Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Comunique-se

FIM DO NO MÍNIMO
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Editores contestam argumentos do iG para encerrar NoMínimo, 2/07/07

‘Alfredo Ribeiro e Xico Vargas, editores do recém-encerrado NoMínimo, contestaram as razões apresentadas pelo iG para cortar o patrocínio ao site. Em comunicado enviado ao ombudsman do iG, Mario Vitor Santos, os jornalistas afirmam que encaram o assunto como uma rescisão entre um contratante e um contratado que tem seguido à risca os critérios legais. E que não há nenhuma motivação política para o fim do contrato.

Porém Ribeiro e Xico não aceitam o rótulo de ‘não-rentáveis’ e rejeitam o argumento de que o NoMínimo representava 1,36% da audiência do iG: ‘Três milhões de pageviews/mês para um site de jornalismo não é pouco, não, companheiro. O iG seria mais correto se nos comparasse com os números do Último Segundo, mas prefere nos diminuir, jogando NoMínimo na vala comum da audiência de todo o portal. Além do mais, o que é ‘Jornalismo rentável’, caro ombudsman? Enfim, estamos aqui juntando nossos caquinhos, correndo atrás de novos parceiros sem jogar pedra em ninguém, não é justo que, volta e meia, o iG venha a público dizer que a gente não vale nada, por isso estamos no olho da rua. Mais respeito, por favor. Este grupo de jornalistas merece’.

1,36%

Após a publicação do editorial do NoMínimo que alertava para um possível fim das atividades, o ombudsman do iG questionou a direção do portal sobre o fim do contrato de patrocínio. Alexandre Barreto, diretor de portal e conteúdo, respondeu que o NoMínimo não era financeiramente rentável; que representava somente 1,36% da audiência do iG segundo o Ibope/Net Ratings; e que, com o reposicionamento estratégico do portal, o iG se concentrou em conteúdo interativo – com o lançamento de diversos blogs jornalísticos – e que não fazia sentido direcionar o investimento para um só site. Foram esses argumentos que motivaram a resposta dos editores do NoMínimo.

Ainda segundo o ombudsman, os diretores do iG não entraram em mais detalhes após a manifestação de Xico e Ribeiro, e reafirmaram seus argumentos.

Desde sua estréia como ombudsman, Mario Vitor recebeu diversas mensagens sobre o fim do NoMínimo. Cerca de 40% dos e-mails que tratavam de conteúdo reclamavam da não-renovação da parceria. O assunto também mobilizou a muitos comentários no blog.

Unibanco nega

A assessoria de imprensa do Unibanco negou qualquer negociação para que o banco compre uma cota de patrocínio para sustentar um possível sucessor do NoMínimo, diferente do informado anteriormente. A assessoria do Grupo Estado confirma a continuidade das negociações.’

MERCADO EDITORIAL
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Revista Brasileiros chega às bancas fazendo jornalismo sobre personagens, 2/07/07

‘Tinta fresca. O cheiro do amarelo vivo das estantes e portas recém-pintadas atestam a juventude da redação da Brasileiros, revista lançada nesta segunda-feira com proposta editorial diferenciada. Capitaneada por Hélio Campos Mello, Nirlando Beirão e Ricardo Kotscho, a revista pretende construir textos baseados em personagens, brasileiros, oferecendo liberdade de forma para seus repórteres.

A revista quer trazer histórias bem contadas, acompanhadas de fotos de qualidade, incentivando o trabalho de campo da dupla repórter/fotógrafo. A criatividade individual não só é valorizada como é estimulada; é a diagramação e a edição da revista que se moldam aos textos e não o contrário. Mas isso não quer dizer que as matérias serão enormes. O diretor de redação, Campos Mello, entende que algumas histórias devem ser contadas em uma página e outras em 20. O bom senso e a técnica devem ser a baliza de cada redator.

Quarenta e dois mil duzentos e vinte e oito toques fazem a matéria de capa da primeira edição. O texto versa sobre preconceito, que não é um personagem físico, mas um conceito amplo presente no dia-a-dia de todos os brasileiros. Foi escrito por Chico Silva, freelancer, e se baseia numa pesquisa do Ibope para mostrar que os brasileiros começam a assumir seu preconceito, como a negra que não gosta de nigerianos ou o homossexual que tem aversão a travestis.

A redação conta também com os editores/repórteres Alex Branco, Lucy Ayala e Thiago Lotufo e com as estagiárias Luiza Sigulem e Mariana Nadai. O restante das páginas será preenchido por colaboradores freelancers de todo o País, obedecendo à proposta da revista de buscar brasileiros com histórias interessantes além do eixo RJ-SP-DF.’

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Jurássicos e focas, 2/07/07

‘Sobre a mesa do diretor de redação repousa um Tiranossauro de plástico branco e roxo. Ele mesmo comprou o brinquedo, referência aos cabelos brancos e décadas de jornalismo que acumula. Alex, Lucy, Nirlando e Kotscho também ostentam alguns fios grisalhos, ao passo que os cabelos de Thiago, Luiza e Mariana ainda têm apenas uma cor.

Buscando uma postura textual inovadora, Brasileiros deliberadamente funde o ímpeto e a criatividade da juventude com a experiência dos mais velhos. A redação é horizontal, todos têm o direito e o dever de opinar sobre os rumos da revista. Diz Campos Mello: ‘A hierarquia deve funcionar para o barco andar, não pelo prazer da hierarquia. A redação é feita de palpites, todo mundo tem que dar palpites indiscriminadamente’.

Uma lenda quase viva

Beirão e Kotscho, diretores adjuntos, compartilham essa linha de pensamento e também o bom humor do diretor de redação. Uma das primeiras lições passadas para a estagiária Mariana Nadai ocorreu em seu primeiro dia de batente. Estava ela sentada ao lado de Kotscho quando passou Campos Mello e questionou: ‘E então, como você se sente trabalhando ao lado de uma lenda viva, ou melhor, quase viva, do jornalismo brasileiro?’. Tudo entre amigos.

Misto da euforia de uma publicação nascente e da postura pessoal de seus membros, principalmente de sua direção, é possível sentir no ar (junto com o cheiro de tinta fresca) o bom humor da redação que avalia a possibilidade de incluir consultoria geriátrica em seu expediente. ‘Uma revista, como qualquer outro projeto, é um concentrador de estresse, então quanto menos você piorar isso, melhor. Não precisa ser irresponsável para ser bem humorado’, avalia o diretor de redação.

O bom velho new journalism

Sem a Realidade, o jornalismo brasileiro passou décadas lamentando a ausência de um espaço voltado para o exercício profissional do estilo que ainda pode ser chamado de new journalism. Agora, em menos de um ano, duas publicações, Brasileiros e Piauí, surgem com a proposta de oferecer textos mais trabalhados, autorais, para seus leitores. As páginas da história da imprensa brasileira bem que andam precisando de um pouco de tinta fresca.’

INTERNET
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Primeiro texto da ombudsman do UOL critica cobertura da crise aérea, 2/07/07

‘‘Jornalismo é tarefa árdua. Quando envolve serviço, torna-se ainda mais. A cobertura da crise nos aeroportos evidenciou as dificuldades do UOL e seus parceiros em prestar um bom serviço ao internauta.’ A ombudsman do UOL, Tereza Rangel, dedica o primeiro texto à cobertura do portal na crise aérea que o Brasil está enfrentando.

Um internauta queixou-se que o UOL e a Folha Online assumiram como verdadeiras informações fornecidas pela Infraero e deixaram de lado o bom serviço e a boa reportagem.

O editor-chefe da Folha Online, Ricardo Feltrin, respondeu a crítica afirmando que, ‘na medida do possível’, tem enviado repórteres para os aeroportos para acompanhar a situação, além de dar espaço para aqueles que vêm sofrendo com os atrasos dos vôos.’

