Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Débora Pinho

‘Paulo Maluf, candidato à prefeitura de São Paulo, não conseguiu direito de resposta na revista Veja. O juiz Galdino Toledo Júnior, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, acatou os argumentos da Editora Abril nesta sexta-feira (30/7). Os advogados de Maluf irão recorrer da decisão.

Maluf não gostou da coluna do jornalista Roberto Pompeu de Toledo intitulada ‘Candidato em transe’. Em um dos trechos, o colunista afirmou: ‘Maluf faz campanha em que as malufadas se superam em malufices com alto grau de malufagem’. Também tratou de frases pelas quais Maluf ficou conhecido em São Paulo e fez outras críticas ao candidato.

A revista foi representada pelo advogado Alexandre Fidalgo, do escritório Lourival J. Santos Advogados. A defesa alegou que Pompeu de Toledo tratou de ‘frases emblemáticas por todos conhecidas como rouba mas faz e estupra mas não mata’. Também argumentou que a publicação é absolutamente verdadeira e não teve intenção de embaralhar o pleito de 2004.

O juiz entendeu que não houve ofensa para justificar o direito de resposta. ‘Nesse ponto, é de consenso que a vida das pessoas que possuem cargo público é, por costume, alvo de comentários que, por vezes, dão origem a ironias e gracejos, sem que isto signifique, necessariamente, lesão à honra. Admitir o contrário equivaleria a engessar demasiadamente a campanha, dando guarida a suscetibilidades exacerbadas em detrimento do livre debate de idéias’, afirmou o magistrado.’



Alamiro Velludo Salvador Netto e Fernando Neisser

‘Propaganda eleitoral não é sujeira’, copyright Carta Maior Informação Jurídica (www.cartamaior.com.br), 28/07/04

‘A propaganda tem uma importância crucial na disputa pelo voto, principalmente sob o enfoque da democratização das informações de quem são, a rigor, os pleiteantes da função pública

A aproximação das eleições municipais de outubro de 2004 e o início propriamente das campanhas eleitorais despertaram um curioso debate na imprensa sobre a propaganda dos candidatos que, ao fixarem faixas e plásticos em postes, viadutos, passarelas e pontes, mesmo que devidamente respaldados pela legalidade, contribuiriam para a sujeira e poluição visual da cidade.

O interesse da mídia, em todos os meios de comunicação, foi tão grande pelo assunto que ensejou, inclusive, a criação de um acordo multipartidário para evitar, ou atenuar, o volume propagandístico, denominado ‘Pacto por uma São Paulo Limpa’, sendo interessante que onze partidos, por convicção própria ou pressões midiáticas, já assinaram seu compromisso.

Todavia, a questão não pode ser encarada com tamanha simplicidade, devendo ser considerados os diversos aspectos e fatores que envolvem a perspectiva social da realidade das eleições e suas implicações na própria estrutura de poder do Estado na tentativa de, pelo meio representativo, expressar a soberania popular externalizada através do voto. Não restam dúvidas de que a propaganda eleitoral, de fato, altera o visual de uma cidade, principalmente em se tratando de uma metrópole como São Paulo com uma grande quantidade de postulantes aos cargos do Executivo e Legislativo. Da mesma forma, não podemos desprezar a nova visão que o homem, em todo o mundo, vem corretamente desenvolvendo acerca do meio ambiente como espaço vital de interação, jurisdicizando, aliás, os valores fundamentais de um local urbano saudável e limpo.

Ocorre que a eleição, porém, em todo este contexto, ganha um sentido absolutamente relevante e primordial. É indubitável que a propaganda tem uma importância crucial na disputa pelo voto, não somente quando vista na figura daquele que a promove, mas principalmente sob o enfoque da democratização das informações de quem são, a rigor, os pleiteantes da função pública. A escolha do eleitor, neste ínterim, insere a propaganda eleitoral como mais um fator das diversas razões decisórias, menos no aspecto de motivação, e muito mais na cognição da gama de candidatos. Por estes motivos, a propósito, que a propaganda eleitoral é minuciosamente regrada pela legislação eleitoral (Código Eleitoral – Lei 4.737/95 – artigos 234 a 256 – e demais leis extravagantes), pelas resoluções normativas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo estabelecidos até crimes a ela relacionados.

Por mais que se possibilite a realização de propaganda por métodos alternativos à anexação de faixas e plásticos em postes, como o horário eleitoral na televisão e a utilização dos ‘outdoors’, há de salientar que notoriamente se percebe a incapacidade de substituição plena destes outros meios e suas, na maioria das vezes, inacessibilidades. Apenas para exemplificar, todos admitem que a propaganda televisiva dedica a maior parte de seu tempo aos candidatos aos cargos majoritários como a prefeitura municipal, de modo que os futuros vereadores acabam sendo obrigados, na televisão, a divulgar seu nome e número em ridículos segundos. Do mesmo modo, os grandes cartazes custam muito caro, o que impossibilita candidatos ao Legislativo, e ao próprio Executivo, de apontar o seu nome desta forma sem desprender gigantes recursos financeiros que acabam, em última instância, sendo patrocinados pelo capital privado.

