Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Época envolve Berzoini
no escândalo do dossiê


Leia abaixo os textos de quarta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Quarta-feira, 20 de setembro de 2006


ELEIÇÕES 2006
João Domingos


Escândalo atinge outro membro do comitê e Berzoini


‘Citada pelo advogado Gedimar Pereira Passos em seu depoimento na Polícia Federal, a revista Época emitiu nota ontem revelando que foi procurada há duas semanas por um integrante da campanha à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a oferta de uma denúncia contra o candidato pelo PSDB ao governo de São Paulo, José Serra, e o ex-ministro da Saúde Barjas Negri, atual prefeito de Piracicaba.


Segundo a revista, o integrante da campanha que a procurou foi Oswaldo Bargas, responsável pelo setor de Trabalho e Emprego do programa de governo de Lula e ex-secretário do Ministério do Trabalho. Ainda conforme Época, a reunião da revista com o integrante da campanha foi marcada para o dia 6 de setembro, no Hotel Crowne Plaza, em São Paulo. Bargas apareceu acompanhado de Jorge Lorenzetti, que até ontem chefiava a assessoria de risco e mídia da campanha de Lula, conhecida também por ‘Abin do PT’.


De acordo com Época, Bargas afirmou que tinha denúncias sérias contra políticos de renome. ‘Ele disse apenas que as denúncias seriam fortes o suficiente para desmoralizar o candidato do PSDB ao governo do Estado de São Paulo, José Serra, e o ex-ministro da Saúde Barjas Negri’, diz nota da revista.


Relata Época que Bargas e Lorenzetti disseram várias vezes que a reunião nada tinha que ver com o PT nem com o governo. O encontro, segundo eles, servia apenas para sondar o interesse da revista nas denúncias. Bargas, ainda segundo Época, disse que Aloizio Mercadante, candidato ao governo de São Paulo pelo PT, não sabia de nada. E que do PT apenas seu presidente, Ricardo Berzoini, sabia que ele tinha procurado a revista.


As denúncias acabaram não vingando porque, de acordo Época, Bargas telefonou no mesmo dia do encontro para avisar que a pessoa interessada em fazer as acusações contra os ex-ministros Serra e Barjas Negri havia desistido de fazê-las. Uma semana depois a revista IstoÉ publicou entrevista com Darci e Luiz Antonio Vedoin, donos da Planam, com denúncias contra os dois tucanos. À IstoÉ, Luiz Antônio disse ter pago propina a Serra e Barjas Negri para compra superfaturada de ambulâncias, por intermédio do empresário Abel Pereira. Os pagamentos seriam feitos a pelo menos duas empresas, Kanguru e Império – e somariam R$ 601,2 mil.


Berzoini confirmou que soube, sim, que um integrante da campanha pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha procurado a Época para ‘tratar de uma pauta de interesse jornalístico’. Em nota oficial, disse, porém, que não teve conhecimento do que foi tratado entre o repórter da revista e os dois petistas. ‘Jamais tive ciência do conteúdo abordado nesse encontro, conforme reproduzido fielmente pelo site da revista.’


Mais uma vez, o presidente do PT indagou a quem interessa o escândalo da venda do dossiê contra Serra. ‘Manifesto, mais uma vez, a minha indignação com esse episódio e condeno, como sempre condenei, o denuncismo e a baixaria em processos eleitorais, reafirmando a necessidade de que todas as denúncias sejam investigadas e esclarecidas o quanto antes.’ Apesar de afirmar que soube do encontro, Berzoini não cita o nome de Bargas em nenhum momento.’


Expedito Filho


Mulher de novo suspeito é secretária do presidente


‘Depois do envolvimento do ex-assessor da Presidência da República Freud Godoy no escândalo de compra de dossiê para incriminar candidatos tucanos, outro personagem metido na mesma operação, o ex-secretário do Ministério do Trabalho Oswaldo Bargas, é um velho conhecido do Palácio do Planalto. Sua mulher, Mônica Cristina Zerbinato, é secretária do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nomeada em 30 de janeiro de 2003 para o cargo de confiança, classificado na sigla DAS 102-4.


Procurada pelo Estado na noite de ontem, Mônica Zerbinato não foi encontrada, mas seus colegas de trabalho confirmaram que ela é mesmo casada com Oswaldo Bargas. ‘A Mônica é secretária do presidente Lula desde o começo do governo e é casada sim com Bargas, mas não se encontra no momento’, informou uma funcionária.


Apesar do parentesco não há qualquer sinal de participação da secretária de Lula na manobra de risco que teria sido executada por seu marido. Mônica é tida como uma funcionária exemplar, cumpridora de seus deveres e que desempenha muito bem sua função. O elo com Bargas serve apenas para demonstrar que o ex-secretário do Ministério do Trabalho é homem de confiança e tem trânsito livre no gabinete do presidente da República.


