Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

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LEITURAS DE VEJA
Leonardo Attuch

Síndrome de Ricupero na revista Veja, 16/02/06

‘Aconteceu em 1994. Numa conversa off the records com o jornalista Carlos Monforte, captada apenas por antenas parabólicas, o embaixador Rubens Ricupero, então ministro da Fazenda, cunhou uma frase inesquecível. ‘Eu não tenho escrúpulos: o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde’, disse ele, referindo-se aos índices de inflação. Ricupero pela primeira vez parecia inebriar-se com o poder, revelando um aspecto sombrio de sua personalidade. Esse raro tropeço verbal, cometido por um homem de grandes qualidades, custaria sua demissão.

A história de Ricupero me marcou por duas razões. Primeiro porque, na época, eu trabalhava na Veja, como repórter da sucursal Brasília, e nunca antes havia percebido quão intensa era a fome dos chacais da revista diante de mais uma presa. O sangue parecia escorrer pela boca dos editores da revista – e isso, de certa forma, me embrulhava o estômago. Em segundo lugar, eu era amigo de Bernardo, um dos filhos de Ricupero, de quem acabei me afastando após o episódio da parabólica.

Foram necessários 12 anos para que eu me desse conta de que o comportamento da revista Veja é muito parecido com o do ex-ministro da Fazenda naquele episódio. O mandamento ‘o que é ruim a gente esconde’ parece cair como uma luva para a Abril. Senão, vejamos:

* No início de janeiro, eu publiquei o livro ‘A CPI que abalou o Brasil’ (editora Futura, R$ 24,90), que traz uma série de revelações sobre o PT e a imprensa brasileira. Narro, por exemplo, como foram os encontros entre Roberto Civita, dono da Abril, e alguns tesoureiros do PT, como Delúbio Soares e Ivan Guimarães, na época em que se discutia o Pró-Mídia. Questiono ainda os métodos investigativos de vários profissionais de renome da Veja, apontando situações em que a barganha pelo furo se aproxima de uma chantagem.

* Duas semanas atrás, o livro conseguiu entrar nas relações de ‘mais vendidos’ das revistas Veja (edição com data de 8 de fevereiro) e Época (edição com data de 6 de fevereiro). Era oitavo na Veja e sétimo na Época, na categoria não-ficção. Como as fontes das duas revistas são praticamente as mesmas redes de livrarias, há diferenças mínimas. Por isso, é admissível que surjam pequenas discrepâncias. Mas só pequenas, repito.

* O inacreditável, porém, ocorreu nesta semana. Na Época (edição de 13 de fevereiro), meu livro subiu para a quarta colocação entre os mais vendidos. Na Veja (edição de 15 de fevereiro), ele simplesmente desapareceu da relação de mais vendidos, assim como desapareciam os inimigos na Rússia stalinista. É, no mínimo, intrigante que o quarto livro mais vendido na lista da Época não seja sequer o décimo na Veja.

Diante do que aconteceu, permito-me fazer algumas perguntas. Será que existe um index librorum prohibitorum na revista Veja? Será que meu livro entrou na lista de mais vendidos da semana anterior por mero descuido de quem fechou aquela seção? Alguém terá comido mosca? É 100% confiável a lista de best-sellers da maior revista do País? São perguntas mais do que naturais. Afinal, não seria justo que algumas citações a profissionais da Abril no meu livro provocassem minha exclusão de uma lista que serve como referência para aquisições de vários livreiros e leitores espalhados pelo País. Ou será que bateu uma síndrome de Ricupero na Veja? Se isso for verdade, tomara que a pessoa que incluiu meu nome na lista de duas semanas atrás não tenha sido vítima de alguma represália. Seria injusto e infame.

(*) Editor das revistas Istoé Dinheiro e Dinheiro Rural, além de autor do livro ‘A CPI que abalou o Brasil’’



MERCADO EDITORIAL
Milton Coelho da Graça

Mao Tse-tung entendia muito de circulação, 17/02/06

‘O relatório do IVC sobre a circulação das publicações brasileiras em 2005 foi amplamente divulgado pelos jornais no dia 13 deste mês, mas creio que somente a Folha apresentou a curva dos resultados dos quatro maiores impressos entre 2000 e 2005. E esses números merecem uma reflexão mais cuidadosa por parte de empresas, profissionais e estudantes.

A Folha de S. Paulo passou de uma média diária de 440,7 mil exemplares em 2000 para 307,9 mil em 2005. Amigos, uma queda de 30%! E os três outros ‘grandes’ sofreram quedas também muito significativas: 15% (O Globo), 42% (Estadão) e Zero Hora (2,5%).

Tem muita coisa mais para pensarmos do que as matérias publicadas. Por que no Rio Grande do Sul os jornais conseguiram manter o interesse do público leitor? Por que Extra e Meia Hora mostram resultados bons no Rio, enquanto só o Jornal da Tarde, entre os três jornais populares paulistas, conseguiu manter sua média de circulação nesses cinco anos, enquanto os outros dois – Diário de São Paulo e Agora – ‘mergulham’ vertiginosamente com quedas de 47% e 33%.

Conto uma estorinha de 31 de dezembro de 1970, quando Luiz Carta, diretor editorial da Abril, me informou que a empresa decidira fechar a revista Placar, porque, em seis meses, perdera mais de dois terços da circulação e estava com pouco mais de 50 mil. A empresa estava se precipitando, a revista tinha imenso potencial – argumentei – e Luiz Carta me disse para continuar a conversa com toda a diretoria. E pediu a Victor Civita, Gordiano Rossi, Roberto Civita, Richard Civita e Edgard Silvio Faria que me ouvissem antes de sair para a festa do reveillón.

No ambiente severo da ampla sala de reuniões do quinto andar na Marginal, comecei a contar que, na reunião plena do Comitê Central do Partido Comunista Chinês em 1954, Mao Tse-tung havia mandado convidar representantes de todos os partidos comunistas latino-americanos e marcou uma reunião especial com todos eles. Em nome do grupo, um argentino levantou-se e começou uma sincera autocrítica dos erros cometidos desde o início da década de 20.

Eu podia sentir que todos estavam atônitos com o que eu contava e só não me interrompiam por curiosidade de saber o que Placar tinha em comum com Mao Tse-tung. (Aliás, o que também vocês devem estar pensando, desta vez em relação à circulação dos jornais hoje).

Enquanto o argentino falava, o intérprete falava junto à orelha de Mao e este acenava com a cabeça mostrando concordar com o que ouvia. Quando terminou essa dura confissão de erros, Mao fez um curto comentário e o intérprete o divulgou em sino-portunhol: ‘O camarada Mao gostou de tudo o que ouviu e acha que os partidos latino-americanos estão em ótima situação.’

O argentino se levantou e disse ao intérprete, como se gritasse com o juiz de um jogo do Boca Juniors: ‘O senhor errou tudo, eu disse examente que nada está bem, até hoje só fizemos besteira.’. O intérprete ouviu sem mudar o sorriso, debruçou-se novamente na orelha de Mao, ouviu com o mesmo sorriso e informou idem, idem: ‘Camarada, é exatamente o que falei antes. O camarada Mao acha que está tudo bem com os comunistas da América Latina. Vocês já cometeram todos os erros possíveis. Agora só podem acertar.’

Foi assim que competentes e bem-sucedidos líderes empresariais decidiram seguir a orientação de Mao Tse-tung, riram muito, me aplaudiram e me deram um prazo de 90 dias para elevar a 90 mil a circulação de Placar (conversa sobre salário ficou para o meio do ano).

Como La Fontaine, apenas contei uma fábula. Cada um escolha a moral que quiser.’

