Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Contardo Calligaris

‘Ainda bem que, de vez em quando, alguém me ‘informa’ direito (as aspas significam que estou sendo irônico; melhor dizer, nunca se sabe).

Por exemplo, você sabia que, entre o 11 de setembro de 2001 e o dia dos atentados de Madri, passaram-se exatamente 911 dias? Ora, 9-11 (setembro-11) é, nos EUA, a abreviação da data do ataque ao World Trade Center. Mas não pense que se trate apenas de uma ‘óbvia’ assinatura da Al Qaeda. Não, isso é só o começo: 911 é o número telefônico que, em Nova York, serve para chamar a polícia em caso de urgência. Ironia dos terroristas? Fácil demais. Será que não é um criptograma que revela os verdadeiros autores do atentado? Não é a prova de que foi o governo americano que orquestrou o ataque que justifica a guerra em curso?

Você duvida? É porque você não sabe que, de manhã cedo, em 11 de setembro, milhares de judeus que trabalhavam nas torres gêmeas (sempre eles, ah?) receberam telefonemas anônimos exortando-os a não ir para o trabalho naquele dia. Está entendendo?

Outro exemplo. Você não estranhou o momento em que o ‘New York Times’ publicou o artigo de Larry Rohter sobre a ‘preocupação nacional’ brasileira com os hábitos alcoólicos do presidente Lula? Foi logo quando o Brasil acabava de ganhar a guerra dos subsídios agrícolas na Organização Mundial do Comércio. Quem tinha interesse em desacreditar o Brasil pelo mundo afora, ah? E se Larry Rohter fosse um agente da CIA há tempo escondido no Brasil para ser ativado de repente na hora de tamanha necessidade estratégica? Aliás, nem é preciso que ele seja um agente, pois é notório (não é?) que a imprensa americana é escrava do complexo político-militar-midiático do império. Rohter pode ter obedecido ao ‘New York Times’, que, por sua vez, deve ter respondido a um daqueles telefonemas do governo que eles recebem a cada dia na hora de decidir a pauta.

Ao escutar pacientes paranóicos capazes de delírios organizados, é fácil constatar que um delírio não é necessariamente menos verossímil que outras crenças que não nos parecem delirantes. Por exemplo, a convicção de que Deus exige que os homens se transformem em mulheres para servi-lo melhor é tão verossímil quanto a idéia de que, a cada missa, a hóstia se transforma realmente no corpo de Cristo. A diferença é apenas esta: o projeto de mudar de sexo para servir a Deus não é coletivo, enquanto a transformação da hóstia (a transubstanciação) é uma fé compartilhada.

Os delírios são crenças que não conseguem se socializar.

Hoje essa diferença se tornou incerta. Graças à internet, qualquer delírio pode se tornar público, circular e conquistar adeptos. Logicamente, este é o argumento decisivo de quem delira: está num site na internet. E, olhe lá, é um site que recebe 12 mil visitantes por dia.

Mas a facilidade com a qual os delírios se socializam não explica sua extraordinária proliferação.

Em 11 de maio (de novo, o 11, viu?), chegou às livrarias americanas ‘The Rule of Four’ (A Regra de Quatro), de Ian Caldwell e Dustin Thomason. Em duas semanas, o romance já é número três da lista dos mais vendidos. Conta a história de dois amigos que devem descobrir os arcanos de um texto renascentista (que existe e que é mesmo repleto de enigmas não resolvidos) para entender o que acontece ao redor deles e, enfim, salvar a pele. Em princípio, quem gostou de ‘O Código da Vinci’, de Dan Brown (número um da lista há 60 semanas nos EUA e agora número um no Brasil), vai gostar de ‘The Rule of Four’.

Os comentadores propõem uma genealogia que começa com ‘O Nome da Rosa’, de Umberto Eco, e continua com esses dois romances recentes. De fato, os três livros têm em comum um gosto pela cultura da Idade Média (no caso de ‘O Nome da Rosa’) ou do Renascimento (para os outros dois), épocas em que o mundo ainda era encantado, ou seja, percebido como um teatro de símbolos e signos que, uma vez decifrados, revelariam que os desenhos da providência divina se estendem, feito vasos capilares, até a periferia da criação. Naquela época, só vivia uma vida sem sentido quem não se desse ao trabalho de resolver as charadas inscritas em cada página do mundo.

