Tuesday, 16 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Filósofos discutem a ‘tela global’


Leia abaixo a seleção de domingo para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Domingo, 23 de dezembro de 2007


MÍDIA & GLOBALIZAÇÃO


Tela legal


Robert Solé


‘Será que os irmãos Lumière sabiam o que iriam provocar? A invenção do cinema, nos anos 1890, não apenas deu origem à sétima arte, mas transformou nossa maneira de ver o mundo e, aos poucos, nossa maneira de viver. Pois as imagens animadas, passando para o domínio da eletrônica, causaram uma reviravolta em tudo. Essa ‘verdadeira revolução copernicana’ é analisada pelo filósofo Gilles Lipovetsky e por um especialista em cinema, Jean Serroy, num livro muito rico que nos faz medir o caminho incrível percorrido em alguns decênios [‘L’Écran Global’, A Tela Global, Seuil, 366 págs., 22, R$ 57].


Eles nos oferecem ao mesmo tempo uma apaixonante história do cinema e um mergulho muito instrutivo na ‘telosfera’. Mas os novos modos de vida que descrevem de maneira concreta e pertinente não ultrapassam de longe o ‘espírito do cinema’? Entre os filmes de ontem, em tecnicolor, e a eletrônica onipresente de hoje não passamos totalmente para uma outra coisa?


O ponto de partida é, portanto, uma tela muda, que faz sonhar. Ela se tornará o suporte da era de ouro de Hollywood e suas estrelas, até os anos 1950. Em seguida passamos para uma terceira fase, marcada pela nouvelle vague na França, o ‘free cinema’ na Inglaterra, e, nos EUA, inovações radicais que acompanham uma explosão dos tabus. E já ingressamos numa quarta era, com um ‘hipercinema’ marcado pela tecnologia digital e a ambição crescente dos produtores: mais efeitos especiais, mais ritmo, mais ambigüidade, mais violência, mais sexo… mais tudo. ‘O excesso já deixou de ser realmente sentido como excessivo’, destacam.


Nesse meio-tempo, a televisão privatizou a tela. Com ela se concretizou o mundo sem fronteiras, a ‘aldeia global’ de McLuhan [1911-80]. Ao longo dos anos, a torneira de imagens não parou de crescer, e as exigências dos consumidores aumentaram conseqüentemente. Reivindicam-se sempre mais e mais emoções e sensações, sem aceitar o tédio mais mínimo.


Mas a TV, hoje, não é mais que uma tela entre outras: computadores, assistentes pessoais, telefones, GPS… Utilitárias ou lúdicas, as telas nos acompanham em todos os atos da vida e mesmo antes do nascimento: a ecografia pré-natal.


Todos para todos


Vivemos, portanto, a era da ‘tela global’. Ela se converteu num intermediário quase obrigatória de nossa relação com o mundo e com os outros, observam Lipovetsky e Serroy. É evidente que a lógica do espetáculo se leva adiante e até se amplifica, mas ela não tem mais o significado que lhe conferiu Guy Debord [1931-94]. A comunicação em sentido único, o ‘um em direção a todos’, cede cada vez mais espaço à interatividade, a uma comunicação individualizada, ao ‘todos em direção a todos’.


É uma nova relação com a realidade: o prazer de descobrir de outra maneira o que acabamos de ver ou fazer. Mesmo as violências cometidas por outros são filmadas: é preciso, de certo modo, que o ato seja autenticado pela câmera. Para que servem as telas planas penduradas em paredes, como se fossem quadros, em locais de passagem pública? As pessoas nem sequer olham para elas.


Ao fundo sonoro somou-se um fundo visual. ‘A tela está ali, como garantia da dimensão midiatizada da realidade.’ Eles ressaltam todos os perigos da ‘telocracia’: quando, por exemplo, jovens internautas passam noites inteiras diante de um videogame, fazendo um sósia deles viver num universo virtual.


Sim, a tela pode ser uma droga pesada, mas nossos dois autores se negam a soar o alarme. Refutam a tese do ‘confinamento interativo generalizado’, proposta por Paul Virilio. ‘Se é verdade que uma parte importante da vida é passada diante de telas digitalizadas, também o é que uma outra parte, não menos importante, investe a dimensão contrária, carregada de expectativa e de prazeres sensoriais.’


Sem catastrofismo


Depender cada vez mais de circuitos eletrônicos e informáticos não impede as pessoas de buscar o bem-estar, de amar a natureza, de querer compartilhar receitas de cozinha, como ilustram cerca de 500 blogs culinários franceses. Numa obra anterior, ‘A Felicidade Paradoxal’ [Cia. das Letras], Gilles Lipovetsky já tinha analisado essas contradições, erguendo-se contra o catastrofismo. A televisão não suscita grandes movimentos de solidariedade com vítimas de catástrofes, doentes ou miseráveis? O ‘homo telensis’ não é necessariamente prisioneiro das telas, nos garante Lipovetsky.


A íntegra deste texto saiu no ‘Le Monde’. Tradução de Clara Allain.’


MÍDIA & POLÍTICA


Lars Movin


Votos em branco


‘Por Que Democracia?’ é certamente um dos mais amplos e ambiciosos projetos internacionais de cinema documental já empreendidos. Abarcando dez filmes de cineastas locais em países tão distantes uns dos outros quanto China, Libéria, Paquistão, Egito, Bolívia, EUA e Dinamarca, exibidos por emissoras em 42 países e contando com o apoio de múltiplos websites, o projeto, lançado em outubro passado, estava previsto para alcançar pelo menos 300 milhões de espectadores e estimular a discussão em torno das perguntas: o que é a democracia? Como ela funciona? Será que é, por definição, a escolha certa para todos?


Marcha em sintonia


Na escola Sempre Verde, em Wuhan, região central da China, as crianças são ensinadas a marchar em sintonia, subordinar o individual ao comunitário e entoar slogans sobre o Estado e o futuro. Essa é a China que conhecemos. Mas anos de política do filho único e liberalização econômica vêm submetendo os valores tradicionais a uma pressão constante.


Se as crianças da nova China não compreenderem por conta própria que precisam ser ambiciosas para ter sucesso numa sociedade cada vez mais competitiva, seus pais certamente os ajudarão a entendê-lo. Então talvez a pergunta seja: o que aconteceria se a sociedade chinesa cortasse seus últimos laços com seu passado e desse livre vazão às forças da democracia?


E se uma classe numa escola fosse autorizada a eleger um representante estudantil seguindo os mesmos princípios usados por adultos no Ocidente para eleger seus representantes -ou seja, indicando candidatos, promovendo campanhas eleitorais e o voto aberto? Foi o que o documentarista chinês Weijun Chen se propôs a explorar quando foi incentivado a desenvolver um trabalho para o projeto ‘Por Que Democracia?’, uma série de documentários de cineastas locais de diversos lugares do mundo, descrevendo visões diferentes da democracia.


Seu filme, ‘Por Favor, Vote em Mim’, é ao mesmo tempo comovente e assustador, documentando o experimento feito por Chen. O cineasta acompanhou três candidatos de oito anos de idade em sua campanha, chegando finalmente à votação dos alunos. É um processo que evolui como uma versão em miniatura do mundo adulto, com todas as suas jogadas sujas, negociatas, troca de votos por favores, cinismo e corrupção.


Local e global


‘Por Favor, Vote em Mim’ representa de modo eloqüente o espírito do projeto ‘Por Que Democracia?’. Como é feito por um diretor chinês, soma a perspectiva local a um tema globalmente relevante.


‘Procuramos evitar as regiões do mundo que são mais explosivas’, disse Mette Hoffman Meyer, uma das responsáveis pelo projeto. ‘Filmes sobre o Afeganistão ou o conflito israelo-palestino provavelmente iriam deslanchar de qualquer maneira’, disse. Meyer chefiou o departamento de vendas internacionais da emissora comercial dinamarquesa TV2 durante 18 anos, incluindo os últimos anos, em que foi editora de documentários. Em agosto passado, começou em seu novo emprego como editora de documentários e chefe de co-produções na emissora pública DR.


