Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Direto da Redação

DIRETÓRIO ACADÊMICO
Ana Beatriz

A humildade no jornalismo, 7/12/06

‘Roanoke (EUA) – Vou invocar aqui o famoso ditado: quanto mais aprendo, mais me convenço de que nada sei. Ou algo parecido.

No meu caso, me dei conta disso quando entrei de cabeça no jornalismo. Logo comecei a perceber que, praticamente a cada nova matéria, existia algo sobre o qual nunca tinha ouvido falar. Às vezes o assunto era mesmo desconhecido aos leigos. Outras vezes era algo bem conhecido e eu acabava me sentindo meio ignorante.

Porém, sempre aprendia e continuo aprendendo; ainda mais morando agora numa cidade diferente, num estado diferente não só em termos de geografia, mas também em termos de cultura. Tenho que escrever matérias com propriedade, virar uma expert em assuntos de uma região sobre a qual pouco sabia, numa questão de horas. Quando não sei algo óbvio, explico aos entrevistados que acabei de me mudar de Miami, há um mês e meio.

Na maioria das vezes, eles sorriem simpaticamente e exclamam, ‘É uma mudança e tanto!’

Ou então se admiram, indagando, ‘Você saiu de Miami para vir para cá!?’

Pois é, meus amigos. Vim para cá para aprender sobre a vida, sobre a arte de limpar o chão, de cozinhar arroz com carne moída, de enfrentar sozinha a saudade, momentos de solidão e frustrações do dia-a-dia. Tudo isso no frio.

E o que isso tudo tem a ver com o jornalismo? Foi o jornalismo que me trouxe até aqui e é a vida que está me preparando melhor para o jornalismo. Afinal de contas, sem o aprendizado, é impossível apurar e escrever com propriedade.

Hoje em dia, tenho um respeito muito grande pelos repórteres mais experientes, pois vejo o quanto é difícil chegar a um certo patamar nessa profissão. Respeito-os também por saberem tão mais do que eu, por terem a habilidade de incorporar um contexto histórico e maior substância para ajudar o leitor a entender melhor a matéria.

O que eu tenho é energia e vontade de aprender cada vez mais. Cada dia é uma prova a cumprir, um degrau na escada que conduz ao sucesso. O jornalismo é um momento, a fração de segundo onde nasce a notícia e tem que ser levado assim, de notícia em notícia. Assim também é a vida.

(*) Retirado do site Direto da Redação.

Sobre a autora: Ana Beatriz é jornalista formada pela Florida International University (FIU), de Miami. Trabalha no Sun Sentinel, um dos principais jornais do sul da Flórida.’



RODRIGUES & MARINHO
Roberto Porto

O salvamento de Roberto Marinho e Nelson Rodrigues, 11/12/06

‘Conheci pessoalmente Nélson Rodrigues (1912-1980) quando trabalhei em O Globo pela primeira vez, em 1974. Não posso garantir, mas percebi por parte dos companheiros da editoria de esportes um certo desprezo por ele. Não me perguntem a razão porque não sei. Particularmente fiquei chocado.

Fui leitor assíduo de Nélson Rodrigues a partir do lançamento de Última Hora (1951-1991) e adorava Nélson Rodrigues. Um certo dia, meu pai, advogado, Nélson Porto (1909-1984), chegou em casa com o primeiro número de Última Hora dizendo que era um jornal lançado por um de seus clientes, Samuel Wainer (1912-1980). De 1951 a 1961 – quando deixou o jornal – li diariamente a crônica ‘A vida como ela é’ e me tornei fã de Nélson Rodrigues. Assim, trabalhar com ele em O Globo foi uma honra para mim.

Pouco a pouco, com muito jeito e certa timidez de minha parte, fui fazendo contato com ele. Não durou muito e passamos a amigos íntimos. Toda noite, Nélson Rodrigues ligava para minha casa para fazer as mais procedentes observações dos filmes passados pela Rede Globo. Até que um dia, na redação, decidiu me relatar uma aventura estranha e perigosa que tivera com Roberto Marinho (1904-2003). Era a década de 30 e O Globo, um dos promotores da regata, a remo, de Santos ao Rio. Impaciente, Roberto Marinho passou na redação e arrebanhou Nélson Rodrigues para assistirem juntos, mar aberto, a chegada dos remadores. Nélson Rodrigues ainda tentou argumentar que não sabia nadar, mas de nada adiantou.

Foram os dois para o Iate Clube do Rio de Janeiro.

La chegando, Roberto Marinho – a coragem personificada – dispensou o marinheiro da lancha e os dois lançaram-se ao mar. Como não viram ninguém, Roberto Marinho tocou a lancha para os lados da Barra da Tijuca e lá ficou à espera dos concorrentes. Nélson me disse que ficou apavorado a partir do momento em que perdeu a costa de vista. Lá pelas tantas, paciência esgotada, Roberto Marinho, com a lancha parada, sacou de uma insupeitada espingarda e começou a alvejar gaivotas que sobrevoavam a lancha. Foi quando ocorreu o rigorosamente inesperado: a lancha, apesar de nova, pegou fogo. Nélson Rodrigues entrou em pânico e, na absoluta falta de salva-vidas, lançou-se ao mar, agarrado a um banco da lancha. Logo depois, Roberto Marinho fez o mesmo. E ficaram os dois à deriva, sem saber o que fazer pois a lancha simplesmente soçobrara em chamas, com tudo o que tinha dentro.

Nélson Rodrigues, dotado de imaginação fértil, logo imaginou ser engolido por tubarões famintos ou mortalmente trespassado por peixes-espadas. No mínimo iria parar, como Pinocchio, no vente de uma baleia. Já Roberto Marinho – segundo depoimento de Nélson Rodrigues – era a calma personificada (um sujeito que praticava hipismo não podia ser nervoso).

Resumo da ópera: os dois foram resgatados por pescadores que ouviram os tiros a esmo disparados por Roberto Marinho.

(*) Pouco tempo depois, contei essa história no Jornal dos Sports. O exemplar do cor-de-rosa que estava na coleção subiu e desceu várias vezes para ser devidamente examinado. Como não continha mentira, retornou são e salvo.’



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Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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