Além disso, o próprio sistema eleitoral brasileiro que prestigia a individualidade do voto – haja vista a pouca cultura partidária -, o nominalismo da escolha e a prática do sufrágio, confere ao constante contato visual importância significativa. Não é de hoje que a democracia se faz com o pilar primordial da informação, do acesso ao conhecimento, único e exclusivo componente capaz de possibilitar a escolha em sua mais completa expressão. Abolir as formas menos custosas e populares de divulgação, mesmo que para tal se arque com conseqüências indesejáveis por um lapso temporal de três meses a cada dois anos, redunda na prática distorcida de prestigiar aqueles com maior capacidade econômica nas eleições e na diminuição da carga informativa ao interessado, qual seja, o cidadão sob a égide do poder.

Nesse âmbito, percebe-se claramente um conflito valorativo, mas que como toda complexidade atinente aos temas desta natureza não pode ser avaliado de modo simples ou unilateral. A campanha eleitoral, por maior que possa ser o descrédito da população ou da imprensa em sua legitimidade, é o fenômeno mais importante da vida democrática e, assim, suas formas de manifestação, regradas e admitidas em lei, não podem ser limitadas e tolhidas mesmo quando enfrentada com outros relevantes valores da escala axiológica. O meio ambiente ajustado é imprescindível, a questão urbana deve ser prioridade de pauta, mas para tal, se faz também inarredável o agir político, as formas públicas de interação e que, por esta mesma natureza, são decididas pelos governantes eleitos pelo mesmo voto; melhor quanto mais esclarecido.

Priorizar a democracia é priorizar seus procedimentos, na dialética da forma e conteúdo. A eleição aberta é a eleição real. Num país onde de tudo o povo já é tolhido historicamente, não podemos permitir que se cometa mais este cerceamento sob o falho diagnóstico da incompatibilidade do conhecimento e o sofisma da cidade limpa como se a eleição fosse o grande foco da sujeira. Enxergar os valores do homem é sempre uma tarefa digna de aplausos, mas desde que entendamos tais princípios como integrantes de uma intrincada rede, a qual tem a democracia como residente em seu mais alto grau hierárquico.

Alamiro Velludo Salvador Netto e Fernando Neisser – Advogados e membros da Comissão de Direito Político e Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de São Paulo (OAB-SP)’



Carlos Heitor Cony

‘Tempo de maratona’, copyright Folha de S. Paulo, 28/07/04

‘Não sei se merecem ser eleitos, mas devem estar merecendo alguma coisa, ou aqui mesmo, neste mundo de Deus, ou no próprio reino de Deus, que tem fama de ser melhor do que o primeiro. Li as andanças dos candidatos no último domingo, dia do Senhor, e todos, pelo menos os do Rio e de São Paulo, cumpriram a maratona eleitoral que incluiu visitas a igrejas de diferentes credos, cada qual vendendo o seu peixe e comprando a benevolência dos eleitores.

Ainda não foi encontrado um meio mais higiênico e menos estafante para chegar ao eleitor comum, que, apesar de agredido massivamente pela TV e outros recursos de comunicação moderna, não dispensa o que entendidos chamam de ‘corpo a corpo eleitoral’, o afago na criancinha, o beijo na velhinha, o abraço no operário, os comes e bebes de circunstância.

Antes de sair de casa, devem tomar alguma poção mágica, recomendada pelo marqueteiro de plantão ou por um nutricionista especializado, capaz de neutralizar as injúrias alimentares a que são obrigados a enfrentar, desde as empadas e pastéis de botequim até as especialidades de circunstância, entre as quais a mais notável foi a buchada de bode que certo candidato foi obrigado a encarar e, deliciado, a lamber os beiços.

Deve sobrar pouco tempo e energia para promessas outras, para ouvir sugestões ou apelos. O importante é o candidato se vender como homem comum, ainda que seja uma mulher como a prefeita Marta, que já teve castelo em Itaipava e, quando se casou recentemente, usou um chapéu que nem Madame Pompadour teria coragem de usar.

Homem comum também se esforça para ser o meu amigo Conde, que nunca teve castelo, mas, a começar pelo tamanho, é incomum, além de arquiteto culto, com quem se pode conversar sobre a Espanha medieval e sobre as Guerras Púnicas, a primeira e a segunda.

Não pretendo votar na eleição deste ano, mas gostaria de votar em todos. Eles merecem.’