Não surpreendentemente, carregou uma ampla rede de contatos para ‘Por Que Democracia?’, que desenvolveu e conduziu em parceria com dois outros editores experientes, Nick Fraser (BBC), e Iikka Vehkalahti, da finlandesa YLE. Nos últimos três anos, os três co-lançaram uma série de grandes projetos, incluindo ‘Tempos Interessantes’, um punhado de documentários chineses, e, notavelmente, uma série de 38 filmes da África sob a bandeira de ‘Na Realidade a Vida É uma Coisa Bela’, em ambos os casos trabalhando com cineastas locais.


Democracia como slogan


‘Quando fizemos o projeto africano, realmente ficou claro para mim como é importante ter cineastas locais dirigindo os filmes, em lugar de simplesmente despachar um repórter ocidental para apresentar a história costumeira mostrando como tudo é deprimente.’ ‘É claro que os filmes dos diretores africanos também tinham seus problemas, mas tinham humor e uma alegria em torno de coisas pequenas que facilitaram em muito a identificação dos espectadores africanos com as imagens que lhes eram apresentadas. Desde então, venho usando o mesmo princípio em muitos contextos’, disse Meyer.


Segundo ela, ‘foram colocadas sobre a mesa várias propostas -as nações árabes e outras escolhas evidentes-, mas então se começou a falar de democracia, esse slogan pelo qual vamos à guerra hoje em dia e que tentamos exportar para outras partes do mundo’, disse. ‘A democracia significa algo diferente para cada um. No Japão, a percepção que se tem dela é distinta da que se tem no Ocidente. Na Rússia as pessoas provavelmente não desejariam o tipo de democracia que vemos na Escandinávia como sendo o único tipo correto. E assim por diante.’


Uma reunião inicial foi realizada em dezembro de 2004, e desde então a bola de neve vem crescendo. A tal ponto que agora já não soa como mera fantasia quando os lançadores do projeto dizem esperar que tenha início um diálogo global sobre a democracia. ‘A coisa ganhou dimensões enormes’, diz Meyer. ‘Após termos fechado parceria com cinco ou seis emissoras, começamos a buscar a adesão do Instituto Dinamarquês de Cinema, do Ministério do Exterior finlandês e de diversos fundos pelo mundo afora e acabamos por fechar contrato com 42 emissoras.’


‘Nem todas as estações de TV envolvidas adquiriram todos os dez filmes, mas todas concordaram em exibir pelo menos dois deles, e a maioria vai transmitir vários ou todos.’ Como encontraram os cineastas? ‘Organizamos encontros e fizemos contatos em todo o mundo. Enviamos e-mails aos nomes das listas de mailing de diferentes festivais de cinema e acabamos por receber 480 propostas’, disse Meyer.


‘Num primeiro momento, as propostas não eram distribuídas geograficamente de maneira tão ampla quanto teríamos gostado, então tivemos que fazer um esforço adicional em alguns lugares. Essa também tinha sido minha experiência com nosso último projeto na África. Quando você trabalha em países que não têm tradição de produzir documentários nem contam com um ambiente ou rede correspondente, é preciso encontrar outros modos de fazer as coisas. Na China fizemos uma reunião secreta, convidando os documentaristas que conhecíamos, e pedimos que nos enviassem propostas. Na Índia fizemos dois workshops, em Mumbai e Calcutá.’


Marketing viral


O grupo responsável pela iniciativa vem procurando pensar a distribuição e o marketing de maneiras não convencionais. Por exemplo, o filme chinês ‘Por Favor, Vote em Mim’ foi postado na íntegra no MySpace. Além disso, o grupo formou uma parceria com o www.joost.com, um novo site de TV na internet lançado por Janus Friis e Niklas Zennström, os fundadores do Skype. Na mídia impressa foi formada uma parceria com o jornal gratuito ‘MetroXpress’, com sucursais em 23 países e, segundo suas contas, 25 milhões de leitores diários, incluindo muitos jovens.


‘Também entramos no marketing viral, criando pequenos comerciais de 30 segundos que esperamos que sejam suficientemente divertidos, grosseiros ou grotescos para que as pessoas queiram dividi-los com seus amigos e que divulgamos via celulares, Facebook [site de relacionamentos] e semelhantes, esperando que ganhem vida própria’, disse Meyer.


Culturas locais


O que mais a agrada no projeto é que os filmes, precisamente por serem criados por diretores locais, também refletem suas respectivas culturas cinematográficas, em graus variados. ‘É o caso do russo ‘Patriotas’, de Nino Kirtadze. Já o Egito, representado por ‘Estamos Vigiando Você’, de Leila Menjou e Sherief Elkatsha, evidentemente tem um nervo caótico muito mais forte do que os filmes que vemos na Europa.’ ‘Um dos desafios do projeto é tentar manter o equilíbrio.


Por um lado, não saímos por aí dizendo aos diretores que deveriam fazer coisas como um filme da BBC. Por outro lado, compreendemos que os filmes são para serem vistos em todo o mundo e têm que ser compreensíveis para todo o mundo. Acho que tivemos sorte por conseguir lançar dez filmes tão fortes e comoventes. Mostrei o liberiano ‘As Damas de Ferro da Libéria’, de Daniel Junge e Siatta Scott Johnson, a uma colega da DR.’


O filme acompanha Ellen Johnson Sirleaf, a primeira presidente democraticamente eleita na Libéria após 14 anos de guerra civil e a primeira mulher a ser chefe de um Estado africano, desde sua posse em janeiro de 2006.


‘Minha colega ficou muito comovida e me disse que foi a primeira vez em que chorou ao assistir a um documentário político africano. É isso o que os documentários fazem. Quando as ferramentas documentais são utilizadas corretamente, os espectadores conseguem identificar-se muito melhor com seus temas e, ao mesmo tempo, compreendem melhor os projetos envolvidos.’


A íntegra deste texto foi publicada na revista dinamarquesa ‘Film’. Tradução de Clara Allain.’


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Filmes são exibidos na TV brasileira


‘O s filmes da série ‘Por Que Democracia?’ podem ser assistidos na TV brasileira. Os documentários são exibidos pelo Futura às quartas-feiras, às 23h30. Segundo Lúcia Araújo, diretora do canal, o plano é usar os filmes do projeto e material de acervo -como programas sobre ética- em projetos de capacitação voltados a instituições educacionais. ‘Estamos preocupados com o desinteresse dos jovens pela participação política’, diz Araújo. Os dez filmes que compõem o projeto internacional são ‘Campanha’ (Kazuhiro Soda, Japão), ‘Charges Sangrentas’ (Karsten Kjaer, Dinamarca), ‘Estamos Vigiando Você’ (Leila Menjou e Sherief Elkatsha, Egito), ‘As Damas de Ferro da Libéria’ (Daniel Junge e Siatta Scott Johnson, Libéria), ‘Patriotas’ (Nino Kirtadze, Rússia), ‘Jantar com o Presidente’ (Sabiha Sumar e Sachitanandam Sathanantan, Paquistão), ‘À Procura de Gandhi’ (Lalit Vachani, Índia), ‘Táxi para o Lado Negro’ (Alex Gibney, EUA), ‘Procurando pela Revolução’ (Rodrigo Vazquez, Bolívia) e ‘Por Favor, Vote em Mim’ (Weijun Chen, China).


NA INTERNET – Leia depoimentos de três documentaristas do projeto em www.folha.com.br/073532


CHINA


Howard W. French


Censura a filme na China leva cinéfilos a Hong Kong


‘DO ‘NEW YORK TIMES’ – As fileiras de visitantes chineses a Hong Kong vêm sendo engrossadas por uma categoria inédita de turistas: os cinéfilos. Devido à censura de um filme sobre amor e traição em Xangai durante a Segunda Guerra, do cineasta taiwanês Ang Lee, milhares de fãs de cinema da China estão indo a Hong Kong para assistir à versão completa de ‘Lust, Caution’.