Eduardo Ribeiro

Jornal popular se prepara para expansão, 15/02/06

‘O jornal popular Aqui lançado com sucesso pelo condomínio dos Diários Associados em Minas Gerais está chegando a Brasília. A nova edição vai se chamar Aqui-DF e contará com uma equipe de 17 pessoas. Seguirá rigorosamente a fórmula de ser um produto barato, tanto na produção quanto no preço de venda, para poder alcançar o público a que se destina: a população de baixa renda. Daí a idéia do projeto de reaproveitar o conteúdo editorial dos vários veículos dos Diários, num jornal popular, feito por uma pequena equipe a um custo muito baixo.

O novo diário brasiliense será lançado em março com tiragem superior a 50 mil exemplares, focado, sobretudo, nos moradores das Cidades Satélites. E a experiência não vai parar por aí: o Grupo Diários quer fazer do Aqui o maior jornal popular do País e tem planos de lançar, no curto prazo, edições regionais também em Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Maranhão e Rio de Janeiro – praças onde já está presente de forma consolidada com outros títulos.

O projeto tem Direção Editorial de Josemar Gimenez e no caso do Aqui-DF a edição foi entregue ao Leonardo Albuquerque, que era anteriormente subeditor de Esportes do Correio Braziliense. Quatro dos cinco editores previstos também já foram contratados. São eles: Gustavo Cunha (ex-Jornal de Brasília), Felipe Campbel, Luiz Roberto Magalhães Jr e Juliana Borre. Também já estão trabalhando no projeto os repórteres Afonso Morais, Michela Luca e Izabel Toscano Vargas.

A redação do Aqui-DF vai funcionar dentro da própria redação do Correio Braziliense, mas com independência.

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Nova revista de motociclismo

Os 50 mil exemplares da nova revista de motociclismo da Editora Europa, MotoMax, desembarcam nas bancas de todo o território nacional nesta 6ª.feira (17/2), com 100 páginas de testes, ensaios, lançamentos e matérias sobre os diversos campeonatos de motociclismo espalhados pelo mundo. Segundo Roberto Araújo, diretor Editorial da Europa, ele próprio um aficionado do motociclismo (foi editor da revista 2 Rodas por quinze anos), o foco da revista vai ser o leitor, ‘com muita interatividade, inclusive no site, e espaços para colaborações, pois moto é coisa de turma e nós vamos reproduzir isso’.

Como prova dessa ‘tribalidade’ ele cita o fato de o redator-chefe, Gabriel Marazzi (que se despediu no final do ano da revista Carro, da Motorpress, para tocar esse projeto) também ter trabalhado na 2 Rodas, além de ser filho de Expedito Marazzi (já falecido), que deixou sua marca nessa área do jornalismo especializado; e do estagiário da redação, Rodolfo Melo, ser filho de Mário Melo, ex-presidente da Federação Paulista de Motociclismo. ‘Está no sangue’, diz Araújo.

A equipe é completada por Mário Fittipaldi (aqui, a afinidade com o tema é apenas homônima), editor de Qualidade, responsável pelo texto, e pelo designer Weelby Dantas, que criou o projeto gráfico. Além da MotoMax, que será mensal, a Europa tem pronto o projeto de uma outra revista, sobre carros, ainda sem previsão de lançamento. ‘Uma coisa de cada vez’, brinca Marazzi, que atende no 11-3038-5072 e e-mail marazzi@europanet.com.br .’



JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

Última mensagem, 16/02/06

‘‘Cortar os laços

desafiando a morte

serviço de homem

que não se rende’

(Talis Andrade in Sertões de Dentro e de Fora)

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Última mensagem

A maioria dos destinatários deve ter apagado do computador, como acontece nestes tempos de tanta necessidade aborrecida, porém o colunista, que o gesto humano n’alma escreve, manteve viva esta mensagem, a última do velho amigo Tales Alvarenga, resposta ao convite para a festa de aniversário do Jornal da Tarde:

Meus caros amigos,

Que saudade daquelas noites fagueiras que os anos não trazem mais!

Vou ter que ficar para o 41º aniversário, infelizmente. Tenho uma pequena cirurgia marcada para o dia 26 de janeiro, que vai me segurar no Einstein por uns três dias.

Obrigado pelo convite. Quero mandar um abraço para cada um de vocês, especialmente para aqueles com quem convivi todas as noites durante quatro anos.

Até a próxima, então.

Abs. Tales.

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Mau casamento

Janistraquis está convencido de que a carolice do técnico Jorginho derrotou o América na final da Taça Guanabara contra o Botafogo:

‘Considerado, ao substituir a figura do Diabo, tradicional símbolo do clube, por uma águia adventícia, Jorginho ofendeu o Lá de Baixo e oficializou na camisa do Ameriquinha o número um do jogo do bicho. E embora o sorteio do Barão de Drummond seja coisa do fute, não se pode atribuir a mesma importância ao criador e à criatura, né não?’

Não entendo muito dessas entidades que regem a vida brasileira, mas carolice e futebol, conquanto andem sempre juntos, não costumam dar bom casamento, ao contrário do que proclamam os partidários de São Jorge et alii.

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Que país!

O considerado Mário Lúcio Marinho envia carta de leitor publicada no jornal Zero Hora, de Porto Alegre:

Concurso — Não pude inscrever-me para o concurso público municipal de serviços gerais, pois não tinha segundo grau.

Pergunto se é engraçado ou desgraçado o país em que se exige segundo grau para um varredor de rua e não se exige o primeiro grau para ser presidente.

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Coisa ruim

O considerado Paulo José Cunha (Telejornalismo em Close, do Observatório da Imprensa, e apresentador do ‘Comitê de Imprensa’, da TV Câmara) lia as matérias do Portal da Comunicação quando deparou com um titulinho desses que não fariam feio se encontrados à beira das estradas, como alguns hilariantes que circulam na internet:

Plamarc lança campanha enaltecendo serviço que não presta mais.

‘É ‘sutileza’ demais, não é?’, comentou Paulo, que sugere a leitura da íntegra da matéria neste endereço: http://portaldacomunicacao.uol.com.br/web/textos.asp?codigo=15028

Janistraquis correu a ler, entusiasmadíssimo:

‘Considerado, desde a última campanha eleitoral do PT ninguém mais tinha enaltecido um serviço que não presta mais; quer dizer que o tal serviço já prestou e hoje é uma boa porcaria, né mesmo?’

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Casamento gay

A considerada Noêmia Barreiros Dias, de São Paulo, envia notinha da coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S. Paulo:

MESMO MORTO 1

Manifesto de repúdio às cenas de estupro e humilhação de mulheres negras pelo coronel Licurgo da minissérie ‘JK’ foi entregue na quarta ao governo federal, com 154 assinaturas. Para o movimento, as imagens ameaçam a auto-estima de mulheres e crianças negras.

Noêmia já perdeu a paciência com esse tipo de ‘reação’ e pergunta a Janistraquis:

Por que será que os movimentos negros sempre embarcam nessas canoas furadas? Informo que sou negra mas sei me comportar.’

Meu secretário diz que a explicação é simples, Noêmia:

‘Trata-se do casamento (gay) entre a burrice e a falta do que fazer, porque tanto esta quanto aquela não respeitam raça, partido político ou religião, etc., etc., e, evidentemente, contaminam todos os cretinos de plantão.’

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A casa certa

Janistraquis informava-se no excelente site do Meio & Mensagem quando os olhos foram atingidos gravemente por este duro golpe:

Verão Tim chega à Copacabana

[02/02 – 17:40] Circuito leva torneio de futevôlei e música eletrônica para areias da zona sul do Rio de Janeiro.

Meu secretário soltou formidável urro e depois falou:

‘Considerado, tá certo que o tal do Verão Tim vá pra Copacabana, porém a crase poderia muito bem ir pra casa do… ah, deixa pra lá!…’

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Pau barbado

Deu em O Fuxico, página de fofocas do UOL, bem acochadinho debaixo do título Globo esclarece — ‘Pênis’ que apareceu no BBB era protetor solar:

(…) A Globo divulgou em sua página oficial do BBB6 o caso polêmico sobre a suposta aparição do órgão sexual do candidato Dan (…) Segundo o canal, Dan decidiu se bronzear e sentou em uma espreguiçadeira. Com um protetor solar em punho, ele espalhou o produto por todo seu corpo e, de repente, ao ser chamado por alguém, colocou o protetor em sua barriga e virou-se para atender o apelo de quem o havia chamado.

