Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Folha de S. Paulo

INTERNET
Camila Fusco

Twitter será mais rentável do que e-mail, diz diretor

Considerado um dos principais ativos do mundo em internet, o Twitter pode não ter provado ainda sua rentabilidade financeira, mas, para a diretoria, o modelo de negócios baseado em serviços pagos deverá trazer resultados superiores aos de outras empresas on-line.

Com três produtos comerciais até agora -tweets promocionais, tendências ou assuntos patrocinados e contas pagas-, além de anúncios, o faturamento do Twitter ainda é um mistério.

A troca recente de comando, com a promoção de Dick Costolo para presidente em substituição ao fundador Evan Williams, colocou em dúvida se de fato as estratégias estavam corretas.

Mas para Kevin Thau, diretor de desenvolvimento de negócios móveis, não há problemas, e o Twitter conseguirá mostrar, em curto prazo, receitas polpudas e superiores às de empresas de e-mail.

‘Do ponto de vista financeiro, as mensagens de um para um, como o e-mail, nunca foram um bom negócio. O Google não ganha muito dinheiro com o Gmail, nem o Yahoo. A tecnologia do Twitter, em que um se comunica com muitos, tem potencial financeiro maior’, disse em entrevista à Folha

A declaração de Thau pode parecer otimismo exacerbado, mas quem observa a carreira do cientista da computação de 37 anos vê que descobrir como fazer dinheiro em companhias desacreditadas é sua vocação.

Em 1995, Thau ajudou a criar os primeiros servidores de e-mail na Software.com, empresa que passou de virtual desconhecida para fornecedora de 60% dos sistemas mundiais de e-mail.

Anos depois, ajudou na criação do primeiro navegador de internet para celulares, na Openwave, em 2000, e contribuiu para a abertura de capital da companhia.

‘Naquele momento atingimos valor de mercado de US$ 14 bilhões’, afirma.

Segundo Thau, o momento do Twitter em se afirmar como rede de informação, e não como rede social, representa desafio semelhante ao do início de sua carreira.

‘Naquela época tentávamos mostrar o potencial da internet móvel. No Twitter temos o mesmo exercício, mas com o valor das mensagens múltiplas.’

A capacidade de ser um termômetro dos temas populares na internet já conquistou os fundos. Estima-se que o microblog já captou US$ 160 milhões em recursos e que está prestes a fazer nova rodada de captação -o que elevaria seu valor de mercado para US$ 3 bilhões.

‘O Twitter faz muito mais do que compartilhar as atividades de uma rede de amigos. É um tremendo ativo, com uma base de dados gigante de assuntos’, diz Laura DiDio, analista-sênior da consultoria americana ITIC.

Segundo a executiva, não será difícil ver, em breve, aquisição do microblog por empresas de tecnologia como Google ou Microsoft, interessadas no potencial de comunicação imediata.

 

Cresce pressão por maior retorno na web

O Twitter pode até estar numa condição confortável sobre seu potencial de comunicação em tempo real para as massas, mas a cobrança por receitas está cada vez mais evidente.

Apesar de seu cofundador, Biz Stone, dizer para jornalistas no ano passado que o microblog estaria no azul até o fim de 2009, até hoje não existem indícios de um modelo de negócios sustentável.

‘Não há dúvidas que o Twitter será rentável, mas o que não está claro é como’, diz Laura Didio, da ITIC.

Em palestra na FGV-EAESP, neste mês, Jawed Karim, 31, um dos fundadores do YouTube, e Aber Whitcomb, 33, do MySpace, falaram sobre a importância de equilibrar inovação e retorno financeiro.

Para Karim, o retorno é uma preocupação crescente, mas os empresários não precisam necessariamente pensar em um modelo específico antes da empresa pronta.

‘O mercado vai avaliar quanto quer pagar por um serviço on-line de acordo com a utilidade. Por isso é importante também não deixar o desenvolvimento tecnológico de lado.’