O fato destaca a rápida mudança nas atitudes do público diante da censura governamental às artes, que não costumava ser questionada, e gerou debate sobre a regulamentação de filmes na China.


Viajantes já visitaram Hong Kong para assistir a filmes no passado, mas os números eram muito menores. Os críticos e comentaristas locais atribuem o interesse pelo filme de Lee a diversos fatores, da divulgação boca-a-boca ao conteúdo sexual ousado eliminado da versão censurada, passando pelo sutil subtexto político raramente visto em filmes chineses. O mais importante, porém, talvez seja a ascensão de uma classe urbana afluente no rico leste da China, cada vez mais acostumada a escolher o que fará parte de suas vidas.


Pelo menos um fã chinês de cinema tentou processar a Administração do Rádio, Cinema e Televisão, que regulamenta o setor, por cortar parte do filme. Lee, o diretor, afirmou que o material censurado foi definido como politicamente inaceitável em Pequim porque reforçava a idéia da simpatia que surge entre uma jovem chinesa e um colaborador dos ocupantes japoneses de Xangai. Muitos membros da indústria chinesa do cinema apóiam a idéia de adotar um sistema de classificação como o dos EUA, que segundo eles reduziria a necessidade de censura direta.


Mas as autoridades do cinema até agora resistem a esse apelo. Alguns dos visitantes que vão a Hong Kong dizem que aceitam os motivos que embasam a existência de um sistema de censura, em um país com tamanhas disparidades regionais de renda e educação, mas acreditam que a prática já não seja justificável nas cidades.


‘Sou contra a censura, mas creio que compreendo por que ela continua necessária no país como um todo’, disse Yan Jiawei, um designer gráfico de Xangai que assistiu a ‘Lust, Caution’ em recente viagem de negócios a Hong Kong. ‘A questão está relacionada ao nível educacional das pessoas.’ Profissionais do cinema chinês disseram que o fato de ‘Lust, Caution’, mesmo censurado, estar em exibição na China demonstra até que ponto os parâmetros daquilo que é considerado aceitável se expandiram desde o começo da era de reformas, há duas décadas.


Embora muita gente pareça ter sido atraída pelo filme de Lee em razão das cenas de sexo, que ainda hoje variam de mornas a inexistentes na maioria dos filmes chineses, um fator ainda mais inédito, para um filme lançado no país, é a idéia de um traidor retratado como personagem atraente, e não vilão, em um dos papéis centrais.


‘O país sem dúvida está se abrindo e avançando mais e mais, e essa é a maré da história, que não se pode deter’, disse Fang Li, um importante produtor chinês. ‘No entanto, diante de uma economia de mercado que está se desenvolvendo com tamanha rapidez, jamais vi um setor tão atrasado quanto o de cinema, na China.’


Fang diz que boa parte da responsabilidade por isso cabe aos censores, pessoas em geral idosas que operam em comitê e convidam diferentes ramos do governo a comentar os filmes.


Outros críticos do sistema dizem que os censores do país se tornaram muito mais cuidadosos em eliminar os rastros de seu trabalho. Wu Di, pesquisador do Centro Chinês da Arte Cinematográfica, em Pequim, afirma que, quando o diretor Tian Zhuangzhuang realizou ‘The Blue Kite’, um filme de 1993 sobre a Revolução Cultural, assunto proibido na China, todas as empresas do setor foram notificadas de que não deveriam voltar a contratá-lo. ‘Agora, sob a chamada sociedade harmônica, eles não agiriam de maneira tão escancarada’, diz Wu, citando a teoria do presidente Hu Jintao. Em lugar de divulgar uma notificação de que contratar uma pessoa está proibido, hoje as autoridades conseguem resultado semelhante com uns poucos telefonemas, que não deixam rastro. ‘Lust, Caution’ tem estréia no Brasil prevista para 8 de fevereiro próximo.’


TELEVISÃO


Laura Mattos


Série revive ano da eleição de Collor


‘Autora das elogiadas ‘JK’, ‘Um Só Coração’ e ‘Os Maias’, Maria Adelaide Amaral estréia em fevereiro, na Globo, sua nova minissérie. ‘Queridos Amigos’ não será histórica, como as anteriores. Baseada em sua própria vida, narra o reencontro de um grupo de amigos em novembro de 1989. O protagonista, interpretado por Dan Stulbach, é inspirado no jornalista Décio Bar, amigo da autora, que se suicidou em 1991.


É sua morte que mobiliza a retomada da turma, que vivera intensamente os ideais da esquerda nos anos da ditadura militar. À Folha, a escritora fala sobre a decepção ao saber que a Globo abortara o projeto de sua série sobre Maurício de Nassau e conta que relação ‘Queridos Amigos’ tem com a disputa entre Lula e Collor.


FOLHA – O que achou de trocar Nassau por ‘Queridos Amigos’?


MARIA ADELAIDE AMARAL – A história da troca começou no dia em que chamei o Dan Stulbach -ele faria o papel de Nassau- à minha casa, para dizer que infelizmente a minissérie havia sido adiada. Então o telefone tocou e era a [diretora] Denise Saraceni, que acabava de sair de uma reunião com o Mário Lúcio Vaz [diretor-geral artístico da Globo]. Ele tinha lhe perguntado se eu não tinha nada de minha autoria, passível de ser adaptado para minissérie. Nessa tarde estava particularmente irritada e respondi que não. E o Dan, que ouvia a conversa, observou que o romance ‘Aos Meus Amigos’ daria uma minissérie. Considerei a idéia, escrevi um argumento e recebi sinal verde para fazer a sinopse. E então me dei conta de que estava fazendo o primeiro trabalho exclusivamente meu para a TV. No teatro e na literatura quase sempre fiz isso.


FOLHA – Lamenta o fato de a minissérie histórica sobre Nassau ter sido descartada em razão do custo alto?


AMARAL – Quando ficou claro que Nassau não seria feita, fiquei muito desapontada. Durante um ano tinha pesquisado, viajado à Holanda e conversado com Evaldo Cabral de Mello, que seria o consultor, inúmeras vezes. Foi muito frustrante.


FOLHA – Por que escolheu novembro de 1989 para a minissérie?


AMARAL – O país teve a sua primeira eleição direta para presidente da República após 20 anos. O dia 15 assinalou os cem anos da República. Caiu o Muro de Berlim. A inflação andava pela casa dos 50% ao mês. O desemprego campeava inclusive na nossa área. Em novembro de 1989 finalizei a edição de ‘Os Cem Anos da República’, para a qual tinha sido chamada pela Nova Cultural (ex-Abril Cultural). A redação reunia jornalistas como Sérgio Pompeu e Renato Pompeu, free-lancers como eu e outros companheiros, naquele momento difícil. Foi minha última contribuição na indústria editorial. No ano seguinte iria para a TV.


FOLHA – Qual será o peso da campanha Lula x Collor? A série mostrará, por exemplo, o episódio do uso da ex-namorada do petista falando sobre o pedido de aborto na propaganda política do adversário?


AMARAL – Não creio que a história chegue ao ponto mais acirrado da campanha. Isso nem teria peso na trama, uma vez que os meus queridos amigos votarão em peso no Lula, no segundo turno, com exceção de um, que votará nulo.


FOLHA – Na série, um grupo de amigos que viveu intensamente os anos 70 se desencontra e desencontra também seus ideais políticos. Já te vi em eventos do PSDB, como no jantar de apoio a Serra na casa de Raul Cortez. O que o fundo político/ ideológico de ‘Queridos Amigos’ tem de relação com a sua trajetória?


AMARAL – Entre os amigos da minissérie estão Léo, cineasta e escritor, alinhado com pensamentos de vanguarda; Ivan e Tito, jornalistas, ex-presos políticos; Pedro, autor de romances que denuncia os porões da ditadura militar; Bia, presa e torturada no DOI-Codi etc. A política impregna a vida deles.