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Brasileiros consultam mais internet do que jornais, 2/07/07

‘O Instituto Sensus divulgou nesta semana uma pesquisa em que a internet aparece como a terceira mídia mais procurada no Brasil. Aproximadamente, 9,4% dos entrevistados afirmaram que preferem veículos digitais em detrimento de jornais (5,4%) e revistas (0,9%). ‘Eu acho que é uma constatação. A gente já sabia que isso ia acontecer com aquele tempo de permanência do brasileiro. Do mesmo jeito que o second life no Brasil vai estourar. Não é nada de extraordinário’, opina a jornalista Pollyanna Ferraz, pesquisadora em intermídias (estudo da interatividade de mídias). A pesquisa alcançou 2.000 entrevistados em todas as regiões do Brasil em 24 estados, sendo 136 municípios sorteados aleatoriamente pelo método da proporcionalidade proporcional do tamanho.

‘Acho que a pesquisa é a comprovação do que só os mídias brasileiros não enxergam; eles são míopes. A publicidade brasileira é uma das mais conceituadas do mundo, mas tem uma miopia chamada mídia’, explica Alberto Luchetti, fundador e diretor-geral da AllTV, criada em 2002. Luchetti ressalta que apesar das discussões sobre TV na internet começarem apenas em 2004, no ano passado o Brasil já contava com 12 sistemas de TV online.

Cenário perigoso

Apesar do ambiente propício, a pesquisa chega na mesma semana em que o NoMínimo anuncia o encerramento de suas atividades. Para Pollyanna apesar do novo panorama, o ambiente pode ser perigoso para muitos projetos. ‘Acho que a gente ainda vai ver a morte de muitos veículos, sou muito cética em relação aos portais. Com muita gente indo direto para o YouTube, Google, não sei se portais como o NoMínimo têm espaço. É um formato que já tinha sido ultrapassado’, afirma a pesquisadora.

O YouTube e a popularização dos vídeos são fatores importantes para o aumento da preferência pela internet. ‘O YouTube deu uma lente de aumento para os mídias brasileiros. Agora eles percebem que a solução é o vídeo na internet, mas desde 2004 já se sabe disso’, critica novamente Luchetti.

Perto da TV

Bruno Mello, editor do Mundo do Marketing, também encara a pesquisa de forma positiva, já que surge em um momento em que a internet ainda é vista ‘com um pé atrás’ pelos anunciantes. ‘Eu acredito que daqui a, no máximo, dois ou três anos vamos igualar ao rádio e chegar perto da televisão’, prevê. O editor também vê os mídias como culpados pela ausência da publicidade online, mas salienta que investimentos ‘não correm, mas caminham’, revelando uma regularidade da internet, que deve superar outros veículos mais tradicionais. ‘Estão aumentando de forma constante, não há um boom. O que não deixa de ser bom quando a gente se lembra o que houve em 2001’

Para Pollyanna as mudanças para o Brasil se igualar a outros países mais desenvolvidos não estão tão distantes do resto do mundo, especialmente com o amadurecimento do usuário. Mesmo o jornalismo online também deve participar dessas mudanças. ‘Não acredito no fim do jornalismo online com o jornalismo cidadão ou participativo. Vejo o jornalista muito mais como um gestor desse caminho, mesmo que seja alguém para ajudar a chegarmos ao melhor formato’, revela.’

Bruno Rodrigues

Os jornais online mudaram – mas e o leitor?, 28/07/07

‘Acompanhar a evolução da internet é como correr atrás de cinqüenta automóveis em alta velocidade e ter que anotar a placa de todos eles. Haja fôlego – e vontade.

Faço isso todo dia por obrigação profissional, mas é a paixão que conta mais. Foi a fissura por novidades tecnológicas, desde a adolescência, que definiu minha profissão. Quando meu teste vocacional deu Comunicação e Informática, em plenos anos oitenta, achei que, se me decidisse pela dobradinha, terminaria a vida redigindo manuais para microcomputadores. O futuro se encarregou de melhorar bastante as perspectivas.

Pois é essa mistura, igual à de tantos jornalistas online que hoje estão no mercado, que me permite ter, ao mesmo tempo, uma ‘visão de dentro’ – como profissional – e ‘de fora’ – como usuário – sobre como e para onde caminha a Rede.

Por isso, ao rever as mudanças da versão online de tantos jornais neste primeiro semestre, não deixo de ficar deslumbrado ao notar como, em apenas seis meses, há mais novidades no ar do que nos últimos três anos. Estamos em uma nova ‘era de ouro’ da web, não há dúvida.

Como leitor e usuário da internet, não teria tempo para abarcar todas as novidades, confesso. Noto que não sou só eu. Esta semana, por exemplo, meus alunos de pós-graduação me entregaram testes de usabilidade simples, que pedi que fizessem com amigos ou parentes. Na maioria dos sites escolhidos, as novidades simplesmente passaram batidas ou foram deixadas para depois. Nesta categoria entram RSS, podcasts e até vídeos. Comentar matérias? No way.

Acho que, aos poucos, a coisa vai. Torço por isso, porque são recursos fantásticos, que ajudam os jornalistas a veicular melhor a informação, e valorizam – e muito – o trabalho realizado.

Como bons exemplos, escolhi algumas das alterações que podem ser vistas este ano em jornais como USA Today, The Times e The Guardian:

– A ordem das notícias agora absorveu de vez o raciocínio do tempo real, que era sempre um apêndice. E, no ‘listão de news’, você encontra de tudo – de notícias sobre economia à última da onipresente Paris Hilton.

– Todas as matérias merecem, agora, ser comentadas. Não há mais escolha, do tipo ‘essa merece ser comentada, essa não’. E dá-lhe votação: vai para o topo da lista o que impacta mais.

– Como em alguns blogs, os comentários mais recentes ficam à mostra na primeira página. É um risco, mas traz credibilidade e reafirma a interação.

– Menos blá-blá-blá e mais imagens na ‘capa’. É sempre bom lembrar que a web é a ‘interface gráfica da internet’. Foto, ilustração e vídeo sempre terão vantagem no quesito persuasão, em especial na primeira página.

– Os jornais mais avançadinhos até acompanham a navegação do leitor – se ele se logar antes, óbvio. Aí dão, de bandeja, notícias sobre os assuntos que ele mais têm acessado.

– Por que criar novas comunidades, se já existem os Orkuts da vida, prontinhos para serem usados? O momento é de criar parcerias. Abra o olho, O Globo.

Acha muita coisa? Olha que apenas escolhi os tópicos mais genéricos… É preciso tempo para conhecer tudo, mas vale a pena.

E você, como jornalista, acha que estes recursos ajudam ou atrapalham o leitor? E em seu dia-a-dia de trabalho, as mudanças influenciam, de fato? Ou seria tudo ‘perfumaria’?

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Na terça-feira da semana que vem, dia 03/07, inicio mais uma edição de meu curso ‘Webwriting e Arquitetura da Informação’ no Rio de Janeiro. Serão cinco terças-feiras seguidas, sempre à noite. Para mais informações, é só ligar para 0xx 21 21023200 e falar com Cursos de Extensão, ou enviar um e-mail para extensao@facha.edu.br. Até lá!

(*) É autor do primeiro livro em português e terceiro no mundo sobre conteúdo online, ‘Webwriting – Pensando o texto para mídia digital’, e de sua continuação, ‘Webwriting – Redação e Informação para a web’. Ministra treinamentos em Webwriting e Arquitetura da Informação no Brasil e no exterior. Em sete anos, seus cursos formaram 1.300 alunos. É Consultor de Informação para a Mídia Digital do website Petrobras, um dos maiores da internet brasileira, e é citado no verbete ‘Webwriting’ do ‘Dicionário de Comunicação’, há três décadas uma das principais referências na área de Comunicação Social no Brasil.’