Neste instante, a câmera o focalizou e pareceu que a tampinha do produto fosse seu órgão sexual.

Janistraquis, que já passou protetor solar com o dobro do tamanho, ficou perplexo:

‘Considerado, para ver aquilo e enxergar ‘aquilo’, é preciso estar muito carente, né não?’

É verdade. A coluna prescreve chá de pau barbado duas ou três vezes por dia.

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Tristeza

Sob o título Literatura complica 1.º dia da Unicamp, o considerado Haroldo Sereno de Andrade, de São Paulo, leu no site do Estadão:

Campinas (SP) – As questões de literatura complicaram a primeira prova da segunda fase do Vestibular 2006 da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), segundo disseram candidatos. Eles contaram que as perguntas exigiam leitura de vários livros indicados na lista do vestibular.

‘Não li nenhum’, confessou Lucas Juck Faustino Pereira, de 17 anos, que disputa uma vaga em Ciências Econômicas noturno.

Haroldo, sinceramente condoído, pergunta ao colunista:

Como fica o ânimo de um escritor ao ler a declaração do jovem analfabeto que pretende ‘estudar’ de noite para ficar o dia inteiro sem fazer nada?

Respondo com o silêncio de minha mais dorida tristeza…

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Obituário

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no Planalto, de cuja varanda aberta para o cenário da corrupção foi possível ver a sogra do Aldo Rebelo a exigir do genro algumas obras no apartamento que ocupa irregularmente, pois nosso Roldão lia o Correio Braziliense quando tropeçou nesta notinha do obituário:

Peter Benchley, escritor — Morreu no sábado, aos 65 anos, o escritor norte-americano Peter Benchley, autor do best seller Jaws (maxilares), obra que inspirou o filme Tubarão.

O escritor morreu … vítima de fibrose ideopática pulmonar. Além da novela Jaws, lançada em 1974, Benchley é autor dos livros (…)

Mestre Roldão,que não tem mais paciência pra dar ou vender, como sabemos, enviou os seguintes comentários à direção do jornal:

1. Best seller é expressão estrangeira, logo deve ser grafada em itálico, apesar do que diz o manual de redação do jornal.

2. Uma melhor tradução para Jaws seria mandíbulas.

3. Não consegui descobrir o que seria ‘ideopática’ na doença que matou o escritor.

4. As obras mencionadas são romances. Novela é uma tradução errada para o inglês novel.

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Nota dez

Antes de envergar a faixa de campeão da Taça Guanabara, o considerado e botafoguense Mestre Sérgio Augusto havia erguido mais um troféu neste autêntico tapete verde que é a inteligência, com o artigo/ensaio intitulado Mentes brilhantes, idéias perigosas, publicado no Caderno 2 do Estadão. Dê uma olhadinha no excerto e confira a íntegra no Blogstraquis:

(…) Maior é a inquietação com o fato de que no país mais poderoso e avançado do ponto de vista científico ‘a ciência e a razão estejam perdendo batalhas para a superstição e a ignorância’.

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Errei, sim!

‘MEDO DE PÂNICO – Manchete de primeira página do caderno Cidades do Jornal do Commercio, do Recife: Há medo de pânico no morro. Janistraquis arquivou-a ao lado daquele título do Planeta Diário, que dizia: Atrocidade termina em violência.’ (fevereiro de 1991)’



JORNALISMO & CINEMA
José Paulo Lanyi

Por que gostei desse filme, 16/02/06

‘Fui assistir outro dia ao ‘Boa Noite, Boa Sorte’, dirigido pelo George Clooney. Gostei. O filme conta um episódio importante da luta contra os desmandos do macartismo. A história é a seguinte: depois de um sem-número de abusos do senador Joseph McCarthy, em sua obsessão algo ideológica, algo oportunista, por expurgar os comunistas (reais ou imaginários) – numa atmosfera que mataria o Torquemada de inveja-(ê, frase longa…), a turma da CBS resolve dedicar-lhe uma sucessão de sovas jornalísticas. O mestre Kung Fu atende por Edward R. Murrow (David Strathaim)e ancora dois programas da emissora: o talk-show ‘Person to Person’ e o investigativo ‘See it Now’. Clooney interpreta o produtor Fred Friendly, que apoiava o colega nessa jornada perigosa na Nova York dos anos 50.

O estopim para o embate com o senador foi uma reportagem da equipe sobre um oficial da Aeronáutica que estava sendo fritado pelas supostas ligações de seus familiares com os vermelhos. O perigo vinha de um subcomitê permanente do Senado presidido por McCarthy, que investigava os esquerdas, e, na outra ponta, dos anunciantes que ameaçavam cortar os patrocínios, para insegurança permanente do chefão da emissora.

O filme é em preto e branco e tem muito jazz. Às vezes, leva a crer que há um incêndio na sala do cinema. Como o alarme não toca, acabamos por perceber que toda aquela fumaça emoldura a redação e os estúdios da CBS. Murrow apresenta com um cigarro na mão (a indústria Kent patrocina a emissora). Ao fim de cada edição, ele faz a sua cara de blasé e, de soslaio, endereça duas frases ao seu público: – Boa noite e boa sorte.

Não vou entrar em detalhes, assista. Como já destacou o Rodrigo Fonseca em O Globo, muito do sucesso de Clooney nessa produção deve-se ao seu conhecimento do ambiente. O pai e a mãe do feioso têm história na TV americana. Ele cresceu nesse meio e soube reproduzi-lo com competência.

‘Boa Noite, Boa Sorte’ pode ser chamado de ‘documentário dramatizado’. A história é bem conduzida, passo a passo, sem pretensões de criatividade ficcional. O elenco é muito bom. David Strathaim é extraordinário em sua discrição, a ponto de, por alguns momentos, pensarmos que ele não é ele mesmo, que o próprio Murrow está lá (não sei qual é o grau de fidelidade à personagem histórica).

Trata-se de um enredo que nos é familiar. Repórteres, produtores e editores obstinados enfrentam políticos folgados. Os primeiros insistem no tema, os últimos reagem pesado, o dono do boteco fica com medo, os primeiros atormentam o dono do boteco, que responde com mais tormento, que se alimenta das ameaças dos folgados, que… Muitos aqui sabem o que digo. Às vezes, a matéria sai, às vezes, não. A um preço alto, no filme ela saiu, uma, duas, várias vezes. Até que…

Para encerrar: há um ligeiro equívoco na análise recorrente do que aconteceu naqueles tempos. Murrow e os demais não estavam lutando pela liberdade de imprensa. É importante, mas pouco. Eles respondiam a uma ameaça mais grave: a Democracia estava em xeque, num jogo em que um oponente chutava o outro por baixo da mesa.

Perde-se a conta do número de pessoas que foram arruinadas pelo macartismo. Era, sim, a Idade Média na América do Século 20. A CBS propôs-se a apagar a labareda, ateando fogo às vestes do inquisidor. Nada mais urgente, num período em que a ideologia e o oportunismo político mandavam prender e mandavam soltar. A liberdade de imprensa não é a causa, mas a conseqüência de um bem social maior, que é a Democracia. Que a nossa arrogância nos permita enxergar o óbvio. E que sempre se defenda o valor prioritário, para que se possa desfrutar de todos os demais. Liberdade de imprensa sem Democracia, isso sim, é uma peça de ficção.’