A relação entre ele e Mônica pode servir de álibi perfeito no caso de uma eventual quebra de sigilo telefônico de Bargas. O ex-secretário pode alegar facilmente que possíveis ligações para o gabinete do presidente Lula tiveram como finalidade conversar com a própria mulher. Dessa maneira, poderia evitar que a oposição especule se eventuais telefonemas no período em que a operação de compra do dossiê dos Vedoin estava em curso tenham sido feitos para outros personagens do círculo presidencial. Afinal, é normal e corriqueiro que marido e mulher troquem telefonemas.’


Dora Kramer


O que será do amanhã


‘A ausência de limites, a transgressão de regras, a indiferença a todas as liturgias – inclusive à do cargo de presidente da República, que recebe ao telefone, do acusado, orientações sobre a reação às acusações – e o acirramento dos ânimos políticos ao ponto da guerra declarada instalam no Brasil uma atmosfera de preocupação e incerteza quanto ao futuro próximo.


A questão inquietante já não é mais o resultado da eleição em 1º de outubro, mas o que será do País depois disso, a partir de 2007. O cenário do ano que vem já faz parte das aflições de gente responsável que, mesmo sendo de oposição, vê risco de conturbação institucional ainda que, por hipótese hoje remota, o resultado final venha a ser diferente do esperado.


Nessa circunstância, o PT se encarregaria de conflagrar o ambiente, a começar pela contestação do resultado eleitoral, alegando fraude.


Se o presidente Luiz Inácio da Silva for reeleito, em tese ficam corroborados todos os métodos utilizados para a preservação do poder. A série reúne de cooptação financeira de parlamentares em troca de apoio político até a montagem de armadilhas contra adversários eleitorais, passando pelo uso do Estado para desmoralizar testemunhas.


Isso para falar apenas nos ilegais. Entre os instrumentos de uso legal reinam os truques para levar na conversa o eleitorado, todos muito bem engendrados: seja a transformação falaciosa de um programa de assistência em projeto de inclusão social, seja a desmoralização da moral coletiva em prol da salvação do projeto político de um partido em particular.


Com a vitória de Lula, a miríade de impropriedades recebe um aval, mas de validade temporária e restrita àquela parcela do eleitorado que, embora majoritária, faz o resultado de uma eleição, mas não conduz o País no restante do tempo.


Reeleito, Lula tomará posse em situação de desgaste e dura contestação política e social, principalmente depois da demonstração de que o PT nunca esteve interessado em pacto com a oposição; só queria mesmo assegurar um período de trégua de submissão à supremacia eleitoral.


O governo conta fazer isso com a colaboração integral do PMDB e a boa vontade conveniente de setores do PFL e do PSDB, principalmente governadores interessados em manter desobstruídos os canais administrativos com Brasília.


O empecilho seria José Serra. A despeito de suas ótimas relações com parte considerável do PT, se eleito governador de São Paulo teria de jogar de acordo com o seu interesse de se eleger presidente em 2010 e se firmar como o contraponto a Lula. Por isso já se escalara publicamente como o principal opositor do governo federal em caso de reeleição do PT.


Esta constatação pautou o ataque desferido contra a candidatura do tucano, cada vez mais claramente uma obra do partido.


Obra esta exposta na nota da revista Época, relatando a oferta que lhe havia sido feita dias atrás, por intermédio de um integrante da campanha presidencial, com o conhecimento, confesso, do presidente do PT, Ricardo Berzoini.


E por que a revista divulgou a história? Com toda certeza por conta do escaldo sofrido quando se deixou usar pelo então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para tentar desmoralizar a palavra de Francenildo Costa.


E por que não o fez há duas semanas, quando recebeu a proposta? Talvez porque não tenha se dado conta das dimensões da conversa e das implicações nela contidas.


Por causa da degeneração de conduta e parcerias, o governo Lula vem perdendo apoio até em áreas que nutriram por ele mais que apreço: alimentavam interesse político, comercial e financeiro em sua reeleição.


Como a renovação do mandato de Lula ainda é o resultado mais provável, teremos uma inusitada situação em que o governo recomeça já em clima de fim de festa e franca amargura.


Confissão


A justificativa do ministro Márcio Thomaz Bastos para a não exibição do dinheiro apreendido com os petistas Gedimar e Valdebran – evitar o uso eleitoral da imagem – só teria o sentido de isenção se o governo não fosse parte na disputa eleitoral. Sendo, equivale a uma confissão de favorecimento.


Contraditório


O controlador-geral da União, Jorge Hage, contesta afirmação feita aqui, segundo a qual deu ‘crédito’ ao dossiê do PT quando comparou, na semana passada, as situações dos ex-ministros da Saúde Humberto Costa e Serra e falou na existência de documentos comprometedores contra o tucano.


‘O que afirmei é que essas imputações devem ser tratadas como indícios que merecem a devida apuração, com as cautelas próprias com que devem ser recebidas declarações de réus sob delação premiada.


