Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Folha de S. Paulo

CASO DANIEL DANTAS
Vinicius Mota

O terceiro mandato já começou

‘SÃO PAULO – O lulismo continuará no poder em 2011, não importa o vencedor das eleições presidenciais do ano anterior. Quem busca elucidar esse enigma nas movimentações de granadeiros petistas de baixa patente, como o folclórico deputado Devanir Ribeiro, erra o alvo.

A resposta está diante dos olhos, em operações como a compra da Brasil Telecom pela Oi, financiada e permitida por um mutirão governista capitaneado pelo Planalto.

Com R$ 4,3 bilhões do Banco do Brasil e R$ 2,6 bilhões do BNDES, mais da metade da necessidade de capital para a transação será garantida pela gestão Lula. O governo também entra com mão-de-obra normativa -vai mudar o decreto que impede fusões- e a boa vontade de acionistas como fundos de pensão e, de novo, o BNDES.

Tanto empenho há de ser recompensado. A influência, no ‘big business’ telefônico, de diversos núcleos políticos e quadros partidários hoje no governo vai perdurar por longos anos. Na dúvida, consultem-se diretorias e conselhos administrativos e fiscais de grandes empresas beneficiárias das privatizações, da política de juros ou da normatização (‘regulação’) dos anos FHC. Muitos fernandistas estão firmes em seu quarto mandato.

A queda de Palocci, adepto das relações preferenciais com os bancos, coincidiu com uma mudança de estilo do governo Lula nesse quesito. O apetite para intervir em grandes negócios público-privados deu um salto sob Dilma Rousseff, mãe do PAC e musa dos empreiteiros.

O governo patrocina a reorganização do capital na telefonia, na petroquímica e em outros setores da economia, aprofundando e estendendo no tempo a confluência estatal, sindical e partidária no mundo dos negócios. A simbiose crescente entre principais partidos, sindicatos e empresas do país, sob fiança do erário, é a principal ameaça à capacidade do Estado de arbitrar conflitos a favor do interesse público.’

 

 

Igor Gielow

O homem oco

‘BRASÍLIA – Daniel Dantas, como é previsível, está calado. Seu silêncio enerva muita gente. Mas do jeito que as coisas vão, ele há de se vingar, provando afinal de contas que não é ninguém. É um homem oco, cuja importância é apenas um delírio da platéia.

Dantas não foi a versão tropical dos oligarcas, os apparatchiks soviéticos que lucraram na esteira de privatizações mal-reguladas. É fantasia imaginar que ele, no governo Lula, tentou aproximar-se do poder com a ajuda do então primeiro-comissário José Dirceu. Não há nada de estranho na condução da fusão da Oi com a Brasil Telecom, nem com a solução de suas pendências. Seus enviados, como Luiz Eduardo Greenhalgh, apenas são bons amigos do pessoal da cozinha do Planalto.

Dantas é oco. Ele nem sequer é dono do Opportunity. Talvez nem seja rico. Não conta com uma bancada de parlamentares, oposição e situação, pronta a tirar o corpo fora quando a idéia é investigá-lo e mais disponível ainda quando o negócio é lhe prestar alguma ajudinha.

O melhor truque do diabo, diz o velho clichê, é ele nos convencer de que não existe. E a mão amiga da Polícia Federal, que se perdeu numa disputa que enrolou o próprio Lula, deixou tudo mais fácil.

Num inquérito em que a missão recebida por uma repórter por sua chefia vira prova da ‘encomenda de matérias jornalísticas’ por parte de Dantas, a coisa parece simples para um bom advogado. De tudo o que apareceu até aqui, apenas o explícito caso de suborno parece que vai vingar, por assim dizer. Mesmo assim, pode haver elementos para circunscrever a fatura aos bagres já pescados.

Dantas ou é um homem oco, para conceder-lhe o direito da dúvida, ou deve sonhar com aqueles de T.S. Eliot, esperando que seu mundo acabe não com um estrondo, mas com um suspiro. Assim, inexistente, ele pode se reinventar. De novo.’

