Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Elio Gaspari

‘O Ibope entrou na campanha eleitoral com o pé esquerdo. Resultou num vexame sua pesquisa, divulgada pelo PT, informando que José Serra e Marta Suplicy estavam tecnicamente empatados na casa dos 20%. Sete dias depois desse resultado surpreendente, o Datafolha bateu de frente com o Ibope e informou que Serra tinha dez pontos de vantagem sobre Marta. A prefeita de São Paulo não conseguira nem o segundo lugar, estava atrás de Paulo Maluf. Quando as pesquisas trombam, ganha o eleitor, pois uma das duas terá que baixar a cabeça e sair do caminho. No dia seguinte à divulgação dos números do Datafolha, o Ibope trouxe novos resultados, de um trabalho contratado pela TV Globo. Neles Serra liderava com folga. Marta? Estava em terceiro lugar, cinco pontos atrás de Maluf.

É bom que isso tenha acontecido em junho porque dá tempo às empresas do ramo das pesquisas para medir os riscos que correm aceitando encomendas ardilosas. O PT contratou o Ibope num lance de astúcia. Ele deveria medir a intenção de voto dos paulistanos entre 15 e 17 de junho, um dia depois de um longo programa de propaganda gratuita no horário nobre da TV. Os comissários petistas manipularam o calendário e transformaram os entrevistadores do Ibope num complemento de sua propaganda. No mais, tudo foi feito nos conformes: a pesquisa foi registrada antes de o PT saber o seu resultado e foi divulgada três dias depois do fim do trabalho de campo. Como o próprio Ibope explicou: toda e qualquer pesquisa fotografa um momento. A pesquisa encomendada pelo PT fotografou os dias seguintes à sua propaganda gratuita na TV.

A astúcia deu certo demais e muita gente boa acreditou que os números do Ibope refletiam um quadro relativamente fiel da divisão do eleitorado de São Paulo. Refletia apenas a variação obtida pelas marquetagens de Duda Mendonça, em cuja empresa trabalha o marido da prefeita, Luis Favre. É provável que o choque provocado pelo confronto dos números da pesquisa encomendada pelo comissariado com os da outra, divulgada pelo mesmo Ibope, oito dias depois, tenha liberado o canibalismo petista contra a prefeita.

Logo Marta Suplicy, que em 1998 foi derrubada dentro da área pelo efeito de uma pesquisa do Ibope divulgada na véspera da eleição para a escolha do governador de São Paulo. O instituto disse que Maluf liderava as intenções de voto (31%), seguido por Francisco Rossi (18%), Mário Covas (17%) e Marta Suplicy (15%). Essa previsão sugeria aos eleitores de Marta que eles poderiam estar ajudando a levar Rossi para o segundo turno, destruindo a candidatura de Mário Covas. Ficou o gosto de voto inútil. Quando abriram-se as urnas, Marta tivera 22% dos votos. Rossi, apenas 17%. Mesmo drenada, Marta ficou apenas um ponto percentual abaixo de Covas.

O Ibope tem 62 anos de idade. Tornou-se um neologismo da língua portuguesa e já passou por quatro regimes, duas ditaduras e cinco Constituições. Começou a funcionar no tempo em que Duda Mendonça e Luiz Gushiken se chamavam Lourival Fontes.

Os institutos de pesquisa que vendem serviços de pesquisa tanto a partidos e candidatos como a órgãos de imprensa sabem os riscos que correm. É sabido que são pesquisas diferentes, feitas para clientes diferentes, mas as empresas de pesquisas não são o Chacrinha, que veio para confundir. Há pesquisadores que não permitem a divulgação dos trabalhos que fazem para partidos ou candidatos. Há também empresas como o Datafolha, que só fazem pesquisas eleitorais para órgãos de imprensa. O Ibope continuará fazendo como acha melhor, mas pode-se acreditar que, se amanhã aparecer um comissário querendo pendurar uma pesquisa numa marquetagem, sua equipe técnica pensará 12 vezes antes de permitir que a instituição seja associada a acrobacias eleitorais. Em tempo: Lourival Fontes (1899-1967) chefiava o Departamento de Imprensa e Propaganda de Getúlio Vargas.’