JORNALISMO ESPORTIVO
Marcelo Russio

Quando voltar nem sempre é um prazer, 26/07/07

‘Olá, amigos.

É comum ouvir de pessoas que deixam as suas cidades (ou seus países) para morar em outro lugar, que, quando voltam à terra natal, as coisas parecem mudadas, muito mais pelos referenciais de quem julga do que, propriamente, por conta dos lugares terem realmente mudado em alguns anos.

Como um carioca que morou em São Paulo por três anos, e que depois voltou, posso dizer que, infelizmente, a cidade que eu conheci, e na qual eu fui criado, mudou completamente. E para pior. Vou tirar daqui todos os aspectos que não sejam relacionados ao jornalismo esportivo, já que este é o assunto desta coluna, mas, ainda assim, o que vocês lerão daqui para frente não é muito animador.

Comparando com São Paulo, o mercado de jornalismo, especialmente o esportivo, no Rio de Janeiro, está calamitoso. Não só pela falta de veículos que absorvam a imensa mão-de-obra que é jogada nas ruas a cada ano pelas faculdades, mas também pela falta de qualidade do que é dado para o leitor/ouvinte/telespectador. Percebo que, aos poucos, o consumidor de jornalismo esportivo vem recebendo, a cada dia que passa, um noticiário menos profundo, de menor qualidade, e mais voltado para o ‘oba-oba’ do que para a informação e, principalmente, a reflexão.

É claro que o poder econômico da cidade de São Paulo atrai os principais veículos por ter maior volume de patrocínios e por deter o maior e mais qualificado mercado consumidor do país. Mas ainda assim, acredito que o problema do jornalismo esportivo carioca não está aí. Está, sim, na estagnação que assola quase todos os segmentos da cidade.

Parece que o Rio de Janeiro parou de tentar crescer, em todos os sentidos. Com raras e honrosas exceções, o jornalismo esportivo segue o mesmo caminho. Já existiram na cidade rádios e jornais que eram verdadeiras referências no cenário brasileiro. Hoje, tirando uma ou outra emissora/publicação, o que temos é um jornalismo empobrecido, superficial, parecendo sem a pegada necessária para voltar a atrair o leitor exigente, que gradativamente migra para a Internet, que é onde se pode encontrar textos e coberturas, pagas ou não, com a profundidade que o público atual exige.

Como sou um carioca fã de São Paulo, fico feliz em ver a cidade com um cenário favorável e forte no jornalismo esportivo nacional. O que me entristece, de verdade, é ver que o Rio de Janeiro não possui mais a importância que uma vez possuiu, e que isso não é apenas no jornalismo esportivo.

(*) Jornalista esportivo, trabalha com internet desde 1995, quando participou da fundação de alguns dos primeiros sites esportivos do Brasil, criando a cobertura ao vivo online de jogos de futebol. Foi fundador e chegou a editor-chefe do Lancenet e editor-assistente de esportes da Globo.com.’

CENSURA & CLASSIFICAÇÃO NA TV
Milton Coelho da Graça

Onde começa mesmo a censura?, 29/07/07

‘Até onde o Estado e/ou a própria sociedade podem interferir na qualidade da programação de rádio e TV sem que essa intervenção possa ser acusada de Censura? O debate promovido na segunda-feira, 25/06, pela TV Cultura, através do programa ‘Roda Viva’, foi muito esclarecedor. A fagulha da discussão era a classificação indicativa criada por uma portaria do Ministério da Justiça. Mas ficou claro que as divergências não são apenas sobre critérios educativos, estéticos ou políticos.

A questão de fundo é: que TV o Brasil deseja e para quê? Diversão, educação, informação, defesa da saúde pública, catequese religiosa, erotismo, cultura, estímulo ao consumo ou tudo isso junto? E em que doses para cada um? Pode-se confiar apenas no discernimento de cada família sobre o tipo de programa mais adequado a cada criança?

É impossível procurar limitar o debate a uma simples portaria sem que ele transborde.

As emissoras comerciais não têm mais como garantir que a auto-regulamentação seja suficiente para que a televisão tenha um papel positivo na educação e na formação da cidadania nos horários diurnos. E, no horário nobre, a busca desenfreada da audiência nobre obriga atores e atrizes a tirarem cada vez mais as roupas, concorrendo com apresentadores empenhados em vulgarizar a violência e o mau gosto.

E é natural que essa ‘crise’ da auto-regulamentação contamine a discussão sobre a criação de uma rede mais ambiciosa de TV pública. As emissoras comerciais não estão aprendendo a lição que deveriam aprender com o fim da RCTV da Venezuela. A RCTV perdeu a concessão por considerar equivocadamente como direito a livre informação o pretenso direito de mentir descaradamente durante um golpe de Estado. E, depois, também se arrogar o direito irrestrito a concessões de rádio e TV, uma prerrogativa do poder público em todos os países do mundo. Nem as outras emissoras comerciais da Venezuela – a Globovision e a Venevision – defendem a RCTV com o vigor e a insistência de algumas das nossas emissoras.

Estou cético sobre a possibilidade de que o diálogo nacional sobre o papel a ser desempenhado por uma rede nacional de TV pública possa ser conduzido com serenidade. Mas, pelo menos entre nós, jornalistas, deveríamos ir cumprindo o nosso papel. COMUNIQUE-SE não garante a isenção de cada um, mas nos coloca num mesmo rink, para também opinar sobre o que cada um pensa sobre os temas discutidos no democrático debate do ‘Roda Viva’ e o que podemos esperar do futuro da TV pública.

2 bi – o preço da independência

Os 32 membros da família Bancroft, que controla o capital votante da empresa dona do Wall Street Journal e da agência Dow Jones de notícias econômicas, não conseguem mais esconder o entusiasmo e o desejo pelos 5 bilhões de dólares oferecidos por Rupert Murdoch pelo que será a jóia de seu império de 110 jornais, o canal Fox de televisão e o planejado novo canal Fox, exclusivo para noticiário de negócios.

Os jornalistas do WSJ fizeram uma curta greve. Os Bancroft fizeram uma lista de exigências numa tentativa meio ingênua de entregar o jornal mas não o controle do conteúdo. Mas Murdoch sabe tudo sobre arte da negociação. Bateu o pé, disse que assim não dava e fez uma contra-proposta, enquanto na Bolsa de Nova York as ações chegavam a US$ 59 e fração, bem pertinho dos 60, sinal de que o mercado já está convencido de que o negócio será fechado. Se os Bancroft dissessem ‘não’ agora, suas ações voltariam para perto do ponto onde estavam em abril – antes da oferta de Murdoch – passando a valer mais ou menos apenas 3 bi de dólares. Ninguém mais acredita que os Bancroft vão continuar insistindo em garantir a independência do jornal além do limite aceito por Murdoch.

(*) Milton Coelho da Graça, 77, jornalista desde 1959. Foi editor-chefe de O Globo e outros jornais (inclusive os clandestinos Notícias Censuradas e Resistência), das revistas Realidade, IstoÉ, 4 Rodas, Placar, Intervalo e deste Comunique-se.’

TV CULTURA / GESTÃO MARKUN
Tiago Cordeiro

Fundação Padre Anchieta anuncia mudanças na TV e Rádio Cultura, 2/07/07

‘A Fundação Padre Anchieta (FPA) anunciou novidades na programação da rádio e TV Cultura que incluem o cancelamento de 17 programas e a reformulação da programação jornalística, respectivamente. Em comunicado oficial veiculado nesta segunda-feira, a Fundação explica que o telejornal Cultura Noite deixa de ser exibido, com seus profissionais sendo remanejados para o Jornal da Cultura, exibido às 22h. O horário passará a ser ocupado pelos programas infanto-juvenis Zoboomafoo e Os Grandes Cavaleiros.