 

 

Folha de S. Paulo

Juiz defende contato com jornalistas

O juiz federal Fausto Martin De Sanctis, que determinou a prisão do banqueiro Daniel Dantas, informou, por meio de nota, que defende o contato do Judiciário com a imprensa como uma forma de ‘dar satisfação à sociedade’, mas sempre preservando o sigilo da investigação. A declaração é uma resposta às críticas que tem recebido por suposta exposição excessiva na mídia.

 

 

Roberto Machado

Oi diz que tomará crédito de R$ 11 bi para compra da BrT

‘Empresa diz que, além dos R$ 4,3 bi obtidos com o BB, estuda lançar bônus no exterior e emitir notas promissórias

Tamanho de empréstimo dado pelo Banco do Brasil surpreende concorrente; aquisição ainda depende de mudança na legislação

A Oi divulgou ontem o plano de financiamento que adotará para a compra da Brasil Telecom caso ela venha a ser permitida após mudanças na legislação do setor, defendidas pelo governo. Serão captados aproximadamente R$ 11 bilhões- que correspondem a 85% dos cerca de R$ 13 bilhões que a operadora estima gastar com a aquisição.

Na quarta-feira, a Oi anunciou um empréstimo de R$ 4,3 bilhões do Banco do Brasil, com juros correspondentes à variação do CDI (certificado de depósito interbancário), mais ‘spread’ de 1,80% ao ano, incluindo a cobrança de IOF (imposto sobre operações financeiras), e com prazo médio de 4,9 anos.

O empréstimo do BB surpreendeu executivos de outras operadoras de telefonia. Um integrante da diretoria de uma das maiores empresas do setor, que não quis se identificar, diz que já era esperado e natural que o BB participasse do programa de captação da Oi, mas que o volume emprestado ficou muito além da expectativa.

Ele vê dois problemas na operação: a excessiva concentração de crédito numa única empresa-levando-se em conta o total emprestado pelo BB para o setor de telefonia- e as garantias que teriam que ser oferecidas por qualquer operadora para obter um empréstimo desse porte.

O último dado disponível, de março, mostra que os empréstimos do BB para todo o setor de telecomunicações somavam R$ 2 bilhões- cerca de metade do que será destinado à Oi. Em nota divulgada ontem para detalhar o programa de financiamento, a Oi declarou que ‘as duas etapas do plano de financiamentos foram precedidas de concorrência no mercado bancário com a participação de cerca de dez diferentes instituições financeiras, de origem nacional e internacional.’

Ainda segundo a nota, ‘o plano foi estruturado considerando o baixo nível de endividamento atual, a forte geração de caixa e a condição de ‘investment grade’, classificação dada às companhias com menor risco de crédito.

Segundo a Oi, a segunda etapa do programa de financiamento está em andamento e consiste na emissão de notas promissórias no valor de R$ 3,6 bilhões, com os bancos Santander, Bradesco e Itaú. A operação terá custo de CDI, mais 1,60% ao ano, com prazo de dois anos.

A Oi disse ainda que iniciou estudos para realizar a terceira e última etapa do programa de captações- e que pretende obter, até o fim de outubro, cerca de R$ 3 bilhões para completar a necessidade de financiamento para a aquisição da BrT. Entre as propostas analisadas estão o lançamento de bônus no exterior, a captação de empréstimos bancários no exterior e a obtenção de crédito junto a organismos multilaterais.

Outro banco público, o BNDES, dará crédito de R$ 2,5 bilhões para promover a reestruturação acionária da Oi.

A compra da BrT foi anunciada em abril, mas ainda depende de mudanças na legislação do setor – principalmente no PGO (plano geral de outorgas). Além disso, será necessário ter aprovação da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).’

 

TV PAGA
Folha de S. Paulo

Lucro da NET recua 10% no segundo trimestre

‘O lucro líquido da Net, maior operadora de TV a cabo do país, caiu 10% no segundo trimestre ante o mesmo período de 2007, para R$ 28 milhões, sob impacto de aumento de custos operacionais. O faturamento subiu 27%, para R$ 891 milhões. O número de usuários de TV por assinatura cresceu 18%, para 2,7 milhões, enquanto a base de usuários de internet avançou 61%.’

