Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Flávia Marreiro e Paula Lago

‘O apelo midiático de Severino Cavalcanti (PP-PE) está causando danos em um dos maiores trunfos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a força do discurso.

A opinião é do sociólogo e publicitário Antonio Lavareda, para quem a repulsa ao ‘estilo’ de Severino pode atrapalhar a recepção das falas de Lula. ‘Esse ‘efeito Severino’ durante algum tempo diminui o impacto, desqualifica ou, pelo menos, faz ser avaliada de forma menos positiva a ‘sinceridade’, a emoção e a simplicidade do discurso do Lula’, diz ele, cujo trabalho atual é preparar a propaganda do PFL, e, por tabela, o candidato a anti-Lula em 2006, o prefeito do Rio Cesar Maia.

Antes apelo exclusivo de Lula, não raro a boca faz Severino roubar a cena, quer em Brasília ou em Roma. Na análise do publicitário, essa overdose severina pode atrapalhar Lula pelo fato de usarem as mesmas ‘armas retóricas’.

Lavareda argumenta que, dividindo o discurso político em três pares de ‘pólos’, nos três Lula e Severino estão no mesmo ponto: entre o da emoção e o da racionalidade, ficam no primeiro; os dois também usam simplicidade argumentativa em contraponto à sofisticação; e as duas falas gozam de ‘percepção de sinceridade’ perante a população em vez da ‘obliqüidade’ comum.

Katia Saisi, professora do curso de especialização em Marketing Político e Propaganda Eleitoral da ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo), avalia que o mais significativo é que o campo dessa ‘batalha discursiva’ é o midiático. ‘É preciso separar o jogo político da percepção que a população tem dessa movimentação. E refletir se toda essa questão não atrai mais a atenção da mídia e dos próprios políticos do que da população’, afirma.

Para o antropólogo Otávio Velho, professor do Museu Nacional da UFRJ, porém, Severino não tem cacife para ‘roubar a cena’ discursiva. ‘Ele não tem essa força e não acredito que venha a ter. A audiência de Lula é nacional.’

Velho acentua as diferenças: ‘Sem dúvida existem semelhanças, mas são formais, não de conteúdo. O que fazem é quebrar, por motivos diferentes, em nome de uma ‘retórica da espontaneidade’, o discurso político instituído’.

O publicitário Chico Malfitani, 54, que trabalha com campanhas políticas desde 1984 (já acompanhou as de Luiza Erundina e a de William Dib, prefeito atual de São Bernardo do Campo), endossa a análise de Velho. Para ele, são figuras opostas. ‘Lula é fruto de um movimento da opinião pública que queria transformação.’ Já Severino, prossegue, ‘foi eleito por currais eleitorais do Nordeste, chegou ao posto [de presidente da Câmara] por uma articulação política’. ‘Sua imagem é oposta à que o povo queria ao eleger Lula.’

O que pode ‘misturar’ as imagens de ambos, diz Malfitani, é o ‘jogo sujo do Congresso’. ‘A troca de cargos, a relação promíscua entre o poder central e o Legislativo os aproximam.’

‘O risco é as pessoas acharem que o Lula é o Severino. Isso seria muito negativo não para o governo, não para um partido, mas para a democracia do país’, salienta.

Origens

Lavareda usa as coincidências biográficas para compará-los, mas também vê a diferença de conteúdo, advinda da trajetória política: ‘Além de pernambucanos, ambos têm origem humilde e migraram para São Paulo. Mas, ao voltar para Pernambuco, Severino fez uma carreira política tradicional. Ao ficar, Lula teve uma escola moderna, o sindicalismo’.

Por afirmar que Lula e Severino partilham agora de uma mesma ‘categoria’ é que, para Lavareda, essa carga negativa pode ‘contaminar’ a fala de Lula -capaz de fazer uma ‘gafe’ ou um ‘excesso’ trocar de sinal na opinião pública: ‘FHC cometeria uma gafe. Lula comete uma sinceridade’, brinca.