‘Esclareço que os documentos mencionados são documentos oficiais recolhidos pela nossa auditoria nos processos de liberação de emendas, pelo Ministério da Saúde, e respectivas prestações de contas, nada tendo a ver com qualquer espécie de dossiê, fato posterior às minhas declarações.’’


CIÊNCIA & MÍDIA
O Estado de S. Paulo


Colegas de Hwang se defendem em processo


‘AP -Começou ontem a defesa formal do cientista sul-coreano Hwang Woo-suk, acusado no fim do ano passado de fraudar pesquisas sobre clonagem de células-tronco embrionárias, e de outros colegas de sua equipe. Eles teriam empregado evidências forjadas para dar credibilidade às pesquisas e arrecadar fundos para o estudo.


Hwang recebeu US$ 2,1 milhões para conduzir os estudos com resultados falsificados. Se confirmada a fraude, ele será condenado a três anos de prisão.


Outros cinco cientistas foram acusados de fraudes similares durante o julgamento. Um deles, Kim Sun-jong, declarou-se culpado. Kim é especialista em cultivo de embriões e alega ter levado células-tronco comuns – criadas a partir de óvulos fertilizados, não de embriões clonados – ao laboratório de Hwang. O pesquisador disse que Hwang nunca tinha questionado a óbvia diferença entre células-tronco embrionárias e as que foram cultivadas no laboratório do cientista. Se Hwang tivesse detectado o crime mais cedo, ele não teria ousado trocar várias células-tronco, afirmou Kim.


O testemunho parece sustentar a repetida alegação de Hwang, desde o início do escândalo no ano passado, de que foi vítima de subordinados que o enganaram.


Os resultados de seus estudos foram divulgados mundialmente em 2004 e em 2005, tendo sido aclamados como ‘uma possibilidade de tratamento de pacientes com doenças incuráveis’. Kang Sung-keun, outro pesquisador do grupo de Hwang, também julgado, disse que detectou a farsa antes de os estudos serem publicados, mas foi incapaz de questionar seu chefe. ‘Eu me arrependo profundamente e lamento meu erro como cientista’, disse Kang.


Hwang chegou a admitir que deu ordens à sua equipe para falsificar dados com o objetivo de chamar a atenção para a clonagem de células-tronco. No entanto, disse continuar acreditando que a essência da pesquisa era válida. Ele foi demitido do cargo de professor da Universidade Nacional de Seul em março deste ano. Mas voltou a trabalhar em um novo laboratório, onde estuda células-tronco de animais. Hwang está proibido de fazer experimentos com embriões humanos. Seus advogados vão se pronunciar em outubro, com a continuidade do julgamento.’


TELEVISÃO
Keila Jimenez


Mais do que futebol


‘Depois do nosso famoso futebol, a Globo TV Sports, distribuidora internacional da Globo de conteúdos esportivos, quer crescer na comercialização de outros esportes. A distribuidora, que faz 1 ano em outubro, já vendeu conteúdo para mais de 125 países em feiras internacionais, entre eles: EUA, França e Itália. Apesar de um extenso catálogo de produtos, o forte mesmo do negócio é o futebol.


O pacote Brazilian Magic Football, que engloba mais de 70 partidas de campeonatos, como o Paulista e o Brasileiro, é o mais procurado pelos compradores. Os jogos são narrados e comentados em inglês.


A CCTV-5, maior canal esportivo chinês, é uma das compradoras desse pacote.


O Clube dos 13 participa da divisão dos lucros da venda dessas partidas.


A distribuidora aguarda agora a Sportel, grande feira do segmento esportivo que será em Mônaco, em outubro.


A Globo TV Sports investirá na divulgação de modalidades como futsal, competições de Stock Car, vôlei de praia e maratonas como a de São Silvestre, que fazem parte de seu catálogo, mas ainda não conquistaram o mercado internacional.


Piada de Cicarelli no VMB


A MTV não sabe se vai tirar uma casquinha ou não no VMB – sua premiação de videoclipes – do vídeo polêmico de Cicarelli que circula na internet. Acostumado a fazer piadinhas nessas premiações, o canal está à espera de um posicionamento da VJ sobre o caso. Daniella, que será uma das mestres-de-cerimônias do evento, aparece no tal vídeo em cenas pra lá de quentes com seu namorado em uma praia na Espanha. Amanhã, a MTV coloca em seu site uma ‘brincadeirinha’ em que o público poderá escolher a roupa que Daniella usará no VMB.


entre- linhas


Escoltada por professor, Lucimara Parisi vem treinando para fazer bonito na pista de gelo do Domingão do Faustão. A diretora star do apresentador compõe o elenco que inaugura mais uma rodada de concurso no dia 1.º de outubro.


E Wanessa Camargo, que também vinha treinando para a dança no gelo do Faustão, mas sobre quatro rodas, em sua casa e sem acompanhamento, deu um passo em falso e sofreu lesão no ligamento do tornozelo. Com figurino by Marcelo Somer prontinho, a moça teve de adiar sua participação para a 3.ª temporada do concurso.’