 

 

RESENHA / O LIVRO DAS CITAÇÕES
João Pereira Coutinho

A partir de palavras de terceiros, Giannetti segue ideal moderno

‘Aconteceu em 1888. Oscar Wilde, o incomparável, publicava o diálogo ‘The Critic as Artist’ (O Crítico como Artista). E, com deliciosa inteligência paradoxal, Wilde afirmava que para dizermos aquilo em que verdadeiramente acreditamos é preciso falar através de lábios alheios. Eis o programa central da modernidade, extensível a qualquer expressão artística: a noção de ‘originalidade’, sagrada para os românticos, era transformada num palimpsesto criativo em que nada é meu, nada é teu, tudo é nosso. Lembrei essa história com o livro delicioso de Eduardo Giannetti. Livro de citações, sim, mas cautela: existem dois tipos de livros de citações. O primeiro é mero conjunto de frases mais ou menos aleatórias (‘Eu só sei que nada sei’ etc.), sem qualquer ‘programa’ ou ‘intenção’. O segundo tipo cumpre o que Oscar Wilde determinava: apresentar um pensamento particular através das palavras de terceiros. É o caso de Giannetti. Dividindo a obra em quatro partes, Giannetti ‘reflete’ sobre a linguagem, o saber, a ética individual e o comportamento cívico. E, depois de explanar longamente sobre a inutilidade dos prefácios (Bataille, Goethe, Baudelaire ou Manuel Bandeira ajudam à festa), o autor avança com uma única certeza: a certeza de que todas as certezas contêm em si o germe da sua própria contradição.

Nietzsche onipresente

Mas Giannetti tenta: leitor de Wittgenstein (e de Nietzsche, onipresente no volume), Giannetti ironiza com Cioran (‘Uma idéia clara é uma idéia sem futuro’, pág. 21) para concluir sobre a importância da legibilidade, base do verdadeiro filosofar. Orwell poderia ser incluído nessa turma. E Giannetti? Em que turma poderia ser incluído? Minha proposta é arriscada. Mas lendo as citações escolhidas, vejo em Giannetti um estóico, no sentido moderno do termo. O que é a felicidade? É não perguntar em que consiste a felicidade, porque existe na interrogação o princípio da infelicidade (Stuart Mill ‘dixit’). O que é a riqueza? A riqueza é não desejar mais do que aquilo que se tem, conselho central dos clássicos, de Epicuro a Platão. O contrário não é apenas uma causa de infelicidade; a ambição desmedida da acumulação material é, como Baudelaire avisa, a raiz da vulgaridade. Além disso, e como diria Sêneca ao seu discípulo Lucílio, nada é mais importante do que o tempo. Não existe maior riqueza pessoal. Cícero, na página 175, concorda com Giannetti. Ou vice-versa.

Opinião pública

Porque somos nós a origem e o fim dos nossos projetos de vida. Por isso aplaudo a inclusão de Henry Thoreau: ‘A opinião pública não passa de um anêmico tirano se comparada à nossa própria opinião privada. Aquilo que um homem pensa de si mesmo -é isso que determina, ou antes indica, o seu destino’ (pág. 62). Basta essa citação para estabelecer a diferença, nem sempre entendida, entre auto-respeito e auto-estima: auto-estima pressupõe o olhar dos outros sobre nós; auto-respeito pressupõe o nosso olhar sobre nós próprios. Ao contrário do que afirmam os livros de auto-ajuda, só o auto-respeito merece ser cultivado: a opinião alheia é volátil e, muitas vezes, fonte de permanente escravidão. Surpresas? Várias. Fiquei surpreso com a inclusão de dois autores que jamais imaginaria em exercícios aforísticos: Bolingbroke e Juan de Mariana, dois nomes do protoconservadorismo europeu. E depois encontrei frases cuja autoria se perdeu no ruído do tempo. Nassim Taleb afirmou em 2007 que a morte é um bom passo na carreira de um autor (pág. 75); Gore Vidal disse o mesmo, mais de 20 anos antes, quando Truman Capote morreu. Também gostei de saber que Simone de Beauvoir considerava o ‘pluralismo’ uma qualidade própria da direita. ‘A verdade é una; o erro, múltiplo.’ (pág. 95) É a receita típica para o fanatismo. Deixo para o fim o momento mais hilário do livro: algumas meditações sobre o excesso de leitura. Será possível que ler em demasia seja prejudicial para qualquer intelecto humano? Descartes aconselhava a que jamais se excedessem os 45 minutos de filosofia por dia. Giannetti cita, entre outros, Lichtenberg: ‘Creio que alguns de nossos scholars realmente medíocres poderiam ter chegado a ser homens mais grandiosos caso não tivessem lido em demasia’. (pág. 26) Com o devido respeito a Giannetti, sugiro para inclusão futura um comentário do ditador português Oliveira Salazar que, confrontado com os ardores filosóficos (e democráticos) de um opositor, afirmava: ‘Esse rapaz é demasiado culto para a inteligência que possui’. Que pena Salazar não se ter dedicado simplesmente ao aforismo…