DIRETÓRIO ACADÊMICO
Carlos Chaparro

A crise é boa, porque nos leva à crítica, 17/02/06

‘O XIS DA QUESTÃO – A crise do jornalismo existe. Mas o jornalismo não está destruído. Ao contrário: como espaço público, se torna cada vez mais importante para as sociedades democratizadas. Nele, as velhas fontes passivas atuam hoje com surpreendente desembaraço, transformadas em instituições deliberadamente produtoras de intervenções e conteúdos, por meio de fatos noticiáveis.

1. Conceito de crise

Ensinam os filósofos que o conceito de crise (do grego krisis) tem, no cerne, o significado de separação sem ruptura. Na linguagem deles (e me sirvo, aqui, de um velho e ótimo dicionário de Filosofia e Ciências Culturais, de Mário Ferreira dos Santos), ‘há, em qualquer existir, um separar-se, quer pela forma, quer pela separação física das coisas’. Mas separação sem rupturas, porque ‘as coisas do ser não se separam de forma absoluta’, nem há seres ‘absolutamente separados’ ou ‘infinitamente distantes um dos outros’.

Filosofia à parte, gosto da idéia de crise vinculada a um separar-se entre as coisas, sem a destruição do ser, pois só assim poderemos analisar as partes sem pôr em risco a apreensão do todo. Essa é a noção de crise que, de alguma forma, nos leva à capacidade da crítica. Ou seja: a capacidade inteligente de, sem jamais perder a perspectiva do todo, olhar as partes separadas, para uma nova reunião dos elementos dispersos.

Se utilizarmos essa noção de crise na tentativa de entender e explicar a crise que, neste início do século XXI, tão fortemente atinge o jornalismo, chegaremos, certamente, a novas possibilidades de discussão inteligente sobre o assunto.

Comecemos, então, por uma tentativa de definir o todo do jornalismo, tal como era entendido antes da crise.

2. Jornalismo arrogante

Até por falta de melhores definições, proponho que aceitemos como boa, representativa de uma linha de pensamento que influenciou fortemente os estudos sobre jornalismo no século passado, a definição a que José Marques de Melo chegou, em seu livro A Opinião no Jornalismo Brasileiro. Depois de percorrer alguns dos autores que ao longo do século XX mais profundamente estudaram o assunto, Marques de Melo propõe a seguinte síntese:

Jornalismo é concebido como um processo social que se articula a partir da relação (periódica / oportuna) entre organizações formais (editoras / emissoras) e coletividades (públicos receptores), através de canais de difusão (jornal / revista / rádio / televisão…) que asseguram a transmissão de informações (atuais) em função de interesses e expectativas (universos culturais ou ideológicos).

Temos, aí, portanto, o entendimento do jornalismo como um processo inteiramente controlado pelo jornalista, em torno dos qual tudo girava – até a própria atualidade, já que se trabalhava com uma noção passiva de atualidade (‘as coisas que aconteciam’), sobre a qual (supostamente) o jornalismo atuava de forma determinante, até autoritária, com a sua capacidade de ‘captar e reproduzir ao fatos’. Ou seja: só acontecia o que fosse noticiado pelo jornalista, e sob sua decisão.

No cenário desse entendimento, as fontes nem sequer eram citadas, como se não fizessem parte do todo. Eram entes sem vida própria.

O mesmo entendimento explica o velho conceito de Notícia, para o qual não havia notícia fora do jornalismo e sem a intervenção mediadora do jornalista – e se alguém quiser entender a arrogância que tão fortemente marca a cultura jornalística e a prática profissional do jornalismo, talvez a explicação esteja aí, na arrogância dos conceitos.

3. Novos papéis, novos formatos

A crise resulta, portanto, da superação desses conceitos pela realidade nova, moldada no ambiente criado pelas modernas tecnologias de difusão. Ou seja: uma realidade elaborada pelas decorrências culturais da revolução tecnológica. E a mais importante decorrência é, a meu ver, a irreversível erupção de práticas e estruturas de democracia participativa, com sujeitos sociais dotados de alta capacidade de intervenção da realidade.

Nessa nova realidade, o todo do processo jornalístico foi profundamente alterado por uma nova relação entre o fato e a notícia. No velho conceito e na velha realidade, havia um intervalo – o intervalo que o todo poderoso jornalismo ocupava – entre ‘o acontecido’ e ‘o noticiado’. Na ocupação desse intervalo, e no controle que exercia sobre a atualidade, se fundamentava o poder da mediação jornalística. Pois esse intervalo desapareceu, e aí está a razão primeira da crise.

Em resumo, o jornalismo perdeu o controle sobre a notícia. Quando muito, ainda a segura, mas pela rabeira.

Quem duvidar, que faça a observação comparativa entre jornais e entre telejornais de qualquer dia. Fiz isso quinta-feira passada, em oito horas de trabalho, desconstruindo o noticiário impresso do dia. Na desconstrução, comparei os três principais jornais diários do País. E não tenho a mínima dúvida em afirmar que o controle da notícia pertence hoje a quem produz os acontecimentos, os fatos, as falas, ou seja, os conteúdos discursivos que o jornalismo socializa.

Tendo ‘o fato produzido’ e a sua notícia como principal ferramenta de ação, as velhas fontes passivas se transformaram em instituições deliberadamente produtoras de intervenções e conteúdos, por meio fatos noticiáveis. Aconteceu, pois, um separar-se, de quase ruptura, de algo que antes, em relação de submissão, se amoldava ao todo de formas e crenças do jornalismo.

A crise existe, portanto. Mas o todo não está destruído. Ao contrário: como espaço público, o jornalismo se tornou mais importante para as sociedades democratizadas.

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A perplexidade que nos atinge persistirá, enquanto não trouxermos para o campo da inteligência a discussão sobre os novos papéis que cabem ao jornalismo. Não só os novos papéis, mas também os novos formatos que deve assumir, nesta lógica de construção da atualidade assentada na vitalidade dos confrontos discursivos que o próprio discurso jornalístico viabiliza.’



TV DIGITAL
Antonio Brasil

A arapuca da TV digital brasileira, 20/02/06

‘Como dizem os franceses, quanto mais as coisas mudam, mais são as mesmas. Esta semana, se alguém tinha dúvidas de que a implantação da TV digital no Brasil não passa de uma grande ‘armação’, jogo de interesses com cartas marcadas, deixou de ter.

Para isso, bastava assistir à entrevista do ministro das Comunicações, Hélio Costa, no Observatório da Imprensa na Rede Brasil ou ter participado de um seminário sobre a TV digital promovido pelo Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro.

Além da presença do ministro global, o programa do Observatório teve a participação de jornalistas que sabem tudo de jornalismo, televisão e arapucas políticas como Alberto Dines, Luiz Nassif e Nelson Hoineff. No entanto, Hélio Costa sabe ainda mais de retórica e sofismas.

Bem que os jornalistas tentaram, mas Hélio Costa, político mineiro experiente e profissional de televisão tarimbado, conseguiu transformar a entrevista em um verdadeiro palanque eleitoral.

Logo na apresentação, o ministro defendeu o atual modelo de gestão e os direitos dos telespectadores brasileiros: ‘Temos que garantir uma televisão digital aberta, gratuita – mesmo nos telefones celulares – para todos os brasileiros. ‘

Em momento algum ele diria: ‘Temos que garantir uma televisão de qualidade e com maior diversidade para todos os brasileiros’. Os colegas rádiodifusores certamente não aprovariam. Hélio Costa pode não entender muito de TV digital, mas sabe tudo de política.

Mais adiante ele defendeu a escolha do padrão técnico preferido pela Rede Globo e talvez – há controvérsias – pelos demais rádiodifusores brasileiros: o padrão ‘experimental’ japonês.

Caso você não saiba, todos os padrões de TV digital ainda estão em fase ‘experimental’. Nenhum deles está totalmente desenvolvido ou implantado em seus próprios países de origem. Nessa verdadeira ‘arapuca’ digital, pagaremos caro para testar uma televisão de transição com prazo limitado de validade. O fim da televisão como conhecemos é questão de tempo. Pouco tempo. O futuro pertence aos sistemas de convergência de mídias como o IPTV (Internet Protocol TV), a televisão na Internet.