Em 1989, estão revendo ou reforçando conceitos, se confrontando com ilusões perdidas e vivendo a ressaca das Diretas. Fiquei amiga do Serra em 1960, tomando o mesmo ônibus para o centro da cidade. Ele ia para a Poli e eu para o Banco da Lavoura de Minas Gerais, do qual saía às 19h para estudar no Colégio Estadual de São Paulo, onde conheci Décio Bar [jornalista que inspira o protagonista da minissérie]. Nunca me filiei a nenhum partido mas sempre me alinhei à esquerda. Fiz parte daquele grupo que, durante a ditadura, subscrevia abaixo-assinados contra a repressão, ajudava as famílias de companheiros presos, dava suporte à imprensa nanica, foi ao enterro e à missa do Vlado e angariava fundos para a greve do ABC.


FOLHA – Sua carreira de jornalista influenciou ‘Queridos Amigos’?


AMARAL – Tive o privilégio de trabalhar na Abril na década de 70, na sua Divisão Cultural, que acolheu, a partir de 1969, professores afastados de seus cargos nas universidades pela ditadura, além de jornalistas e outros ‘refugiados’ da repressão. A atmosfera era rica, linhas de pensamento variadas mas jamais dicotômicas. Todos sabiam quem era o inimigo comum. Foi esse clima de efervescência intelectual e de companheirismo que inspirou a maior parte de minhas obras.


FOLHA – O jornalista Décio Bar, seu amigo que se suicidou, inspirou o protagonista da minissérie?


AMARAL – O que motivou o romance ‘Aos Meus Amigos’ foi o suicídio do Décio Bar, em 1991. Ele foi uma das pessoas mais brilhantes que conheci: poeta e escritor, arquiteto, artista plástico, cineasta, jornalista. Era também muito exigente a respeito do seu trabalho. Décio influenciou meu gosto e minhas preferências ou idiossincrasias culturais. Sua morte me abalou profundamente e mobilizou a vontade de falar sobre ele e nossa geração.


FOLHA – Como as séries normalmente são de época, o tempo mais atual costuma ser relacionado às novelas. Como ‘Queridos Amigos’ se diferencia de uma telenovela?


AMARAL – É diferente uma novela de uma minissérie. Nesta, ainda mais porque o andamento do roteiro é cinematográfico. Há pouca concessão ao folhetim e nenhuma à linguagem.


FOLHA – Cogita voltar às novelas?


AMARAL – Se me mandarem fazer, faço. Mas não o farei com o mesmo prazer com que faço minisséries. Começando pelo fato de que um autor de novela escreve um capítulo por dia e na minissérie tenho dois, três dias para isso, o que confere outra qualidade ao produto. E também porque as minisséries me permitem fazer uma das coisas que mais gosto: pesquisar intensamente.


FOLHA – Por fim, uma curiosidade: em 1989, votou em Lula ou Collor?


AMARAL – Não voto. Sou portuguesa e não tive paciência para a burocracia da naturalização.’


Bia Abramo


Ruído de Comunicação


‘SEMANA PASSADA , a coluna pediu que os leitores se manifestassem em relação aos serviços da televisão paga. O mote foi a campanha da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA) contra o projeto de lei que prevê a obrigatoriedade de uma cota maior de programação nacional.


Além dos leitores, a ABTA também respondeu à coluna no ‘Painel do Leitor’ da última sexta-feira, esclarecendo que ‘o objetivo da campanha ‘Liberdade na TV’ é preservar o direito dos usuários da TV por assinatura a ter acesso à diversidade de informação, de cultura e de entretenimento que a multiplicidade de canais oferece’.


Muito bem: o objetivo até pode ser esse, mas o tom da campanha não é assim tão cuidadoso. Ao contrário, a campanha usa de uma das ferramentas mais comuns (e perversas) do marketing, que é a operação de confundir o interesse público com o da empresa ou instituição.


A peça publicitária, tema da coluna, fala explicitamente em escolha da programação (grifo meu). O slogan não poderia ser mais claro: ‘Eu pago, eu escolho o que ver na minha TV por assinatura’.


O problema é que, sem cota de qualquer espécie, muitos dos assinantes não acham que o fato de pagar lhes confere o poder de decidir sobre a programação, como quer a campanha.


Com a palavra, os leitores (e assinantes) que responderam à coluna. Suely diz: ‘O consumidor de TV paga sofre dois abusos concomitantes: dos pacotes não-flexíveis (e preços abusivos) das operadoras e do baixíssimo nível de alguns canais com intervalos intermináveis, reprises sofríveis e grades de programação para lá de esquisitas’.


Andrea Barros afirma: ‘O que me incomoda profundamente na TV paga, além das repetições de programas, filmes e afins, são os comerciais. Ora, se já pagamos por um programa ‘diferenciado’, por que temos que pagar para assistir comerciais?’.


André Tamarindo Rocha pergunta: ‘Por que não posso montar minha própria cesta de canais? Se eu pudesse montar a lista de canais que eu quero assinar, chegaríamos mais perto da tal afirmação de que a gente escolhe a programação’.


Esses são alguns dos exemplos; vários outros leitores mandaram mensagens com reclamações e indagações semelhantes. Indício claro e seguro de que, quando se trata de ‘direito de escolha’, operadoras da TV paga e assinantes não falam a mesma língua.’


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O Estado de S. Paulo


Sexta-feira, 16 de dezembro de 2007


TELECOMUNICAÇÕES


Ethevaldo Siqueira


Salvando duas estatais e o rádio digital Iboc


‘Por mais estranho que possa parecer, o governo Lula planeja ressuscitar duas estatais – a Telebrás e a Eletronet – e ainda investir no capital de uma empresa americana, a Ibiquity, proprietária da tecnologia de rádio digital In Band on Channel (Iboc). São três projetos polêmicos que caminham sem qualquer debate e sem a participação do Congresso. Façamos uma retrospectiva.


Privatizada em 29 de julho de 1998, a Telebrás já deveria ter sido extinta. Mas sobreviveu os últimos nove anos porque tem responsabilidades trabalhistas com 293 funcionários cedidos à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), além de enfrentar outras questões na Justiça.


A FÊNIX RENASCE


A reativação da Telebrás interessa a três ministérios: Comunicações, Casa Civil e Comunicação Social. Seus defensores atribuem papel estratégico à empresa nos ambiciosos projetos de inclusão digital, que interligarão escolas e hospitais via internet de banda larga, e na operação do futuro Satélite Geoestacionário Brasileiro (SGB), planejado para prestar, entre outros, serviços de comunicações militares e segurança de vôo. É claro que todos esses serviços poderão ser prestados com a mesma segurança e confiabilidade – e por menores custos – pelas operadoras privadas de telecomunicações do País, como ocorre, aliás, em muitos países.


Os investimentos para os projetos de inclusão digital do governo Lula nos próximos três anos são da ordem de R$ 2,5 bilhões e R$ 3 bilhões, segundo prevê o ministro das Comunicações, Hélio Costa.


Para o PT e seus aliados, a recriação de uma estatal como a Telebrás é um prato apetitoso. Segundo observadores independentes, a criação de centenas de cargos nessa nova empresa, a começar pela diretoria, amplia o espaço para barganhas e para o aparelhamento do Estado.


A QUASE FALIDA


Nascida em 1999, no auge da bolha da web, a Eletronet tem como sócias a Lightpar (Eletrobrás) e a AES Bandeirante. O começo de suas operações ocorreu no momento de refluxo dos negócios setoriais, logo depois do estouro da bolha. Seu desempenho, como se poderia esperar, foi catastrófico, resultando em calote de mais de R$ 400 milhões para seus fornecedores.