O LIVRO DAS CITAÇÕES – BREVIÁRIO DAS IDÉIAS REPLICANTES

Autor: Eduardo Giannetti

Tradução: vários

Editora: Companhia das Letras

Quanto: R$ 49 (464 págs.)

Avaliação: ótimo’

 

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Livro do autor virou série de TV

‘O economista Eduardo Giannetti é autor de ‘Vícios Privados, Benefícios Públicos?’ (Prêmio Jabuti 1994 na categoria ensaio ou biografia), ‘Auto-Engano’, ‘Felicidade’ e ‘O Valor do Amanhã’ (todos pela Cia. das Letras), este último transformado em série de TV pelo programa ‘Fantástico’.’

 

MÍDIA & LITERATURA
Folha de S. Paulo

Editora lança selo de ‘literatura feminina’

‘A editora Planeta acaba de lançar no Brasil o selo Essência, inteiramente voltado para a chamada ‘literatura feminina’. Os três primeiros títulos são ‘A Rosa do Inverno’, de Patricia Calbot (pseudônimo da escritora americana Meg Cabot, autora da série infanto-juvenil ‘O Diário da Princesa’, entre outros), ‘Eu Pego esse Homem’, de Valerie Frankel, e ‘O Livro Secreto do Banheiro Feminino’, de Jo Barrett.

Na Espanha, país-sede da Planeta, o selo existe há pouco mais de um ano com o nome de Esencia (www.esenciaeditorial.com). De seu catálogo, títulos de Candace Bushnell, autora do best-seller ‘Sex and the City’, e Nora Roberts, da ‘Trilogia do Coração’, já apareceram nas listas de livros mais vendidos do país.

Passado e presente

No Brasil, o catálogo do selo Essência terá três linhas distintas: romance histórico (histórias de amor ambientadas dos séculos 17 a 19), romance contemporâneo (novamente histórias de amor, aqui com mais humor), e ‘chick lit’ (romances que falam dos altos e baixos na vida amorosa e profissional da jovem mulher urbana).

Até o fim do ano, o selo Essência vai colocar no mercado mais seis títulos. Em breve, o novo selo lançará o site www.essencialivros.com.br, com mais informações sobre os livros e suas autoras.’

 

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‘Eu Fui Vermeer’ testa limites da crítica

‘Uma das formas mais tentadoras de descrever o falsário Han van Meegeren (1889-1947) é retratar um artista ressentido com os críticos, que usa seu talento irrealizado para debochar do mundo artístico.

Mas Frank Wynne evita a armadilha. Para o jornalista irlandês, como disse à Folha, Van Meegeren é do tipo ‘que tem talento técnico, mas nada a dizer com sua própria arte’. Diferente, segundo Wynne, de nomes como Geert Jan Jansen ou Eric Hebborn, ‘que gostam do desafio de imitar o estilo de outros artistas, enganando os críticos, jogando com o prejuízo e com as esperanças deles’.

Isso não quer dizer que o autor não mostre uma personalidade ímpar em uma Europa que sucumbia com a guerra. ‘Alguém como Van Meegeren, que tenta falsificar ‘velhos mestres’, precisa ser um historiador, artista, químico e sobretudo mentiroso, criando histórias plausíveis e documentos que justifiquem a procedência para um trabalho que nunca existiu’, diz.