Mentiras verdadeiras e verdades mentirosas

Infelizmente, no programa do Observatório da Imprensa, não houve oportunidade para um debate descontraído e aberto. Bem que os jornalistas tentaram. Mas o formato do programa e a distância dos participantes – espalhados em diferentes capitais do Brasil – impedem uma discussão mais acalorada e significativa. Além disso, Hélio Costa sabe tudo de sofismas, mas também sabe tudo de televisão. O que se viu foi uma ‘performance’ muita bem preparada e ensaiada.

O ministro fez o dever de casa e trouxe uma seleção de dados técnicos para garantir e justificar uma decisão essencialmente política. Não eram mentiras. Mas também não eram verdades. Bom estrategista, preferiu devolver as perguntas com respostas evasivas e ainda mais frases feitas. Nos poucos momentos de ‘saia justa’, recorreu à retórica. Jogava para a torcida. Tudo muito bem preparado para não prejudicar uma imagem de político ambicioso. Em outros tempos, Hélio Costa foi grande aliado do presidente Collor. Hoje, faz parte do governo Lula. Sabe tudo de sobrevivência. Talvez um dia, com a ajuda dos ‘amigos’ e ex-patrões, seja eleito governador de Minas e, quem sabe, no futuro próximo, seja candidato à presidência da República. No Brasil de Sarney, Collor, FHC e Lula, tudo é possível.

Mas, hoje, Hélio Costa é, antes de tudo, um apaixonado pela televisão brasileira.

No Observatório da Imprensa, ele deixou bem claro que a nossa produção televisiva – ou seria somente os programas Globo? – é excelente, de qualidade internacional, muito melhor do que os programas das televisões européias. Para o ministro, ‘tirando alguns ‘documentários’, nossos programas são muito melhores do que os programas da BBC’. Ouço e não acredito!

Somos contemplados com mais uma ‘pérola’. Em outra oportunidade (ver aqui a coluna Professores de jornalismo nas redações), ele se superou ao definir os jornalistas e os professores de jornalismo: ‘Você tem dois tipos de jornalistas. Os que fazem jornalismo e os que ensinam. Escolha.’ Lembram? Deveria ser o nosso próximo ministro da Educação.

Mas, para fins de discussão, podemos destacar algumas questões importantes que não foram bem explicadas ou que foram ‘omitidas’ durante a entrevista do ministro Hélio Costa no OI.

1. Ministro radiodifusor

Pra começo de conversa, em momento algum da entrevista o ministro citou ou foi perguntado, se ele seria parte ‘isenta’ nas discussões sobre a implantação da TV digital no Brasil. Caso você não saiba, o ministro Hélio Costa é um ‘radiodifusor. Ele é dono de rádio em Barbacena, Minas Gerais. Pouco importa que ele ainda (ênfase no ‘ainda’) não tenha uma concessão de TV. Mera questão de tempo.

Em um jogo de interesses de grupos poderosos, em ano eleitoral e de copa do mundo, essa questão não é um mero detalhe. É uma questão fundamental para entendermos as recentes mudanças no ministério das comunicações, a falta de transparência nas negociações com a sociedade e a urgência como está sendo tratado o nosso futuro.

2. Hélio Costa e a Globo

Em momento algum da entrevista foi perguntado ao ministro a natureza da sua relação com o principal interessado na implantação da TV digital no Brasil: a Rede Globo de Televisão. Ser radiodifusor e ter trabalhado durante tantos anos para a Globo influenciariam de alguma forma o seu julgamento ou avaliação? Perguntar não custa. E mais. Como se deu a sua indicação para o cargo de ministro das Comunicações em momento tão delicado e importante da vida política brasileira? O senhor teve o apoio da Globo para ser ministro das Comunicações? Essas perguntas poderiam ser consideradas deselegantes ou embaraçosas. Mas certamente são relevantes e oportunas.

É evidente que a trajetória profissional e política do ministro sempre ‘coincidiu’ com os interesses dos radiodifusores e da Globo. A história e a política brasileiras costumam comprovar que ‘onde há fumaça e dinheiro…’

3. Defesa da constituição brasileira

Em outro show de ‘sofismas’ o ministro justificou a impossibilidade da inclusão de novos players, as empresas de telecomunicações: ‘a constituição brasileira não permite’. Mas bom político, pensando sempre no futuro com novos aliados, ele fez questão de indicar a possibilidade de mudanças na constituição. No Brasil, tudo é possível. Fiquei ainda mais ‘chocado’. Não estou acostumado.

Um pouco de história. Em outros tempos, na época da ditadura militar, outro ‘radiodifusor emergente’, a Rede Globo de Televisão não teve o menor escrúpulo ou dificuldade para ignorar a constituição brasileira vigente. Apesar dos gritos dos ‘radiodifusores’ brasileiros, a Globo assinou contrato com grupo ‘estrangeiro’, o Time-Life, recebeu enormes recursos externos, eliminou a concorrência e se tornou poder hegemônico. Recordar é viver.

4. Produção independente na TV digital

O ministro Hélio Costa já tem a solução para esse problema. Teremos que acreditar na boa fé e na incapacidade dos empresários do setor de produzir programas de televisão. Ouço apreensivo. Não acredito.

Segundo Costa, os radiodifusores brasileiros não terão condições de produzir programas em quantidade suficiente para preencher o tempo disponível nos novos canais digitais que receberão de mão beijada nos próximos dias. Não há nada a temer. Eles certamente abrirão espaço para as produções independentes brasileiras. Muitos empregos serão criados e a veremos uma explosão de pequenas empresas produzindo conteúdo televisivo de alta qualidade. Afinal, conhecemos muito bem o padrão de qualidade da televisão brasileira.

Mais uma vez, não é uma mentira. Mas também não é uma verdade. É retórica. Discurso político de conveniência.

Para conferir a declaração do ministro, ligo a televisão aberta e a cabo. Afinal, o ministro sabe tudo de televisão brasileira. No entanto, o que vejo é uma enxurrada de programas de auditório, Shoptime, Leilão na TV, Cultos Evangélicos e tantos outros programas de qualidade internacional produzidos pela televisão brasileira. Programas muito melhores do que os programas da BBC. E reflito sobre a tremenda dificuldade que terão os nossos empresários para produzir ainda mais baixarias e porcarias. O ministro tem toda a razão. Eles não vão conseguir. Abrirão espaço para os produtores independentes brasileiros. Hélio Costa para presidente!

3. A urgência para implantar a TV digital brasileira

O ministro das comunicações também não acredita que haja pressa ou precipitação na implantação da TV digital brasileira. Para comprovar, tirou um monte de dados da cartola. Muitas informações, datas e termos técnicos para confundir e intimidar os jornalistas e ainda mais os espectadores. Hélio Costa pode não entender muito de TV digital, mas sabe tudo de política.

Para o ministro, a discussão sobre a TV digital já está mais do que madura. Não há motivos para mais discussões com a sociedade e adiamentos. Temos que decidir o nosso futuro agora. Não temos mais tempo a perder. Ou seremos condenados ao pior dos males: o subdesenvolvimento televisivo.

Mais uma vez, não se trata de uma mentira e muito menos de uma verdade. No Brasil, o debate sobre a TV digital se arrasta há muitos anos. Mas sempre foi conduzido por poucos ‘sábios’ e se limitou a discutir questões técnicas. No entanto, somente nos últimos meses, a sociedade brasileira parece ter despertado para a importância desse debate. Perceberam o risco de estarmos leiloando o nosso futuro. Lembram da ‘farra’ das privatizações?