Mas ‘O Nome da Rosa’ conta uma história policial acontecida na Idade Média (por mais que ela tenha conseqüências em nossa cultura), enquanto ‘O Código da Vinci’ e ‘The Rule of Four’ nos propõem enigmas cuja solução explica os malogros do presente (para manter a filiação com Umberto Eco, os dois romances são mais comparáveis com ‘O Pêndulo de Foucault’ do que com ‘O Nome da Rosa’). Em suma, o leitor de hoje gosta de enigmas porque eles confirmam que a bagunça de nosso mundo esconde um sentido.

Depois de dois séculos de individualismo realizado, estamos aparentemente cansados de cruzar os dedos esperando com Adam Smith que, por um acerto do acaso, as peripécias de nossas vidas singulares resultem num mundo minimamente ordenado e compreensível.

Somos animados pela mesma angústia que anima os delírios da internet, pois descobrimos, com razão, que a tragédia não é que poderosos e feiosos tramem e manipulem nas sombras. A tragédia, o intolerável é que os feiosos, exatamente como nós, são um atrapalhado exército de Brancaleone. E nossa história, como dizia o poeta, é um conto cheio de barulho e fúria, que não significa nada.’



TODA MÍDIA
Nelson de Sá

‘Ressurreição’, copyright Folha de S. Paulo, 8/06/04

‘Dez anos depois de deixar o Ministério da Fazenda, apanhado dizendo que escondia más notícias para ajudar a eleger FHC, Rubens Ricupero passou pela purgação e vai se tornando unanimidade nacional.

Com o encontro da entidade de comércio que preside, ligada à ONU, é ele o protagonista da semana no país e no mundo ‘em desenvolvimento’.

Ontem, ensinava na cobertura da Globo e dos sites aquilo que o Brasil deve fazer para crescer no comércio mundial: apostar em inovação e qualidade. Citou o café:

– Apesar de ser um dos maiores exportadores, o Brasil não tem uma marca internacional de café.

Não falava da concorrência da Colômbia, mas daquela feita por Itália e Alemanha, ‘os maiores exportadores mundiais de café beneficiado’.

– A qualidade não é só a alta tecnologia, às vezes é a embalagem, às vezes é vender carne desossada em vez de bruta.

Ele pode soar vago, mas o problema é bem presente.

O site do ‘Wall Street Journal’ noticiou ontem que o preço da soja nos Estados Unidos subiu com a perspectiva de maior demanda da China.

EUA e Argentina poderiam receber mais pedidos chineses ‘em lugar do Brasil’, segundo o jornal, devido à baixa qualidade da soja entregue por exportadores brasileiros à China.

Aqui, prossegue a resistência.

Enquanto Ricupero pedia soja de qualidade, Germano Rigotto, governador do mesmo Rio Grande do Sul cujo porto contaminou a soja enviada à China, insistia na RBS que são os chineses os errados.

O encontro a ser realizado pela ONU em São Paulo vai muito além da soja ou do café. Em entrevista ao ‘Financial Times’, Ricupero falou em negociações ‘ambiciosas’ entre os países em desenvolvimento.

Segundo o ‘FT’, o slogan do evento é ‘uma nova geografia global’, da frase de Lula na China. O ‘Valor’ destacou a ‘negociação sul-sul’. Organizadora do encontro, Lakshmi Puri falou em ‘revolução silenciosa’.

O entusiasmo maior, até agora, está na Índia. O novo governo indiano fez reunião ontem, segundo o jornal ‘Financial Express’, para tratar do encontro em São Paulo.

Deve, segundo o ‘The Times of India’, sublinhar ‘a luta contra os subsídios das nações desenvolvidas’. Segundo o ‘The Hindu’, o país vai, ao lado de Brasil, China e África do Sul, ‘adotar uma postura agressiva’.

INAUGURAÇÃO

O Jornal Nacional foi contido. Os telejornais locais e rádios até que se esforçaram em registrar informações de serviço sobre as unidades da tal Farmácia Popular. Mas com dois assessores do ministro da Saúde ‘sob suspeita’ de fraude e a novidade do arrombamento, o caso era incontornável. Após breve menção à farmácia, a Globo voltou a entrevista com Humberto Costa, ontem de manhã, ao escândalo. Uma pergunta:

– O senhor não desconfiou que os seus dois auxiliares diretos pudessem ter atitudes assim?

E foi disso que o ministro mais falou na Jovem Pan etc. Até na campanha de vacinação, no fim de semana, havia a sombra do escândalo na cobertura.

