Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Folha de S. Paulo

EUA
Sérgio Dávila

Obama usa mídia para voltar a impor agenda

‘Barack Obama começa a semana seguindo a máxima que muitas vezes ajudou sua campanha vitoriosa à Casa Branca: se você não gosta do que está sendo falado, mude o assunto. Hoje, o presidente americano aparecerá em entrevistas a cinco programas de TV diferentes no mesmo dia, um feito inédito. Amanhã, fará uma participação no ‘talk show’ de David Letterman, o primeiro ocupante do cargo a fazer isso.

As entrevistas de hoje aos programas noticiosos dominicais das três principais emissoras abertas norte-americanas, ABC, CBS e NBC, mais a CNN e a hispânica Univision, foram dadas na sexta. A gravação no programa de Letterman é amanhã, em Nova York. Elas se seguem a conversas recentes com a emissora financeira CNBC e o site Bloomberg. A blitz serve a um propósito: o democrata quer retomar o comando da agenda política do país, hoje nas mãos da oposição.

Segundo trechos já vazados à imprensa, nas entrevistas o democrata rejeita que o racismo seja o motor das críticas que vem recebendo mais e mais frequentemente nas últimas semanas, acusação feita pelo ex-presidente Jimmy Carter e repetida por políticos e analistas do país inteiro. ‘Há pessoas que não gostam de mim por conta de minha raça?’, pergunta-se retoricamente na entrevista à CNN. ‘Tenho certeza de que há, mas essa não é a questão predominante aqui.’

Há duas semanas, enquanto defendia seu projeto de reforma do sistema de saúde pública numa sessão conjunta do Congresso americano, Obama ouviu do representante (deputado federal) republicano sulista Joe Wilson a frase ‘Você mente!’. O ato descortês e incomum foi tanto um exemplo da divisão política em que encontra o país oito meses após a posse quanto um detonador da discussão sobre o peso do fator racial nessa divisão.

A questão real, segundo defendeu Obama em entrevista à CBS, é que ele quer fazer reformas amplas e profundas em setores importantes da sociedade, como o da saúde pública, e isso suscita reações. ‘O que está conduzindo as paixões agora é que a saúde pública virou um substituto para um conjunto maior de questões sobre o quanto o governo deveria se envolver na nossa economia.’

Nos encontros, nos quais tenta influenciar o ciclo noticioso de 24 horas da mídia, Obama critica esse mesmo ciclo. Parte da culpa do debate inflamado é dos blogs e TVs pagas, disse ele, que se concentram nos elementos extremos de ambos os lados. ‘A melhor maneira de se conseguir seus 15 minutos de fama hoje é ser rude com alguém’, afirmou.

ONU e G20

Além disso, a semana também marca a volta do presidente ao cenário global. Na quarta, ele faz sua primeira aparição na Assembleia Geral da ONU, em Nova York, onde fala logo após o discurso do brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva. Antes, na terça, participa da reunião de mudança climática organizada pelo secretário-geral da entidade, Ban Ki-moon.

Na quinta-feira, parte para Pittsburgh, na Pensilvânia, para a reunião de dois dias com o G20, grupo das 20 economias mais ricas do mundo, Brasil inclusive. Nas três ocasiões, cobrança e oposição devem dar lugar à boa vontade com que foi saudado logo após a posse.

No encontro sobre o clima, terá pouco a apresentar: a discussão da ambiciosa lei que apresentou ao Congresso, em que tenta começar a mudar a matriz energética do país e adotar medidas mais ‘verdes’, deve ficar para o ano que vem.

Na ONU, terá de defender entre outras coisas seu enfoque para a Guerra do Afeganistão, conflito crescentemente impopular no país e no mundo. Já no G20, realizou pouco da lista de tarefas que os próprios países se deram quando se encontraram em abril, em Londres.

‘A estatura do presidente Obama agora não é a mesma de Londres’, disse ao ‘Wall Street Journal’ Ted Truman, do Peterson Institute for International Economics, de Washington. ‘Obviamente, ele não é mais o ‘rock star’.’’

 

ASSINATURA
Denise Menchen e Paula Nunes

TV impõe migração para pacotes mais caros

‘A proliferação de pacotes de televisão por assinatura, em vez de trazer divertimento para os clientes, tem provocado, em vários casos, mais transtornos do que facilidades.