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Folha de S. Paulo


Quarta-feira, 20 de setembro de 2006


ELEIÇÕES 2006
Editorial


Grampos no tribunal


‘ECLIPSADO pelo chamado escândalo do dossiê, o episódio dos grampos telefônicos no Tribunal Superior Eleitoral não inspira menos preocupação do que a malfadada tentativa de compra de informações contra os candidatos José Serra e Geraldo Alckmin por parte de integrantes do PT.


Numa inspeção de rotina nos aparelhos instalados na corte, nas residências dos ministros e em telefones celulares, foram identificadas escutas irregulares destinadas a registrar as conversas de algumas das principais autoridades judiciais do país. O presidente do TSE, Marco Aurélio Mello, o vice, Cezar Peluso, e o juiz Marcelo Ribeiro, ministro responsável pela análise da propaganda eleitoral de candidatos à Presidência da República, tiveram seus telefones grampeados.


A espionagem, infelizmente, parece um negócio em franca expansão no Brasil. Gravações telefônicas, filmagens e outras bisbilhotices ilegais proliferam de modo indiscriminado e instauram um ambiente de insegurança e ameaça constante.


Descobertos nos últimos dias da campanha eleitoral, os grampos envolvem nítidos interesses partidários. O ministro Marcelo Ribeiro, o terceiro alvo da escuta clandestina, tem sido um dos mais severos magistrados na punição a irregularidades na propaganda dos candidatos.


Desde o início da campanha, por determinação do TSE, a candidatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição já perdeu mais de 10 minutos em programas e inserções. Seu principal adversário, Geraldo Alckmin, foi proibido de reapresentar mensagem considerada ofensiva ao petista. Representações em análise no tribunal ameaçam cortes ainda maiores na propaganda situacionista. Caso todas as queixas sejam acatadas, o presidente poderá perder 12 minutos em inserções e 37 minutos nos programas.


Agrava a situação o fato de a espionagem não se restringir, potencialmente, ao âmbito eleitoral. Além de ministros da corte eleitoral, Marco Aurélio Mello e Cezar Peluso também ocupam cadeiras no Supremo Tribunal Federal, a mais alta instância do Judiciário nacional. Está sob ameaça, portanto, a integridade da principal corte do país.


A Polícia Federal anunciou a abertura de inquérito para investigar a origem das escutas. A mais leve suspeita de que possa haver envolvimento de agentes públicos basta para que o caso seja tratado como prioridade e envolva também o Ministério Público. Infelizmente, a própria natureza do delito praticado dificulta a obtenção de esclarecimentos e a reunião de provas.


Essa intensa atividade de ‘arapongagem’ é em parte seqüela dos serviços de segurança do período militar, quando, sob os auspícios do Serviço Nacional de Informações (SNI), foi desenvolvido um extenso e ameaçador dispositivo de espionagem. Como a democracia não pode aceitar nenhuma herança autoritária, assegurar punição exemplar aos que patrocinaram os grampos ilegais na corte eleitoral é a melhor maneira de impedir o recrudescimento dessa chaga.’


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Revista envolve campanha de Lula em negociação de dossiê


‘Coordenadores da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição, incluindo o presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, tiveram ontem seus nomes envolvidos no caso do dossiê contra tucanos elaborado pela família Vedoin, acusada de chefiar o esquema da máfia dos sanguessugas. Os petistas Oswaldo Bargas e Jorge Lorenzetti, que têm função na campanha, sondaram, com o conhecimento de Berzoini, eventual interesse da revista ‘Época’ no material que comprometeria José Serra na fraude das ambulâncias.


Após divulgação de nota da publicação relatando o episódio, Lorenzetti comunicou em carta a Berzoini seu desligamento do cargo de analista de risco e mídia da campanha. O presidente do PT, também em nota, disse que soube do encontro dos petistas com jornalista da revista, mas que desconhecia o dossiê.


Sem citar nomes, Lula defendeu em Nova York uma investigação a fundo, ‘doa a quem doer’, mas acusou a oposição de estar há dois anos tentando evitar sua reeleição. E emendou: ‘a quem interessa melar o processo eleitoral a essa altura do campeonato?’.


A Justiça de Mato Grosso negou ontem pedido de prisão do ex-assessor da Presidência Freud Godoy e determinou a soltura do petista Valdebran Padilha e do ex-agente da PF Gedimar Passos, presos com R$ 1,7 milhão que seria usado para comprar o dossiê, e de Paulo Roberto Trevisan, detido com o material.


Ontem, o TSE abriu investigação judicial contra Lula e os petistas envolvidos para apurar se houve abusos de poder econômico e de autoridade no caso.’