Quanto a Lula e Marta Suplicy, sobrou ontem falar sem parar que a distribuição das unidades não segue ‘critério político’. No JN, Lula surgiu ao lado de um pefelista. Mas Boris Casoy, na Record, não se convenceu.

Paz e amor

O programa de ontem do PSDB, quase todo voltado a José Serra, confirmou o que vinham avisando alguns comentaristas. Em tom pastel, a propaganda apresentou ‘Serrinha paz e amor’, um esforço publicitário de tornar a imagem do tucano agradável aos eleitores.

Foi terminar o programa e veio a resposta da sorridente Marta Suplicy, em comerciais sobre transporte público.

500 anos

Depois do documentário na BBC, no domingo foi o ‘Miami Herald’ que dedicou um longo e favorável dossiê ao MST.

O enviado do jornal dos EUA ao Pontal disse que ‘os quase 500 anos de leis a favor dos ricos estão no coração da violência em torno da terra’. José Rainha ganhou perfil, intitulado:

– Conforme obtém sucesso, líder carismático se torna alvo.

Ganha todas

O ministro da Fazenda está em estado de graça, pelo noticiário. Antonio Palocci anunciou para a internet, como um oráculo, que ‘o Brasil já está no quarto trimestre de crescimento’.

Desafio agrícola

Já o ministro da Agricultura está cada vez mais à vontade no discurso lulista. Na Globo News, dizia Roberto Rodrigues:

– O maior desafio do século 21 é reduzir as diferenças entre os ricos e os pobres.

Casa de horrores

Garotinho, afinal, assumiu o problema. Ele surgiu nos canais de notícia, ao vivo, para falar da ‘situação de emergência’.

Foi após dois dias de cobertura pesada da Globo, do Fantástico ao RJTV, que teve até ‘câmera escondida’ na Casa de Custódia -a ‘casa de horrores’.

A REAÇÃO

A reação à defesa do software livre pelo Brasil prossegue. O site do ‘New York Times’ dizia ontem que no Brasil, ‘com apoio do governo, o software livre já ganha ritmo’ também fora da administração pública.

O site Carta Maior, que é hospedado no UOL, noticiou que a Microsoft, maior prejudicada, estaria ‘lançando uma ofensiva política para barrar o software livre no Brasil’. Um especialista, segundo o site, ‘alertou que os monopólios estão se preparando para financiar campanhas’ na eleição deste ano.

Mas a multinacional sofreu um revés de imagem. O ‘Financial Times’ destacou em sua home a informação -que ‘chocou o setor no mundo’- de que ela tentou absorver recentemente a maior empresa de software da Alemanha, ampliando seu domínio global.’

***

‘‘Kill Bill’’, copyright Folha de S. Paulo, 6/06/04

‘Gilberto Gil encerrou o Fórum Internacional de Software Livre, em Porto Alegre, com um show destacado ontem pelo ‘Correio do Povo’. Nome do show: ‘…/liberdade/digital’.

O ministro fez mais, lançando a música ‘Oslodum’ para ‘livre comercialização na internet’. Perguntaram se na web não vão ‘estragar’ a música. E ele:

– Essa é a idéia. É o sinal de que existe liberdade.

O fórum e o ministro são parte de uma ação que vai além deles.

O governo Lula é chamado de ‘líder mundial’ na adoção de software livre em sua gestão e, segundo o ‘Valor’, pode trazer a China ao ‘movimento’.

Uma missão governamental e empresarial chinesa está no país ‘para conhecer as inovações mais recentes do Brasil na área de governo eletrônico’, melhor dizendo, de software livre.

A integração na área começou a se concretizar nesta semana com os investimentos de US$ 3 milhões, anunciados anteontem no site de ‘O Estado de S.Paulo’, a serem feitos no Brasil pela Speed InfoTech, fabricante de computadores de Xangai.

Mas a ação também vai muito além de Brasil e China.

A revista ‘Forbes’ destaca na capa de sua mais recente edição, sob o título ‘Kill Bill’, mate Bill, que a IBM, fabricante americana de computadores, está gastando ‘bilhões na cruzada para fazer do Linux o sistema de operação mais popular do mundo’.

O Linux é grátis e está na base do software livre implantado aqui e em outros países. O alvo da IBM é o Windows, produzido pela Microsoft de Bill Gates.

Além da IBM, também a Dell aposta bilhões no Linux. E agora é a HP, também fabricante, que anuncia que vai adaptar os seus PCs para o sistema Linux.

O foco de IBM, Dell e HP não são governos, mas corporações.