Paralelamente à reativação da Telebrás, o governo está decidido a recuperar a Eletronet e mantê-la na condição de estatal, pensando em usar intensamente sua rede de 16 mil quilômetros de cabos de fibra óptica instalada sobre as torres de transmissão de energia de alta tensão da Eletrobrás. O Ministério da Comunicação Social está de olho nessa rede para ampliar a cobertura da TV Brasil.


Mesmo enterrada em dívidas, a Eletronet não paralisou suas atividades. A Eletrobrás afastou a sócia AES e assumiu as operações, passando a prestar serviços a 20 clientes. Mas não assumiu as dívidas da empresa, que já devem ter ultrapassado R$ 550 milhões.


Segundo estudo elaborado por J. P. Martinez, consultor e analista de telecomunicações, ‘estatais como a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, apoiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), vêm bancando a operação dos serviços e podem negociar a aquisição da empresa’.


APOIAR A IBIQUITY?


O terceiro e mais surpreendente projeto em gestação no governo visa à introdução do rádio digital no Brasil. Foi anunciado há duas semanas pelo próprio ministro Hélio Costa. O padrão de rádio digital Iboc (conhecido também pelo nome comercial de HD Radio), criado pela empresa americana Ibiquity, ainda não está plenamente amadurecido do ponto de vista tecnológico para ser adotado pelas emissoras brasileiras.


Como saída para essa dificuldade, o ministro Hélio Costa sugere que o governo brasileiro faça uma parceria estratégica com a Ibiquity, para ajudá-la a concluir o desenvolvimento da tecnologia. E faz uma proposta realmente criativa, leitor: o governo ajudaria uma empresa brasileira, privada ou estatal, a associar-se à Ibiquity, com recursos do BNDES.


Todo esse apoio na expectativa de que a empresa americana conclua o desenvolvimento do padrão digital Iboc e, em contrapartida, se instale no Brasil, para fabricar e exportar equipamentos digitais para a América Latina. Para alguns analistas, a Ibiquity precisa de, no mínimo, US$ 100 milhões.


Se concretizado, o generoso projeto de Hélio Costa pode ser providencial para a empresa americana, mas traz sérios riscos ao Brasil.


Vale lembrar que o padrão de rádio digital Iboc tem quatro problemas não resolvidos: 1) atraso (delay) de oito segundos entre o sinal analógico e o digital, com a repetição ou a eliminação de palavras essenciais ao entendimento de notícias ou à audição de música; 2) ruídos e interferências em canais vizinhos, tanto em AM como em FM, especialmente à noite; 3) diferença de alcance das transmissões analógicas e digitais, com problemas de instabilidade nos pontos de limite das transmissões digitais; 4) excessivo consumo de energia, que impossibilita a produção de receptores portáteis, por esgotamento das baterias em poucas horas.’


PROPAGANDA


O Estado de S. Paulo


Agência de publicidade tem aumento de receita de até 40%


‘Com a expansão do setor imobiliário, cresceu também a necessidade de construtoras e incorporadoras de criar formas eficientes de divulgação dos produtos. Por causa disso, a agência Eugênio, há quase 18 anos no mercado, decidiu se reposicionar: desde 2006 passou a atender apenas empresas do setor imobiliário.


Para dar conta de atender ao aumento da demanda, o número de funcionários da agência subiu de 100 para 130. Além disso, a empresa também precisou abrir escritórios em outras cidades, como Rio, Salvador, Brasília e Porto Alegre.


A sede em São Paulo, contudo, ficou pequena para abrigar tantos empregados novos. ‘Vamos nos mudar em fevereiro. Hoje, não temos nem mil m² de área. Vamos para um espaço com 1,8 mil m²’, disse o vice-presidente de criação da agência, Carlos Valladão.


A empresa, que desenvolve peças publicitárias, comerciais para rádio e televisão, anúncios e estratégias de marketing para as companhias do setor imobiliário, tem registrado um faturamento entre 30% e 40% superior em 2007, na comparação com o ano anterior.


‘Sempre atuamos com clientes do setor imobiliário, mas com o crescimento do mercado decidimos nos dedicar exclusivamente a ele. Os resultados estão sendo excelentes’, comemorou Valladão.’


JORNALISMO CULTURAL


Daniel Piza


Melhores do ano


‘Este ano editorial repetiu os últimos e trouxe número maior de destaques em não-ficção, especialmente em biografias. Mas em termos de qualidade o destaque vai enfim para a ficção. Li bons romances neste ano, curiosamente pequenos em tamanho. O que mais me agradou, o que mais ficou na minha memória em cenas ou climas, foi O Mar, de John Banville, escritor irlandês, dono de uma prosa que mistura sensibilidade artística com senso científico. Na Praia, de Ian McEwan, não tem a força de Reparação ou mesmo Sábado, mas é uma bela novela. Martin Amis voltou ao seu melhor nível em Casa dos Encontros, um romance ‘russo’ em suas conturbações emocionais e políticas. E Philip Roth continuou a demonstrar por que é o maior de todos, com Homem Comum (original do ano passado, quando eu já o tinha destacado) e Exit Ghost, este ainda não traduzido.


Outros bons autores de língua inglesa tiveram livros editados no Brasil em 2007, mas a meu ver abaixo do que podem, como John Updike, Julian Barnes, Don DeLillo e J.M. Coetzee. Isso para não falar em O Castelo na Floresta, último romance de Norman Mailer, uma das tantas perdas deste ano. Antes que me acusem de só falar de autores anglófonos, confesso que não tive tempo para enfrentar As Benevolentes, do francês Jonathan Littell, e que me diverti muito com Il Colore del Sole, suspense do italiano Andrea Camilleri sobre o pintor Caravaggio, ainda inédito em português.


Quanto aos brasileiros, O Filho Eterno, de Cristóvão Tezza, e O Sol se Põe em São Paulo, de Bernardo Carvalho, são livros interessantes, mas, de novo, abaixo do que cada autor poderia ter feito com a mesma história. Outra tônica foi a grande quantidade de reedições ou novas traduções importantes. Livros de Onetti, Waugh, Faulkner; relançamento do Borges completo; reavaliações como a de Paula Fox, autora dos contos de Desesperados – muitos seriam os exemplos. Na poesia, traduções de Emily Dickinson por José Lira, de Sylvia Plath por Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Lenz de Macedo, além do clássico saxão Beowulf por Erick Ramalho, merecem aplausos. O melhor livro de poesia brasileira que li, claro, foi Meu Filho, Minha Filha, de Fabrício Carpinejar.


A lista de biografados ou perfilados brasileiros é grande: Dom Pedro II, Tim Maia, Rubem Braga, Joaquim Nabuco (que comento na próxima semana), Anita Malfatti, Oswald de Andrade (estas duas, reedições), Vinicius de Moraes (perfil por Sergio Augusto e mais seu cancioneiro), Gilberto Freyre. A melhor, ou mais completa, é a de Braga. Leu-se bastante, de novo, sobre a história brasileira, em livros como 1808, de Laurentino Gomes, ou em artigos como os recuperados de Raymundo Faoro, A República Inacabada, e na tese A República Consentida, de Maria Tereza Chaves de Mello. Ensaios de Luiz Roncari, Leyla Perrone-Moisés, Leda Tenório Mota e José Carlos Avellar também trouxeram ângulos novos para velhas e boas discussões. O grande prêmio é de A Dança dos Deuses, de Hilário Franco Júnior, um dos melhores sobre futebol.


Nos ensaios de autores estrangeiros, três temas foram dominantes: religião, meio ambiente e modernismo. Religião foi assunto polêmico de Richard Dawkins e Christopher Hitchens. O tema do meio ambiente teve boas contribuições de James Lovelock e Michael Pollan. E a arte moderna está em livros traduzidos de T.J. Clark e David Sylvester e em três outros lançados nos EUA que resenhei na semana passada: Modernism, do historiador Peter Gay; o terceiro volume da biografia de Picasso por John Richardson; The Rest Is Noise, do crítico Alex Ross. A ciência também rendeu bons livros, como a biografia de Einstein por Walter Isaacson, Eu, Primata, de Frans de Waal, Alucinações Musicais, de Oliver Sacks, e The Stuff of Thought, mais recente de Steven Pinker.


