Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Ian James

‘O estúdio da rádio se enche de aplausos quando o apresentador fala das dezenas de milhares de equatorianos que lotaram as ruas de Quito em protesto contra o governo, resistindo às nuvens de gás lacrimogêneo e terminando por forçar Lucio Gutiérrez a deixar a presidência.

‘Um minuto de aplauso. Para quem? Para vocês’, disse o chefe do programa, Luiz Pozo, aos ouvintes na quinta-feira. ‘Em oito dias de protestos, conseguimos nos livrar de Lúcio Gutiérrez!’

Sua rádio alternativa, a La Luna 99,3 FM, exerceu papel-chave na cristalização da desilusão pública com Gutiérrez, injetando ânimo nas manifestações populares que acabaram por derrubar o governo do presidente equatoriano.

Quando o ex-coronel do Exército foi eleito, em 2002, prometendo combater a corrupção e ajudar os pobres, a rádio num primeiro momento o apoiou. Mas sua direção, de tendência esquerdista, acabou por rejeitar Gutiérrez quando avaliou que ele estava assumindo poderes ditatoriais, ignorando a corrupção e descumprindo suas promessas.

A queda de Gutiérrez levou meses para ser completada. Uma semana atrás ele dissolveu a Suprema Corte, o que acabou por suscitar protestos maiores, que, na quarta-feira, terminaram com a decisão da destituição do presidente tomada pelo Congresso.

Enquanto Gutiérrez solicitava asilo político ao Brasil, ouvintes da La Luna telefonavam para parabenizar a rádio. Nas últimas semanas, seus comentaristas pediam a destituição do presidente e abriam as linhas telefônicas a ouvintes irados, para quem as manifestações eram a única saída.

A La Luna promoveu manifestações com temas que mudavam a cada noite. Uma noite os manifestantes batiam em panelas, na noite seguinte estouravam balões nas ruas, em outra noite atiravam papel higiênico. Os protestos receberam apoio total do diretor da rádio, Paco Velasco, que tachou Gutiérrez de traidor e ditador e previu a queda do governo.

A causa atraiu uma larga gama de defensores, desde aposentados até donas-de-casa acompanhadas de seus filhos, todos os quais foram às ruas protestar. Os levantes passados no Equador normalmente foram liderados por sindicalistas, estudantes ou grupos indígenas. ‘Pela primeira vez no Equador ocorreram protestos sem lideranças’, disse Pozo. ‘Foi a revolta do povo contra todos os políticos tradicionais.’

Paco Velasco, ex-professor universitário de 46 anos, conta que pagou um preço pessoal alto por tudo isso: ele e sua família já receberam várias ameaças de morte. Ele escondeu sua família e passou a dormir na própria rádio ou em casas de amigos. ‘Estes últimos oito dias têm sido difíceis’, disse.

Na sexta-feira passada, dezenas de partidários do governo invadiram a rádio carregando tochas acesas e gritando insultos que acabaram por provocar uma briga. Ninguém se feriu. Mas, os funcionários da estação começaram a observar interferências no sinal da rádio. Pozo acredita que as Forças Armadas estariam tentando interromper as transmissões da rádio. A energia elétrica da transmissora foi cortada sem explicações, mas a estação não parou de transmitir.

Os partidários do governo acusaram a La Luna de instigar a violência. Mas os defensores da rádio afirmam que os protestos promovidos pela rádio foram cruciais para a destituição de Gutiérrez.

Os diretores da La Luna dizem que a estação é financiada pelos anúncios e que conserva sua independência. Anos atrás, Velasco a usou para ajudar a liderar a oposição a outro presidente, Abdala Bucaram, que foi acusado de corrupção e destituído pelo Congresso, em 1997, por ‘incapacidade mental’.

Na quarta-feira, quando Gutiérrez foi removido, centenas de pessoas se reuniram diante da rádio. Dentro da estação, dezenas se abraçaram e cantaram o hino nacional. ‘Quando Lucio foi derrubado, eu chorei’, disse Pozo. Tradução de Clara Allain’

CASO JACKSON

Sérgio Dávila

‘Jackson é condenado (ao descaso da mídia)’, copyright Folha de S. Paulo, 24/04/05

‘Era para ser o ‘Julgamento do Século’, uma espécie de ‘O.J. Simpson – Parte 2’ dez anos depois, mas, por enquanto, o caso do cantor Michael Jackson na corte de Santa Maria, na Califórnia, ainda não ‘aconteceu’. Um dos sinais evidentes é a quantidade de caminhões-satélite no estacionamento do complexo judiciário, que pela primeira vez apresenta vagas. Outro é o pequeno número de repórteres na fila das 6h, em busca de credenciais para aquele dia. ‘Sim, houve uma pequena queda no número de jornalistas’, disse Peter Shaplen, coordenador de mídia do tribunal. ‘Mas acredito ser sazonal.’