TV digital é um assunto complexo. Poucos entendem ou se interessam. Mas agora virou ‘torcida’. O Flamengo seria melhor do que o Vasco que por sua vez pior do que o Corintians? Meu carro é melhor do que o seu. Ou seja, a discussão que deveria ser técnica e política, descambou para o ‘achismo’. Ninguém tem certeza de nada. Todos os padrões estão ‘em construção’. Por que o padrão japonês seria muito melhor do que o padrão americano ou europeu? Ou seria o contrario? Na verdade, tanto faz. O que nunca se discutiu – pelo menos até agora – é o modelo de gestão da futura televisão brasileira. Essa discussão, sim, tem precedência e relevância para a sociedade. A ênfase no debate tecnológico não passa de um subterfúgio para evitar mudanças em um modelo econômico que sempre cria novas ‘capitanias hereditárias’.

Seminário e Sessão Descarrego

E o tal seminário sobre TV digital promovido pelo Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações no Sindicato dos Jornalistas profissionais do Rio de Janeiro citado no inicio da coluna? Explico. Eu fui. Mas cometi o erro de chegar pontualmente na hora marcada, às 19h. O seminário só começaria bem mais tarde. Um dia eu aprendo.

Apesar do atraso, os principais convidados anunciados pelos organizadores – o ex-ministro das Comunicações Miro Teixeira e sua colega Jandira Feghali – não compareceram. Tudo a ver. As televisões locais, inclusive a Globo, também ignoraram o evento. Com uma única exceção: a mui heróica equipe de jornalismo da TVE. Faz sentido.

Os organizadores e os debatedores de plantão se esforçaram muito para informar, sensibilizar e mobilizar o pequeno público presente. Eles estão de parabéns. Assim como os jornalistas do Observatório da Imprensa. Eles tentaram.

Mas o debate com a sociedade sobre a TV digital brasileira pode ter chegado tarde demais. Neste momento, as decisões sobre mais essa ‘arapuca’ estão sendo tomadas no Jardim Botânico e nos bastidores do governo. Um governo em plena campanha eleitoral.

Para relaxar, ligo a TV e assisto a um dos melhores exemplos da qualidade internacional da TV brasileira: a Sessão Descarrego. Troféu Brasil 2005. Sempre imperdível!

Os franceses têm razão: ‘quanto mais as coisas mudam, mais são as mesmas’.’



RÁDIO
Cassio Politi

O dia em que Silvio Santos foi ao ar como ouvinte, 18/02/06

‘Joseval Peixoto tem mais de 50 anos de experiência no rádio. Apresenta o Jornal da Manhã, da Rádio Jovem Pan AM, de São Paulo. A filha de Silvio Santos fora seqüestrada e libertada. Depois, o líder da do grupo, voltou à casa de Silvio Santos, que virou refém. Fato de repercussão nacional. No dia seguinte, o radialista criticava Geraldo Alckmin quando foi interrompido pela ligação de um ouvinte que queria entrar no ar: o próprio Silvio Santos.

Quem está falando?

Desde a madrugada, o assunto era um só. Um rapaz de 22 anos invadira a casa de Silvio Santos e o fez refém por sete horas. Era o mesmo que havia seqüestrado, dias antes, a filha do empresário e apresentador de TV. Numa atitude condenada por especialistas, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, decidiu atender a exigência de Fernando Dutra Pinto, o bandido, e foi à mansão para garantir sua segurança e pôr fim ao seqüestro.

A produtora entrou no estúdio e avisou: ‘Olha, Joseval, o Sílvio Santos quer falar com você’. ‘Tudo bem, vou atender’, pensou o jornalista, que estava no ar, ao vivo. Assim que entrasse uma matéria, iria rapidamente à redação e retornaria a ligação. Mas não era bem isso. Silvio Santos estava no ar.

– Quem está falando? – perguntou a voz marcante.

– É Joseval.

– Oi, Joseval, eu estava vindo para cá, de carro, para o SBT, e estava ouvindo o seu comentário com relação ao governador. Eu posso garantir a você que, se o governador não fosse ontem até a minha casa, eu tenho certeza… não é um palpite… eu poderia morrer. O Fernando [Dutra Pinto] certamente morreria e mataria três ou quatro policiais que lá estavam.

Glauco, o operador técnico, primou pela agilidade. Colocou Silvio Santos no ar de surpresa. Joseval Peixoto levou um susto. Foi assim que começou um fato histórico do rádio brasileiro, na Rádio Jovem Pan AM, de São Paulo. Era sexta-feira, 31 de agosto de 2001.

Diálogo

Até ser interrompido pela produção, Joseval Peixoto se baseava nas entrevistas dos dias anteriores e na longa experiência não só como radialista, mas também como advogado criminalista. ‘A gente apurou que a Polícia Militar está preparada para negociar com seqüestradores’, comenta, ainda hoje, o apresentador do Jornal da Manhã. ‘Oficiais fazem cursos no Exterior para negociar com seqüestradores’.

Nunca a autoridade máxima deve ir ao local. Esse mandamento faz parte da tática da polícia: cansar o seqüestrador. Foi por esse motivo, entre tantos outros, que especialistas reprovaram a atitude de Alckmin. Esse era o teor da crítica que ia ao ar naquele momento na voz de Joseval Peixoto. Sílvio Santos tinha, por outro lado, seus argumentos:

– Ele [Fernando Dutra Pinto] estava com duas armas muito carregadas. Ele estava tranqüilo, absolutamente, tranqüilo e convencido de que ele, com 22 anos de idade, não queria entrar numa penitenciária. Ele só sairia de lá se o governador garantisse que ele não morreria. (…) O que estão comentando com relação ao governador Geraldo Alckmin é uma injustiça, porque ninguém estava lá nos acontecimentos (…) Ontem, na minha opinião, e eu estou certo disso, absolutamente certo, ele [Alckmin] salvou algumas vidas, alguns chefes de família da Polícia Militar. Só isso.

Joseval prestou atenção. E ponderou que o entrevistado era, claro, ilustre. Mas estava saindo de dois seqüestros: um como pai, outro como refém. Não cabia fazer perguntas que fugissem ao debate. Esperou Silvio Santos concluir e manteve o tom crítico a Alckmin:

– Muito bem. Está feito o registro, Sílvio, na defesa que você faz do ato do governador de atender o seu chamado e comparecer ao fato. Não queremos polemizar. A posição que eu tomei evidentemente não foi essa. Os dados que temos são de 105 seqüestros só no primeiro semestre na cidade de São Paulo, um a cada dois dias [dados referentes a 2001]. E nas entrevistas todas que nós fizemos, enquanto todo o Brasil torcia pela sorte sua e de sua família, todas as entrevistas dos profissionais que aqui falavam, indicavam que foi um ato tresloucado, impensado e de quebra do poder. Não queremos polemizar, mas fica aí o registro de Sílvio Santos.

Entrevista, não

O que não era para ser uma entrevista, acabou sendo. Ainda que curta. Ou, para classificar com precisão, foi um rápido debate. Poucas palavras, muito conteúdo. Silvio Santos tinha contra-argumentos. Respondeu defendendo a capacitação da Polícia. Argumentou que, em seqüestros, todos os casos são tratados de maneiras diferentes. E que, dos 105 casos citados, houve (apenas) uma morte. Voltou a defender o governador, a quem estava grato, dado o risco de uma tragédia.

– Ele [o sequestrador] não queria ir para a cadeia em hipótese alguma, e eu sabia. Eu percebi. Atiraria em quantos policiais fosse possível e evidentemente eu também morreria, e ele também morreria. Eu tinha certeza disso.

O helicóptero de uma emissora de TV acompanhava o carro em que Silvio Santos era mostrado segurando o celular ao ouvido. O diálogo acontecia de forma curiosa: o interlocutor estava lá embaixo, na imagem aérea, ao vivo. Muitos telespectadores possivelmente se perguntaram: com quem será que o Silvio Santos está falando agora? Com a família, para ver se estão todos mais calmos? Com o SBT, para colocar a agenda em dia? A porta do estúdio se abriu novamente. Um outro nome de peso da Jovem Pan se posicionou perto do microfone.