Nesta área também se viu o admirável trabalho de tirar o atraso editorial brasileiro. Livros de Samuel Pufendorf, Benjamin Constant e Trevor-Roper preencheram algumas lacunas da biblioteca liberal. Ensaios de Literatura Ocidental, de Eric Auerbach, e Piero della Francesca, de Roberto Longhi, representam dois dos maiores críticos do século 20. De críticos na ativa tampouco faltaram bons exemplos, como Shakespeare, the Thinker, de A.D. Nuttall, e The Power of Art, de Simon Schama. Istambul, de Orhan Pamuk, os dois de Ashley Kahn sobre jazz, Kind of Blue e A Love Supreme, e A Batalha pela Espanha, de Antony Beevor, felizmente saíram aqui.


Já sei, citei muita coisa. Quer ir ao foco? Voto em cinco melhores: O Mar, de John Banville; Homem Comum, de Philip Roth; Rubem Braga, de Marco Antonio de Carvalho; Alucinações Musicais, de Oliver Sacks; Istambul, de Orhan Pamuk. Boas festas.


DE LA MUSIQUE


Os CDs costumam ser minha segunda diversão de qualidade, embora não saiam tantos CDs bons quanto livros bons. As cantoras brasileiras embalaram o ano: Rosa Passos (que vi no Teatro Fecap), Roberta Sá, Marina de la Riva, Teresa Cristina, Maria Rita, etc. – além da portuguesa Teresa Salgueiro (Tom Jazz), que em Você e Eu só gravou canções brasileiras. Que Belo Estranho Dia pra se Ter Alegria, de Roberta Sá, foi o que mais me alegrou. O mundo pop teve White Stripes, Wilco, Paul McCartney, Björk, Joni Mitchell. Radiohead me parece um grau mais original, com In Rainbows, e não por ter feito o lançamento na internet. Mas pop m-e-s-m-o quem fez foi a encrenqueira, toxicômana e talentosíssima Amy Winehouse. Em apresentações ao vivo ela não vai tão bem, mas seu CD Back to Black é de uma força que havia muito não se escutava. Ela cantando Rehab (‘no, no, no’), You Know I’m no Good e Love Is a Loosing Game (o amor é um jogo de perdas) é, como se dizia no Pasquim, duca…


Num campo menos popular, trabalhos que mesclam gêneros como Welcome to the Voice, de Steve Nieve, Contínua Amizade, de Hamilton de Holanda e André Mehmari, e Con el Permiso de Bola, de Gonzalo Rubalcaba e Francisco Céspedes, são um alento. E na chamada música ‘erudita’ também houve poucos e bons. Três violoncelistas: Rostropovitch, morto neste ano e homenageado com a caixa Le Violoncelle du Siècle; Yo-Yo Ma (que voltou a brilhar no Cultura Artística), com Appassionato; Antonio Meneses (com Gérard Wyss), Música para Violoncelo e Piano de Mendelssohn. E três jovens para reanimar esperanças: o violinista Vadim Repin, o pianista Evgeny Kissin e o maestro Gustavo Dudamel.


CADERNOS DO CINEMA


Os melhores filmes que vi foram no começo do ano, dentro do ‘pacote’ do Oscar, com destaque para Cartas de Iwo Jima, de Clint Eastwood, bem melhor do que Babel, de Alejandro Iñárritu, Borat, de Sacha Baron Cohen, A Rainha, de Stephen Frears, e Vênus, de Roger Mitchell. Ainda não vi Império dos Sonhos, de David Lynch, e A Maldição da Flor Dourada, de Zhang Yimou, dois cineastas que admiro. Piaf, de Olivier Dahan, vale pela atriz, Marion Cotillard.


Quanto ao cinema brasileiro, diga o que quiser, mas variado e inquieto ele tem sido. Tropa de Elite, de José Padilha, é o filme do ano, apesar dos problemas, e tem o ator do ano, Wagner Moura. O Cheiro do Ralo, de Heitor Dhalia, vive de um brilhante Selton Mello. O Passado, de Hector Babenco, e Mutum, de Sandra Kogut, são filmes de poucas concessões. Em documentários, novamente dependemos de Eduardo Coutinho e João Moreira Salles, mas não vi ainda Jogo de Cena e não sou um dos entusiastas de Santiago, por beirar a autocomiseração.


OUTROS DESTAQUES


Por motivos profissionais, não pude ir muito neste ano a concertos, teatros e eventos noturnos em geral, mas não posso deixar de citar a peça dirigida por Felipe Hirsch, Educação Sentimental do Vampiro, com textos de Dalton Trevisan, e a nova coreografia do grupo Corpo, Breu, com música de Lenine. São pessoas que não confundem ser experimental com ser impenetrável.


As exposições não foram numerosas também. Vi fotos de Miguel Rio Branco na galeria Millan, revi no CCBB de São Paulo o Aleijadinho e Seu Tempo que tinha visto no Rio, etc. Curiosamente, neste lamentável período do Masp (que agora teve duas de suas obras mais valiosas furtadas!), ali curti Darwin e Goya.


POR QUE NÃO ME UFANO


Corte de gastos, privatizações ou concessões, melhora do ambiente de negócios, reforma tributária sem aumento da carga, combate à corrupção e à burocracia – muita, muita coisa pode e deve ser feita para ‘compensar a perda da CPMF’, como dizem governo e imprensa. Em um ano ou dois os R$ 40 bilhões seriam recuperados. Além disso, a arrecadação vem crescendo muito acima do PIB, e o governo só fez aumentar despesa com pessoal, número de ministérios, cargos comissionados, alíquotas de impostos… O problema não é só perder a CPMF de repente; é adquirir competência administrativa de um ano para outro.’


REVISTA DAS REVISTAS


Francisco Quinteiro Pires


A poesia como ruptura de automatismos


‘Na estreante Modo de Usar & Co., a regra é buscar a quebra de automatismos por meio da produção poética. A escolha do título do impresso sobre poesia revela de saída a proposta de intervenção, um convite aos leitores para observarem as escolhas e reações tidas como naturais sob outra luz.


A preocupação recai não mais somente sobre a novidade do conteúdo ou dos autores, a qual se tornou uma obsessão cega nas publicações em estréia, mas sobre a possibilidade de seus conteúdos transformarem os parâmetros vigentes e repensarem os cenários nos quais os leitores estão inseridos, o que não deixa de ter lá a sua novidade. É a função repensada – para ser renovada – no universo atual do utilitarismo extremado que a tudo invade, das relações humanas aos espíritos, e que dita a submissão à reprodução incessante das coisas e à uniformização de comportamentos.


Quando faz uma crítica aos padrões e aos cânones, a revista afirma que não busca uma revisão oportunista, mera substituição de nomes e medidas vigentes pela instauração de outros conceitos que passam a ser hegemônicos e, por isso, adotados. Os editores apostam na máxima de que um novo momento histórico impõe novas necessidades, às quais poetas em gestação e os já mortos têm de responder. E resumem sua posição no debate poético contemporâneo assim: ‘Forma e função, uso como profanação do estático posto em movimento, Modo de Usar & Co.’


Fundada pelos poetas Angélica Freitas, Fabiano Calixto, Marília Garcia e Ricardo Domeneck, com idades entre 30 e 40 anos, Modo de Usar & Co. (204 págs., R$ 20) traz os ensaios dos poetas-críticos Dirceu Villa sobre a obra de Dom Tomás de Noronha – ‘figura singular, extravagante e boêmia’ – e Franklin Alves Dassie sobre a obra de Sebastião Uchoa Leite (1935-2003) – ‘quem não se contradiz/ não diz’. Franklin mostra como o uso pelo poeta pernambucano de formas e procedimentos relacionados normalmente a uma poesia do mínimo e do conciso não o filiam de modo passivo a essa estética. O ensaísta debate, para além da perspectiva rasa, as implicações poéticas da obra de Uchoa Leite.