Ninguém pensou, é claro, que a Microsoft assistiria sem reagir.

O ‘Washington Post’ e outros traziam despacho da Reuters, anteontem, com declarações agressivas de Emilio Umeoka, presidente da Microsoft Brasil, contra a adoção do Linux pelo governo Lula. De Umeoka:

– Se o país se fechar outra vez, daqui a dez anos vai acordar e ser dominante em algo que é insignificante. Meu chefe disse: irrelevância é o início do fim.

O chefe dele é Bill Gates.

Mas talvez a preocupação de Umeoka fosse outra, bem mais imediata. A agência Dow Jones trazia ontem a notícia divulgada pela própria Microsoft Brasil, no sábado -sobre sua vitória no Cade, num caso de concorrência desleal de cinco anos.

É mais do que um exagero, mas já tem gente dizendo, caso do blog de Ricardo Noblat, que Lula pode até apoiar Antonio Palocci para presidente em 2006.

A ‘Veja’ não chega a tanto, mas se derrama pelo ministro em sua nova edição, que faz um longo perfil. Na capa, além da foto e da manchete ‘Palocci ganha todas’, destaca que ele é ‘o mais popular ministro do governo’.

A fonte, no entanto, não é das mais confiáveis. Trata-se de ‘pesquisa Ibope para a agência de Duda Mendonça’, com a aprovação de 63% à política econômica.

Mas é certo que o ministro está bem na foto, ao menos nesta apresentada agora pela ‘Veja’. Além das vitórias sem fim (‘Ele venceu’ é o título do perfil) dentro e fora do governo, como crescimento, salário mínimo e outras, ele ‘conhece tudo de Machado de Assis’ -e por aí vai.

Lula e a oposição

Às vésperas de uma votação no Senado, Lula volta os olhos aos tucanos que foram amigos. O UOL e os telejornais davam manchete ontem ao seu pronto envio de tropas federais a Minas. Pedido de Aécio Neves.

Já o ministro Aldo Rebelo e os seus só fazem agradar tucanos. De Tasso Jereissati, a ‘O Globo’, sobre a líder do PT no Senado:

– A Ideli já senta com a gente no cafezinho e até conversa.

Na posse de Nelson Jobim no Supremo, ‘do lado de fora Tasso e Arthur Virgílio traíam o PSDB com Aldo Rebelo, mas pediam a degola de Humberto Costa’.

Ultimato

O ministro da Justiça pode ter defendido o ministro Costa em rede nacional. Lula pode ter feito igual na reunião ministerial.

Mas Costa levou ‘ultimato’ do presidente, diz o ‘Valor’, para ‘varrer, de forma irrefutável, a corrupção de seu ministério’. Do contrário, perde o cargo.

Tumulto

Mas não é só do atual ministro que se trata. O jornal ‘Financial Times’ entrou no tema dizendo que ‘o escândalo ameaça causar tumulto tanto no governo como na oposição’. E registrou:

– José Serra negou qualquer má conduta, mas observadores acham que o escândalo pode manchar a campanha a prefeito.

Regras

Um ex-ministro da Justiça, o tucano Aloysio Nunes Ferreira, também entrou em campo para a defesa, no site do PSDB.

Segundo ele, ‘a mudança nas regras de licitação, conduzida pelo ex-ministro da Saúde José Serra, provocou uma queda nos gastos’, o que ‘foi reconhecido pelo atual ministro da Saúde’.

Rio Branco

No ‘Financial Times’, durante a semana, ‘traders’ que vendem soja brasileira na China atacaram Lula por não pressionar os chineses a aceitar a soja contaminada.

Ontem, no jornal ‘O Estado de S.Paulo’, Rubens Ricupero, que preside a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio, reagiu dizendo que há um século o barão do Rio Branco já via a ‘esperteza’ dos exportadores brasileiros:

– Preocupam-se mais com quantidade do que com qualidade. Aqui (na Europa), todos me dizem que o café freqüentemente vem misturado com tijolo, terra, folhas. E o algodão vem com pedras.

Lições

Como Ricupero, o economista Décio Zylbersztajn, da FEA-USP, escreveu no ‘Valor’ das ‘lições’ do caso ‘para a cadeia da soja’:

– No mundo do agronegócio, não basta produzir muito, é preciso produzir com qualidade.

A vez do Brasil

No cotidiano da Organização Mundial do Comércio, que busca reabrir as negociações globais, a novidade é a pressão para o Brasil fazer sua proposta de abertura do setor de serviços, em resposta ao corte nos subsídios agrícolas.