O presidente da FPA, o jornalista Paulo Markun, não quis dar entrevista. Já Marcelo Bairão, assessor de imprensa da Fundação, descartou novas mudanças na mesma intensidade. ‘Tenho impressão de que não [haverá novos cancelamentos]. O fim do jornal foi para reforçar o Jornal da Cultura’, explicou Bairão.

AM & FM

Na rádio Cultura, a jornalista Gioconda Bordon passa a ser a nova responsável. Com 17 anos de rádio, Gioconda estava há cerca de dois anos na Cultura FM. Salomão Schvartzman, que apresentava ‘O Diário da Manhã’, afirmou à jornalista Mônica Bergamo que sua demissão foi política.

‘Era a maior audiência da emissora e tinha quatro anunciantes. Foi um problema ideológico, mas não me interessa entrar em choque político agora. Eu só queria que a Fundação tivesse um presidente, não um dono que retire programas do ar’, declarou Schvartzman. A hipótese ganhou mais repercussão pelo fato de o programa ter sido o primeiro a ser cancelado, o que, segundo Bairão, se explicaria pelo fato do ‘Diário da Manhã’ ser o primeiro a ser veiculado.

‘Existiam vários programas na rádio Cultura, um deles era o do Salomão, portanto não é só ele que ficou sem programa. Razões ideológicas têm só lá na cabeça dele. A [nova diretora] Gioconda também perdeu o programa dela’, informou o assessor. De acordo com a assessoria da Fundação, as mudanças fazem parte da estratégia da Cultura de aumentar seu foco em música erudita.’

DIRETÓRIO ACADÊMICO
Carlos Chaparro

Jornalismo de multimídias e multilinguagens, 28/06/07

‘O XIS DA QUESTÃO – Os conteúdos jornalísticos da second-life se desdobram e se complementam em dimensões gloriosamente interativas de multimídias e multilinguagens. Com a tendência, cada vez mais forte, de a operação geradora ser uma só, integrada, confiada a profissionais multi-operacionais.

1. Manifestações da ‘Second-life’

A cada dia, e cada vez mais freqüentemente, a versão impressa d’O Estado de S. Paulo deixa de dar informações que antigamente jamais faltariam em suas reportagens, e remete o leitor para o portal do jornal, se quiser saber o que falta no texto impresso. Aconteceu comigo, dias atrás. No dia seguinte à vitória do amazonense Sandro Viana nos 100m do Troféu Brasil, procurei no Estadão a matéria da competição, interessado em saber o tempo feito pelo velocista campeão. Não encontrei a informação. Mas, no pé da matéria, lá estava o aviso, mais ou menos assim, sob o logotipo tipo azul do portal: ‘Veja os resultados do Troféu Brasil – www.estadao.com.br’.

A revista Placar, referência jornalística na área do esporte, levada pelos ventos universais da second-life (assim está sendo chamada a fantástica fronteira digital que nos seduz para o futuro), percebeu que ficaria para trás na corrida do tempo se continuasse a limitar o seu jornalismo, nas versões impressa e eletrônica, à velha receita de texto e fotos. Para fugir do perigo, contratou meios humanos e tecnológicos para oxigenar com os recursos televisão a sua capacidade de socializar conteúdos.

Atualmente, na Europa, e assim começa a acontecer também no Brasil, ninguém resolve lançar um novo jornal ou uma nova revista pensando apenas em papel. O projeto já nasce com a versão eletrônica. E, dentro dela, texto, imagem fotográfica, som e imagem com movimento. O que significa dizer que são coisa do passado os meios impressos que limitam o seu jornalismo ao suporte papel.

Em resumo: conteúdo jornalístico teve de se adaptar ao uso simultâneo de várias formas, meios e linguagens. Deixou de ser só texto, ou só texto com foto, ou só rádio, ou só televisão. O conteúdo jornalístico da second-life se desdobra e se complementa em dimensões gloriosamente interativas de multimídias e multilinguagens. Com a tendência, cada vez mais forte, de a operação geradora ser uma só, integrada, confiada a profissionais multi-operacionais.

Faz parte dessa tendência, por exemplo, o fato de a TV Globo já dar preferência à contratação de jornalistas que, além de competentes nas lides do texto e da fala, saibam operar máquinas de filmar e editar. De alguma forma, o programa ‘Profissão Repórter’, comandado por Caco Barcellos, enquadra-se nesse novo cenário profissional.

2. Hora de abrir olhos e mentes

Temos, aí, pois, generosa matéria-prima para o trabalho de bons filósofos – até porque filósofo medíocre não daria boa conta da tarefa. Como não sou filósofo, nem dos bons nem dos medíocres, limitarei minha ousadia pensante à colocação de duas observações que me parecem pertinentes.

A primeira delas relativa às transformações no perfil do mercado de trabalho. A terceirização já se afigura como um caminho sem volta, nas novas formas de produção. Até Franklin Martins, ao falar do seu projeto de Televisão Pública, trabalha com a hipótese de quatro horas diárias da programação preenchidas com produções independentes.

A terceirização na produção de conteúdos jornalísticos faz parte de um cenário que se universaliza em todos os setores da atividade humana produtiva. Trata-se de outra pancada forte no sindicalismo tradicional, pensado para as realidades da primeira metade do século 20, que já se foi.

Assim, parece cada vez mais evidente a necessidade de reinventar novos pactos e novas estruturas de poder, para as relações sociais no mundo produtivo.

Podem até surgir leis que tentem preservar o esqueleto de conflitos que davam sentido ao sindicalismo tradicional. Mas não me parece que esse tipo de militância legislativa seja suficiente ou eficiente para deter as transformações sociais, políticas e culturais que a revolução tecnológica acelera.

A outra observação tem a ver com um certo ensino de jornalismo, bastante resistente, apoiado na crença de que o mundo da informação continua articulado pelas fronteiras da especialização de meios e linguagens. Fazem parte desse modelo de ensino os projetos laboratoriais (jornais, revistas, programas de TV, programas radiofônicos e sites) pensados e realizados como espaços autônomos, fechados para os avanços transdisciplinares que recheio e dão fisionomia ao mundo de hoje.

Está na hora de mudar. Ou de fechar as portas.

(*) Carlos Chaparro é português naturalizado brasileiro e iniciou sua carreira de jornalista em Lisboa. Chegou ao Brasil em 1961 e trabalhou como repórter, editor e articulista em vários jornais e revistas de grande circulação, entre eles Jornal do Commercio (Recife), Diário de Pernambuco, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, Diário Popular e revistas Visão e Mundo Econômico. Ganhou quatro prêmios Esso. Também trabalhou com comunicação empresarial e institucional. Em 1982, formou-se em Jornalismo pela Escola de Comunicação de Artes, da USP. Também pela universidade ele concluiu o mestrado em 1987, o doutorado em 1993 e a livre-docência em 1997. Como professor associado, aposentou-se em 1991. É autor de três livros: ‘Pragmática do Jornalismo’ (São Paulo, Summus, 2007), ‘Sotaques d’aquém e d’além-mar – Percursos e gêneros do jornalismo português e brasileiro’ (Santarém, Portugal, Jortejo, 1998) e ‘Linguagem dos Conflitos’ (Coimbra, Minerva Coimbra, 2001). O jornalista participou de dois outros livros sobre jornalismo, além de vários artigos (alguns deles sobre divulgação científica pelo jornalismo), difundidos em revistas científicas, brasileiras e internacionais.’