Milton Coelho da Graça

‘Pesquisa não vale nada? Deveria valer’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 5/07/04

‘O IBOPE procurou explicar a enorme diferença entre suas duas pesquisas sobre a eleição em São Paulo, no mês de junho, com a obviedade de que cada pesquisa flagra um momento da opinião pública. Verdade, mas especialistas de outros três institutos concordam que, em apenas oito dias e ainda em início de campanha, nunca houve outra manifestação de opinião pública tão volúvel.

Na primeira (paga pelo PT, R$ 57.600, conforme registro no TRE), com trabalho de campo supostamente realizado entre 15 e 17 de junho, o IBOPE apontou um ‘empate técnico’ entre Serra (22%), Marta (21%) e Maluf (18%). Na segunda pesquisa (trabalho de campo entre 25 e 27), paga pela Rede Globo e por ela divulgada no dia 27, o IBOPE registrou: Serra 30%, Maluf 21% e Marta 16%.

Números parecidos com esses (Serra 30%, Maluf 24%, Marta 20%) já haviam sido anunciados pelo Datafolha na edição dominical da Folha (dia 27, MESMO DIA EM QUE O IBOPE TERMINAVA SUA SEGUNDA PESQUISA).

Elio Gaspari e Marcelo Beraba fizeram, em suas colunas deste domingo (4/7), um belo trabalho de análise deste assunto. Beraba estranhou ‘uma mudança tão grande em tão pouco tempo’. Gaspari atribuiu a disparidade de resultados a uma esperteza de Duda Mendonça, que teria encomendado a pesquisa imediatamente em cima do programa eleitoral do PT.

Infelizmente nenhum dos dois comentou – certamente porque não tiveram conhecimento – o fato de que a primeira pesquisa foi divulgada pela Rede Globo, com a informação (totalmente absurda porque o próprio PT confirmou ter pago ao Ibope) de que ela teria sido encomendada pelo Diário de São Paulo, das Organizações Globo.

Um dos motivos do manifesto de Lutero a favor da Reforma religiosa foi a venda de indulgências aos pecadores ricos. Não era mais possível aceitar que a Igreja ouvisse confissões e cobrasse pelo perdão. A Arthur Andersen teve de encerrar suas operações porque vendia consultorias e estudos às próprias empresas, cuja boa fé atestava nos balanços e outros documentos contábeis.

Os institutos de pesquisa também não deveriam vender pesquisas e, ao mesmo tempo, consultorias de marketing eleitoral a seus clientes. Essas duas atividades configuram um claro conflito de interesses e colocam sob suspeita a lisura das pesquisas, especialmente as encomendadas por partidos e candidatos.

Elio Gaspari disse: ‘O IBOPE tem 62 anos e esse nome já virou até neologismo da língua portuguesa’: E alerta: ‘Institutos de pesquisa não são o Chacrinha, que veio para confundir.’

Juízes e procuradores eleitorais têm o dever de examinar e estabelecer regras que evitem a divulgação de pesquisas sem garantia de lisura e isenção.

E a Globo deveria investigar e descobrir quem lá dentro meteu o Diário de São Paulo naquela notícia…’

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‘Números e sons sobre Marta, Lula e JB’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 28/06/04

‘A Folha de São Paulo publicou ontem a mais recente pesquisa Datafolha (feita nos dias 24 e 25 de junho sobre as eleições na cidade de São Paulo: Serra, 30%; Maluf, 24%; Marta, 20%. Os números são surpreendentes porque, uma semana antes, a Rede Globo havia divulgado uma pesquisa Ibope, que registrava empate técnico entre Serra e Marta.

A pesquisa Ibope, curiosamente, não foi encomendada pela Rede Globo e sim pelo jornal Diário de São Paulo, também das Organizações Globo. Nas Organizações Globo, o comum é que as pesquisas – em geral muito caras – sejam pagas pela TV e divulgadas no dia seguinte pelos seus jornais – O Globo, Extra e o Diário.