Segundo o site da ‘Forbes’, foi o que cobraram o responsável pelo setor na OMC, o chileno Alejandro Lara, e o representante comercial dos EUA, Roberto Zoellic.

Os ‘serviços’ incluem finanças, energia e telecomunicações.

Cai a cortina

Ronald Reagan, ator de política, cinema e teatro, morreu ontem. Em canais como a Fox News e a CNN, imagens de seus trabalhos. Ele tornou a democracia, de uma vez por todas, encenação.

Era um bom ator. Chamavam-no ‘O Grande Comunicador’.’

***

‘Lula e a oposição’, copyright Folha de S. Paulo, 4/06/04

‘Lula apelou ao sul para dar, afinal, uma longa entrevista. Falou aos ‘editores, colunistas e comunicadores’ do grupo RBS, com reprodução nas emissoras regionais vinculadas à Globo, na rádio Gaúcha e no jornal ‘Zero Hora’, entre outros.

Disse que, ao ser eleito, tomou a ‘decisão de não ir para a TV chorar e comparar os dois governos’, embora toda a propaganda petista recente tenha feito precisamente isso.

E ele próprio, na entrevista, não perdeu de vista a ‘oposição’ em momento nenhum. Disse que ‘todos os dias surgem novos esqueletos’ de FHC. Citou três e ficou repetindo:

– Não estava no Orçamento. E eu tenho que pagar.

Sobre as eleições municipais, declarou que elas ‘nunca foram e nunca serão um plebiscito do governo federal’:

– O Fernando Henrique perdeu e foi reeleito.

Garantiu que não vai ‘subir em palanque nem em São Paulo’, mas acrescentou:

– Não pretendo…

Saudou a ‘grande vitória’ de anteontem no salário mínimo e disse, sobre o valor:

– Alguém no país gostaria de dar um mínimo maior que eu? Nem o Arthur Virgílio!

Virgílio é o líder do PSDB no Senado. Lula foi obsessivo até ao falar da cobertura, pedindo comparação com FHC:

– A imprensa é infinitamente mais pessimista do que a população. Para fazer direito, tem que comparar o Brasil de hoje com o de outras épocas.

Por fim, descrição dele para a atual oposição:

– A oposição hoje é a mesma que o Fernando Henrique tinha. Até o discurso é o mesmo.

Tamanha obsessão pode ter se intensificado ainda mais ontem. Como se assistiu nos telejornais, Lula e a oposição ficaram frente a frente, na posse no Supremo.

O RETRATO

Para a Globo, é o ‘retrato do desemprego’. O porto de Santos está abrindo 300 vagas para estivadores, ‘as inscrições só começam na segunda-feira’ que vem -e os candidatos já estão na fila há cinco dias, com previsão de ficar mais três. Os candidatos apelam para cobertores e até barracas, outros se revezam em cadeiras na fila. De um desempregado, ouvido pela emissora:

– A gente está fazendo um turno de seis horas. São quatro períodos por dia.

Lula e o Senado

De Lula, à RBS, sobre a votação do mínimo no Senado:

– Vai ser mais difícil, porque há uma concentração de forças mais apertada. O grande ‘bunker’ do PSDB é o Senado.

O ministro José Dirceu, ao lado dele, concordou.

Franklin Martins, à tarde na Globo, foi ‘mais realista’:

– No frigir dos ovos, o novo mínimo também será aprovado no Senado. A votação na Câmara mostrou que o governo continua com maioria no Congresso.

À noite no JN, Martins atenuou sua certeza de vitória.

‘Traição’

O Bom Dia Brasil falou em ‘traição’, mas não de Lula a seus eleitores, como cantou a oposição, e sim do PL e de parte do PMDB ao governo.

Alexandre Garcia gastou ironia com o partido de Michel Temer, chamado de ‘mistura de governo e oposição’, com ‘as vantagens’ do poder e aquelas de parecer ‘bom moço’.

Oferta e procura

Um título do ‘Valor’, ontem, sobre a prefeita de São Paulo e a negociação do apoio do PMDB e do PL à sua reeleição:

– Marta Suplicy oferece cargos para atrair frente.

E um título do jornal ‘O Estado de S.Paulo’, idem:

– Vereadores querem cargos para apoiar Marta.

A volta da Cobra

A cobertura do 5º Fórum Internacional de Software Livre, em Porto Alegre, vai do argentino ‘Clarín’ ao site noticioso criado por Frei Betto, o Adital.