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Bargas é casado com secretária do presidente


‘Amigo de Luiz Inácio Lula da Silva há três décadas, Oswaldo Bargas tem acesso livre ao gabinete presidencial. Não só pela relação muito próxima com Lula, metalúrgico assim como ele, mas também pelo fato de ser casado com Monica Zerbinato, secretária pessoal de Lula.


Bargas é um dos melhores amigos de Lula. A ligação vem desde o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, nos anos 70. Bargas foi braço direito de Lula em várias greves. Os dois foram cassados pelo regime militar.


Eleito, Lula o encaixou como secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho. Depois foi chefe de gabinete do ministério. Há 50 dias, pediu exoneração para participar da campanha. Deveria coordenar o programa de governo de Lula sobre geração de empregos, mas agora se sabe que atua na preparação de dossiês.


Em 2003, foi identificado pela ‘Veja’ como um dos membros da campanha de Lula à Presidência em 2002 que tinha como missão obter dossiês contra adversários.’


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ÍNTEGRA DA REVISTA ‘ÉPOCA’


‘Em depoimento à Polícia Federal, o advogado Gedimar Pereira Passos -que afirma ter sido contratado pelo PT para negociar um dossiê com denúncias contra o candidato José Serra- citou a revista ‘Época’. Diante dessa citação, ‘Época’ gostaria de esclarecer que:


1) Oswaldo Bargas, ex-secretário do Ministério do Trabalho, atual responsável pelo capítulo de Trabalho e Emprego do programa de governo de Lula, procurou há duas semanas o jornalista Ricardo Mendonça, de ‘Época’. Ele pediu um encontro com o repórter.


2) O encontro foi marcado para uma suíte do hotel Crowne Plaza, em São Paulo, no final da tarde do dia 6 de setembro. Nessa reunião estava presente também Jorge Lorenzetti, analista de risco e mídia da campanha de Lula. Bargas afirmou ter sido procurado por alguém que tinha denúncias sérias contra políticos de renome. As acusações, segundo ele, poderiam ser comprovadas por meio de fotos, vídeos e de uma ‘farta documentação’. Bargas perguntou se havia interesse da revista em publicá-las.


3) O repórter de ‘Época’ disse que tinha interesse em conhecer o teor das denúncias, mas não se comprometeria a publicá-las. Isso dependeria de uma investigação sobre a relevância e a consistência das acusações.


4) Bargas afirmou não ter nada para mostrar naquele momento. Disse que não podia especificar quais eram as denúncias nem quem era o denunciante. Diante da insistência do repórter, ele disse apenas que as denúncias seriam fortes o suficiente para desmoralizar o candidato do PSDB ao governo do Estado de São Paulo, José Serra, e o ex-ministro da Saúde Barjas Negri.


5) Durante o encontro, Bargas e Lorenzetti disseram várias vezes que aquela reunião nada tinha a ver com o PT nem com o governo. Aquele encontro, segundo eles, servia apenas para sondar o interesse de ‘Época’. Bargas afirmou que Aloizio Mercadante, concorrente de Serra na disputa pelo governo de São Paulo, não sabia das denúncias nem da reunião. Disse ainda que, no PT, apenas o presidente do partido, Ricardo Berzoini, havia sido avisado do encontro com o repórter para passar informações de interesse da campanha. Berzoini, segundo Bargas, não tinha conhecimento do conteúdo do material.


6) No final da reunião, que durou cerca de 30 minutos, Bargas disse que voltaria a falar com o denunciante e depois entraria em contato com o repórter.


7) Naquela mesma noite, Bargas telefonou para avisar que o denunciante voltara atrás e não queria mais apresentar o material, nem dar entrevista. Uma semana depois, a revista ‘IstoÉ’ publicou a entrevista em que Darci e Luiz Antonio Vedoin, os donos da Planam, acusavam Serra e Barjas Negri.’


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ÍNTEGRA DA NOTA DE JORGE LORENZETTI


‘Excelentíssimo senhor deputado federal


Ricardo Berzoini


Presidente da Comissão Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores


Nesta senhor presidente,


Reporto-me aos fatos ocorridos no dia 15 de setembro próximo passado e que vêm sendo objeto de ampla divulgação pela imprensa nacional.


Julgo ter extrapolado os limites de minhas atribuições como assessor de risco e mídia da coligação ‘A Força do Povo’, mas, nada obstante, afirmo taxativamente que em momento algum autorizei o emprego de qualquer tipo de negociação financeira na busca de informações relacionadas a adversários políticos.


Minha participação no episódio circunscreveu-se tão somente em solicitar que fosse averiguada a autenticidade dessas informações, visando, exclusivamente, contribuir para a correção de uma injustiça que vem sendo cometida contra o Partido dos Trabalhadores no escândalo conhecido como máfia dos sanguessugas.


Já encaminhei, através de meu advogado, petição ao Departamento de Polícia Federal colocando-me à disposição para prestar os esclarecimentos necessários à apuração dos fatos, e faço o mesmo, por essa missiva, em relação ao Partido dos Trabalhadores razão pela qual comunico meu desligamento incondicional das atividades da campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.