– Sílvio, eu gostaria que você ouvisse o nosso chefe de reportagem, Anchieta Filho.

– Ah, mas isso é fazer entrevista e eu não quero fazer entrevista.

– É só para você… [dito por Joseval Peixoto]

– Eu só queria te dar esse esclarecimento para evitar essa injustiça que está sendo feita com o governador Geraldo Alckmin.

– Ô Sílvio, é só para aproveitar a sua participação aqui no Jornal da Manhã e esclarecer como foi…

– Eu sei, mas seria injusto eu dar uma entrevista para o Anchieta, que é um hábil questionador. Não dei para ninguém, eu dei para a Jovem Pan, porque eu sou fã da Jovem Pan e porque eu saio de casa ouvindo a Jovem Pan e sou bem informado.

Cadê a entrevista?

Pensando bem, havia dois dos maiores radialistas no estúdio e, do outro lado, Silvio Santos, menos de 20 horas depois de ser libertado . Que perguntas deveriam ser feitas naquele momento? ‘Nenhuma. Nada que fosse perguntado suplantaria o fato de Silvio Santos ter ligado do próprio celular para entrar no ar. Dali para a frente, o que se perguntasse já não era relevante. Não é verdade?’. O relevante já tinha acontecido.

A tentativa de introduzir Anchieta Filho a uma seqüência de perguntas segue a linha da própria emissora e a dele mesmo, Joseval. ‘Tem apresentador que, nesses momentos, querem tomar conta do show. Minha linha não é essa. O importante é valorizar o repórter’.

Sorte e glória

Perdi as contas de repórteres que, por uma situação inesperada qualquer, se embananaram durante uma entrevista. Por desatenção, por nervosismo, por despreparo, por inexperiência. Incluo-me, aliás, nessa lista de errantes. São inúmeras, as armadilhas. ‘Tenho mais de 50 anos de rádio. Num caso como o do Silvio, você tem uma surpresa do próprio evento. Mas, a partir daí, seu autodomínio já vem da prática da profissão. Não fiquei nervoso, não’.

Às vezes, simplesmente dá certo. E se a recepcionista não tivesse transferido a ligação para o estúdio? Poderia ter passado para a redação; alguém atenderia e tentaria gravar uma entrevista. Talvez ele não quisesse falar… Mas tudo se encaixou. Foi o dia de glória. Depois, foi só editar e colocar no ar novamente, repetidas vezes. Sílvio Santos não deu entrevista para mais ninguém. O pronunciamento municiou todas as emissoras de rádio e TV. ‘Até o SBT e a Globo’, diverte-se.

* * * * *

Talvez alguém tenha decidido estacionar rapidamente o carro para conseguir prestar atenção, assim que a conversa entrou no ar, ao vivo, oito e pouco da manhã. Será que é trote? Não pode ser. Não foi um ouvinte quem estacionou de supetão: foi um concorrente. Eu trabalhava no jornalismo da Rádio Transamérica àquele tempo. O público tem noção do peso de um fato jornalístico como esse. O jornalista tem mais noção ainda. Então, perguntei a Joseval se aquele tinha sido o principal momento de sua vida como radialista. A partir daí, a nossa conversa tomou muito mais do que os quarenta minutos que prometi à secretária. A conversa teve quase duas horas. Uma conversa sobre a vida, o rádio e o Jornalismo. Idéias estas que têm pouco a ver com o caso ‘Silvio Santos no ar’, mas seria um desperdício não registrá-las.

* ‘Uma vez, no programa São Paulo Agora [também da Jovem Pan], a Elis Regina dava uma entrevista dizendo que faltava só uma música para compor o novo disco que ela iria lançar. E falou no ar que, se algum produtor tivesse uma música interessante, que mandasse. E mandaram. Era aquela música que ficou famosa, do Caipira Pira Pora. Foi um sucesso nacional. A história da rádio não é só o Silvio Santos.’

Um complemento após pesquisa na web: a música é Romaria, de autoria de Renato Teixeira. Foi gravada em 1977.

* ‘Não é o fato de ser advogado que ajuda a conduzir entrevistas como a do Silvio Santos. É o fato de viver fora da redação. E a banca do advogado é aonde os fatos da vida vão todos os dias. Eu lembro que o Miguel Jorge criou o Jornal da Tade e o dirigiu por 15 anos. Aí foi contratado pela Auto Latina. Declaração dele depois que entrou no empresariado: ‘eu não imaginava que eu era tão desinformado’. No Direito, nós temos uma frase: ‘o jurista que é só jurista é uma triste coisa’. E no Jornalismo acontece o mesmo. O jornalista que está preso à redação coloca nas laudas o fato que já vem direcionado. Quem está na vida conhece a vida mesmo, na sua ardência. O fato de eu sair da redação, vir para o escritório, me enriquece muito.’

* ‘Tenho a coleção de 40 volumes do Césare Cantú. Eu não saberia citar quem foi o autor, mas alguém escreveu no prefácio dessa obra uma coisa que me impressionou. O sujeito escreveu que ‘não há angústia maior que o conhecimento’. Porque o conhecimento é um ato de relação. Como é que você conhece o que é uma árvore? A partir do momento em que você sabe tudo o que não é árvore. Mas como é que você vai saber tudo o que não é árvore? Então, o saber é sempre uma angústia. Porque você tem de partir do nada nessa relação. Isso atinge o jornalista também. Se ele ficar preso como setorista da Câmara, por exemplo, vai conhecer o que são os vereadores, como eles trabalham, e nada além disso. Vai ser um jornalista limitado àquele trabalho. É um trabalho importante. Mas é limitado’

* ‘Pessoalmente, eu tinha cruzado o Silvio Santos duas ou três vezes. Foram contatos absolutamente ocasionais. Há alguns meses, ele esteve na rádio [Jovem Pan]. Conversou comigo e se declarou um admirador meu. Não preciso dizer que sou admirador dele, até porque eu sou radialista e e ele deve ter sido o primeiro radialista do Brasil que ficou rico com o microfone. É difícil achar outro exemplo. Ele foi lá porque o Pânico ia para o SBT. Ele é amigo do Tuta [Antonio Augusto Amaral de Carvalho, diretor presidente da Rede Jovem Pan] e foi fazer uma visita. Aí, sim, nós nos sentamos à mesa. Ele é ouvinte do Jornal da Manhã. Mas a gente não sabia que era nesse nível. Curiosamente, ele foi lá dizer que não ia levar o programa Pânico na TV para o SBT. A gente até estranhou. Todos esperavam que ele fosse negociar a ida para o SBT. Ele disse: ‘vim aqui para agradecer, mas não quero levá-los’. Ele estava cumprindo um acordo feito com a Rede TV!, que a gente não sabe qual é.

ERRATA: Por um problema técnico, este teve, entre a noite de sexta e a tarde de sábado (18/02), os primeiros parágrafos retirados acidentalmente.’



CASOY vs. TV RECORD
Comunique-se

Sem acordo, Casoy vai processar Record, 20/02/06

‘Foram duas reuniões entre os respectivos advogados e diversos telefonemas. Mas nada foi suficiente para que Boris Casoy e a TV Record fechassem um acordo sobre o valor que a emissora terá que pagar ao jornalista como multa da rescisão contratual. Ele deixou a bancada do Jornal da Record no final do ano passado. ‘Nenhuma das propostas me pareceu justa’, contou Casoy ao Comunique-se. A assessoria de imprensa informa que a empresa estranha a decisão do ex-apresentador do Jornal da Record pelo fato de ter havido até agora apenas dois encontros.

A Record ofereceu cerca de 60% dos salários dos 11 meses que Casoy ainda tinha na Casa – o contrato ia até novembro deste ano. Segundo o documento, a parte infratora terá que pagar multa integral – a totalidade do contrato – caso este não seja cumprido. O advogado do jornalista deve cobrar 48 meses de salários. A informação é de Daniel Castro, da Folha de S. Paulo.