Para Whitcomb, o mercado está aprendendo como recompensar criações como as redes sociais. ‘Os usuários não querem ter contas em redes sociais diferentes. Quem vencerá tanto em inovação quando financeiramente é quem oferecer melhor sistema’, diz.

Jawed criou o YouTube em parceria com Chad Hurley e Steve Chen em 2005. Um ano depois o trio vendeu o site para o Google por US$ 1,65 bilhão. Apenas recentemente o site atingiu a rentabilidade e segundo estimativas, o Google vai faturar US$ 1 bilhão com o YouTube em 2011.

Já o MySpace, criado por Whitcomb, Chris DeWolfe e Colin Digiaro em 2003, dois anos depois foi adquirido por US$ 580 milhões pelo grupo de mídia NewsCorp.

Foi a rede mais popular até 2008, quando perdeu o título para o Facebook em número de usuários.

 

Sistemas do Ibope de medição de sites apresentam problemas

A divisão de mídia do Ibope informou, em nota, que os produtos Netview e WebRF, que mensuram atividades de internautas, apresentaram problemas.

A empresa disse que os dados de medição da navegação on-line do mês de outubro apresentaram uma variação de 9% devido à falha e terão que ser reprocessados.

Os dados de novembro serão entregues aos clientes com atraso, mas a companhia ainda não informou quando isso acontecerá.

O Net View é um serviço que fornece relatórios sobre a receptividade dos internautas aos anúncios de banners.

Já o Web RF tem como foco o planejamento de mídia on-line. Por meio de dados de navegação coletados, destaca os canais e páginas mais apropriados para o plano de comunicação do cliente.

 

FUSÃO
Grupo do ‘El País’ aprova acordo com fundo dos EUA

Os acionistas do grupo espanhol de mídia Prisa (dono do ‘El País’ e das editoras Moderna e Objetiva) aprovaram ontem acordo com o fundo americano Liberty Acquisition Holdings, em que receberá injeção de capital de 650 milhões. Com o negócio, o Liberty se torna acionista do grupo espanhol -que, por sua vez, terá 100% do fundo.

 

TELEVISÃO
Laura Mattos

Ligações perigosas

Bete amava Olavo, que é pai de Jéssica, que ama Berilo, que ama Agostina, que é filha de Totó. Totó é pai de Agnello, que amava Lorena, que é filha de Stela, que ama Agnello e é viúva do irmão de Totó, Saulo. Saulo foi morto e não ama mais ninguém.

É preciso ler o parágrafo acima com muita calma para tentar entender um pouco as relações cada vez mais emaranhadas de ‘Passione’.

Em capítulos recentes, namorados se descobriram primos e foram parar em um especialista, que os alertou para os riscos de terem um filho com doenças genéticas.

Antes, a moça, Fátima (Bianca Bin), havia feito um aborto de Danilo (Cauã Reymond), irmão do atual namorado e seu primo também.

Duas mulheres (Agostina/Leandra Leal e Jéssica/ Gabriela Duarte), casadas com o mesmo homem (Berilo/Bruno Gagliasso), descobriram ser tia e sobrinha.

Logo, os filhos das duas são, além de meio-irmãos, primos de segundo grau. E é melhor parar por aqui ou essa página vai ser pouco para listar os complexos parentescos.

Silvio de Abreu leva o antigo clichê folhetinesco de revelar um parentesco inesperado às penúltimas consequências -as últimas consequências seriam o incesto, grande tabu nas novelas.

‘Romances e relacionamentos complicados fazem parte do meu estilo’, diz o autor. ‘Ter os personagens muito próximos uns dos outros cria um clima de intimidade melhor para a história, além de ter um lado proibido, transgressor, que é fascinante tanto para quem escreve como para quem assiste.’

Abreu tempera a salada familiar com crimes (em ‘Passione’, dois já morreram e outros estão no alvo), inspirado em Agatha Christie.