Desde já, apresento minhas sinceras desculpas se não correspondi à confiança depositada em minha pessoa.


Cordialmente’


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ÍNTEGRA DA NOTA DE RICARDO BERZOINI


‘Tendo em vista a citação do meu nome em esclarecimento publicado hoje pelo site da revista ‘Época’, tenho a dizer o seguinte:


1. De fato, tive conhecimento de que um integrante da nossa campanha manteria contato com a revista ‘Época’ para tratar de uma pauta de interesse jornalístico. Jamais tive ciência do conteúdo abordado nesse encontro, conforme reproduzido fielmente pelo site da revista;


2. Jorge Lorenzetti me encaminhou hoje carta desligando-se da campanha e explicando os seus motivos, entre os quais ele reconhece ter extrapolado os limites de suas atribuições como assessor de risco e mídia da Coligação ‘A Força do Povo’, mas afirma taxativamente que não autorizou o emprego de qualquer tipo de negociação financeira;


3. Manifesto, mais uma vez, a minha indignação com esse episódio, e condeno, como sempre condenei, o denuncismo e a baixaria em processos eleitorais, reafirmando a necessidade de que todas as denúncias sejam investigadas e esclarecidas o quanto antes. E pergunto: a quem interessa criar confusão nesta campanha eleitoral?


Ricardo Berzoini


Presidente nacional do PT’


Leila Suwwan


Crise do mensalão foi uma construção fantasmagórica da mídia, afirma Chaui


‘A filósofa e ideóloga do PT Marilena Chaui afirmou ontem que a crise do mensalão foi uma ‘construção fantasmagórica’ da mídia, que, com seu poder, ‘tornou Deus inútil’. Apesar disso, avaliou que o povo começa a se libertar desse domínio e o voto das camadas populares em Luiz Inácio Lula da Silva reflete a chegada da verdadeira democracia no país.


Em palestra no Sindicato dos Bancários sobre a mídia e o poder, ontem em Brasília, Chaui usou a crise política e os escândalos de corrupção para exemplificar sua tese de que a mídia usa ‘a ideologia da competência’ e seu aparato de encenação e persuasão como forma de poder.


‘Nesse sentido a mídia tornou Deus inútil. E vimos esse poder em 2005 com a criação midiática da crise política’, disse Chaui. Ela citou o filósofo Hegel para dizer que houve predomínio da cultura de terror na qual todos são suspeitos e todos os suspeitos são culpados.


Não falou especificamente das acusações de corrupção ou pagamento de mensalão. Mas disse que a corrupção no país é ‘endêmica’ e ‘estrutural’. ‘Não existe a [corrupção] ‘jamais vista’. A [corrupção] ‘jamais vista’ começou em 1500’, afirmou.


Ela vê uma divisão entre os chamados formadores de opinião -definidos como meia dúzia de articulistas- e a verdadeira opinião da população, que prefere Lula.


‘O que parece se anunciar nas próximas eleições é que a realidade é mais forte que o simulacro, que o pensamento é mais forte que a manipulação e que a experiência social é mais forte que a intimidação. A construção da democracia está a caminho’, disse. ‘Ao que tudo indica, o povo tem opinião e a exprime publicamente.’


Ela disse também que suas primeiras impressões são de que nestas eleições há uma ‘auto-afirmação das classes populares’.’


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Interesses


‘O ‘Jornal Nacional’ voltou à carga, com manchete sobre manchete, bloco sobre bloco, mas o destaque era mesmo um blog, da também global ‘Época’, com o ‘esclarecimento’. Na síntese da escalada do ‘JN’:


– Surge novo personagem no escândalo da compra do dossiê. O ex-assessor do Ministério do Trabalho Oswaldo Bargas ofereceu o material à ‘Época’ e disse que o encontro com o repórter era do conhecimento do presidente do PT, mas o teor das acusações, não.


Entre o blog e o ‘JN’, Ricardo Berzoini soltou nota dizendo que sabia do encontro para tratar de assunto ‘de interesse jornalístico’ -ao que William Bonner retrucou dizendo ser ‘de interesse da campanha’.


Rede Globo, uma tela de computador com o blog da ‘Época’


VAI PEGAR FOGO


O post no Blog Brasil, da ‘Época’, foi alvo de suspense em outros blogs, das Globos ou não. Jorge Moreno, no Globo Online, por exemplo:


– O tsunami está chegando. Como diria o Galvão Bueno, ‘haja coração!’. O Brasil vai pegar fogo! A coisa é feia!


Depois, dele mesmo:


– O tsunami chegou, gente, parte principal do mistério está desvendada… A revista foi procurada por petistas vinculados a Berzoini.


BOBAGEM GOLPISTA


De outra parte, integrantes do governo se revezavam, da blogosfera aos telejornais, na defesa de Lula e da punição -e no anúncio do apocalipse.