Entre os dois institutos, a confiança no Datafolha tende a ser bem maior do que no Ibope. A razão é simples: o Ibope vende também serviços de consultoria de marketing eleitoral e esse é, a meu ver, um erro semelhante ao que a Arthur Andersen e outras empresas de auditoria cometeram, quando decidiram também oferecer consultoria financeira a seus clientes.

Provavelmente foi coincidência, mas o fato é que, nesta mesma semana, o presidente Lula levou uma vaia no velório de Brizola. Assisti a todos os jornais noturnos das tevês, porque tive a curiosidade de verificar qual deles daria maior cobertura da vaia. Disparadamente a Globo foi a mais moderada – a palavra ‘traidor’ só pôde ser ouvida uma vez e com volume mais reduzido do que nas outras.

Fora da seara global, outros números inesperados. Cristina Albuquerque, responsável pela circulação do Jornal do Brasil, de maneira muito simpática e atenciosa, telefonou para desmentir minha afirmação (na coluna anterior) de que as vendas do JB vêm caindo. Cristina garante que o JB aumentou sua circulação em relação ao ano passado – tanto aos domingos como nos dias de semana – enquanto todos os outros jornais sofreram queda. E me mandou por fax, como comprovantes, os relatórios do IVC (Instituto Verificador de Circulação) referentes ao último mês de abril.

Além de informações e avaliações de jornaleiros, leitores e executivos de outros jornais, não tenho como refutar os números de Cristina e do IVC. Segundo eles, a média de vendas do JB em abril em todo o país foi de 104.056 aos domingos e 74.678 nos dias úteis – 84.038 e 61.050, respectivamente, na região metropolitana do Rio.’



Eliane Cantanhêde

‘Festival de arrogância’, copyright Folha de S. Paulo, 1/07/04

‘Pense bem numa eleição com José Serra, Marta Suplicy e Paulo Maluf! Dose para leão. Imagine um debate com os três?! Eles vão se matar, com Luiza Erundina ajudando a botar fogo no circo e Paulinho abanando a fumaça. Você, eleitor em São Paulo, não perde por esperar o festival de arrogância.

O favorito José Serra (PSDB) é homem público e economista respeitado, intelectual disciplinado o suficiente para varar a noite estudando como votar no Senado numa questão sobre uma área que não é a sua, o Judiciário. É o arrogante dissimulado, que não altera a voz e faz cara de humilde. Acha que sabe tudo. Pior: que só ele sabe tudo.

A prefeita Marta Suplicy (PT) é muito determinada, pegou uma terra arrasada e investe pesado em educação e em pequenos-grandes feitos, como o bilhete único (que dá direito a mais de um ônibus durante duas horas). É a arrogante assumida, dessas meninas mimadas que, contrariadas, gritam, empinam o nariz e batem pezinho. À la Ciro Gomes, perde fácil as estribeiras com eleitor, assessor e jornalista. Acha que é uma estrela. Pior: que aos demais mortais cabe ficar na platéia, aplaudindo.

Paulo Maluf (PP) deveria dispensar comentários, mas vamos lá: é o arrogante que se faz de autista. Perguntam de conta na Suíça e ele responde sobre túneis; de ilhas Jersey, sobre viadutos; de patrimônio público, sobre abobrinhas. Acha que está acima do bem e do mal. Pior: finge que todo mundo acredita.

Luiza Erundina (PSB) é mais discreta e sisuda, mas não é nenhuma freirinha pronta a dar a outra face a tapa. Acha que a esquerda é sua devedora pelo massacre na gestão anterior. Pior: que o PT é que deve mais.

Já Paulinho (PDT) vai ter de suar mais na estrada eleitoral e nos meandros político-partidários antes de botar a arrogância de fora.

Detalhe: o futuro de Lula e de FHC também estará sendo jogado aí.

E em quem eu vou votar? Em ninguém, porque nem voto em São Paulo. Mas sou solidária com você, eleitor paulistano. A vida é dura.’