Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Graça Magalhães-Rüether


‘Mostrar Hitler como um ser humano normal é moralmente correto? Esta foi a pergunta polêmica que acompanhou o lançamento do filme ‘A queda! As últimas horas de Hitler’, ano passado, na Alemanha. Primeira superprodução alemã sobre o tema que, ainda hoje, 60 anos após a capitulação e morte do ditador, causa sentimento de culpa nas gerações mais velhas, o filme é, segundo o diretor Oliver Hirschbiegel, uma tentativa de compreender o passado e os mecanismos que tornaram a ditadura nazista possível.


– Com base nos fatos históricos, tentamos mostrar como eram essas figuras reais, como pessoas como Hitler, Göebbels ou Himmler pensavam. Ou seja, ocupamos o nosso tempo com pessoas com quem, até mesmo nos piores sonhos, não gostaríamos de ter qualquer relação – diz Hirschbiegel.


‘Precisava tomar banho depois de horas com Hitler’


Por esse motivo, decifrar o enigma Adolf Hitler não foi uma tarefa fácil, em especial no plano emocional, como admite o diretor.


– Depois de dedicar-se por horas à mente de uma pessoa que tentou implantar um regime de guerra sem fim contra o mundo inteiro, eu precisava tomar um banho – diz ele. – Tinha que buscar uma compensação para este encontro com o Mal ouvindo Bach.


Até hoje, nenhum filme alemão tinha ousado ir tão longe na abordagem do tema. No imediato pós-guerra, a população da parte ocidental do país dividido procurou esquecer de tudo, como afirmou a psicanalista Margaret Micherlich no livro ‘A incapacidade para o luto’. Mais tarde, o assunto passou a ser abordado historicamente, mas de maneira objetiva e sem muitas discussões. Na Alemanha comunista, no entanto, discutia-se o nazismo como parte da educação antifascista.


– Na escola, aprendíamos os fatos sobre a ditadura nazista, e o assunto era encerrado. Nós ouvíamos que foi um erro, que nunca mais poderia ser repetido. Mas não havia uma discussão que tornasse possível compreender o que aconteceu, como foi possível que acontecesse – lembra Hirschbiegel, que antes de fazer cinema estudou arte.


Segundo o produtor e roteirista Bernd Eichinger, a discussão sobre Hitler ter sido um ser humano ou um monstro é acadêmica. Como disse em entrevista recente, ‘ele tem que ser interpretado como um ser humano, mas, depois de estudá-lo, eu diria que se trata do personagem mais singular e destrutivo de toda a História mundial’.


– Eu não quero ensinar ao público o que foi a ditadura nazista. Quero tocar o público – continua Eichinger.


Oliver Hirschbiegel acrescenta que o filme não quer fazer uma avaliação moral sobre quem foi Hitler, mas mostrar, através dos seus últimos dias no bunker em Berlim, como foi o fim da ditadura.


– O que tentamos fazer foi, pela primeira vez, mostrar tudo do lado de dentro sem avaliar como foi – diz ele, enumerando diversos questionamentos sobre os fatos daqueles dias. – Quais foram os mecanismos? Como essas pessoas viviam? O que pensavam? O que sentiam? Como tudo o que aconteceu foi possível? Como era o centro do poder?


Bruno Ganz procurou evitar simpatia por Hitler


O veterano ator suíço Bruno Ganz, que vive Hitler, confessa que, depois de terminar o trabalho, teve medo de ser confundido na rua com o ditador ou de ser chamado assim. Ele diz que só é possível interpretar bem uma pessoa ‘sentindo-se como ela’, mas lembra que não procurou despertar simpatia por Hitler.


– O diretor me disse que tinha que procurar descobrir o Mal em mim. Se eu não conseguisse compreender o que é o Mal e o demoníaco, então não teria conseguido interpretar Hitler — afirma Ganz, que fez um dos melhores trabalhos da sua carreira, tão perfeito que foi acusado de ‘humanizar demais’ a figura de Hitler.


O resultado do trabalho foi surpreendente. Por ocasião do lançamento do filme na Alemanha, em setembro de 2004, os jornais e canais de televisão divulgaram durante várias semanas amplas reportagens sobre os últimos dias de Hitler.


Para Frank Schirmacher, o editor do jornal ‘Frankfurter Allgemeine’, o que Eichinger conseguiu com seu roteiro foi, pela primeira vez, recriar a figura de Hitler num contexto adequado. O filme se baseia na documentação de fatos históricos feita pelo jornalista e historiador Joachim Fest em seu livro ‘Der Untergang’ (também título original do filme), sobre o fim do ‘Império de Mil Anos’ (como o próprio Hitler chamava o seu regime), e nas recordações da secretária Traundl Junger, que, pouco antes de morrer, em 2002, escreveu as suas memórias com a ajuda da jornalista Melissa Müller.