Tarso Genro, na Folha Online, atacava a ‘bobagem golpista’ e o que chamou de ‘operação tabajara’. E Waldir Pires recordava, no Terra:


– Acompanhei ainda jovem a construção da farsa do mar de lama que levou Getúlio ao suicídio. É a velha tradição dos donos do poder…


ESTARIA REELEITO HOJE


No horário eleitoral, Geraldo Alckmin surgiu bradando, ele mesmo, ‘basta!’ e ‘chega!’, em eco marqueteiro dos editoriais do ‘Correio da Manhã’ em 1964. Lula, em seu programa, respondeu aconselhando ao ‘povo brasileiro’ refletir sobre ‘a quem interessa perturbar as eleições’ e não se deixar ‘perturbar pelo desespero dos perdedores’.


Minutos antes, o ‘JN’ havia registrado os números do Datafolha. E o site do instituto trazia como enunciado que ‘Lula mantém 56% dos válidos e estaria reeleito hoje’. Como se lia pela blogosfera, porém, o levantamento não refletiu ainda os dois dias com ‘JN’ e outros em armas.


GOLPE (NA TAILÂNDIA)


Nas imagens do ‘JN’, Lula discursa para aplausos de Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia


Fátima Bernardes, num intervalo da Globo:


– O presidente discursou na abertura da Assembléia Geral da ONU, em Nova York. E o exército da Tailândia aproveitou a viagem a NY do primeiro-ministro, acusado de corrupção e abuso, para tomar o poder.


E Ana Paula Padrão, na escalada do ‘SBT Brasil’:


– Enquanto isso, em Nova York, Lula discursa contra a guerra. E na Tailândia o exército aproveita uma viagem e declara golpe de estado. Na Hungria, o povo se enfurece contra o primeiro-ministro que mentiu para se reeleger.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


Palmeira desbanca Santoro no Oscar da TV


‘Um dos poucos atores brasileiros com alguma projeção internacional, o versátil Rodrigo Santoro foi desbancado pelo esforçado Marcos Palmeira na disputa pelo Emmy International, o Oscar da TV mundial (fora a dos Estados Unidos).


Santoro, que acaba de ser escalado para o megassucesso ‘Lost’, foi desclassificado na seletiva latino-americana do Emmy International, realizada no Chile. Ele foi inscrito pela Globo na categoria de melhor ator por ‘Hoje É Dia de Maria 2’. Mas perdeu uma das duas vagas da América Latina para Marcos Palmeira, por ‘Mandrake’, produção da Conspiração para a HBO, e para Milton Gonçalves (‘Sinhá Moça’).


Na categoria de ator, a América Latina indica dois nomes, Ásia/África/Oriente Médio outros dois e a Europa, quatro. Em outubro, serão conhecidos os quatro finalistas. A final será em novembro, em Nova York.


Em busca de seu primeiro Emmy desde 1982, a Globo inscreveu 15 programas e cinco atores. Continuam na disputa sete programas (‘Clara e o Chuveiro do Tempo’, ‘Os Amadores’, ‘Cidade dos Homens’, ‘Sinhá Moça’, ‘Caldeirão do Huck’, ‘BBB 6’ e ‘Carandiru – Outras Histórias’) e três atores _além de Milton Gonçalves, Fernanda Montenegro (‘Belíssima’) e Letícia Sabatella (‘Maria 2’). O Brasil tem 12 candidatos. Além dos dez da Globo e de Palmeira, há ‘Filhos do Carnaval’ (O2/HBO).


OUTRA VISÃO 1 O SBT resolveu contra-atacar a Record, que tem enviado toda semana a anunciantes e publicitários um comparativo de sua audiência no horário nobre na Grande São Paulo com a do SBT, em que a rede de Edir Macedo leva ligeira vantagem.


OUTRA VISÃO 2 A resposta veio na forma de um ranking dos 15 programas mais vistos em todo o Brasil no último mês, sem contar os da Globo. Em agosto, dos 15 campeões de audiência do SBT e da Record, os dez primeiros eram da TV de Silvio Santos.


GELADA A atriz e ex-paquita Monique Alfradique era ontem à tarde favoritíssima a substituir a cantora Wanessa Camargo na segunda edição de ‘Dança no Gelo’. Wanessa se contundiu.


VÁCUO NACIONAL A próxima novela produzida pelo SBT só entrará no ar em março. ‘Cristal’, que termina no final de outubro, não será substituída por uma produção nacional, porque não haverá tempo para isso. Em seu lugar entrará a mexicana ‘Mundo de Feras’, sucesso da Televisa.


EMBALO MEXICANO Já o fenômeno juvenil ‘Rebelde’, que termina no final do ano, será substituído por ‘Código Postal’, também uma ‘Malhação’ mexicana.