COMUNIQUE-SE
Cassio Politi

Cicarelli é jornalismo; Fátima Bernardes é fofoca, 2/07/07

‘Não noticiar que Fátima Bernardes saiu do ar em pleno Jornal Nacional foi uma ação deliberada. Foi o que explicou a este ombudsman a redação do Portal, em resposta à coluna da semana passada. Quarta-feira (27/06), porém, Fátima Bernardes sumiu da bancada do JN de novo. Passou mal à tarde e não apresentou o telejornal.

A pergunta é: a redação tinha a informação? Se não tinha, errou por não cobrir direito o mercado. Se tinha, errou também, pois a linha editorial do Comunique-se passa pela cobertura do dia-a-dia dos veículos.

Fofoque-se

Vou continuar minha luta para que o Comunique-se faça uma cobertura consistente do mercado de jornalismo. Caso eu fracasse, fica aqui uma sugestão de pauta: a Rede TV estuda contratar Íris Stefanelli para apresentar o TV Fama. Afinal, se o caso ‘Cicarelli x YouTube’ é pauta e Fátima Bernardes não, a mídia especializada em vida de artista que se cuide: o Comunique-se vem aí! (Verifiquei na Fapesp: o domínio ‘fofoque-se.com.br’ está livre. É só registrar!)

Barrigadas (parte 2)

A exemplo da coluna passada, listo aqui notícias que o Comunique-se deveria ter dado, pois saíram em outros sites. Aqui vão três:

* Band e BandNews começam a ser exibidas na Directv dos Estados Unidos;

* Maquiadora acusa apresentadores da ESPN dos EUA de assediar funcionárias e processa emissora;

* Diogo Mainardi ataca Élio Gaspari, chamando-o de ‘Fada Sininho de Lula’. O Observatório da Imprensa, por exemplo, abordou o caso. Teria dado um bom debate no Comunique-se.

Pauta

Também na coluna passada, um leitor deu uma informação que gerou um debate caloroso. Segundo ele, Folha, Estadão e Band usam carros com placas de Palmas (TO). É um fato irrelevante, julgaram alguns usuários. Sim, é possível que seja um dado inútil, mas pode ser que não. Fico aqui me perguntando: a redação procurou pelo menos apurar a denúncia?

Ombudsmando o Informativo

Um leitor criou o termo ‘ombudsmando’. A definição está perfeita! A área de comentários existe para o usuário opinar, questionar, debater, informar e ombudsmar. Outro leitor ombudsmou: ‘Pela primeira vez em toda a história do site, eu recebo o e-mail para assinantes chancelado de SEM ASSUNTO. Sem assunto, hoje, dia 28 de Junho?’. É verdade: o Informativo Comunique-se do dia 28/06 ficou com o campo ‘assunto’ em branco.

Ombudsmando o Blog-se

Muito coerente foi o usuário que assim ombudsmou: ‘O Blog-se está se transformando em Orkut-se. Há gente nova que ocupa a maior parte do espaço com estardalhaço, desconfigurando tudo. Algo deve ser feito a respeito. Por respeito’.

Já vi esse filme. Há tempos, um leitor ombudsma sobre o canal Banco de Empregos, utilizado de maneira no mínimo imprópria. E, até hoje, a única resposta que recebi mais ou menos similar ao rascunho de um esboço de uma solução que talvez funcione foi: ‘estamos trabalhando na solução do problema’.

Cassio Politi é jornalista. Trabalha com Internet desde 1997. Esteve em projetos pioneiros em jornalismo na Web, como sites da Zip.Net, e no site UOL News, do Portal UOL. Ministra cursos de extensão sobre Jornalismo On-Line e Videorreportagem desde 2001. Deu aulas em 25 estados brasileiros para mais de 2 mil jornalistas. Em janeiro de 2007, tornou-se o primeiro ombudsman do Comunique-se, empresa na qual também ocupa o cargo de diretor de Cursos e Seminários.’

O MASSACRE – ELDORADO DE CARAJÁS
Wilson Baroncelli

Livro denuncia impunidade de Carajás, 27/07/07

‘Onze anos se passaram desde a tarde de 11 de abril de 1996, quando 19 sem-terra foram mortos pela PM do Pará em no que ficou conhecido como o ‘Massacre de Eldorado do Carajás’, episódio que repercutiu mundialmente e que se tornou emblemático da impunidade que vigora no País – até hoje, apenas um coronel e um major sofreram condenações, mas, ao todo, não ficaram mais do que nove meses na prisão. Por sugestão do amigo e advogado Nilo Batista, que atuou como assistente de acusação no primeiro julgamento (anulado) dos PMs envolvidos no caso, há pouco mais de três anos, Eric Nepomuceno decidiu recontar esse episódio, voltando ao trabalho de reportagem que no final da década de 1980 havia trocado pela literatura de ficção e pelas traduções.

O resultado é ‘O Massacre – Eldorado do Carajás: uma história de impunidade (Planeta)’, livro que, segundo ele, ‘é a reconstituição mais ampla que foi feita até agora. Trata dos antecedentes da malfadada marcha do MST, conta de como a PM agiu, quem deu as ordens. Recria toda a tensão. Levanta hipóteses que ficaram de fora, ou foram tocadas apenas superficialmente, nas investigações policiais.’ A obra mostra também como vivem, hoje, os sobreviventes, nas terras que receberam do governo, conta a história dos julgamentos – e da impunidade dos responsáveis – e faz denúncias sobre possíveis mandantes, os desmandos da PM durante a ação, além de levantar indícios de execuções sumárias, disfarçadas de confronto.

O lançamento já está marcado: será em São Paulo, no dia 25/7, às 19h30, com um debate no Sempre um Papo (organizado pelo mineiro Afonso Borges) no Teatro-Auditório do Sesc Paulista (av. Paulista, 119 – informações no 11-3179-3700 ou www.sempreumpapo.com.br). Nepomuceno é autor de diversas obras de ficção, entre eles os livros de contos Coisas do mundo, A palavra nunca, 40 dólares e outras histórias e Quarta-feira, além de ter traduzido cerca de outros 50, de autores como Gabriel García Márquez, Eduardo Galeano, Juan Rulfo, Julio Cortázar e Jorge Luis Borges.

Reproduzimos a seguir os principais trechos da entrevista dele a J&Cia, em que fala sobre processo de produção do livro, sobre a migração do jornalismo diário para a literatura e sobre o ofício de escrever. A íntegra da entrevista estará no programa de J&Cia na Rádio Mega Brasil Online que vai ao ar nesta 5ª.feira (28/6), às 17h, com reapresentações na 6ª (29/6), às 10h, e na 2ª (2/7), às 20 horas.

Jornalistas&Cia – Por que você resolveu escrever sobre Eldorado dos Carajás?