Clima pesado na morte dos filhos de Göebbels


O clima que existia no bunker foi tão bem reproduzido que os atores e o diretor chegaram a chorar na cena do assassinato dos seis filhos de Magda e Joseph Göebbels.


– Era um pesadelo. E havia ainda nesse bunker as crianças e a Sra. Göebbels, que andava como um fantasma, carregando veneno na bolsa. A mais velha, Helga, já tinha 10 anos de idade. Ela tinha olhos tão tristes. Era tão quieta. Eu tinha a impressão de que essa criança tinha de alguma forma uma idéia do que aconteceria. Era terrível – diz Traundl Junger, nas suas memórias.


Hirschbiegel lembra como a cena do assassinato dos filhos de Göebbels foi a parte mais difícil da rodagem do filme:


– A cena em que Corinna Harfouch, no papel de Magda Göebbels, assassina os seus proprios filhos foi terrível. Nós precisamos interromper as filmagens por vezes.


Rochus Misch, que trabalhou como telefonista particular de Hitler até os últimos dias de vida do ditador, considerou o filme exagerado.


– Todo mundo falava muito baixo, de forma sussurrada. No bunker , até Hitler não falava tão alto como é mostrado no filme. O único que falava mais alto, ao telefone, era eu – diz Misch, último sobrevivente das várias pessoas que estiveram com o ditador no bunker nos últimos dias.’



EUA / PIRATARIA


O Globo


‘Liberdade para gravar’, copyright O Globo, 7/05/05


‘A Justiça assegurou aos americanos o direito de gravar um programa na televisão. A Corte de Apelações do Distrito de Columbia suspendeu ontem uma nova legislação da Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês) que exigia de eletroeletrônicos um dispositivo antipirataria. Isso impediria que alguém gravasse um programa de TV para assisti-lo depois.


Um painel de três juízes concluiu que a FCC excedeu sua autoridade ao exigir que aparelhos de televisão digitais e outros eletroeletrônicos vendidos a partir de 1 de julho incluíssem um dispositivo antipirataria.


A regra da FCC gerou protestos de grupos de consumidores, incluindo associações de bibliotecas. Seus advogados argumentaram que a exigência iria elevar os preços dos aparelhos digitais e impedir os consumidores de gravarem, em videocassete ou DVD, programas em casos permitidos pela lei.


A tecnologia, chamada de etiqueta de transmissão, permite às redes de televisão que usarem o sistema digital ‘etiquetar’ determinados programas para impedir que eles sejam gravados pelos telespectadores ou distribuídos pela internet. As empresas do setor dizem que esse dispositivo é necessário para evitar a pirataria.


A FCC admitiu que nunca usou de sua autoridade para regulamentar a forma de transmissão dos programas, mas argumentou que não há, na legislação, proibição expressa para que o faça. O argumento foi rejeitado pelos juízes.


Em uma das audiências, o juiz Harry Edwards disse que a FCC havia ‘passado dos limites’ e perguntou se o próximo passo seria tentar regulamentar aparelhos domésticos:


– As máquinas de lavar são as próximas?’



FSP CONTESTADA


Painel do Leitor, FSP


‘Emprego’, copyright Folha de S. Paulo, 7/05/05


‘‘A interpretação da Folha de que o governo esvazia o Programa Primeiro Emprego, publicada em 5/5 na Primeira Página, não condiz com a realidade. 1) O Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego (PNPE) continua a ser prioridade do governo federal. 2) O programa tem várias ações para inserir os jovens no mercado de trabalho. A de qualificação e inserção por meio dos Consórcios Sociais da Juventude revelou-se até agora a mais eficiente. Por isso está sendo estimulada e ampliada. 3) O que poderia caracterizar um esvaziamento do programa seria a redução de recursos para o PNPE, o que não aconteceu. 4) Toda a demanda pelo incentivo financeiro à contratação de jovens por R$ 1.500 por ano a cada vaga criada será atendida. 5) Não há dificuldade de aferição dos resultados dos consórcios, que têm inserido no mercado de trabalho mais de 30% dos jovens que qualificam. O índice é inédito entre iniciativas de intermediação de mão-de-obra. 6) As vagas obtidas pelos consórcios podem se realizar por meio da subvenção econômica, uma evidência de que o incentivo financeiro continua. 7) Todas as demais ações do PNPE continuam a ser executadas, como o Soldado Cidadão, o Serviço Civil Voluntário, agora chamado Juventude Cidadã, o Menor Aprendiz, a contratação por meio da Responsabilidade Social e o Empreendedorismo Jovem. 8) A ênfase na qualificação deve-se ao reconhecimento de que o público do PNPE, de baixa renda e de baixa escolaridade, encontra melhores oportunidades ao capacitar-se especialmente com a metodologia dos consórcios. 9) As ações de qualificação de jovens no ano passado beneficiaram 200 mil jovens de 16 a 24 anos -e 104 mil foram empregados por meio do Sistema Nacional de Emprego (Sine). 10) O jornal insiste em reafirmar erro cometido anteriormente de que apenas um jovem da Bahia estava contratado em março do ano passado. A primeira contratação foi feita em Goiânia, em 17 de novembro de 2003, por meio do Sine local. O número de contratados, à época, era de aproximadamente 500 jovens.’ Myrian Luiz Alves, assessora especial do Ministério do Trabalho e Emprego (Brasília, DF)


