, Guga reagiu e venceu por 6/4. E venceu também o quinto por 6/2. Era hora de deixar o estúdio arrumar as malas.

Cadê meu passaporte?

O vôo para Paris sairia naquela noite mesmo. O repórter deixou a rádio, no Morumbi, em São Paulo, e correu para casa. ‘Eu não achava meu passaporte em lugar nenhum’. Depois, lembrou que seu passaporte, assim como os de todos os membros da equipe, estava na própria rádio.

Horas depois, desembarcava em Paris, já a caminho do complexo de Roland Garros, na véspera da semifinal, contra o espanhol Juan Carlos Ferrero. A Bandeirantes passava a ser a única rádio brasileira no evento. Era preciso entrevistar Guga o quanto antes.

Um gravador, uma credencial

O desafio era entrar em Roland Garros. A saída foi comprar ingresso de um cambista, por 200 francos (cerca de 40 dólares). Em seguida, foi obrigado a convencer o segurança a permitir a entrada do gravador.

Como sempre acontece, os tenistas treinam em quadras secundárias de Roland Garros. Guga estava em uma delas. O jornalista caminhou um pouco e avistou Rafael Kuerten, irmão mais velho do tenista. Procurou, então, a assessora de imprensa, Diana Gabanyi.

– O Guga não vai dar entrevista por causa de uma matéria que saiu no jornal O Globo.

– Mas eu sou de rádio. Não tenho como mudar o que ele disser.

Não convenceu. Mas Guga deixou a quadra e foi obrigado a passar pelos corredores que se formam entre as quadras. João Pedro Paes Leme, da TV Globo, se aproximou, fez uma pergunta e apontou o microfone para o tenista, que respondeu. Patrick se aproximou e ligou o gravador. Pegou uma carona na entrevista. Pronto. O dia estava salvo.

Escada de imprensa

Sexta-feira, 10 de junho de 2000. Guga e Ferrero se enfrentariam na semifinal. Patrick comprou novo ingresso e se juntou à torcida, empunhando um celular. A brecha para entrar no ar na Bandeirantes, via celular, surgia a cada dois games, quando os tenistas descansam rapidamente e trocam de lado na quadra.

Acontece que, além de exigir absoluto silêncio, a organização dos grandes torneios de tênis proíbe a circulação de pessoas na platéia. É uma forma de garantir o silêncio, fundamental para a concentração dos tenistas. Com essas regras, as extremidades das fileiras de assentos ficam bloqueadas, com pequenas correntes. A cada dois games, uma fiscal abre as correntes e as fecha instantes antes de o game seguinte começar.

‘Eu falei para a fiscal que tinha de falar no telefone a todo instante por causa de um problema grave na minha empresa. Ela me autorizou a assistir ao jogo sentado na escada. Eu corria para a escada que fica do lado de fora da quadra e entrava no ar’. O apresentador da Bandeirantes naquele momento era Ricardo Capriotti.

Entrevista

Guga derrotou Ferrero, novamente de virada, por 3 sets a 2. Estava na final, que seria no domingo, dia dos namorados no Brasil. Após o jogo com Ferrero, Patrick correu para a porta que dava acesso à área de coletiva. Precisava dar um jeito de gravar o que o tenista dizia.

Uma correspondente brasileira na França, chamada Taís, foi a salvação. Patrick pediu a ela que colocasse seu gravador na mesa. Ela concordou. Menos de uma hora depois, lá estava ela de volta. A segunda entrevista da viagem à Europa estava salva.

Enganado na final

Domingo, final de Roland Garros entre Guga e o sueco Magnus Norman. Patrick já tinha o manual de como entrar como torcedor, falar da arquibancada e conseguir entrevistas.

Dessa vez, quando foi entrar, descobriu que o ingresso que acabara de comprar de um cambista dava direito a entrar no complexo de Roland Garros, mas não na quadra central. ‘Voltei e achei o cambista. Tive de pagar mais cem francos, que equivalia a uns vinte dólares, para conseguir o ingresso certo’.

Daí para frente, foi só repetir as entradas no ar direto da escada que dá acesso às fileiras. O brasileiro venceu os dois primeiros sets, perdeu o terceiro e quase matou os brasileiros do coração no quarto. Estava 6 a 6. No tie break, Guga errou aqui, acertou ali e, no final, venceu por 8 a 6 e se tornou bicampeão.

Sem entrevista

A mágoa de Guga com a imprensa parecia ter passado. O problema não era mais esse. Patrick precisava novamente de um colega que levasse o gravador até a sala de imprensa. Um cinegrafista aceitou ajudá-lo. Terminada a entrevista, ele voltou com a bomba.

– Fui colocar o gravador, mas não consegui. Uma pessoa me perguntou: ‘você é cinegrafista ou repórter?’. Me desculpe.

Patrick sentiu um calafrio. Já fazia duas horas que o jogo, transmitido ao vivo pela TV brasileira, tinha terminado. Como resgatar a fala do campeão? No complexo, conheceu uma francesa chamada Monique, que sugeriu que ele fosse até a Radio France Internationale. ‘Fui até a rádio, que fica perto da Torre Eiffel, e capturei a coletiva inteira’.

Alô, Patrick

Intervalo de jogo em São Paulo. Sérgio Patrick é chamado direto de Paris, num dia de festa para Guga. Ele entra no ar, descreve a festa e coloca as sonoras com Gustavo Kuerten. Trabalho típico de um enviado especial. Por essa e por muitas outras, Sérgio Patrick é hoje, seis anos depois, coordenador da equipe de Esportes da Rádio Bandeirantes.

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(*) Cassio Politi é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero. Atuou como videorrepórter de matérias de Cidades e Especiais no Uol News, comandado por Paulo Henrique Amorim até 2004. Trabalha com Internet desde 1997. Esteve em projetos pioneiros em jornalismo na Web, como sites da Zip.Net. Ministra cursos de extensão há cinco anos e deu aulas em 24 estados brasileiros para quase 2 mil jornalistas e estudantes de Jornalismo. Atualmente, tem suas atenções voltadas para a área de Marketing. Ocupa o cargo de Diretor da Escola de Comunicação, a unidade de cursos e seminários do Comunique-se.’



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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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