Já o que causa desconforto e repulsa no discurso de Severino, antes de serem as opiniões propriamente ditas, é o ‘excesso de transparência’ do presidente da Câmara, incompatível com o discurso político, diz Otávio Velho.

E esse mesmo Severino, atacado como ‘símbolo do atraso’, é o garoto-propaganda da classe média e da elite, como no caso da derrubada da MP 232, que aumentaria impostos para prestadores de serviços. ‘São posturas táticas. Severino nota também que, no momento em que ele está sob fogo cerrado, ele precisa se abraçar em bandeiras de maior legitimidade’, explica Antonio Lavareda.

Ney Figueiredo, 67, consultor político, analisa o momento de Severino como seus ‘15 minutos de fama’: ‘Lula é vôo de águia, e Severino, de galinha. Severino está em seu momento de glória, é o homem humilde que quer mostrar que deu certo. A elite quer cooptá-lo para que ele não faça a coisa errada. E ele, entrar para um clube ao qual não era convidado.’’



Humberto Medina

‘Governo desiste de dar TV local para prefeitos’, copyright Folha de S. Paulo, 8/04/05

‘O governo federal acabou com a possibilidade de os prefeitos gerarem uma programação local própria nos canais de televisão que forem solicitados ao Ministério das Comunicações.

Em decreto editado em fevereiro, o governo havia criado a RTVI (retransmissora de televisão institucional), dando às prefeituras a possibilidade de ter um canal institucional com até 15% do tempo destinado à programação local.

Isso significa que, se uma RTVI ficasse 24 horas no ar, os prefeitos poderiam veicular 3 horas e 36 minutos de geração própria.

O decreto também abria a possibilidade de patrocínio para essa programação.

Agora, os canais que forem pedidos pelos prefeitos podem apenas retransmitir a programação das emissoras institucionais, como TV Câmara, TV Senado, canais ligados ao Judiciário e Radiobrás. O recuo aconteceu depois de críticas de que a medida poderia servir de moeda de troca eleitoral.

Para ter uma RTVI, os prefeitos precisam apenas comprovar que existe um canal vago na cidade. Apenas São Paulo e Rio de Janeiro não têm mais espaço para novos canais. Esses canais transmitirão os programas institucionais, acessíveis por TV por assinatura.

‘Em um primeiro momento, é difícil gerar conteúdo e ter patrocínio. Televisões e rádios institucionais, no Brasil, ainda são vistos pela população como uma espécie de coisa chapa-branca, como se estivesse a fim de fazer propaganda de governo’, disse Paulo Lustosa, secretário-executivo do Ministério das Comunicações.

‘A maneira de você tirar esse ranço é colocar conteúdos produzidos em nível nacional, que não têm comprometimento dos problemas políticos locais’, afirmou o secretário-executivo.

Lustosa disse ainda que a possibilidade de as prefeituras gerarem programação própria poderia ser prejudicial para as contas públicas, porque as prefeituras iriam gastar para produzir e teriam dificuldade de conseguir patrocínio.

O secretário-executivo do Ministério das Comunicações não descartou, porém, a possibilidade de, no futuro, os prefeitos serem autorizados a ter programação própria. Ele negou que as emissoras de TV aberta tenham feito pressão para a modificação do decreto que criou a RTVI.’



O Estado de S. Paulo

‘Assédio da imprensa incomoda a primeira-dama’, copyright O Estado de S. Paulo, 10/04/05

‘Enquanto o presidente Lula tentava provar sua fé, a primeira-dama Marisa Letícia demonstrou visível desconforto com a presença de fotógrafos e jornalistas durante a visita à Basílica de São Francisco, em Assis. Sempre educada, ela não manifestou nenhum sinal de irritação, mas o presidente seguiu para Perugia, onde almoçou com três governadores de províncias italianas, sem o ônibus que conduzia os jornalistas.

A explicação oficial é de que o ônibus deveria retornar a Roma em função do horário. O trajeto de quatro horas de ida e volta entre a capital e a cidade santa serviu apenas para que os jornalistas registrassem o momento em que o presidente, mais um vez, reafirmava sua fé católica.