Eric Nepomuceno – Na verdade eu estava há muitos anos afastado daquilo que chamo de literatura de não-ficção, de fazer livros jornalísticos ou reportagens mais longas. Esse tema me foi sugerido há uns três anos e pouco pelo Nilo Batista, um dos melhores advogados criminalistas do Brasil, que atuou como assistente de acusação no primeiro julgamento. Nilo é meu amigo há muitos anos e me disse ‘Puxa, essa história vai tender a sumir, que absurdo!’. Acabei me interessando, me entusiasmando pela idéia. Claro, eu tinha a mesma memória de todos nós: foi um massacre. Por que nunca aconteceu nada com os responsáveis, nenhum foi punido? Que fim levou aquela gente? O que foi feito dos sobreviventes? Comecei com perguntas meio naturais. E aí fui atrás da história para construir o livro. Não aconteceu nada para ninguém, a não ser, evidentemente, com os mortos, que morreram, e com os mutilados, que mutilados estão e assim ficarão para sempre. Acho que essa é uma situação realmente muito emblemática do Brasil, tanto da violência, como da injustiça, e sobretudo da impunidade. Fui ao assentamento, convivi com aquelas pessoas vários dias. Queria saber como era a vida deles. Houve duas mudanças drásticas. Primeiro: eles são sobreviventes de uma carnificina. Segundo: foi a custo de muito sangue, de muita morte, de muito trauma, que conseguiram a terra que queriam. Eu queria saber como que é viver nessa terra, ou seja, o que é o sonho. O preço do sonho nós sabemos qual foi, eu queria saber como é agora esse sonho vivido na realidade. É uma coisa muito impressionante, porque foi uma espécie de duplo abandono. Evidentemente que hoje eles vivem em condições muitíssimo melhores do que antes de serem assentados. Mas, se tivessem tido um pouco mais de apoio, alguma política prática, objetiva, um projeto concreto, poderiam estar vivendo melhor ainda. Eu acho que Eldorado de Carajás, que está longe de ser um fato isolado, é apenas emblemático. Poderia servir de laboratório de prova do que não se pode fazer no Brasil.

J&Cia – Como foi a sua migração do jornalismo diário para a literatura e trabalhos de tradução?

EN – São vertentes do mesmo ofício. Fico sempre meio constrangido quando me definem como jornalista, porque na verdade a minha função é escrever. Considero o jornalismo um gênero literário, mais sacrificado do que os outros, mas não menor do que os outros. Então meu ofício é o de escrever. Para mim, a intensidade da folha em branco, da tela azul, é a mesma se eu vou escrever uma reportagem, um perfil jornalístico, um conto, ou se vou traduzir um amigo. Engraçado que cada um tem a sua origem, mas tudo converge na palavra escrita. Eu comecei a traduzir para o português por acaso. Em 72 ou 73 fui morar em Buenos Aires e comecei a descobrir escritores e a fazer amigos que não eram conhecidos no Brasil, que não eram traduzidos no Brasil. Então, quase que comecei a traduzir os novos amigos na esperança de que os velhos amigos daqui pudessem ler e, digamos, entrar em contato nem que fosse pela palavra escrita, fazer uma espécie de rede. Sempre que me perguntam por que eu comecei a traduzir, digo que foi por questões afetivas. E assim continuo até hoje. Acho que dos 50 livros que traduzi, apenas dois ou três foram por curiosidade; todos os outros conheci o autor ou era alguma referência para mim. Uma única e exclusiva vez aceitei uma tradução como trabalho profissional e foi um desastre, porque acabei não gostando do livro; da tradução também não gosto. O suficiente para nunca mais aceitar outra empreitada em termos profissionais. E o trânsito entre o jornalismo e os contos é o que existe entre a literatura de ficção e a literatura de não-ficção. Para mim, é escrever, é a mesma coisa. Abandonei o jornalismo diário há 20 anos porque chegou a um ponto em que começou a perder a graça do desafio. Vários amigos meus, da minha geração, continuaram no ofício e tenho a maior admiração, carinho e respeito pelo que eles fazem. Não foi o meu caso. Perdi a graça do desafio e preferi aceitar outros.

J&Cia – Hoje você atua na Fundação Darci Ribeiro?

EN – Dizer que atuo lá é um exagero. O Darci foi um queridíssimo amigo meu, era amigo do meu pai. Pouco antes de morrer, instituiu uma fundação e nomeou um grupo de amigos como conselheiros vitalícios, e eu fui um deles. Minha atuação é absolutamente simbólica, não é profissional, de jeito nenhum. Eu hoje me dedico ao ofício de escrever, eventualmente faço material jornalístico para a Espanha, para a Argentina, mas pouco. Lamentavelmente, cada vez menos. Vivo de roteiros de filmes, tradução, livros, encomendas de textos. Trabalho muito, trabalho todo dia. Mas consegui determinar um dia por semana pra não fazer nada. E nesse dia em que não faço nada fico pensando no que fiz ontem e no que tenho de fazer amanhã (risos).

(*) Wilson Baroncelli é editor-executivo do informativo Jornalistas&Cia. Está escrevendo interinamente a coluna durante as férias do titular, Eduardo Ribeiro.’

JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

Enfiando o dedo, 28/07/07

‘(…)o que era meu terceiro dia

foi meu terceiro mês

e assim sucessivamente

a vida foi encurtando

(Talis Andrade in Os Herdeiros da Rosa)

Enfiando o dedo

O considerado Diego Sierra, jornalista em São Paulo, passava os olhos nas notícias do portal Terra quando deparou com este título assaz, como direi, tonitruante; ou, quem sabe, simplesmente colossal:

Dirigente ezalta campanha da McLaren na temporada

Sierra, que não é parente daquela Dolores da canção imortalizada por Nersão Gonçalves, tomou um susto do tamanho do esquisito verbo:

Ô loco!!! Ezaltar tá mais pra nome de iraquiano, né mesmo? Mas só pra não ser muito maldoso, vou acreditar que foi apenas o dedo do responsável que escorregou à esquerda do teclado. Aposto que ele sabe escrever direito…

Janistraquis concorda; afinal, sempre que o dedo escorrega prenuncia-se a desgraça…

Ignorância

O considerado Walter dos Reis Cardoso, chefe de família no Rio de Janeiro, indignou-se com o recente noticiário policial:

‘O pai de um daqueles criminosos que espancaram a doméstica na Barra da Tijuca e cometeram outras barbaridades, disse na TV: ‘Não se deve prender junto com marginais uma criança que estuda e trabalha’. Ora bolas, a ‘criança’ tem 19 anos de idade e é um bandido perigoso. Enquanto os ignorantes vêem os filhos dessa forma, não sei onde iremos parar.’

Você está coberto de razão, ó Cardoso. Janistraquis também anda enojado com essa ‘família moderna’ e recorda a frase de Jô Soares em Viva o Gordo: tem pai que é cego…’

Acompanhante

A considerada Camila Alves, professora em Vitória (ES), leu no Meio&Mensagem online o título capaz de ouriçar todos os que mantêm um bom relacionamento com a flor do Lácio, tão inculta quanto bela:

GNT levará assinante à Londres.

‘Por que ààààà Londres? Quando vão parar com essa mania de meter crase onde a crase não é chamada?!?!?!’

Professora, Janistraquis achou sutilíssima a forma como o GNT anuncia que o telespectador premiado pode levar acompanhante; o sujeito viaja a Londres e a crase vai junto…

Brumas do texto

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no Planalto, de cujo varandão debruçado sobre a esterqueira oficial vê-se a bezerra de Roriz a degustar capim importado da França, pois Roldão lia o Correio Braziliense quando foi atraído pelo texto-legenda intitulado Brumas do Lago, o qual tentava explicar o fenômeno atmosférico raro no Distrito Federal:

‘Para haver nevoeiro, explicam (os técnicos do Instituto Nacional de Meteorologia), é necessário que a umidade relativa do ar seja maior que 80% e o clima frio. Naquele momento (da foto), a umidade relativa do ar estava em torno de 60%. Mas uma massa de ar se deslocou da vegetação – com umidade maior que a da água (sic) – e pairou sobre o lago. Isso fez com que o ar frio em contato com a água quente (sic) provocasse um (sic) condensação do vapor d´água e surgisse o nevoeiro.

Esse tipo de fenômeno é raro nesta época do ano, quando predomina uma massa de ar quente e há poucas nuvens. Elas funcionam como uma espécie de estufa, fazendo com que o calor do sol fique retido na superfície terrestre. Como não há barreira (sic), (afinal, há ou não há nuvens?), os raios solares incidem diretamente na terra durante o dia, mas o calor se esvai rapidamente à noite porque não há a barreira natural. Daí fazer calor de dia e frio à noite.’