Sob o argumento de que o plano contratado não existe mais, empresas forçam a migração para opções mais caras. A medida, considerada ilegal por órgãos de defesa do consumidor, não é assumida pelas operadoras, mas foi relatada por assinantes ouvidos pela Folha nas últimas semanas.

No Procon-SP, o número de queixas revela a insatisfação dos clientes. As empresas de televisão por assinatura estão entre as que mais recebem reclamações, atrás apenas das de telefonia – já são 449 neste ano. O órgão não informa quantos dos registros são relativos a mudanças nos pacotes -que, segundo os assinantes, podem ocorrer de diferentes maneiras.

A engenheira de software Debora Theodoro recebeu no dia 21 de agosto um e-mail informando que o plano da Net, no Rio, estava sendo ‘descontinuado’ e seria substituído por outro, com mais canais de filmes, mas sem outros 14. O valor da mensalidade subiria até 8%. ‘O e-mail dá a entender que, a qualquer momento, eles vão mudar o plano e eu vou ter que pagar mais caro’, diz Theodoro. ‘Eu contratei um plano, eles têm que me oferecer o plano que eu contratei. Mas eles querem que eu pague mais e ainda dizem que alguns canais vão ficar indisponíveis. É absurdo.’

Assinante da Sky, o administrador de empresas Fabio Cavallini, de São Paulo, também enfrenta problemas devido a um plano que a empresa deixou de comercializar. O incômodo começou quando ele notou um aumento na mensalidade.

‘Liguei para reclamar e me disseram que meu pacote havia acabado e que por isso tinham me colocado em outro com mais alguns canais’, afirma. Ele diz que ligou várias vezes para a empresa até um atendente, depois de ouvir que ele iria cancelar a TV, oferecer um desconto. A validade da oferta é de seis meses, e sempre que esse prazo se aproxima ele tem que negociar sua prorrogação.

Já a professora Vera Lúcia da Rocha Santos, moradora do Rio, diz ter recebido um telefonema da Net avisando que precisava trocar seu receptor, analógico, por um digital. Quando a conta chegou, o valor do plano tinha passado de cerca de R$ 150 para mais de R$ 200, e o ponto adicional, antes gratuito, agora custava R$ 25.

Depois de ligar várias vezes para a empresa sem conseguir reverter o aumento, ela cancelou o ponto adicional e migrou para um pacote mais barato. ‘Perdi muitos canais, mas não tinha estrutura emocional para enfrentar um embate’, diz.

Outra queixa diz respeito a canais e serviços oferecidos como ‘degustação’ -condição da qual, muitas vezes, o cliente toma conhecimento apenas quando a ‘oferta’ termina. Foi o que ocorreu com a gerente de comunicação institucional Daniela Costa Campos, 28, que decidiu assinar um plano da Net atraída pela diversidade de canais e pela interatividade.

Depois de um mês, ela viu a função de interatividade parar de funcionar. Foi informada de que, se quisesse continuar com o serviço, teria de migrar para um novo plano. ‘Fiquei tão nervosa que nem quis ouvir o valor’, afirma.

O coordenador do Procon em Porto Alegre, Omar Ferri, cita ainda a venda do pacote de jogos do Campeonato Brasileiro como motivo de queixas, principalmente entre os clientes do plano básico de TV.

‘Na hora de vender, eles prometem todos os jogos, mas depois algumas partidas são transmitidas apenas em canais de que o usuário básico não dispõe em seu contrato.’ Segundo ele, o órgão tem obrigado as operadoras a liberar esses canais para que o assinante do ‘pay-per-view’ possa ver todas as partidas.

Colaborou GRACILIANO ROCHA , da Agência Folha, em Porto Alegre’

 

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Net e Sky respondem por 82,3% do mercado de TV paga no Brasil

‘Líderes na comercialização do serviço de TV paga no Brasil, Net e Sky detêm, juntas, 82,3% de participação no mercado. Os dados são da consultoria Teleco, especializada no setor de telecomunicações, com base em informações fornecidas pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e pelas operadoras.

No caso da Net, que distribui o sinal por cabo, o número de assinantes chegou a 3,480 milhões no segundo trimestre de 2009, o que representa 51,3% do total nacional. A empresa foi criada em 1991 e tem entre seus acionistas a Embratel, a Embratel Participações, a Distel Holding, a GB Empreendimentos e Participações e a Globo -as três últimas são ligadas à família Marinho, das Organizações Globo.

Já a Sky, com transmissão via satélite, é controlada pela DirecTV Group e pela Globo Comunicações e Participações. No segundo trimestre de 2009, a empresa detinha 31% do mercado de TV paga do país.

