Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Folha de S. Paulo

ELEIÇÕES 2006
Marcelo Coelho

Teatro das demissões

“LULA SABIA ou não sabia? A dúvida foi intensa no escândalo do mensalão, e se repete, com menos ênfase talvez, neste caso do dossiê contra Serra. É que, de certo ponto de vista, a pergunta deixa de ter relevância.

Com Lula sabendo ou não, o essencial é que, sob o seu governo, criou-se um sistema criminoso de aparelhamento do Estado a serviço do PT. Vê-se agora que nada do que ocorreu durante a crise do mensalão levou os dirigentes do partido a mudar de comportamento. Para cada Delúbio que sai, há sempre um Gedimar, um Freud, ou seja lá que nome tenham, para manter a máquina funcionando.

Lula promove algumas demissões, mas o esquema se recupera prontamente, do mesmo modo que uma árvore ganha força ao ser podada de vez em quando. Se os escândalos não tiveram, até agora, grande impacto sobre a popularidade de Lula, isso em parte se deve à sua pronta disposição para demitir quem quer que seja: Zé Dirceu, Palocci, Gushiken, Genoino, e agora Berzoini, duram o quanto puderem durar.

A cada escândalo, Lula se livra da tutela do PT, sem perder as vantagens que lhe traz uma organização disposta a tudo para mantê-lo no poder. Seu governo pôde mesmo, graças ao escândalo, beneficiar-se com um ganho de eficiência. Coincidência ou não, os resultados administrativos mais palpáveis começaram a aparecer depois da saída de Zé Dirceu, em cujo gabinete, ao que se diz, emperravam-se dezenas de comissões e projetos.

O teatro das demissões não impede que o alto e o baixo clero petistas se comportem como se fossem donos do Estado brasileiro. O delírio aparelhista, as violações freqüentes da lei, as investidas contra o sistema republicano ganham livre curso, acompanhadas de quando em quando por ataques à liberdade de imprensa, enunciados com ares de indignação e inocência.

É curioso que venham das antigas bases sindicais do PT os atos mais infames do governo. Delúbio, Berzoini, Gushiken, Palocci, Freud Godoy, Jorge Lorenzetti, Paulo Okamotto, não são nomes que surgiram depois de instaurado o vale-tudo das alianças com o PL e o PTB.

São petistas autênticos, de longa data. Um passado de lutas funciona como espécie de autorização interna para a delinqüência. A duplicidade moral se torna o modo de funcionamento básico do governo Lula que não sabe de nada, mas não sabe sabendo.

É assim que o gangsterismo partidário convive com a independência da Polícia Federal. De certo modo, Lula desenvolve a tática do ‘cada macaco no seu galho’. Deixa o Banco Central na mão dos ortodoxos, deixa o vice-presidente criticar os juros; põe Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente, e faz aliança com deputados adeptos da motosserra; não impede as ações da PF, muito menos as velhacarias dos companheiros de partido.

Punam-se os culpados, com rigor! Temos outros para continuar o serviço.

MARCELO COELHO é colunista da Folha”



MERCADO EDITORIAL
Rafael Cariello

Livraria de intelectuais paulistanos chega ao fim

“Não se fazem mais livrarias como a Duas Cidades nem amizades como a que unia o crítico literário Antonio Candido e o idealizador da loja e editora, José Petronillo de Santa Cruz.

A livraria, aberta em 1954, foi por décadas um dos principais pontos de encontro de intelectuais paulistanos, entre eles e com os livros que ansiosamente aguardavam chegar da Europa. Ela puxa hoje definitivamente suas grades na rua Bento Freitas, centro degradado de São Paulo.

Santa Cruz está enterrado no túmulo da família de Candido no cemitério São Paulo, no bairro de Pinheiros. Ao seu enterro, num domingo do início de julho de 1997, compareceram o próprio Candido e sua mulher, Gilda de Mello e Souza.

A viúva de Santa Cruz, desde então responsável pela Duas Cidades, Maria Antonia, 60, lembra-se da presença discreta do crítico no fundo da igreja onde se celebrou a missa de sétimo dia. Lembra-se também que os críticos Roberto Schwarz e Davi Arrigucci Jr. participaram da cerimônia.

Foi pela editora de Santa Cruz que talvez a melhor parte da produção da geração de Schwarz, a maioria alunos de Candido, veio a público. A livraria editou, ainda na década de 70, o hoje clássico ‘Ao Vencedor as Batatas’, de Schwarz, além de diversas outras obras de ponta do pensamento social e literário brasileiro.

Essa produção continua a ser editada, agora em parceria entre a Duas Cidades e a ed. 34, na coleção ‘Espírito Crítico’. Maria Antonia diz que o fechamento da livraria não afetará a atividade editorial. Mas a espécie de ‘centro cultural’, a ‘livraria moderna’ em que, diz o editor Augusto Massi, hoje na Cosacnaify, se podia encontrar casualmente com Candido ou com a professora de filosofia Marilena Chaui, não conseguiu acompanhar as mudanças do mercado, além de ter sido em parte vítima de sua própria localização ‘central’.