O calcanhar-de-aquiles do falsário foi o ‘seu’ Vermeer ‘Cristo com a Mulher Surpreendida em Adultério’, vendido (não diretamente) para Hermann Göring, braço-direito de Hitler. Depois que a guerra acabou, o holandês ficou numa situação difícil e acabou preso. Ou tinha vendido a obra-prima para os nazistas (crime gravíssimo), ou confessava a falsificação e se assumia como um escroque. Acabou confessando, mas daí precisou convencer os próprios críticos que pouco antes tinham saudado e autenticado com convicção os Vermeers redescobertos.

Natural portanto que a história desse holandês afável, bon-vivant, viciado em morfina, tenha virado um calcanhar-de-aquiles também para a crítica.

Wynne, que também é tradutor e verteu para o inglês o iconoclasta escritor francês Michel Houellebecq, recheia seu livro com citações bem-humoradas. Para sorte do leitor, o autor teve a esperteza de dar graça a todo o anedotário que cerca o caso, inclusive a suposta reação perplexa de Göring, na prisão, ao descobrir que seu maior tesouro era uma fraude. Diz a lenda que nesse momento ‘se deu conta da existência do mal pela primeira vez’.

O caso Van Meegeren não é desconhecido nem inédito, mas é um dos mais emblemáticos, além de saboroso. Contando a mesma história, por exemplo, também está saindo nos EUA ‘The Forger’s Spell’ (o feitiço do falsificador, Harper, 368 págs., US$ 26,95, cerca de R$ 43 mais frete), de Edward Dolnick. ‘Dizem com freqüência que Van Meegeren pôde ter sucesso durante a Segunda Guerra porque era mais difícil autenticar pinturas, mas não é verdade. As carreiras de Elmyr de Hory nos anos 50, de Eric Hebborn e Tom Keating nos anos 70 e de John Myatt ou Geert Jan Jansen nos anos 90 superaram em muito a mera contribuição de sete falsificações’, diz Wynne.

São personagens que desestabilizam a autoridade dos especialistas e podem virar do avesso um ‘mundo de investimento, leilões e publicidade’, como define Wynne o mercado de arte. Além disso, freqüentemente são interessantes, como o Hory citado acima, o protagonista do genial ‘F for Fake’ (1974), de Orson Welles, ele mesmo um notório ‘falsificador’ que testou os limites entre verdades e mentiras no rádio.

E no caso do holandês, há ainda a personalidade do próprio Vermeer (1632-1675), que tem só 35 telas reconhecidas e, acredita Wynne, teria se beneficiado postumamente da ação do compatriota. ‘O que tornou Vermeer uma ‘estrela’ do porte de Rembrandt é o fato do crítico Thomas Bodkin, em 1940, ter chamado de ‘descoberta sensacional’ a ‘soberba’ ‘Ceia em Emaús’. ‘Ceia em Emaús’, obra-prima que saiu dos pincéis de Van Meegeren. Obra-prima?’

 

 