Mas a notícia na área, ontem, estava no ‘Valor’: um pacote de software livre da Cobra, aquela mesma, hoje ligada ao Banco do Brasil. O lançamento ganhou o nome estranho de ‘Freedows’, em oposição ao Windows.

Modelos

A ‘Economist’ traz cobertura especial da Argentina em sua nova edição. Em linhas gerais, diz que o país deve acertar os pagamentos aos credores e buscar ‘modelos nos lugares certos’.

Questiona a importância do Mercosul e diz que o exemplo a seguir é o Chile, com sua ‘abertura comercial’. Mas a revista comete a heresia de elogiar as políticas de Carlos Menem.

FHC na Argentina

Quem também anda por Buenos Aires é FHC. Segundo o ‘La Nacion’, ele esteve lá anteontem, para mais uma palestra, mas também para encontro com o presidente da União Cívica Radical, de oposição.

‘Eleição’

O ‘USA Today’ noticiou que o primeiro-ministro do Iraque obteve sua indicação depois de contratar empresas de lobby e marketing em Washington.

A OUTRA MISSÃO NO HAITI

A missão brasileira no Haiti, além da cobertura diária de emissoras como Globo ou CNN em espanhol, estimula análises na imprensa americana -sublinhando sempre que não se trata só de operação militar, por ser um país tão pobre.

No ‘Miami Herald’ de ontem, dois acadêmicos escreviam que ‘é de interesse dos EUA aceitar o apoio do Brasil’ na região, saudavam ‘mais um sinal de que o país está surgindo como um jogador global’ -e, sobretudo, sugeriam o que o Brasil deve fazer para desempenhar ‘um papel central no desenvolvimento do Haiti’.

De sua parte, análise da agência conservadora UPI, vinculada ao ‘Washington Times’, sublinhava ontem que o Brasil, além de pôr ordem num Haiti que o ex-presidente Aristide deixou em caos, ‘precisa achar um jeito de lidar com uma população faminta’.’

***

‘Inimigos íntimos’, copyright Folha de S. Paulo, 3/06/04

‘Até governo e oposição fecharam um inusitado acordo para aprovar logo o salário mínimo. É que tinha jogo da seleção. E não mais um jogo: o adversário era a Argentina. Manchete no Jornal Nacional:

– Entra em campo uma das maiores rivalidades do futebol mundial.

A ansiedade era tamanha que a derrota de Guga para um argentino à tarde virou manchete nos sites, que esqueciam tudo mais. Da Globo.com:

– Argentina vence o primeiro round. Segundo round: Vitória sobre os nossos vizinhos vale a liderança.

De sua parte, os sites argentinos faziam a festa. O ‘Clarín’ falava da ‘façanha do tênis argentino’. Lá como cá, porém, a atenção maior era para o futebol. Algumas expressões coletadas por lá:

– O grande clássico… Talvez o maior clássico mundial… São os dois senhores do mundo.

E algumas opiniões:

– É estranha a mescla de auto-suficiência e respeito que os brasileiros mostram diante de tudo o que seja argentino. Têm fé no Brasil, mas respeitam a nossa seleção mais do que a respeitamos na Argentina. Pela grande paridade do clássico. Porque tem lendas.

Pelo mundo, quase a mesma coisa. ‘Financial Times’ e ‘Washington Post’ dedicaram reportagens. Para o segundo, é um jogo ‘com excesso de honra nacional em disputa’. Mas é de um site de El Salvador talvez a melhor descrição:

– Argentina e Brasil. Inimigos íntimos.

No comércio, por exemplo. O ‘La Nacion’ destacava ontem que o presidente Néstor Kirchner se prepara para ir à China, a exemplo de Lula. Sem ciúmes, na visão do jornal:

– A dianteira que o Brasil leva pode nos ajudar.

Outro exemplo, a integração militar. O ‘Clarín’ noticiou que o Senado argentino aprovou ontem o envio de tropas ao Haiti e que o ministro da Defesa viaja ao país caribenho em seguida, ‘junto com seu colega brasileiro, José Viegas’.

No mesmo ‘Clarín’, ontem, uma cobertura especial sobre software livre terminava com um texto descrevendo o Brasil como ‘pioneiro e líder na utilização’. E o título:

– Brasil, exemplo a seguir.