Entre a seqüência de ‘causas’ que levaram à decadência da livraria e que afastaram potenciais compradores, a viúva de Santa Cruz enumera a transferência de escolas do centro, como a Faculdade de Filosofia da USP, que antes funcionava na r. Maria Antonia, a degradação do centro e a diminuição de importância do francês como língua estrangeira no país -obras nesse idioma chegaram a representar quase 80% dos títulos da livraria.

‘Depois, surgiu a internet’, arremata Maria Antonia, referindo-se àquela que provavelmente foi a pá de cal num negócio especializado na difusão de obras estrangeiras.

As dificuldades financeiras, no entanto, vinham desde a década de 80. Candido chegou a publicar um artigo na Folha, em 1987, para tornar pública a pressão e ameaça de despejo que a ordem dos dominicanos fazia sobre a livraria.

Gesto feio

O crítico se tornou amigo de Santa Cruz quando este ainda pertencia à ordem e era conhecido como frei Benevenuto, na década de 50. A loja da livraria, comprada nessa época, continuou a pertencer aos padres quando Santa Cruz deixou a batina, em 1971 -uma década e meia depois, proprietários e locatário passaram da separação ao conflito.

Candido acusou os religiosos de preferirem ‘agir como uma imobiliária qualquer’ e concluía o texto afirmando que o gesto de disputar o aluguel podia ser legal, mas era ‘triste e feio, muito feio’.

Maria Antonia conta que, após a pressão pública do crítico, Santa Cruz e a ordem chegaram a um acordo, dando sobrevida à livraria.

A parceria entre crítico e livreiro, no entanto, não seria apenas prática mas também editorial. A professora titular de literatura na USP Walnice Nogueira Galvão, freqüentadora da loja e aluna de Candido na década de 70, lembra-se que foi ele que lhe ‘levou pela mão’ para publicar um de seus livros pela Duas Cidades.

‘Eu mais ou menos aproximei esse pessoal’, diz o crítico em referência a seus alunos e à editora.

Tal associação informal se iniciou com o livro do próprio Candido ‘Parceiros do Rio Bonito’, publicado inicialmente pela editora José Olympio, em 1964. ‘Quando a primeira edição se esgotou, perguntei ao José Olympio se ele queria reeditá-lo’, conta o crítico. Mais tarde, em conversa informal, informou a Santa Cruz o resultado -negativo- da conversa. ‘Ele me disse que tinha interesse’, e o livro ganhou vida nova, agora pela Duas Cidades.”



A TRAJETÓRIA DE OCTAVIO…

Folha de S. Paulo

Biografia do ‘publisher’ da Folha é lançada em evento na ABL, no Rio

“A Academia Brasileira de Letras promoveu ontem no Rio de Janeiro o lançamento do livro que traça o perfil biográfico do ‘publisher’ da Folha, ‘A trajetória de Octavio Frias de Oliveira’ (editora Mega Brasil). O autor, Engel Paschoal, autografou o livro ao lado de Frias.

O presidente da ABL, Marcos Vilaça, saudou o convidado: ‘Esta casa [existe] para servir a língua e a cultura, desejou Machado de Assis, como está escrito no estatuto dos 40 fundadores. A sua presença [de Frias] significa isso’.

O ex-ministro da Educação e acadêmico Eduardo Portella afirmou ‘que uma das obrigações da Academia é reconhecer e reverenciar as figuras que contribuíram com o Brasil. No caso específico de Frias, através do jornal politicamente independente e qualificado, com uma legitimidade que foi conquistada, não imposta, nos momentos graves da história republicana e contemporânea’.

O acadêmico Arnaldo Niskier, secretário de Educação do Estado do Rio de Janeiro, contou que ‘praticamente todos os acadêmicos passaram pela Folha: escrevendo, dando entrevistas ou como colaborador’.

O jornalista Engel Paschoal disse que se sentiu privilegiado por escrever sobre um personagem a respeito do qual não existia livro específico. De acordo com o editor Eduardo Ribeiro, em breve sairá a segunda edição -a primeira teve 4.000 exemplares.

O evento reuniu figuras de gerações diferentes do Rio. Do ex-governador da Guanabara e ex-ministro Raphael de Almeida Magalhães, do ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso e do general reformado Carlos de Meira Mattos ao humorista Hélio de la Peña, do programa ‘Casseta & Planeta’. Acompanharam Frias sua mulher, Dagmar, filhos e netos.

Embora tenha passado a maior parte de sua vida em São Paulo, o ‘publisher’ da Folha nasceu em Copacabana, na cidade na qual foi lançado ontem o livro sobre sua história.”



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