Marisa Letícia fica incomodada com a correria exigida por assessores, jornalistas e seguranças, além dos padres, em volta de Lula. Ruth Cardoso, mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, também tinha restrições ao assédio da imprensa.’

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‘Severino é ‘atormentador-chefe’ de Lula, diz Economist’, copyright O Estado de S. Paulo, 8/04/05

‘Para revista britânica, presidente da Câmara é uma ameaça aos planos do governo Depois de descobrir que descende de nobres italianos, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti n(PP-PE), agora ganhou espaço nobre na revista britânica The Economist, nas bancas desde ontem, que o rotula como ‘atormentador-chefe’ do presidente Lula. A revista diz que a eleição de Severino ameaça ‘ambiciosas reformas’ projetadas pelo governo e a própria reeleição de Lula. E dá como exemplo de sua força a derrota, em plenário, da MP 232.

A revista diz que Severino dá ‘uma nova face a um velho problema’ – a dificuldade de partidos sem maioria nos Congressos governarem. Explica que o PT ‘tem de dividir parcela do poder com partidos de centro e direita, que criticou durante décadas na oposição’. E explica que a base da eleição de Severino foi o ‘lower-clergy’ (tradução literal de baixo clero) do Congresso.

A Economist registra que o primeiro ato de Severino foi tentar aumentar os ganhos dos deputados, medida que ganhou sólida rejeição na opinião pública. Assinala que, quando Severino cobrou a nomeação de um ministro, Lula desistiu da reforma ministerial.

A matéria diz que Lula pode usar o Senado para reverter ‘medidas irresponsáveis’ aprovadas na Câmara. Ressalta que a economia forte aconselha a que Lula seja visto mais como amigo do que como inimigo. O texto é acompanhado de charge em que Lula aparece jogando capoeira com Severino, mas os músicos usam instrumentos errados: violão e maracas, mas nenhum berimbau ou atabaque.’



A CENSURA DE SEVERINO
Folha de S. Paulo

‘Risco de Censura’, Editorial, copyright Folha de S. Paulo, 8/04/05

‘Mais uma vez, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), exorbitou ao defender a censura a beijos entre pessoas do mesmo sexo na programação da TV. O deputado tem, como qualquer outro cidadão, o direito de manifestar seu descontentamento com o que lhe pareça inadequado, mas é inaceitável que o segundo homem na linha sucessória da República propugne por um instrumento de arbítrio banido pela Constituição de 1988.

A proscrição da censura, porém, não deve ser interpretada como uma licença para que TVs exibam o que bem entendam à hora que quiserem. Redes abertas são concessões públicas e isso já legitima alguma forma de controle sobre o seu conteúdo.

Essa restrição é mais fácil de ser percebida em casos extremados. Nenhuma rede nacional, por exemplo, chegaria ao ponto de exibir programas eróticos em horário vespertino -pois não é difícil concluir que as reações da sociedade (e do mercado) se encarregariam de punir quem fosse tão longe. Existe, porém, uma ampla zona cinzenta entre o aceitável e o inaceitável que é explorada milimetricamente por certas programações.

Essa realidade tem despertado iniciativas duvidosas de quem acredita ser necessária uma atuação mais direta do Estado. Tramita atualmente na Câmara um projeto de lei que pretende acabar com a ‘baixaria’ na TV. O texto até traz algumas idéias razoáveis, como o fim da publicidade de produtos para crianças no horário infantil, o que configura uma verdadeira chantagem contra os bolsos paternos. O projeto acaba, porém, dando vazão a uma sanha legiferante que tornaria ilegal boa parte dos programas hoje exibidos. É o caso do dispositivo que veta desenhos animados que transmitam a idéia de que a violência não machuca.

Propostas como essa ressaltam a importância de que as emissoras adotem um código comum de auto-regulamentação, algo que as pouparia -e ao país- das sempre perigosas tentativas de controle estatal.’