Aproveitando a conversa, Casoy negou as informações do mercado que dão conta de sua possível contratação pela Rede TV! ‘Isso não procede. Tenho conversado com várias pessoas mas até agora não foi feita nenhuma proposta concreta’. Enquanto isso, ele tem aproveitado as ‘férias’ para ler e descansar.

Quanto à sua saída da Record, o jornalista conta que no último dia 30/12 foi chamado para uma reunião, onde a direção informou que estava rompendo o contrato com ele. ‘Chegaram a propor mudanças no Jornal da Record, mas eu não concordei. Queriam fazer uma espécie de Jornal Nacional. Me neguei a fazer isso’. A emissora afirma que a negativa foi motivo para afastar Casoy.

Há oito anos e meio, quando recebeu o convite da Record, ele fechou contrato com a emissora e uma das cláusulas assegurava liberdade para trabalhar. Uma outra cláusula determinava que ele só se subordinaria à vice-presidência executiva da empresa. ‘Essa questão nunca foi motivo de discórdia entre os dois lados. Estava no contrato’. Casoy assegura que no SBT, quando tinha que se subordinar a uma direção de jornalismo, o trabalho não deu certo. Então a sugestão de incluir no contrato a cláusula, que, afirma ele, foi aceita sem discussão pela emissora.

Nesta terça-feira (21/02), o Comunique-se publica mais uma parte da conversa com Boris Casoy.’

JN SEM OPINIÃO
Comunique-se

JN não tem mais comentaristas, 20/02/06

‘A partir dessa semana, Franklin Martins, Chico Caruso e Arnaldo Jabor não terão mais espaço para suas opiniões no Jornal Nacional, da Rede Globo. A assessoria da emissora disse ao Comunique-se que o JN é um jornal eminentemente informativo e, desde muito tempo, a TV Globo abdicou do seu direito de emitir opiniões sobre os fatos, e adotou a postura de só se pronunciar quando ela própria for objeto de críticas relevantes ou ‘quando as liberdades constitucionais estiverem inequivocamente em risco’.

Além disso, a idéia era que eles comentassem os diversos fatos, contextualizando-os para o público. Porém, segundo a assessoria, o formato do JN impedia que o público tivesse a exata noção de que a opinião ali expressa pelos três era deles, e não da TV Globo. Ainda segundo a assessoria, nos outros telejornais isso não acontece porque a participação do comentarista se dá num tempo maior e numa conversa com os âncoras. No JN, ‘isso seria impossível sem descaracterizar o formato do programa, que agrada ao público há tantos anos’. Sendo assim, a emissora conversou com os jornalistas e decidiu que não teria mais comentaristas em dias fixos no Jornal Nacional, como acontecia até aqui. ‘A participação deles acontecerá em momentos especiais, quando o noticiário assim exigir’.

Franklin continuará no Jornal Hoje e no Jornal da Globo, rotineiramente. Jabor estará no ar no Jornal da Globo com a mesma periodicidade de antes. Chico Caruso fará um quadro no Fantástico.

Franklin Martins disse ao Comunique-se que essa foi uma decisão da TV Globo e não cabe discussão. ‘O que posso dizer é que gostava de muito de fazer o JN. Era um desafio muito grande e como todo jornalista gostaria de continuar.’

Para Chico Caruso ir para o Fantástico vai ‘ser bem legal’. ‘Estréio em março. Estava no JN há três anos. A fórmula já estava meio esgotada. No Fantástico vou ter mais tempo e vai ser meio novo, diferente’.

O Comunique-se tentou localizar Arnaldo Jabor, mas até o fechamento dessa nota isso não foi possível.’



GUERRA DAS CHARGES
Héctor Ricardo Leis

Confusão entre religião e política, 16/02/06

‘O conflito internacional detonado pelo cartunista do jornal dinamarquês ‘Jyllands-Posten’ não se reduz a uma disputa entre diferentes valores. Não são a liberdade de expressão ou a defesa da dignidade religiosa que estão em discussão. É uma questão muito mais importante, com a qual o mundo civilizado não pode conviver ou compactuar. Até agora, no entanto, esta questão permanece na obscuridade talvez por conta da extrema complexidade de sua solução.

A pergunta a nos fazermos é: se a legislação em vigor no país onde um muçulmano vive permite que sejam publicadas caricaturas de Maomé, com que direito um cidadão de fé muçulmana que nele viva pode se indignar e proferir ameaças às instituições deste país?

Não há qualquer problema no fato de cidadãos da Arábia Saudita ou do Irã, por exemplo, não aceitarem publicações de charges com Maomé nos jornais de seus respectivos países. Se a legislação de seus Estados assim o estabelecer, não existe argumento válido, mesmo que em defesa da liberdade de expressão, para defender o direito à publicação. Certamente, em muitos países islâmicos o cartunista do jornal ‘Jyllands-Posten’ não encontraria espaço para publicar seu material. Mas isso não seria problema nenhum, nem seria objeto legítimo de protesto, já que ele não é um sujeito de direito nesses países.

Além disso, devemos considerar que cartunistas ocidentais batem à vontade em todos os símbolos sagrados de qualquer cultura, inclusive do cristianismo. Não se trata, portanto, de campanha antiislâmica, mas sim de um rotineiro trabalho daqueles cujo ofício consiste em fazer-nos rir com seus desenhos.

De que se trata, então?

Num mundo onde grupos islâmicos, alguns dos quais apelando para a morte e a destruição de indivíduos que não vivem de acordo com a sua fé, vivem em países que não participam da mesma crença religiosa, o escândalo criado em torno do episódio, politicamente insignificante, revela algo mais que intolerância. Revela uma confusão entre religião e política, entre Igreja e Estado. E isso o mundo ocidental não pode negociar.

A natureza íntima de uma religião é expressar a palavra de Deus, explicando os mistérios da existência humana num plano transcendente. Desde sua origem, a Igreja Católica fez clara distinção entre o que é de César e o que é de Deus – e a última encíclica do Papa Bento XVI, ‘Deus caritas est’, é mais um claro exemplo disso. O desenvolvimento da civilização ocidental tem como base a distinção entre Igreja e Estado: nem o Estado pode impor a religião, nem a Igreja pode pretender que o Estado faça o que é de seu exclusivo interesse. Jacob Burckhardt, um dos maiores historiadores do século XIX, nas suas ‘Reflexões sobre a História Universal’ mostra que a atual situação não é uma novidade. Segundo ele, a fusão entre Igreja e Estado é um dado essencial do islamismo. Assim sendo, seu sistema de Estado é ‘inevitavelmente despótico’. Burckhardt chega mais longe e se pergunta até que ponto o islamismo comporta algum tipo de Estado, isto é, algum tipo de Estado de Direito, tal como se entende no Ocidente.

Não parece, portanto, existir conflito de valores entre Ocidente e o islamismo no que diz respeito às charges com Maomé. Conflito de valores é um fenômeno que apenas pode existir em países que separam religião e política, como acontece no Ocidente. Na maioria dos países islâmicos, não existem nem podem existir conflitos de valores precisamente pela preeminência do fator religioso na vida política. Nessas condições, o conflito de valores é decodificado como declaração de guerra e só pode concluir com a eliminação do ‘inimigo’. Tal como ensinava Max Weber, a política desaparece quando ela é subordinada a uma ética da convicção de tipo único. A importância do problema que enfrenta hoje o Ocidente deriva da importância da convicção religiosa para os cidadãos dos países islâmicos. Sem uma convicção forte na pluralidade dos valores e na separação Igreja-Estado, nem o Ocidente poderá se defender eficientemente dos ataques dos muçulmanos radicais, nem tampouco poderá ajudar os cidadãos dessa fé a viver no mundo atual.

(*) Professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Fonte:O Globo’



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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

O Globo

Agência Carta Maior

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