Para esta novela, conta também ter sido influenciado por Tennessee Williams, Eugene O’Neal, Anton Tchekhov e Nelson Rodrigues.

‘Esses são os que melhor escrevem sobre relações familiares’, opina Abreu.

Autor de ‘Anjo Pornográfico’, biografia de Nelson Rodrigues, Ruy Castro lembra que uma de suas peças, ‘Álbum de Família’ (1945), ‘que era um festival de incesto, ficou 22 anos proibida’.

As famílias de ‘Passione’ são, como em Nelson Rodrigues, para lá de complicadas, com traição entre pais e filhos e avó cafetina de neta.

O novelista diz não querer retratar a realidade, nem ter em sua própria família alguma inspiração. ‘Prefiro a ficção, onde tudo é possível.’

Ele conta que na sinopse da novela todos os parentescos estavam definidos.

‘Improviso muito pouco ao longo da trama no que se refere às ligações entre os personagens. Sei exatamente quem é quem e suas relações de parentesco e, curiosamente, não tenho nada escrito ou pregado na parede para me orientar’, afirma.

Diferentemente do público, ele jura que, ‘graças a Deus’, nunca se confunde com as relações. Nos últimos capítulos, tem colocado diálogos explicativos de parentescos, como o de Gerson (Marcello Antony) com Sinval (Kayky Brito): ‘Sou seu tio e futuro sogro’ -Gerson, aliás, deve revelar no capítulo de amanhã o que de tão secreto faz no computador.

FALTA DE ATOR?

Abreu nega que todo mundo seja parente em ‘Passione’ porque a Globo hoje teria menos atores, com a concorrência da teledramaturgia da Record. ‘A minha novela tem menos personagens porque gosto de trabalhar assim.’

‘Passione’ tem 49 personagens. Já sua antecessora, ‘Viver a Vida’, da Manoel Carlos, que prefere elencos maiores, contava com 74.

 

Keila Jimenez

Record aproveita bolha de audiência de ‘A Fazenda’

Lá se vão dois meses no ar e toda a programação da Record colhe os frutos de ‘A Fazenda’, em uma curva de audiência que impressiona.

Segundo dados do Ibope, a média/dia de audiência da emissora (das 7 horas à meia-noite) subiu cerca de 14% desde que o reality de confinamento de famosos entrou no ar, em 28 de setembro.

Com links ao vivo de ‘A Fazenda’, intermináveis entrevistas com ex-participantes, máquinas da verdade, quase toda atração da emissora que tira sua casquinha do programa obteve crescimento de ibope em outubro.

O ‘Legendários’ é um dos casos impressionantes. Foi de 7 pontos em setembro para 10 pontos em outubro. (Cada ponte equivale a 60 mil domicílios na Grande SP).

‘Programa do Gugu’, que, antes do reality, mantinha média de dez pontos, chegou aos 12 pontos em outubro, investindo em lavação de roupa suja e brincadeiras com Monique Evans, Sergio Mallandro e outros eliminados de ‘A Fazenda’.

O ‘Hoje em Dia’ subiu de 5 pontos (setembro) para 6 pontos (outubro) e o ‘Tudo É Possível’, de 7 para 8 pontos.

O ‘Show do Tom’, com ‘O Curral’, paródia de ‘A Fazenda’, chegou a alcançar em novembro a liderança no horário, registrando média de 11 pontos de audiência. Em setembro, a média do humorístico era de 7 pontos.

A bolha de ibope do reality também levou a Record a ser a única emissora aberta a crescer em audiência e share (participação no total de televisores ligados) no mês passado. Foi da média/dia nacional de 6,7 pontos em outubro de 2009, para 7,5 pontos em outubro deste ano.

A pergunta que o mercado faz, com coro da concorrência é: ‘E quando essa bolha estourar, o reality acabar? Essa audiência vai ficar?’.