Não é preciso seguir, apenas integrar, no entender de Hélio Jaguaribe, em artigo publicado também no ‘Clarín’, anteontem. Para o sociólogo brasileiro, ‘nunca foram mais favoráveis as condições para consolidar e aprofundar a integração argentino-brasileira’:

– Os governos de Lula e Néstor Kirchner podem coordenar suas estratégias de desenvolvimento nacional e ser protagonistas em uma nova ordem internacional multipolar.

MAIS DO ‘NYT’

A repórter do ‘New York Times’ que fez os textos sobre armas de destruição em massa no Iraque, Judith Miller, virou destaque da nova edição da revista ‘New York’ (foto ao lado), num perfil devastador, com referências à sua suposta ‘ambição sem limites’. Ela respondeu no ‘New York Observer’: ‘Quem ainda lê a ‘New York’?’

CANUDOS LÁ

O Oficina de Zé Celso viajou à Alemanha com ‘Os Sertões’, na última semana, e virou capa da principal revista teatral européia, ‘Theater Heute’, com o título ‘O sentimento do Brasil’, mais três páginas sobre a encenação da grande obra de Euclydes da Cunha. A última parte do espetáculo, ‘A Luta’, estreou lá no domingo.

Operação PMDB

Alexandre Garcia abriu o dia, na Globo, avisando que o PMDB estava ‘dando atenção’ para ‘convencer’ seus deputados a votar ‘o mínimo do governo’.

O site de ‘O Estado de S.Paulo’ completou à tarde que o líder peemedebista Renan Calheiros mergulhou na ‘operação para melhorar a performance do partido na votação’, chegando a ligar para Anthony Garotinho e pedir os votos do Rio.

A partilha

De sua parte, Marta Suplicy disse ontem à Folha On Line que ‘as reivindicações (do PMDB em São Paulo) são legítimas e democráticas’. E ‘quem partilha programa partilha governo’.

Ofereceu ‘crescimento político’, cuja tradução é, como se sabe, ‘cargos’. Serve para a eleição paulistana e, no dia, serviu para a votação do salário mínimo.

Novas indústrias

O Rio de Janeiro ainda nem acabou de contar direito os mortos da chacina, uma agência internacional fala em ‘êxodo de empresas’ devido à violência, mas ‘O Globo’ destacava ontem, em sua primeira página, tratando do BNDES:

– Carlos Lessa diz que o Rio terá novas indústrias.

Promessas

O foco está todo no Rio, mas a fuga de presos em São Paulo tem sua repercussão local. A rádio Bandeirantes fez editorial criticando o governo estadual por não ter aberto as vagas perdidas na implosão do Carandiru.

Segundo a rádio Jovem Pan, depois da nova fuga, no fim de semana, o governador Geraldo Alckmin ‘voltou a prometer desativar todas as carceragens da cidade de São Paulo’.

‘Go west’

Se as metrópoles vão mal, com violência e desemprego, a economia se volta para o interior, para o oeste. Ontem a ‘Gazeta Mercantil’ destacou que a Bahia vai realizar o Agrishow Nordeste ‘no oeste do Estado’:

– Os organizadores comemoram o recorde de produção local de soja e estimam que a feira movimente cerca de R$ 500 milhões em negócios.

Desabamentos

As chuvas que caíram sobre Maceió, em Alagoas, receberam destaque no JN e até em algumas agências internacionais. Mas a rádio CBN foi a única a registrar que elas atingiram as ‘regiões nobres’ da capital e:

– Provocaram até desabamentos de mansões.’

***

‘A balança e o avião’, copyright Folha de S. Paulo, 2/06/04

‘Manchete no UOL e no Jornal Nacional, ontem:

– Balança comercial tem o melhor resultado da história.

É um ‘saldo histórico’, esse que o ministro Luiz Furlan anunciou e que correu mundo em agências como AP e AFX. Mas o ministro queria mais do que divulgar um superávit. Do título da Globo On Line:

– Furlan diz que exportação cresceu após viagens de Lula.

Ele fez as contas. Depois das respectivas visitas, a exportação para a Líbia cresceu 52%, para a África do Sul, 50%, para a Síria, 800%. Dele, no site do ‘Valor’:

– O presidente abre portas, ruas, avenidas que são ocupadas pelos empresários brasileiros e isso se transforma em resultado.

Por fim, abordou o que, ao que parece, queria mesmo dizer:

– A compra do avião, por exemplo, só o que crescemos na Síria já paga com folga.

No fim de semana, ‘O Globo’ havia destacado que a aeronave a ser comprada para substituir o ‘Sucatão’ tem até banheira.