Mestre Roldão leu, releu e desabafou:

Dá para entender um texto tão, digamos, artístico?!?!?!

Talis Andrade

Leia no Blogstraquis a íntegra de O Tempo Visível, cujo excerto encima esta coluna.

Santo a dar-com-o-pau

O considerado Hermógenes Infante enviou, ‘para nossa apreciação’, esta notícia que saiu na Folha de S. Paulo:

Durante missa na capela do Alvorada, dom Cláudio compara Lula a Jesus

Em missa que marcou a reabertura da capela do Palácio da Alvorada, dom Cláudio Hummes, ‘ministro’ do papa na Congregação para o Clero, comparou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Jesus Cristo e a são Francisco de Assis.

Conformado, Janistraquis bodejou:

‘O Brasil está salvo, considerado Hermógenes!!! Já temos Frei Galvão, Padim Ciço vem aí, depois a Irmã Dulce, Menininha do Gantois e, agora, o presidente-mártir. ‘Aqui só aparece coisa que a gente entende’ como diz seu Asdrúbal, numa das histórias do excelente livro de Fernando Portela, O Homem Dentro de Um Cão,

De cedilhas

O considerado Miguel Mota, jornalista paulistano que está sempre de olho nas belezas do jornalismo, como bom observador sediado na Vila Formosa, pois Miguel ilustrava-se pela internet afora quando tropeçou neste intrigante título exposto no portal Imprensa (http://portalimprensa.uol.com.br/mapadamidia/new_mapa_data_view.asp?code=2986):

PARCERIA: UNILEVER E PERDIÇÃO ANUNCIAM ALIANÇA ESTRATÉGICA

Mota tem certeza de que a cedilha entrou aí de gaiata, porém Janistraquis, veterano doutras campanhas publicitárias, elogiou o falso engano:

‘Considerado, esses ‘criativos’ das agências são danados; a tal parceria assim anunciada sugere que os produtos da Perdigão são mesmo uma perdição.’

Lubrificante

O considerado jornalista Paulo Droescher despacha da Avenida Paulista:

Mal começo a bisbilhotar a Internet nesta quarta-feira e dou de cara com uma maliciosa chamada na capa do UOL:

Pan: cuspe e vaselina no caminho do ouro

Sei que os atletas dão o máximo de suas capacidades para chegar ao tal do ouro, mas… onde é que ele anda escondido?

Não tão horrorizado como estaria antes da Parada Gay, Janistraquis suspirou:

‘Considerado, o que me espanta de verdade é a ignorância do pessoal; há anos existe no mercado um gel lubrificante e já é tempo de se parar com esse negócio antigo e anti-higiênico de cuspe e vaselina!’

Cocaína

O considerado Xavier Rodrigues Malta, carioca ‘há 67 anos’ e engenheiro aposentado, escutou no rádio esta informação que é, sem dúvida, um tremendo barato:

Segundo a ONU, há no Brasil 860 mil usuários de cocaína.

Malta, que não se excede em botequins, não fuma e nem joga, garante que os, se me permitem, onunistas, andam a beber demais:

Garanto, escrevo e assino embaixo que somente aqui no Rio temos o dobro de usuários de cocaína; e quem não tem dinheiro para isso, se dana no craque, na maconha e o escambau.

Janistraquis tem certeza de que no meio desse escambau esconde-se o ‘Cheirinho da Loló’ e também assina embaixo.

Talento

Perguntei a Janistraquis o que seria, em literatura, um ‘estilo despojado’, como recentemente li numa resenha. Meu secretário fez como Renan Calheiros e não pensou duas vezes:

‘Considerado, estilo despojado é quando o escritor não sabe escrever.’

Nota dez

O considerado Antonio Ozaí da Silva publicou em seu blog e o Observatório da Imprensa reproduziu o excelente texto abrigado sob o título Atentados Lilgüisticos – O vício do gerundismo:

Estarei escrevendo na tentativa de estar contribuindo para que os leitores possam estar prestando atenção a uma determinada forma de comunicação oral e escrita que está sendo comumente utilizada em nosso tempo.

Caros leitores, por favor, não estranhem a linguagem. Procuro apenas ser fiel à maneira de se comunicar que, se já foi novidade e modismo, hoje parece consolidada e incorporada à fala e escrita da intelligentsia de Pindorama. Até mesmo quem deveria prezar pela ‘última flor de Lácio, inculta e bela’, como diria o poeta, aderiu ao gerundismo.

(Leia aqui a íntegra do indispensável artigo.)

Errei, sim!

‘COELHO COLLOR – Lição do Correio da Paraíba: ‘O jornalista e poeta baiano Fernando Collor (foto), 43 anos, chega hoje a João Pessoa com um ‘discurso’ para lançar seu livro O Comício do Vento’. Pois apesar do discurso, do comício, da foto e do vento, o jornalista e poeta baiano não é Fernando Collor, mas Fernando Coelho…’ (maio de 1992)

Colaborem com a coluna, que é atualizada às quintas-feiras: Caixa Postal 067 – CEP 12530-970, Cunha (SP), ou japi.coluna@gmail.com.

(*) Paraibano, 64 anos de idade e 45 de profissão, é jornalista, escritor e torcedor do Vasco. Trabalhou no Correio de Minas, Última Hora, Jornal do Brasil, Pais&Filhos, Jornal da Tarde, Istoé, Veja, Placar, Elle. E foi editor-chefe do Fantástico. Criou os prêmios Líbero Badaró e Claudio Abramo. Também escreveu oito livros, dos quais três romances.’

TELEVISÃO
Antonio Brasil

Por um Michael Moore brasileiro!, 25/06/07

‘Ele não é um cineasta típico americano ou brasileiro. Não freqüentou grandes universidades, não herdou fortuna nem é filho de banqueiro. Nascido na pequena Flint, Michigan, seus pais eram operários e assim como milhões de outros trabalhadores americanos, foram demitidos por empresas como a toda-poderosa General Motors.

Com o seu indefectível boné de baseball, Michael Moore parece um palhaço. É gordo, feio, tímido, meio ranzinza e não acredita em violência. Sua principal arma é ridicularizar pessoas e situações particularmente absurdas. Atrás das câmeras se transforma no terror das grandes corporações ao criar um jornalismo investigativo sério com recursos do melhor entretenimento ‘pastelão. Produz uma nova vertente de filmes documentários performáticos onde a ‘persona’ do ator/diretor se confunde com a militância política. Lembra outros cineastas performático como Sacha Cohen, o criador de Borat, o segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão.

Mas ao contrário dos documentários tradicionais, Michael Moore recorre sempre ao humor. Ele acredita que rir ainda é o melhor remédio.

Seu senso de humor e instinto de rebeldia são velhos conhecidos daqueles que apreciam a boa televisão no Brasil. Ele foi o criador de um dos melhores programas ‘alternativos’ exibidos nos canais por assinatura, o TV Nation. A série era imperdível, diferente de tudo que costumamos ver na TV. Não era mais um documentário muito chato sobre coisas que não nos interessam. Michael Moore foi consagrado com o Oscar de melhor documentário em 2003 por ‘Tiros em Columbine’e a Palma de Ouro de Cannes de melhor filme com Fahrenheit – 11 de Setembro.

Moore para presidente!

Esta semana, Michael Moore acabou de lançar, Sicko (louco, doentio), um documentário que denuncia a sorte ou falta de sorte de 55 milhões de americanos que não têm seguro saúde (veja o trailer).