A Record aposta que sim. A Globo e seu ‘Big Brother’, que estreia em janeiro, não.

AUDIÊNCIA

24% RECORD CRESCEU À NOITE

Na faixa noturna (das 18h à meia-noite), com a exibição de ‘A Fazenda’, a Record aumentou sua audiência de 8,6 pontos (outubro de 2009) para 10,1 pontos (outubro deste ano). Na média/dia (das 7h à meia-noite), o crescimento de ibope no mês foi de 14% em relação à outubro do ano passado.

JAPA

Nova aposta da Globo, Camila Chiba, 24, estreia na TV como Hoshi, uma decasségui fã de mangás na próxima novela das 19h da emissora, ‘Dinossauros e Robôs’; a trama de Walcyr Carrasco terá cenas gravadas no Japão

 

Vanessa Barbara

A grama do vizinho

AQUI EM casa nós temos quatro: o primeiro é o controle remoto do DVD, com 31 botões e duas pilhas AAA. Depois tem o controle do Blu-ray, com 52 botões de quatro cores. Então, vem o da televisão, com 44 botões, e o dos canais a cabo, com 45 e um redondo chamado ‘agora’.

A televisão fica a apenas 1,78 m de distância do sofá e, ainda assim, quando um dos controles é perdido entre as almofadas, a única reação possível é desistir de tudo e ir dormir mais cedo.

O controle remoto extinguiu os botões giratórios na frente do aparelho, bem como os gritos para alguém na cozinha ir até a sala mudar de canal.

Aniquilou os cabos de vassoura, que serviam para aumentar e diminuir o volume à distância e eliminou a audiência por inércia: ninguém mais permanece num canal por preguiça de se levantar.

Acima de tudo, o controle remoto trouxe ao bojo da modernidade a incerteza, aquela incômoda sensação de haver algo, em algum lugar, mais interessante do que o que estamos assistindo.

Diante de uma oferta de 96 canais, é difícil contentar-se com ‘Super Petroleiros’ (NatGeo), quando em outra emissora pode haver ‘Le Haim’ (TV Aberta), ‘Eu Não Sabia que Estava Grávida’ (Discovery Home & Health) ou ‘The Walking Dead’ (Fox).

O controle remoto popularizou o verbo zapear e o costume de dar a volta na programação. Às vezes, o sujeito é impaciente e vai atropelando tudo, até que vislumbra algo de seu interesse. O problema é que, em geral, a cena já foi engolida por uns 20 canais e o mais fácil é dar a volta de novo.

A única pessoa que escapa a esse hábito tele-hiperativo é a minha mãe, que gosta de ‘dar uma chance’ para todo e qualquer curta-metragem indonésio em que um sujeito demora 15 minutos para atravessar o deserto enquanto entoa algum mantra.

E nem é preciso estar assistindo a algo mediano para ter vontade de espiar o que está passando alhures: é comum perdermos uma boa reprise de ‘Seinfeld’ (Sony) só por causa de uma coceirinha que nos faz dar toda a volta, passando por ‘Bonanza’ (TCM) e ‘Roda a Roda Jequiti’ (SBT), aterrissando, exaustos, no indefectível ‘Medalhão Persa’, um porto seguro para onde retornamos após longa e extenuante jornada.

 

JABUTI
Sérgio Machado

‘Garfaram’ a lógica

RESUMO

O editor da Record, Sérgio Machado, responde artigo de Luiz Schwarcz publicado na Ilustríssima de 21/11 a respeito da polêmica do Prêmio Jabuti de Ficção atribuído ao romance ‘Leite Derramado’, de Chico Buarque. Machado reitera os argumentos de sua carta à CBL e rebate os termos usados por Schwarcz em seu artigo.

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A Ilustríssima publicou há duas semanas uma reportagem que discutia as incongruências do Prêmio Jabuti e minha decisão, anunciada em carta aberta, de não mais inscrever os livros do Grupo Record na premiação por discordar dos critérios esdrúxulos de seu regulamento.