Para o diretor da Teleco José Luiz Souza de Oliveira, a concorrência no setor foi reduzida pela ausência de novas licitações de licenças do serviço de TV a cabo e pela limitação imposta ao capital estrangeiro nas empresas do ramo. ‘O crescimento do setor está prejudicado, e o consumidor acaba ficando com poucas opções’, diz.

O analista sênior de telecomunicações da IDC, Vinícius Caetano, também atribui à legislação parte da explicação pela falta de concorrência no setor. Segundo ele, empresas que oferecem internet banda larga poderiam aproveitar sua rede para fornecer também o serviço de televisão batizado de IPTV. Limitações impostas pela Anatel, porém, dificultam o desenvolvimento do setor.

Segundo ele, hoje apenas 13,5% dos lares brasileiros têm acesso à TV paga. Em São Paulo, o índice chega a 25%.’

 

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Mudança de plano não prejudica cliente, afirmam empresas

‘A Net e a Sky afirmaram que seus clientes não são prejudicados quando um pacote de TV por assinatura deixa de ser comercializado. Apesar dos problemas relatados pelos assinantes, ambas disseram que quem já assinou o serviço pode mantê-lo inalterado pelo tempo que desejar.

Segundo as empresas, o lançamento de pacotes foi intensificado nos últimos anos. Na Sky, o processo começou há três anos. ‘Assim como na indústria automobilística, a Sky lança a cada ano uma nova versão dos pacotes’, afirmou por e-mail a assessoria da companhia. No caso da Net, a mudança é ainda mais recente. Antes de 2008, a empresa oferecia apenas seis opções de pacote de TV, ante mais de 20 hoje.

A Net afirmou que o e-mail citado pela reportagem, que informava sobre a substituição de um dos pacotes, foi resultado de um erro. De acordo com a assessoria, a ação tinha por objetivo mostrar aos clientes as vantagens que eles teriam se migrassem para outro pacote.

‘Porém, houve uma falha operacional e o texto utilizado para a confecção do e-mail marketing foi o errado’, afirmou a empresa. A assessoria disse ainda que o e-mail foi enviado apenas para cem clientes e que todos foram procurados para esclarecimentos. A engenheira de software Debora Theodoro, uma das destinatárias, diz não ter sido procurada.

A assessoria de imprensa da Net afirma que a empresa realiza um processo gradual de migração para a tecnologia digital, que é feito sem ônus para o cliente e sem alteração do pacote contratado.

A empresa disse também que, quando há mudanças na programação, o cliente é avisado com ao menos 30 dias de antecedência e não é prejudicado.

Já a Sky afirmou que não altera seus pacotes de forma unilateral. ‘O cliente recebe ofertas diferenciadas para optar pela migração ou aquisição de um pacote opcional. Eventualmente, a Sky disponibiliza por mera liberalidade e por um período determinado a degustação de novos canais, mas o cliente não paga mais por isso.’’

 

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Procedimento é ilegal, afirmam órgãos de defesa

‘A mudança de planos de TV por assinatura sem a aquiescência do assinante é ilegal. Segundo o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) e o Procon-RJ (Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor), o cliente não pode ser prejudicado por uma decisão que parte da empresa.

A advogada Estela Guerrini, do Idec, diz que, se a empresa decide tirar algum canal do pacote, o cliente que antes tinha direito a esse canal pode exigir a sua substituição por outro similar ou requerer um abatimento do valor na mensalidade. Se preferir, pode também rescindir o contrato sem qualquer tipo de multa, mesmo durante a vigência do período de fidelização.

Ela destaca ainda que a troca dos receptores analógicos pelos digitais, quando imposta pela empresa, não pode ser cobrada.

O coordenador-geral do Procon-RJ, Paulo Roberto Novaes, criticou também o e-mail enviado pela Net a alguns consumidores afirmando que o plano seria descontinuado e substituído por outro, com acréscimo de até 8% no valor da assinatura.

Ele orientou os clientes que tiverem esse e outros problemas a procurarem os órgãos de defesa do consumidor: ‘Nesses casos é possível abrir um processo coletivo contra as companhias’.’