PÁGINAS LIVRES O Ministério da Justiça estuda arquivar o processo administrativo que instaurou contra a novela ‘Páginas da Vida’, por causa do depoimento de uma mulher que falava de seu primeiro orgasmo e do striptease de Ana Paula Arósio.’


CRÍTICA
Marcelo Coelho


O momento literário


‘A CRÍTICA está morrendo. No máximo, temos reportagens sobre autores. Não se quer conhecer nenhuma obra; o que interessa são os detalhes biográficos de quem a escreveu. O jornalismo é hoje uma instituição coletiva, anônima e quase irresponsável. A literatura brasileira passa por um período de estagnação.


Na política, as casas legislativas se transformam, como nunca, em tipos coletivos de ajuntamento ilícito, sem nenhuma preocupação hipócrita de salvar aparências. Literatura e democracia sofrem do mesmo mal: a ignorância popular, fomentada e cultivada pelos poderes públicos.


Tudo isso se dizia em 1904. É o ano em que o escritor e jornalista João do Rio (1881-1921) fez uma série de entrevistas com muitos dos principais homens de letras brasileiros. Reuniu-as em ‘O Momento Literário’, livro que agora é reeditado pelas Edições Criar, de Curitiba.


As frases que pus no começo do artigo resumem considerações do próprio João do Rio e de alguns de seus entrevistados. Foram quase 40: de Olavo Bilac, Coelho Neto e Silvio Romero a Pedro do Couto, Magnus Söndhal e Félix Pacheco.


As reclamações dos literatos não se alteram com os anos e, sem dúvida, têm boas razões para continuar em voga. Mas, quando dizemos que nada mudou, há muitas ilusões de ótica distorcendo nosso julgamento.


Uma vez, estive em Ouro Preto, e, numa daquelas visitas às igrejas, o guia estava explicando os diversos procedimentos pelos quais se tentava enganar o fisco -desde o célebre ‘santinho do pau oco’ ao recurso de esconder ouro em pó no meio do cabelo crespo dos escravos. Ao meu lado, um turista não se continha de admiração diante da inventividade humana quando se trata de escapar aos rigores da tributação. ‘Sonegando, hein… Já naquela época!’ E seu risinho surpreendido comemorava, sobre um abismo de dois séculos, a imutável esperteza humana.


Claro que, em muitos aspectos, o Brasil literário de 1904 padecia das mesmas insuficiências que conhecemos hoje; mas algumas semelhanças podem ser enganadoras, e outras podem não passar de simples coincidência. Toda época, ou quase toda, está sujeita ao mesmo tipo de crítica por parte de quem vive nela: o panorama é confuso, os novos talentos não se firmaram, os escritores atuais não têm a mesma estatura daqueles do passado…


Por outro lado, a belle époque brasileira foi mesmo um período fraco para a literatura. Pululam figuras menores como Luís Delfino, Guimarães Passos, Luís Edmundo, Artur Orlando, Medeiros e Albuquerque… Que se dizem influenciados por gente ainda mais desconhecida, do quarto time da literatura e do pensamento europeu: Maiseroy, Poitou, Wyrouboff, Roberty…


Quanta poeira! Quantos fantasmas! Quantas convicções! Que múmias! Mas não tiro do livro nenhum motivo de superioridade ou depressão. Desse granizo miúdo de personalidades literárias -Sousa Bandeira, Gustavo Santiago, Curvelo Mendonça- o que fica, na verdade, é uma impressão de vida, de calor, de inquietação.


Há alguns entrevistados bem patetas, é verdade. Mas não havia mais patetas em 1904 do que em 2006, apesar de nossa resistência em admitir o fato. Mesmo algumas figuras totalmente presas às convenções de sua época emergem das entrevistas como indivíduos únicos, com seu grau de loucura, de alegria, de furor particular.


O padre Severiano de Resende, ‘com voz passada em seda’, odeia Castro Alves, a quem chama de ‘insuportável metralhador de sílabas’; mas concede a Machado de Assis o mérito de ser ‘o único prosador honesto que temos’. Lima Campos improvisa em voz alta: ‘Ah! João! A crítica é sempre a água da análise pedantocrática vazada malevolamente na açorda saborosa da produção’.


Tudo tem vida nesse livro: as recordações de infância de Silvio Romero, o entusiasmo de Medeiros de Albuquerque ao saber do assassinato de um ministro russo, o sarcasmo de Frota Pessoa contra a ABL (‘nunca, jamais, nenhum imortal, ali penetrando, fez, no seu caráter de imortal, outra coisa que não partir para a bem-aventurança’).


‘Isto é macabro’, completa Frota Pessoa. Sem dúvida. Estão todos mortos. Mas as entrevistas de João do Rio não são daqueles retratos antigos, de homens bigodudos, usando pincenê, rígidos como cadáveres. Mostram pessoas que estão vivendo intensamente o seu tempo, pessoas únicas, irrepetíveis. Podem não ter sobrevivido literariamente, mas viveram. Já é alguma coisa.’


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