Pelos critérios do Jabuti, uma obra que, na avaliação de sua própria comissão julgadora, ficou em segundo lugar em seu gênero, pode conquistar a categoria Livro do Ano (de ficção ou não ficção) e ganhar o prêmio principal. Na matéria da Ilustríssima, a repórter Josélia Aguiar apurou e comparou regulamentos de vários prêmios internacionais: o leitor constatou que as regras do Jabuti não têm paralelo no mundo.

Clara em minha carta à Câmara Brasileira do Livro, minha decisão não entrava no mérito das obras agraciadas, somente questiona um regulamento que desconsidera o voto dos próprios especialistas contratados pela CBL, permitindo que outros critérios -não literários- prevaleçam. Disse também que, sendo a inscrição onerosa e voluntária, eu exerceria o meu direito de não compactuar com esses equívocos.

APOIO Fui gratamente surpreendido pela reação de apoio à carta. Recebi emocionadas manifestações de solidariedade de colegas editores e várias pessoas do mundo do livro, mas, naturalmente, foram as mensagens de meus próprios autores que mais me tocaram. Há muitos anos pensávamos em nos retirar do Jabuti, mas receávamos desapontar os escritores da casa.

Ao contrário, de Leonardo Boff e Luiz Alberto Moniz Bandeira a Demétrio Magnoli, Alberto Mussa, Lya Luft, Márcia Tiburi, Marina Colasanti, Marco Lucchesi, Cristovão Tezza e dezenas e dezenas de outros nomes importantes de nosso catálogo escreveram-nos lindas mensagens de apoio.

Durante o período que se seguiu à solenidade de premiação, em que até sites literários portugueses fizeram chacota do Jabuti, Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras, omitiu-se sobre o tema, para, na semana seguinte à matéria da Folha, vestir a carapuça e brindar os leitores da Ilustríssima com um raivoso artigo em que me acusou, entre outros ‘crimes’, de ‘tentar desqualificar’ o escritor Chico Buarque. Acusação falsa e leviana de quem quer tergiversar.

Eu disse que, como Chico não ganhou o prêmio de melhor romance, não deveria ganhar o Livro do Ano de Ficção, e acrescentei que a CBL transfere aos editores a incômoda tarefa de explicar esse truncado regulamento a autores que venceram pela avaliação do júri técnico, mas perderam na eleição do prêmio principal.

Não questionei a legalidade da premiação de Chico, nem de longe pensei em processos ou medidas do gênero para ‘melar’ o Jabuti deste ano. Disse apenas que, no futuro, com essas regras, não participarei mais, até porque ficaria constrangido se um autor meu levasse o prêmio de Livro do Ano sem ter sido considerado o melhor em sua categoria.

DESELEGÂNCIA Deselegante, Schwarcz acusou falsamente o escritor Edney Silvestre de manifestar uma justa sensação de ter sido lesado, o que ele jamais fez em público. Apesar de sentido, o vencedor da categoria de melhor romance de 2009 ficou calado.

Schwarcz ainda aproveitou o espaço para intrigar a mim e à diretora editorial do Grupo Record, Luciana Villas Boas, mera testemunha da entrevista, com os livreiros, como se houvéssemos dito que eles não têm competência para escolher o título a ser premiado. Eu disse simplesmente que os jurados do Livro do Ano não têm tempo de ler as obras concorrentes.

Por fim, o editor da Companhia fabulou uma conspiração com o jornalista Reinaldo Azevedo, baseado no fato de ter sido ele o primeiro a apontar em seu blog a incongruência do Jabuti. Teria sido bem melhor para Schwarcz se ele houvesse preservado a atitude olímpica que sempre buscou projetar. Com esse artigo infeliz, caiu do pedestal.