Trocando sugestões e críticas via e-mail, já que nenhum dos editores mora no mesmo Estado, os quatro decidiram publicar traduções de poetas de outros contextos histórico-culturais, cujos trabalhos são pouco vertidos para o português, como Hans Arp, Pierre Albert-Birot, H.C. Artmann, Gerhard Rühm, Jack Spicer, John Cage, Benjamín Prado, Gonzalo Rojas, Martín Gambarotta, etc.


Além das traduções, os editores-poetas trazem suas contribuições. Fabiano Calixto publica o poema Animal Boy, em homenagem ao cineasta Rogério Sganzerla, pródigo em referência a elementos contemporâneos e como que uma carta poética de intenções, das quais o novo periódico está embebido.


Nascida para ser anual, mas com a intenção de ser semestral, Modo de Usar & Co. pode ser comprada pelo e-mail revistamododeusar@gmail.com. Mais informações no revistamododeusar.blogspot.com.’


TELEVISÃO


Etienne Jacintho e Keila Jimenez


Eleição nada democrática


‘Melhor do que desligar a TV é assistir ao que ela tem de pior e criticar, criticar e criticar. O que seria de nós, simples e mortais telespectadores, se não fossem os fiascos de audiência, os micos, as obras ininteligíveis, os arroz-de-festa, os engavetados, os ex-BBBs e todas as celeumas e mazelas dessa fábrica de loucos.


Em um balanção de 2007, reunimos em divertidas categorias algumas das atrações e artistas que foram assunto este ano, mesmo que em uma conversa de bar.


Mas não espere uma lista de melhores do ano na telinha. Essa está na página seguinte, devidamente votada pelo democrático júri popular.


A eleição abaixo foi realizada pela equipe do TV & Lazer, que criou categorias e escolheu seus respectivos vencedores com total parcialidade e escracho. Uma homenagem bem-humorada à reciclagem de programas e personagens que, ainda assim, cativam a audiência. Porque, em se tratando de TV, quem mais reclama é quem mais vê.


Tecla SAP


A proposta foi boa, mas quem entendeu a minissérie A Pedra do Reino? Legendas, por favor!


Arroz-de-festa


Diego Hypólito ganhou medalha, foi comentarista, participou de novela… Chega, não?


Diego Alemão


Categoria que retrata aqueles que prometiam, mas não deram em nada. Vencedor: Donas de Casa Desesperadas, da Rede TV!


Vô, num vô!


Quem não vai no Rodrigo Hilbert (Duas Caras) ou na Camila Pitanga (Paraíso Tropical)? Já o Cadelão de Ed Oliveira, também de Paraíso, e a Carola de Fernanda Souza, em O Profeta, ganham um grande ‘num vô!’ Nas séries, todo mundo vai no Jonathan Rhys-Meyers (The Tudors) e na Katherine Heigl (Grey’s Anatomy), mas não dá para ir no Jorge Garcia (Lost) e nem na Ugly Betty de America Ferrera.


A desinibida do Grajaú


Alzira (Flávia Alessandra) finge ser enfermeira em Duas Caras, mas gosta mesmo é de dançar no poste.


Não faz me rir


Toma Lá, Dá Cá consegue ser pior do que Zorra Total no quesito sem graça. Saudades de A Diarista.


Hematoma


Mais do que a Record, quem causou grande baixa nas produções da Globo foi a Dança no Gelo, de Faustão. De fraturas a traumatismo craniano.


José Mayer


O maior pegador nas novelas no momento é Juvenal Antena (Antônio Fagundes). Até Alzira caiu na dele. Vale lembrar que o papel seria do próprio Mayer em Duas Caras.


Ex-BBB


Sem chance nenhuma de dar certo, o programa de Supla saiu do ar no SBT logo após a primeira e única exibição. Pobre papito.


Mico do ano


O bordão ‘Dança Galvão!’ fez o locutor pagar micos seguidos no Pânico. Até a Globo sofreu com a invasão de siris na tela


Saia do armário!


Ronaldo Ésper – aquele do vaso no cemitério – assumiu que é gay no Superpop. Só Luciana Gimenez não sabia…


Lost


Quando você perde um episódio, não consegue entender mais nada da trama. Com Heroes foi assim, até pela quantidade absurda de mutantes em cena.


Cabral


O televisivo que fez a grande descoberta do ano foi Silvio Santos, que ensinou ao País no ar que ‘muçarela’ é com ‘ç’ e não com ‘s’.


Pingüim


Mais congelado que lasanha de caixinha, Ratinho passou o ano na geladeira do SBT.


Merchan Neves


Eles criaram a piada e caíram nela. O Pânico foi um dos programas com mais merchandisings este ano. Só faltou anunciar a manjada iogurteira Top Term.


Zizou


Em homenagem à cabeçada de Zidane, o título de mesa-redonda mais briguenta vai para a clássica Mesa-Redonda da Gazeta.


Extreme Makeover


Que fique claro que Alinne Moraes é linda e que não temos dor-de-cotovelo. Mas que ela mexeu no rosto em 2007, ah, mexeu…’


Keila Jimenez


Paraíso mandou bem na eleição dos melhores do ano na TV realizada pelo TV & Lazer


‘Nem o criador imaginou o sucesso da criatura. Bebel (Camila Pitanga) e Olavo (Wagner Moura) roubaram a cena literalmente em Paraíso Tropical. A musa de ‘catiguria’ do calçadão de Copa brilhou muito mais que o empresário invejoso, é fato, mas juntos eles aqueceram o ibope da trama das 9 da Globo.


Reflexo sentido em nossa enquete, é claro. Com menos categorias abertas este ano para a escolha do público, a votação dos melhores da TV foi promovida pelo TV & Lazer entre os dias 16 e 19 de dezembro, no portal do Estadão. Bebel, Olavo e Paraíso abocanharam três categorias.


Camila arrebentou, vencendo como melhor atriz, com 64% dos votos. A segunda colocada, também de Paraíso, foi Alessandra Negrini.


Wagner Moura não teve concorrência. Bateu Tony Ramos – veja bem, isso não é pouco uma vez que o peludo ator sempre leva os prêmios em nossa enquete anual. Olavo rendeu a Wagner 58,1% dos votos na categoria melhor ator. Deixando de lado a lavada do vilão global, Heitor Martinez foi bem com seu caricato Jacson em Vidas Opostas.


Paraíso também surrou as concorrentes. O público a elegeu como a melhor novela de 2007, com 52,2% dos votos. A trama que começou fraca em ibope, conquistou seu espaço, encerrando sua jornada em alta na Globo, e com muita repercussão na mídia. O segundo lugar ficou para Vidas Opostas (Record), com 23,1%, seguida por O Profeta, Duas Caras e Caminhos do Coração.


O melhor programa, de novo


Não deve mesmo ser fácil concorrer com as camisas incríveis do Agostinho (Pedro Cardoso) ou com o corte de cabelo do Beiçola (Marcos Oliveira) – que nem precisa falar em cena. É só aparecer, para arrancar gargalhadas. Tanto, que A Grande Família sai mais uma vez consagrado como o melhor programa da enquete promovida pelo TV & Lazer. Com 36,9% dos votos, o seriado venceu concorrentes que deram o que falar neste ano, como Hoje em Dia (20,5%) e o Pânico na TV (18,5%), e outros que já tiveram dias melhores, como Fantástico (13,4%) e Caldeirão do Huck (10,4%).


Com uma direção de arte impecável, roteiros sagazes e um elenco que dispensa qualquer comentário, o programa mantém o mesmo fôlego desde a estréia, em 2001, levando ao ar uma mistura pop interessante – a de um humor popular, mas de piadas inteligentes e situações absurdas, nunca descambando para a vulgaridade que os humorísticos da TV aberta costumam oferecer.