 

CINEMA
Ana Paula Sousa

Classificando no escuro

‘Se o departamento de classificação indicativa do Ministério da Justiça pudesse limar uma palavra do dicionário, escolheria, provavelmente, a palavra censura. Nada inquieta tanto os responsáveis pela definição da faixa etária de programas de TV, filmes e games quanto o termo herdado da ditadura militar. ‘A gente regula, não reprime. Também não punimos nem processamos’, diz, de pronto, Romeu Tuma Jr., secretário nacional de Justiça.

Delimitado o terreno de atuação, ele admite que, três anos depois de instituído o manual de classificação, é tempo de ajustá-lo. ‘Vamos rever os critérios. Eles precisam ser mais maleáveis.’

Se a classificação para a TV já deu bastante o que falar, menos discutido tem sido o trabalho feito para o cinema -que segue as mesmas regras.

‘Da maneira como é hoje, virou um novo tipo de censura’, diz Leon Cakoff, organizador da Mostra de São Paulo e distribuidor de filmes de arte. ‘Deveria haver autorregulamentação.’ Outro que mantém a palavra tabu no vocabulário é Jean Thomas Bernardini, da Imovision. ‘Sou prejudicado pela classificação’, diz. ‘Quase todos os nossos filmes obtêm classificação maior aqui do que em outros países.’ As distribuidoras dos blockbusters, por sua vez, não se queixam. ‘Quase todos os países têm órgãos semelhantes’, diz Rodrigo Saturnino Braga, da Sony Pictures.

Informado das queixas dos independentes, Tuma Jr. pontuou, primeiro, que não há diferença de tratamento entre os grandes estúdios e os pequenos. Mas admitiu que, ao contrário do que aconteceu com a TV, freguesa de reuniões, o cinema ainda não foi colocado em foco no departamento.

Para a indústria, no entanto, a classificação é questão de vida ou morte. ‘Um filme pode deixar de ser lançado se receber 18 anos’, diz Braga. ‘É comum o produtor pedir para o diretor mudar um filme classificado como R [restricted].’ O ‘restricted’, nos EUA, equivale aos nossos 18 anos. Nesses casos, nem acompanhado dos pais o adolescente pode entrar.

A jornalista Márcia Pereira levou a filha de 16 anos para ver ‘Brüno’, classificado para 18 anos -após recurso, o filme mudou para 16. Por não saber da proibição, ela desobedeceu o bilheteiro e entrou na sala. Recebeu, no escurinho do cinema, a visita de três seguranças. ‘É uma hipocrisia. Eu é que sei o que minha filha pode ver. Além disso, ela baixa o filme na internet na hora em que quiser’, diz.

Não por acaso, será esse o mote da campanha governamental, que incluirá cartazes e filmetes a serem exibidos nos cinemas. ‘Não se engane. Tem coisas que seu filho não está preparado para ver’, avisa a peça publicitária.

‘Nosso procedimento é muito original, mas não é inventado. São critérios testados mundialmente’, diz Davi Pires, diretor do departamento. ‘Se há alguma censura, é a do mercado, que muda um filme para ter outra classificação’, diz, referindo-se aos 26 minutos limados de ‘Halloween’. ‘Eu já disse, em reuniões com o estúdio, que, no Brasil, se tiver tortura é 18 anos. Por outro lado, somos muito mais tolerantes com sexo que eles’, pondera Braga.

‘Gostam de falar mal da classificação em público. Mas muitos pais têm medo de dizer não para os filhos e querem que a gente diga’, diz Tuma Jr. O secretário, que acostumou-se a lidar com as pressões da TV, diz que, no caso do cinema, é tudo muito menos ruidoso.

Segundo Pires, apenas Luiz Carlos Barreto foi visitar o ministério, para tentar fazer com que ‘O Homem que Desafiou o Diabo’ recebesse 14 e não 16 anos. E quem ligou foi Renato Aragão, tentando obter o carimbo ‘livre’ para seu último filme. ‘Mas não teve jeito’, lamenta Pires. ‘Havia criança em situação de sofrimento.’’

 

Hélio Schwartsman

Portaria da classificação é inconstitucional

‘Vá lá, até dá para admitir que alguém precisa alertar os pais acerca dos conteúdos das películas exibidas nos cinemas, a fim de que os genitores possam julgar se vão ou não permitir que seus filhos as assistam.

Minha relutância em aceitar a premissa inicial se explica: idêntico raciocínio pode ser aplicado a livros e à internet -hipótese que se me afigura bastante perturbadora.