Não há apenas uma razão que explique o desinteresse, mas uma conjunção de fatores, segundo pessoas ouvidas pela Folha.

Primeiro porque, diferentemente do caso do jogador de futebol americano acusado de matar sua mulher e o amante em 1995, o juiz Rodney Melville não permitiu a presença de câmeras em Santa Maria. Assim, as grandes emissoras da TV aberta norte-americana perderam parte importante do que podem oferecer ao público e diminuíram as entradas diárias, hoje relegadas aos canais noticiosos ou de celebridades da TV paga, como o E!, que faz reencenações com atores 24 horas depois.

Em seguida porque, apesar de Jackson ter nascido negro, seu caso não tem o racismo como pano de fundo, como tinha o de O.J. Simpson, que aconteceu no mesmo momento histórico em que a população se indignava com a fita de Rodney King sendo espancado pela polícia de Los Angeles.

Por fim, e talvez mais importante, porque o assunto do julgamento, o suposto abuso sexual de um menor, é considerado tabu pelo consumidor da indústria de celebridades, e o mundo de Jackson, como mostrado pela promotoria desde fevereiro, seria ‘esquisito’ demais para o americano médio.

Só nas últimas semanas, entre as testemunhas trazidas por Tom Sneddon, que representa o condado de Santa Barbara e comanda a acusação, há o ex-empregado que hoje dirige um site pornográfico e vende fitas em que ele próprio aparece fazendo sexo. Há o ex-segurança que não pôde testemunhar por ter sido preso em Las Vegas durante o julgamento, acusado de ser o autor de uma série de assaltos na cidade. Há ainda a ex-empregada doméstica que descreveu as vezes em que ia limpar o quarto do músico pela manhã no rancho Neverland e encontrava as paredes empestadas com fezes dos macacos que ele mantém em seu zôo privado…

‘É grotesco’, disse Jonathan Klein, presidente da divisão norte-americana da CNN. ‘Chega um pouco perto demais do lado podre ao mostrar a carne viva do mundo das celebridades.’ Para ele, colabora o fato de não haver o escapismo e a obsessão diária que as transmissões ao vivo de TV proporcionavam nos tempos de O.J. Simpson -embora, ressalte, também nesse haja bons momentos midiáticos, ‘como a chegada de Jackson de pijamas à corte’.

‘Não vejo o mesmo frenesi na Califórnia que computei durante o julgamento de Scott Peterson’, quando o assunto ganhou mais espaço no noticiário do que, por exemplo, a Guerra do Iraque, disse John McManus, diretor da ONG Grade the News (avalie o noticiário, em inglês), referindo-se ao caso do vendedor do Vale do Silício condenado à morte em dezembro pelo assassinato da mulher, grávida de nove meses.

O acadêmico, que comanda um dos mais renomados grupos de quantificação crítica da mídia, ainda não revela números, assim como o Instituto Poynter, que também examina o caso.

Uma compilação realizada pela Folha, no entanto, corrobora a tese de McManus. Na comparação informal entre três casos que mobilizaram a mídia americana nos últimos meses, o de Jackson não se sai melhor do que o suicídio assistido de Terri Schiavo e do que o julgamento de Peterson em nenhum de três dos principais veículos dos EUA: o jornal diário ‘The New York Times’ (o segundo de notícias gerais em vendas no país), a revista semanal ‘Time’ (a líder do segmento) e a revista ‘People’ (a mais bem-sucedida e respeitada entre as publicações do jornalismo de celebridades).

Os primeiros 80 dias do julgamento do músico, da escolha do júri, que começou em 31 de janeiro, à última quarta-feira, mereceram 120 textos do jornal, ante 159 para Schiavo nos 80 dias que antecederam sua morte na Flórida, em 31 de março, e 34 para Peterson no mesmo número de dias que antecederam sua condenação, em 13 de dezembro de 2004. Na revista de informação, Jackson e Schiavo empatam, com 14 referências. Na ‘People’, contudo, Peterson é citado cinco vezes mais do que o autor de ‘Thriller’.

A semanal de celebridades é um bom parâmetro. Nos últimos seis meses, a ‘People’ dedicou cinco capas a Peterson e só uma a Jackson, logo depois do indiciamento. ‘E mesmo esta não vendeu bem’, afirmou o secretário-assistente de Redação Larry Hackett. ‘Isso nos diz que o público não se interessa pelo caso ou se cansou dele, uma vez que vem ouvindo o mesmo tipo de acusação contra Michael Jackson há 12 anos.’