Não é à toa, então, que tenha vencido como o melhor humorístico simplesmente três vezes (2003, 2004 e 2005) e saído vencedor também como melhor programa em 2003 e 2005.


Jornalístico


Categoria disputada, mas sem novidades. Quem levou a melhor entre os jornalísticos foi o Jornal Nacional (25,7%) , mas passou longe da vitória fácil de eleições anteriores. O noticiário disputou voto a voto com o Jornal da Record, que ficou com 25,3% dos votos. Em terceiro lugar outro global, o Jornal da Globo, seguido pelo Jornal da Band e Jornal da Cultura.’


Mário Viana


Da arte de dar nome aos bois


‘Batizar um filho é a maior complicação. Imagine, então, o que é encontrar nome para 45, 50, às vezes mais, criaturas nascidas da imaginação. Antes mesmo da trama de uma novela ganhar força, o cérebro do dramaturgo ferve ao buscar o nome certo para cada personagem. Sim, cada personagem deve ter o nome certo – mesmo que seja Dorgival. Numa obra que consome R$ 250 mil por dia, nada pode ser aleatório.


Em Sete Pecados, Walcyr Carrasco não perdeu tempo com sutilezas. Dante e Beatriz são uma óbvia referência ao escritor italiano Dante Alighieri, autor do clássico Divina Comédia, e sua musa. Na trama, Beatriz é protegida pelo anjo da guarda Custódia (Claudia Jimenez). No dicionário, custódia é o ato de proteger e é também o nome do vaso em que se guarda a hóstia, nas igrejas católicas. Já o casal mais popular da novela, Romeu e Juju, vive uma história de amor proibido, como se fossem os personagens de Shakespeare na idade madura.


Na Record, a estreante Gisele Joras também foi explícita em Amor e Intrigas. Celeste (Denise del Vecchio) é uma personagem alegre, pra cima, do bem – celestial, mesmo. Já a vilã Dorotéia (Ester Góes) é dura, seca, impiedosa. Não dá pra esperar outro comportamento de uma mulher com esse nome. Em Caminhos do Coração, a mocinha é uma pureza só. E, portanto, se chama Maria – nome da mãe de Jesus em emissora evangélica pega bem pra caramba.


Dos autores estrelares, nenhum vai mais longe que o blogueiro Aguinaldo Silva. Ele sempre traz para a linha de frente nomes que outros autores destinam a empregadas, porteiros e personagens simplórios. Nazaré, a inesquecível vilã de Senhora do Destino, é um exemplo. Duas Caras também carrega a marca do autor. Alguém lembra de outra moça tão vistosa como Flávia Alessandra que levasse o nome de Alzira? Nas novelas, Alziras quase sempre são tias, no máximo, secretárias. É tão ousado como chamar o herói de Evilásio. Aguinaldo só escorregou no Dorgival, um nome diferente demais – que me perdoe o sanfoneiro potiguar Dorgival Dantas. E, como estamos falando de Duas Caras, alguma pista deve haver no nome de Gioconda. De risonha, como diz o original italiano, a Gioconda de Marília Pêra não tem nada. Aquela milionária lesadinha deve ter algum segredo muito bem guardado.


e-mail: mvianinha@hotmail.com.br’


Etienne Jacintho


Lost volta dia 31 de janeiro


‘Uma boa notícia para os fãs de Lost: a 4ª temporada estréia no dia 31 de janeiro nos EUA. Infelizmente, só há oito episódios prontos por causa da greve dos roteiristas, mas já dá para ter uma amostra dos flashfowards na história.


A ABC liberou também mais um trailer da nova temporada, desta vez com a data certa do retorno da série, e vale a pena ver. O vídeo lança mais uma incógnita no mundo de Lost: o letreiro avisa que o suposto resgate chegou – e mostra um helicóptero -, mas ‘alguns sobreviventes vão deixar a ilha e outros, não.’


Bom, Kate e Jack estão entre os resgatados, como foi visto no último episódio da última temporada, mas o trailer termina com a cena em que os dois se encontram no aeroporto e Jack grita para Kate: ‘Nós temos que voltar!’


Quem quiser assistir aos trailers, podcasts e vídeos sobre Lost, basta entrar no site da ABC (http://abc.go.com).


O canal também estreará as séries Cashmere Mafia, no dia 3 de janeiro, e Eli Stone, dia 31.


A primeira traz Lucy Liu no elenco e conta as peripécias de quatro amigas e super executivas em Nova York – bem no estilo Sex and the City. Já Eli Stone é uma espécie de Ally McBeal, mas com personagem masculino no papel principal. O astro é Johnny Lee Miller (de Trainspotting), ex-namorado de Angelina Jolie.’


Alline Dauroiz


‘No SBT ninguém me via’


‘Rodrigo Veronese pode sim dizer que a vingança é um prato que se come quente. Logo após ser trocado em uma novelinha B do SBT por Dado Dolabella – veja bem, isso não é nada bom – o ator emplacou seu primeiro papel na Globo. Lucas de Paraíso Tropical, o terror das balzaquianas que viveu um romance com Ana Luísa (Renée de Vielmond), saiu da novela e teve de voltar a pedido do público.


A guinada lhe rendeu grana, fama e mais um bom personagem. Veronese estará no núcleo cômico da próxima novela das 7 da Globo, Beleza Pura. Viverá um químico, que morre ao tentar descobrir uma fórmula mágica, mas depois volta à história.


Em entrevista ao Estado, o ator revela os segredos de sua virada.


Depois de fazer sete novelas (no SBT e Record) o que sente em ser considerado ator revelação de 2007?


Parece que só agora fui descoberto, né? Tento entender que para o grande público eu era desconhecido, porque trabalhei em emissoras que, na ocasião, tinham pouco ibope. Eu inverti a gramática da coisa, porque se fosse entender como ator revelação, realmente é meio frustrante. Tenho uma carreira de 17 anos (Veronese tem 37 anos). Não gosto de sentir que ainda tenho de provar minha competência.


Qual a diferença de fazer uma novela na Record, no SBT e na Globo?


Trabalhei na Record de 1997 a 2000 (antes da nova fase de teledramaturgia), quando a novela dava só 6 pontos de audiência. O que eu sentia na Record, e sinto até hoje no SBT, é que você faz um trabalho, mas ninguém te vê. O termômetro do sucesso é a sua família, seus amigos … O assédio da imprensa é menor. Não há críticas positivas nem negativas. Já a Globo te transforma em celebridade, que é o grande ponto negativo. Você vira uma pessoa pública.


Fez curso de ator?


Fui descoberto na balada, comecei a fazer propaganda e passei a ser disputado pelas maiores agências de modelos de São Paulo. Graças a uma das campanhas publicitárias fui parar na oficina de atores da Globo: um curso de seis meses, do qual saí um pouco antes, para ser contratado pela Record. Tirando isso, nunca fiz curso, mas não sinto falta. Sou preguiçoso.


Como você se prepara para seus personagens?


Gosto do dom da observação. Meu forte é a ‘antropologia visual’. Vejo muito filme e TV.


Por que demorou para ser reconhecido?


Porque demorei para ir para a Globo. Nas vezes em que a Globo me chamou, eu estava contratado em São Paulo. Recusei dois convites lá. Quando fazia novela na Record, fui convidado para Laços de Família, para o papel do protagonista Edu (que lançou Reynaldo Gianecchini). Mas tem um lance muito doido. Lembro de ter uns 25 anos e as pessoas me perguntarem: ‘E a Globo?’. E eu respondia: ‘Vou estrear na Globo com 37 anos, numa novela do Gilberto Braga’.Isso se profetizou. Acho que atores que explodem com fama mais tarde têm uma carreira mais estabilizada, porque têm maturidade. Comecei a fazer novela com 27 anos. O Marcelo Antony estourou na Globo com trinta e poucos anos, o Wagner Moura está estourando agora.Assim é mais fácil administrar essa loucura do assédio sem pirar.’


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