E vem aí mais viagem. Como noticiou ontem o ‘Valor’, Lula vai a Nova York no dia 22 para um encontro ‘com empresários e investidores dos EUA, Canadá e México’. Luiz Furlan e outros ministros seguem com ele.

E ontem, por outro lado, a agência Tass deu a chegada a Moscou de uma delegação com 35 empresários brasileiros, para encontros com empresários russos. Segundo a chancelaria brasileira, é para ‘fazer tantos contatos quanto for possível’. Por enquanto, sem Lula.

O GRANDE TESTE

É hoje ‘o primeiro grande teste do ministro Rebelo’, na opinião do comentarista Merval Pereira, na CBN. A votação do valor do salário mínimo está sendo tocada pelo ministro da Articulação Política, com todo o poder para negociar -o que inclui jurisdição sobre cargos no governo. Na cobertura, foi ele quem falou de dois reajustes no salário mínimo neste ano. Após reunião com os líderes na Câmara, garantiu que ‘a base está segura dos votos para aprovar’.

Show

Luiz Antonio de Medeiros uniu-se à Polícia Federal e ao Jornal Nacional para um show no horário nobre, ontem.

O flagrante que o deputado encenou para uma tentativa de suborno lembrou o velho Aqui Agora. Em tempo real, com a narração de César Tralli e até um acusado sendo entrevistado ao entrar no camburão.

O pastor

A atuação do pastor, no caso do massacre de presos no Rio, foi questionada pela Defensoria Pública na CBN e defendida por representantes do governo de Rosinha nos sites e emissoras.

Ao UOL News, o pastor disse que o massacre poderia ter sido evitado se não se misturassem no presídio as três organizações: Amigos dos Amigos, Comando Vermelho e Terceiro Comando.

Remessas

O superávit comercial recorde não é o bastante -e a Caixa Econômica Federal sai pelo mundo ‘de olho nas remessas dos brasileiros que moram no exterior’, segundo a ‘Gazeta Mercantil’, ontem. A entrada da Caixa nesse ‘mercado global de remessas’ foi destaque também na agência Dow Jones, citando que o Itaú fez o mesmo.

Segundo o ‘Valor’ de ontem, os brasileiros já mandam para o Brasil R$ 17 bilhões por ano.

Lula lá 1

O ‘Financial Times’ publicou editorial em tom de apelo a Lula. Diagnostica que ‘a lua-de-mel política terminou’, mas ‘ainda não chegaram as recompensas pela abordagem ortodoxa das dificuldades que herdou’, como ‘a economia muito endividada e os juros extremamente altos’.

Mas ‘as recompensas para a determinação estão começando a surgir’, diz. E encerra:

– Depois de trabalhar tanto para estabelecer a reputação de políticas sólidas, o governo deve convencer de que tem vontade de manter o rumo. Sem dúvida pode ter sucesso. Precisa ter.

Lula lá 2

O temor maior do ‘FT’ está no Congresso e no Supremo. A ‘BusinessWeek’ também cita ambos e discute se Lula está ‘perdendo o controle’. Menos dramática, a revista diz o que pode ‘reverter’ o quadro:

– A economia brasileira já cresce muito mais rapidamente, graças a exportações em alta e juros em queda. Se a sensação boa chegar em tempo para as eleições, os brasileiros podem apoiar candidatos de Lula. Isso aumentaria a confiança.

A Globo age

Também a Globo está de olho nos outros dois poderes. Sobre o mínimo e taxação de inativos, está quase em campanha.

UM MEDIADOR

Como noticiou ontem o site do ‘New York Times’, o general brasileiro Heleno Pereira ‘recebeu o bastão’ do general americano Ronald Coleman em uma cerimônia -e assim ‘a ONU tomou comando dos EUA no Haiti’.

‘Washington Post’, ‘Le Monde’, ‘El País’ e inúmeros outros publicaram reportagens sobre a mudança, que envolve muito mais do que a liderança da missão pelo Brasil -a atenção se voltou principalmente para a troca de uma força unilateral americana por uma multilateral. Mas o ‘Financial Times’ observou, em sua reportagem:

– Mr. Lula da Silva está ansioso por demonstrar as ambições do Brasil, de ter um papel maior na diplomacia internacional. A ajuda ao país mais pobre do hemisfério também sublinha a crescente liderança brasileira como um mediador e um pacificador numa região que muitas vezes se mostra volátil. Em princípio, os EUA recebem bem o Brasil como uma força de estabilização regional.’