Resposta da jornalista Marta Salomon – As contratações subsidiadas de jovens eram a inovação do programa e ainda são a linha do Primeiro Emprego na qual o Orçamento autoriza mais gastos. Há outros programas de qualificação no governo, tanto que a nota contabiliza a qualificação de 200 mil jovens no ano passado, período em que o Primeiro Emprego teria qualificado 6.800 jovens. A reportagem anterior usou dados do Tesouro Nacional.


Abin


‘A Folha utiliza novamente a Abin para tentar atingir o governo Lula, confundindo atividade de Estado com ações governamentais, desta vez através do articulista Janio de Freitas (‘Perigos do complexo’, Brasil, 5/5). Se tivesse pesquisado melhor, o referido jornalista não teria oferecido informação incorreta aos leitores. O projeto de crescimento da agência antecede o governo Lula e existe desde a criação da Abin, em 1999. Além disso, as prioridades da agência estão vinculadas a interesses do país, e não a demandas pontuais. Os freqüentes ataques e ofensas gratuitas à Abin demonstram, em realidade, outros ‘perigos do complexo’, ou seja, aqueles gerados por determinado tipo de jornalismo que avoca para si a condição de ‘dono da verdade absoluta’.’ Mauro Marcelo de Lima e Silva, diretor-geral da Abin -Agência Brasileira de Inteligência (Brasília, DF)


Resposta do jornalista Janio de Freitas – O artigo não fez menção nenhuma à origem de ‘projeto de crescimento’ nem isso viria ao caso. O artigo refere-se a planos expostos como atuais, em depoimento do missivista ao Congresso, na terça-feira, para aplicação a partir de agora. Além disso, sua agressividade é injustificada, prepotente e tola.


Rio x Guanabara


‘Em resposta ao senhor Demétrio Magnoli, que me citou na sua coluna semanal da última quinta-feira (‘Forte apache Rio’, Opinião), gostaria que, após este seu rompante de indignação com o movimento Rio Cidade-Estado, refletisse um pouco mais e usasse a razão -porque me parece ser uma pessoa inteligente- em vez de usar o fígado. Em primeiro lugar, gostaria de saber onde ele foi buscar que eu almejo um governador carioca com poder policial para controlar as entradas e saídas da cidade, frase que colocou entre aspas como sinal de que teriam sido proferidas por mim. Isso é incorreto. Ele também não deve sustentar seus argumentos atrelados ao CEP (código de endereçamento postal) de quem ele ataca, pois poderá ficar surpreso ao ver que há pessoas da Tijuca, do Méier, de Niterói e de Caxias engajadas no resgate de nossa identidade cultural. Se também ele está preocupado com a questão da pobreza no Brasil, razão final que nos mobiliza a todos, é importante ter em mente que razões superficiais não eliminarão a pobreza. Pelo contrário, elas a ampliarão, como tem ocorrido nos 30 anos da fusão. Como disse Roberto Da Matta, antropólogo, em ‘O Globo’ de 4/5, temos de ir em busca das razões mais profundas para explicar a tremenda disfunção dos poderes públicos no Rio de Janeiro, que já foi capital do Império, Distrito Federal, Estado federado e hoje é simples município. Enquanto isso, Brasília, paradoxalmente, é uma cidade-Estado. Aliás, é lá que está o chamado forte apache.’ Paulo Rabello de Castro, economista (São Paulo, SP)


Resposta do colunista Demétrio Magnoli – O missivista pode consultar a entrevista que concedeu a esta Folha (publicada em 3/4) na qual está a frase que nega ter proferido.’