Teixeira Coelho

Jornalismo razoável se une a frágil literatura

‘O que o sucesso de um falsário primeiro demonstra é o fracasso da idéia de arte, derrotada pela cultura. Quando o valor de uma obra depende do reconhecimento do nome do autor, é sinal que a cultura (a mera informação, o hábito, as idéias feitas) se pôs diante da arte e oculta sua percepção. Nesse caso, o logro existe quer a obra seja ‘autêntica’ ou ‘falsa’, quer o logrado seja o crítico ou o visitante comum do museu. Mas o que é um ‘falso’, em arte? Durante séculos, colecionadores encomendaram a cópia de obras que apreciavam. Se a cópia era tão boa quanto o original, tudo bem. O valor, a virtude, não estava na originalidade mas no ‘bem fazer’ (como fez Boucher ao copiar magnificamente um magnífico Veronese: o resultado está no Masp). De uma orquestra que execute um Beethoven tão bem quanto outra não se diz que está falsificando ou copiando esta. Há escassas razões para mudar a argumentação quando se muda de arte. Orson Welles tem razão em ‘F for Fake’: ‘A arte é, em si mesma, verdadeira’. E o que busca quem faz uma cópia ou ‘pinta ao modo de’ alguém que já morreu, como Van Meegeren, o ‘falsário’ deste livro? Dinheiro? Vingança contra ‘críticos insensíveis’? (Crítico sensível é aquele que gosta do que faço.) Obsessão pela mentira? Pode ser. Mas, também, como todo artista ‘verdadeiro’, o desejo de ter a própria obra apreciada pelo único juiz que interessa: algum artista do passado que se admirava, cujas telas ou livros gostaríamos de ter feito. Ser reconhecido pelo presente, pelo futuro, está bem. Melhor é ser admirado pelo antecessor. O que mais recompensa Van Meegeren é ver seu ‘falso’ pendurado na parede do museu ao lado dos grandes do passado. Velhos mestres não podem ter consciência do novo; mas o mundo todo os verá ao lado da nova obra, ‘falsa’ ou ‘real’ -e é ‘como se’. Tal como no ‘livro perfeito’ de Bioy Casares, ‘A Invenção de Morel’, em que o personagem se coloca dentro do filme em que aparece sua amada, depois de lhe ter estudado os gestos e as falas, dando a quem depois visse o filme a impressão de que os dois estiveram juntos quando ‘na verdade’ ela nunca o conheceu porque existiu antes dele… A questão do ‘falso’ e do ‘verdadeiro’ não é central apenas na arte: é central nesta cultura pelo menos desde Platão e seu mito da caverna. Questão bem mais complicada do que faz supor esse livro, misto de jornalismo razoável e frágil literatura que conta a história de um holandês que fazia Vermeers. O livro prende a atenção nos trechos em que narra o processo de falsificação, que levou seis anos, e é exemplo da rala literatura de massa quando ficcionaliza passagens da vida do falsário. Há um aspecto curioso nesse livro, apropriado a seu tema. A primeira edição em inglês, em capa dura, mais cara, veio com o título (em tradução) ‘Eu Fui Vermeer: Ascensão e Queda do Maior Falsário do Século 20’. Quando o livro saiu na barata e massificada edição de bolso, o título passou a ser aquele que a edição brasileira preferiu. Parece que a massa precisa de uma isca a mais. É curioso porque, se a venda de um ‘falso’ de Van Meegeren aos nazistas deu origem à descoberta posterior de seus feitos, essa é uma parte menor do livro, centrado em coisas mais vitais que aconteceram antes: como o ‘falsário’ trabalhou, como ‘enganou’ críticos e museus (mas, a arte não é sempre verdadeira?), como reagiram suas ‘vítimas’. O título original do livro (o título ‘verdadeiro’?) é mais apropriado. É curioso. Talvez pertinente.

TEIXEIRA COELHO é curador-chefe do Masp.

EU FUI VERMEER: A LENDA DO FALSÁRIO QUE ENGANOU OS NAZISTAS

Autor: Frank Wynne

Tradução: Hildegard Feist

Editora: Companhia das Letras

Quanto: R$ 39 (304 págs.)

Avaliação: regular’

 