Para usar uma expressão consagrada nesta polêmica, ‘garfou’ a lógica, a verdade factual e, em algum momento, até a gramática. Diversionista, não contemplou a estranheza de, em um prêmio, o segundo lugar ganhar do primeiro. Mas, vendo que os escritores perceberam que eu estava do lado deles quando defendia critérios de mérito nas premiações literárias, Schwarcz passou da defesa ao ataque e me comparou com os políticos.

Acusou-me de autoritarismo por exercer meu direito de não participar de um prêmio com um regulamento incongruente. Cúmulo do delírio, ele fez uma analogia com o presidente Lula e disse que minha atitude é ‘mais um capítulo da história política brasileira recente quando candidatos […] desmerecem adversários políticos que os antecederam, mas cujas realizações possibilitaram o sucesso econômico e político do país nos últimos anos’.

Essa comparação poderia até me deixar envaidecido, mas como não me sinto merecedor, vou dispensar.

REFORMULAÇÃO Há muito tempo editores e escritores fazem críticas sobre a condução do Jabuti aos representantes da CBL. O professor Moniz Bandeira, querido autor do Grupo Record, conta a quem queira ouvir que toda Feira de Frankfurt ele diz ao pessoal da Câmara que o Jabuti precisa ser reformado com urgência, sob o risco de perder seu significado e prestígio. Nossa decisão de sair do prêmio era a única maneira de deslanchar esse processo de reformulação.

Finalmente, quero deixar claro que não vou participar da discussão das novas regras. Seria uma interferência incabível por parte de um editor. Fui apenas o menino da fábula que gritou que o rei está nu. Não quero ser alfaiate de trajes reais, deixo isso para os encarregados de organizar a premiação. Não percebe Schwarcz que a atitude que tomei prima pela transparência e lisura. Tenho mais a fazer do que discutir remuneração de jurados ou custos de festas, como propõe ele, para desviar o foco do debate.

‘Ouve o que eu tenho a te dizer.’ -São os escritores os concorrentes aos prêmios e, portanto, os únicos vencedores do certame. Não sou papagaio de pirata e não costumo subir ao palco para dividir a atenção com meus autores. Já publicamos muitos livros que ganharam o Livro do Ano, o Prêmio São Paulo e até o Nobel.

Se os nossos autores não ganharam neste ano, outros autores do nosso catálogo poderão ganhar no próximo. Mas quem concorreu em desigualdade nas últimas edições talvez não tenha outra chance. Contra essa iniquidade, eu me manifestei.

São princípios como esse que, com muito orgulho, transformaram a Record no maior grupo editorial do Brasil.

O editor da Companhia fabulou uma conspiração com o jornalista Reinaldo Azevedo, baseado no fato de ter sido ele o primeiro a apontar a incongruência do Jabuti. Teria sido bem melhor para Schwarcz se ele houvesse preservado a atitude olímpica que sempre buscou projetar. Com esse artigo infeliz, caiu do pedestal

São os escritores os concorrentes aos prêmios e os únicos vencedores do certame. Não sou papagaio de pirata e não costumo subir ao palco para dividir a atenção com meus autores

 

Edney Silvestre

Somos o elo mais fraco neste mercado hostil

Sou essencialmente um jornalista enveredando pelos caminhos da literatura.

Escrevo porque gosto de contar histórias que, imagino, interessem às outras pessoas.

A aceitação que busco, mesmo, é a dos leitores.

Não fiz -nem me caberia- nenhum comentário público sobre a polêmica do Jabuti -que, registremos, deu a meu romance de estreia o primeiro lugar na categoria, para minha alegria.

Por isso mesmo, só posso lamentar que, numa discussão em nome de ética, respeito, delicadeza e cultura, seja gratuitamente atacado por um dono de uma poderosa editora ‘concorrente’, que bem sabe que nós autores -ainda mais iniciantes- somos o elo mais fraco neste mercado surpreendentemente tão hostil.

 

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