Não é esse, porém, o ponto central aqui. O problema da portaria nº 1.100/06 do Ministério da Justiça, que regula a classificação indicativa de filmes, vídeos, games e congêneres, é que ela é escandalosamente inconstitucional quando tenta, em seu artigo 19, proibir jovens de assistir a fitas classificadas como impróprias para menores de 18 anos mesmo que autorizados pelos pais.

Os artigos 21, XVI e 220, pár. 3º, I da Carta são cristalinos ao estabelecer que a classificação das diversões públicas tem caráter apenas ‘indicativo’. Isso significa que o poder público recomenda o filme para determinada faixa etária, e os pais ou responsáveis -que, ao contrário dos burocratas lotados em Brasília, conhecem o jovem- acatam ou não a ‘indicação’.

O argumento, por vezes repetido, de que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a lei nº 8.069/90, tornou a classificação indicativa obrigatória no que diz respeito à proteção do menor constitui uma afronta à Carta e ao princípio da não contradição. Como sabe qualquer primeiranista de direito, uma lei ordinária não pode criar embaraços ou restrições a direitos claramente afirmados na Lei Maior.

No mais, aqueles que se dignarem a ler com atenção o ECA verão que o legislador em nenhum momento veda o acesso de jovens a filmes impróprios. E não o faz porque, se o fizesse, incorreria em manifesta inconstitucionalidade.

O que se depreende disso tudo é que, devidamente autorizados pelos responsáveis legais ou por eles acompanhados, crianças de qualquer idade podem ver qualquer filme, mesmo que seja pornográfico, apologético de crimes e drogas ou encerre outras barbaridades.

Não que eu aprove levar crianças de 11 ou 12 anos para assistir a ‘Garganta Profunda’, mas não podemos querer reescrever a Carta a cada contrariedade. As garantias inequivocamente expressas no texto magno precisam valer sempre, mesmo que isso contrarie o politicamente correto, ou nem vale a pena ter uma Constituição.’

 

TELEVISÃO
Bia Abramo

‘Viver a Vida’ promete ser mais arejada

‘OUTRO DIA, esta coluna foi classificada como uma coluna que não ‘fala bem de nada’, como se houvesse aqui, a priori, uma indisposição generalizada com tudo o que está acontecendo na TV. Ora, por mais que as impressões dos leitores pareçam, à primeira vista, imprecisas -justamente naquela semana havia na coluna uma avaliação um tanto entusiasmada de uma minissérie-, elas devem ser levadas em conta.

Então, hoje, para falar de ‘Viver a Vida’ (Globo, 21h, não indicado para menores de 12 anos), tentemos ajustar o foco de uma disposição, digamos assim, mais prazenteira. Um possível método é o da comparação com aquilo que veio antes. Saem as dancinhas, os sáris e o túnel geográfico mágico entre a Índia e o Rio de Janeiro e entra em seu lugar o supermapeado Leblon de Manoel Carlos.

Desta vez, há também as praias de azuis e verdes intensos de Búzios, com seus ecos de balneário chique e de gente bonita, que remontam à sua ‘descoberta’ por Brigitte Bardot nos anos 70. Portanto, a novela de Manoel Carlos promete ser, digamos, mais arejada do que ‘Caminho das Índias’.

Outro método que pode conduzir a um olhar menos mal-humorado é considerar as limitações próprias do gênero. Ora, se há algo que esbarra o tempo todo em limitações é a novela, sobretudo nesse momento de sua história, em que um certo esgotamento se abate. As do horário mais nobre da Globo, então, sofrem ainda mais desgaste, justamente por serem o padrão a partir do qual se medem as novelas.

Então, temos de pensar que, dentro das variadíssimas e cada vez mais sufocantes limitações, ‘Viver a Vida’ poderá ser uma boa novela. Há a vasta beleza e atuação segura de Taís Araújo, que faz a estreia da primeira Helena negra do extenso plantel de protagonistas do mesmo nome. Há um certo capricho do autor na construção de alguns tipos, o que permite alguns personagens simpáticos ou divertidos -a aposta da coluna, por enquanto, vai para a Ingrid de Natália do Valle.

Há também seu passo mais lento, pouco afeito a reviravoltas e às soluções mágicas de roteiro, que se não for estragado pela pressão de fazer subir a audiência, garante uma narrativa mais calma e contemplativa.

Por ora, é tudo o que dá para depreender dos primeiros capítulos da novela. Novela, como os vinhos, mesmo os maus, tem um tempo de maturação. E, novamente como os vinhos, sobretudo os maus, estraga fácil, fácil.’

 

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