TELEVISÃO
Rafael Capanema

Reality coloca ‘gostosas’ e ‘geeks’ sob mesmo teto

‘Diz um item de uma corrente de e-mails com lições de vida (erroneamente atribuídas a Bill Gates): ‘Seja legal com os CDFs. Existe uma grande probabilidade de você vir a trabalhar para um deles’ -ou, talvez, de conviver com alguns desses caras num programa de TV, caso do reality show ‘As Gostosas e os Geeks’, exibido no Multishow. Eis a premissa desse ‘experimento social’, produto da usina de criatividade aparentemente inesgotável que é a mente dos criadores de reality shows: um intercâmbio entre garotas bonitas, que usam a expressão ‘tipo’ como vírgula, e nerds de variadas espécies -de escoteiros a programadores. Confinados em uma mansão, os participantes formam sete duplas mistas que, em competições, aprendem lições de história, geografia, gramática (as gostosas) e moda, paquera, dança (os geeks), com vistas a um prêmio de US$ 250 mil. O programa, de 2005, já está na quinta temporada nos EUA, onde foi criado. O melhor de ‘As Gostosas e os Geeks’ está nas pequenas confissões que arranca. ‘Eu nunca tinha ganhado nada com a inteligência’, diz a ‘gostosa’ Mindi Emanuel depois de vencer uma prova de conhecimentos gerais. É também divertido ver os rapazes constatando, animados, que nunca haviam tido tanto contato com garotas. A gama de geeks vai de Richard Rubin, um nerd de visual ‘clássico’ -o mais carismático da série-, ao bonitão Brad Hooker, membro da Mensa, sociedade formada por pessoas de alto Q.I.. Cansada de ouvir conversas sobre ‘histórias em quadrinhos e caratê’, a modelo de lingerie Lauren Bergfeld desabafa: ‘Quero sair desta casa e encontrar gente normal’. Mas, aos poucos, algumas diferenças arrefecem, e os participantes acabam tirando lições como essa, da ‘Barbie em tamanho real’ Erika Rumsey: ‘A beleza vai muito além da aparência exterior. Precisei vir aqui para entender isso’.

AS GOSTOSAS E OS GEEKS

Onde: Multishow

Quando: hoje, às 22h45

Classificação indicativa: não informada’

 

Folha de S. Paulo

INCÊNDIO NA GLOBO ATINGE CIDADE CENOGRÁFICA

‘O fogo ontem pela manhã destruiu cerca de 15% dos cenários da próxima novela das 19h, ‘Três Irmãs’, no Projac, no Rio. Ninguém ficou ferido. A causa do incêndio não foi informada até o fechamento desta edição.’

 

 

Priscila Pastre-Rossi

‘É Tudo Falso (Fakes)’ analisa a pirataria

‘Há duas formas de assistir ao documentário ‘É Tudo Falso (Fakes)’. Uma é buscando culpados. A outra é se sentindo culpado. Opte pela segunda: o documentário ganha impacto abordando a indústria criminosa que mais cresce no mundo. ‘Fakes’ mostra que a pirataria não nasceu na China, mas sim da decisão de grandes corporações em transferir sua produção para a Ásia atrás da redução de custos. O efeito colateral foi óbvio: o chinês que faz um legítimo Nike viu que também poderia fazer um genérico. O documentário foge do lugar-comum ao revelar que o apelo por uma marca cobiçada não sofre distinção social. Uma dondoca londrina explica candidamente durante sua sessão de botox por que comprou a bolsa falsificada. ‘A fila [pela original] demoraria seis meses, e aí ela já teria saído de moda’, diz. Ela pagou 20 vezes menos o que custaria a original -cerca de 20 vezes menor é também o salário desses chineses. Quem melhor fecha a equação é Christophe Zimmermann, da Organização Aduaneira Mundial. Ele afirma que a pirataria chegou até aos medicamentos. E deixa claro que não existe inocência ao se comprar uma Louis Vuitton na pechincha.

É TUDO FALSO – 1ª PARTE

Quando: amanhã, à 0h30

Onde: no GNT

Classificação indicativa: não informada’

 

 

RÁDIO
Folha de S. Paulo

Morre cantora Jo Stafford, estrela da era do rádio

‘Uma das mais populares cantoras do período pós-guerra nos EUA, Jo Staf-ford morreu na quarta, aos 90 anos, na Califórnia, em decorrência de problemas no coração -a notícia foi divulgada ontem.

Stafford vendeu mais de 25 milhões de álbuns e gravou mais de 800 canções, transitando entre o pop, folk e o jazz. Suas músicas foram muito ouvidas por soldados americanos durante a Segunda Guerra (1939-45), o que lhe rendeu o apelido de GI Jo.

Ela começou a carreira no Pied Pipers, grupo vocal no qual era a única voz feminina e que acompanhou a orquestra de Tommy Dorsey. O grupo chegou a dividir algumas faixas com Frank Sinatra. A partir de 1944, Stafford iniciou carreira solo, participando de programas de rádio e TV; seu último álbum é de 1970. Ela deixa dois filhos e quatro netos.’

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