Tudo pode mudar em duas semanas, no entanto. A partir de amanhã, a promotoria promete encerrar sua lista de testemunhas, que culminou na semana passada com a mãe da suposta vítima, e findar a exposição do caso. Assim, na semana que vem, será a vez de a defesa chamar as testemunhas.

Segundo a lista que o advogado Tom Mesereau leu para os jurados em fevereiro passado, as pessoas que podem aparecer na pequena corte de Santa Maria constituem um verdadeiro ‘quem é quem’ do showbiz -ou um show de horrores e vaidades, dependendo da maquiagem e do figurino do dia.

Vão do ex-ator-mirim Macaulay Culkin, que é amigo do músico, às atrizes Lisa Minnelli e Elizabeth Taylor, passando pelo apresentador de televisão Jay Leno, que testemunharia que os pais da suposta vítima teriam tentado tirar dinheiro dele também, e até o artista plástico brasileiro Romero Britto, que já esteve em Neverland. Resta saber se o argumento da defesa será mais bem construído do que o da promotoria, por enquanto com algumas falhas. Se condenado, Jackson, 46, pode ficar até 20 anos na cadeia. Ele nega as acusações.’

 

WSJ


Mario Lima Cavalcanti

‘WSJ.com já dá mais dinheiro que o impresso’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 20/04/05

‘Essa semana me deparei com uma notícia um tanto quanto curiosa: a edição online do Wall Street Journal, um dos jornais mais tradicionais dos Estados Unidos, passou a dar mais lucro que a impressa. O ocorrido foi noticiado em alguns grandes jornais norte-americanos, como o New York Post. Mas quais teriam sido as causas de tal ascensão?

Antes, vale mencionar que a intenção do artigo não é apontar a melhor ou a mais lucrativa mídia, mas simplesmente abordar um fato que antes poucos viam como possível e hoje é real (versão virtual lucrando mais que a tradicional), e humildemente filosofar sobre as possíveis causas dessa conseqüência.

A edição virtual do Wall Street Journal, vulgarmente WSJ.com, já vinha gerando lucro há um bom tempo. Isso alimenta a fogueira do conteúdo na Internet e pode vir a animar os mais otimistas, achando que a profecia do conteúdo fechado e pago gerando altos lucros é verdadeira. Mas a verdade é que alguns fatores contribuíram para tal crescimento financeiro e de posicionamento, o que poderíamos encarar nesse primeiro momento como um caso a parte.

Segundo dados publicados no New York Post, o tradicional Wall Street Journal já vinha caminhando com dificuldades, com sua taxa de crescimento mais baixa que a de qualquer outro veículo no setor e tendo problemas com investidores e anunciantes. O WSJ.com, por sua vez, conta com uma base de cerca de 731 mil assinantes. É nesse momento que temos que ficar com o pé no chão. O New York Post publica afirmações de ex-leitores da impressa que decidiram migrar para a online somente pelo fato do preço da assinatura ser muito mais barata (USD$ 84 ao ano da virtual contra USD$ 356 ao ano da tradicional).

Mesmo com tal diferença no preço da assinatura anual, temos ainda o público-alvo como fator positivo para o caçula da edição impressa. Leitores, à primeira vista, financeiramente equilibrados, para os quais conteúdo pago – um fantasma na opinião de muitos internautas – não representa nenhuma ameaça.

Aliás, dois centavos sobre possibilidades de ascensão do conteúdo pago, sejamos pé no chão: a verdade é que nos acostumamos com conteúdo gratuito na Internet. Inclusive muitos acham, mesmo sem fundamento, que na Internet não se pode ou não se deve cobrar. Mas não é impossível imaginar que daqui a alguns anos ou décadas pagar por serviços online, inclusive noticiosos, seja algo natural. E a verdade é que se o poder midiático e a maioria dos conglomerados de mídia inventarem de cobrar por seu conteúdo, com estratégias bem costuradas, assim será. E será assim, bom para os alternativos.

Simplificando e resumindo, possíveis fatores para o bom posicionamento do WSJ.com: o preço mais barato; o público-alvo; o dinamismo que a Internet permite e os problemas, esperamos que temporários, da versão impressa. Um caso a parte. Mas bem que o Chaparro disse (aqui) que o reino hegemônico dos jornais tradicionais acabou. Até a próxima!

Em tempo:

Qual sua opinião sobre conteúdo pago na Internet? O que achou da ascensão da versão online do Wall Street Journal? Queremos saber sua opinião. Utilize o formulário abaixo e deixe sua participação registrada.’