Só quem já morou nos EUA tem idéia do que é a constante ameaça de não ter seguro saúde no país da medicina mais avançada e mais cara do mundo. A qualquer momento você pode ser surpreendido por doença ou acidente e ter negado um tratamento milagroso que poderia salvar a sua vida. Muitos amigos brasileiros que vivem e trabalham nos EUA permanecem durante muitos anos nos seus empregos por uma única razão: manter o seguro-saúde.

Michael Moore navega contra a corrente. Ele se recusa a aceitar as explicações televisivas que nos procuram convencer de que tudo acontece simplesmente porque… acontece. Uma cultura que divulga, vende e lucra com os nossos medos e transforma o ódio ou a humilhação em bens de consumo. Tudo sem maiores explicações, com a notícia se confundindo com os comerciais. É assim porque sempre foi assim.

O cineasta está sendo acusado pela administração de George W. Bush de ter violado o embargo americano a Cuba. Moore filmou diversas cenas de seu documentário, aqui entre nós, as melhores, na ilha de Fidel Castro. Ele agora teme que o governo use esse pretexto para prendê-lo. Moore certamente sonha com isso. Quem sabe, um dia, torna-se candidato à presidência dos EUA. Certamente também sonha isso.

Em seu filme, Moore visita o Canadá, Inglaterra e França para mostrar como nestes países, onde o sistema de saúde é gratuito, as pessoas são bem atendidas e a expectativa de vida da população é maior. Para isso, Moore, pesquisador dedicado e meticuloso, cita pesquisas oficiais divulgadas pela Organização Mundial de Saúde. Michael Moore parece um palhaço, mas é bom jornalista.

Na última e melhor parte de seu filme, Michael Moore acompanha um grupo de voluntários que ajudaram nos trabalhos de resgate após os atentados de 11 de setembro e que viaja a Cuba em busca do mesmo atendimento médico recebido gratuitamente por supostos terroristas no centro de detenções de Guantánamo. É simplesmente hilário ver e ouvir aquela figura cômica e determinada implorando aos militares o direito de entrada na mais hedionda prisão americana.

Em busca da verdade

Como todos filmes de Michael Moore, alguns adoraram e outros detestaram. A crítica do NYT diz que é o seu filme mais engraçado e que ele aparece bem menos. De qualquer forma, é impossível ficar indiferente às suas provocações. Ele sabe como ninguém utilizar a mídia para promover suas idéias e ameaçar seus inimigos. Conseguiu o que muitos analistas políticos consideravam impossível: trazer para o debate presidencial, a questão da saúde pública nos EUA. Bem que o presidente Bill Clinton tentou no passado. Sua modesta proposta foi derrotada no congresso americano. Assim como no Brasil, o lobby das seguradoras é poderoso. Defende e promove com unhas e dentes a falência do sistema público de saúde e a privatização a qualquer custo. São grandes anunciantes dos principais eventos, principalmente eventos esportivos transmitidos pela TV nos EUA ou no Brasil.

Muitos políticos dependem de suas ‘doações’ para campanhas milionárias. Não é considerado suborno ou corrupção. É lobby ou estratégia política.

No seu jeitão irônico e mordaz, Michael Moore revela os segredos desses grupos tão poderosos. Inclusive sua relação nebulosa com os políticos americanos. Em um de seus melhores momentos, o cineasta indica o valor de cada um dos congressistas a serviço das empresas de seguro. Todos teriam um preço. Questão a negociar.

É nesse caminho, em busca de explicações para as tragédias recentes e para tanta violência na sociedade americana, que Michael Moore tem direcionado seu trabalho. Ele faz um jornalismo de guerrilha que contesta tudo e incomoda muitos. Não teme exibir suas idéias e sentimentos em seus filmes. Se expõe como mais um elemento perigoso da mídia à esquerda dos interesses políticos e econômicos americanos. Ao abrir mão da segurança das regras consensuais que exigem objetividade e isenção, o cineasta dá um exemplo para aqueles que ainda consideram que jornalismo não deveria se tornar sinônimo de indiferença e irresponsabilidade social.

Agora você imagina se o Michael Moore viesse investigar o nosso país. Em tempos de denúncias contra presidente de congresso, Renan Calheiros, Roriz, mensalão, apagão aéreo e tantas outras mazelas não faltaria trabalho para o cineasta americano.

Ao invés de documentários ruins e chatos, financiados pelo governo, estatais ou pela Petrobras e ignorados pelo público, seria muito melhor investir em um Michael Moore brasileiro.

Alguém que produzisse bons filmes que nos façam rir e pensar ao nos mostrar a verdade.

(*) É jornalista, professor de jornalismo da UERJ e professor visitante da Rutgers, The State University of New Jersey. Fez mestrado em Antropologia pela London School of Economics, doutorado em Ciência da Informação pela UFRJ e pós-doutorado em Novas Tecnologias na Rutgers University. Trabalhou no escritório da TV Globo em Londres e foi correspondente na América Latina para as agências internacionais de notícias para TV, UPITN e WTN. Autor de diversos livros, a destacar ‘Telejornalismo, Internet e Guerrilha Tecnológica’ e ‘O Poder das Imagens’. É torcedor do Flamengo e não tem vergonha de dizer que adora televisão.’

JORNALISMO & NÚMEROS
Rodrigo Vargas

Números e jornalismo, 29/06/07

‘Fonte:Diário de Cuiabá – Jornalistas, em geral, detestam números. Uma pesquisa no histórico escolar da maioria certamente revelará uma grande dificuldade em lidar com as matérias ‘de exatas’. Eu, mesmo sendo filho de uma professora de matemática, sempre me dava mal quando tinha de empregar fórmulas, calcular proporções e porcentagens.

Já em meio à loucura do mercado de trabalho, descobre-se que estas indigestas tarefas vão nos acompanhar diariamente, a cada nova reportagem. Seja para estabelecer conexões ou descobrir relações de causa e efeito, os números estarão lá, como oportunidade e desafio.

Mas, se rejeitamos os cálculos, por que então costumamos dar tanto destaque às estatísticas e rankings que são lançados a cada dia? Porque estes dados nos chegam prontos, quase escritos. Nosso trabalho, muitas vezes, consiste em ouvir uma ou outra fonte, ‘para humanizar’.

No mundo inteiro, porém, e com cada vez mais força no Brasil, o casamento entre o jornalismo, a informática e noções avançadas de matemática e estatística está a gerar frutos bem mais interessantes para o leitor. E a adicionar uma série de novos conhecimentos à lista de pré-requisitos do ofício.

O jornalista norte-americano Steve Doig, ganhador do prêmio Pulitzer de 1993 por conta de uma reportagem produzida sob os ditames do conjunto de técnicas chamado de RAC (Reportagem Auxiliada por Computador), vê uma terceira onda no jornalismo.

‘Primeiro, o repórter aguardava os dados fornecidos por autoridades. Depois, o jornalista discutia um problema a partir do uso de aspas. Com o RAC, ele organiza os dados, contextualiza e transforma a si mesmo em um especialista, com o auxílio do computador’, disse ele, durante um evento para jornalistas promovido no mês passado.

Na palestra, Doig deu alguns exemplos do que chamou de ‘ciência do fechamento’. Trabalhando tabelas em uma planilha de dados eletrônica, uma repórter descobriu que a cor da pele influenciava a concessão de financiamento habitacional nos EUA.

Em sua reportagem premiada, Doig detectou que, entre as casas destruídas pelo furacão Andrew, a maioria era de construções recentes. Informações contidas em dados oficiais que, sem a percepção do repórter, continuariam a ser apenas um dado, não informação.

Sim, trata-se de uma discussão entre jornalistas. Mas que interessa à sociedade. Embora haja muito que avançar, hoje já temos uma quantidade colossal de informações públicas ao alcance de um clique. O desafio, para nós, é extrair dali a matéria-prima para o dia seguinte.’

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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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