Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Isabelle Moreira Lima

‘Depois de mais de um mês de silêncio, a discussão sobre a Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual) foi reacesa na noite de anteontem. Segundo o secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, Orlando Senna, a agência deve começar a exercer suas novas funções -agora apenas fomentar e fiscalizar a produção audiovisual do Brasil- até o fim do ano. Enquanto o projeto da agência passa por adaptações, o marco regulatório (lei geral) da agência, segundo Senna, também está sendo trabalhado.

‘A decisão do presidente Lula é que as duas coisas sejam feitas ao mesmo tempo, e não uma depois da outra. A lei está sendo trabalhada agora para que seja apresentada ao crivo da opinião pública’, explicou o secretário durante debate com o cineasta Toni Venturi e o pesquisador do Centro Cultural Banco do Brasil André Gatti. O evento integra a Bienal da UNE (União Nacional dos Estudantes), que termina hoje, no Pavilhão da Bienal, no parque Ibirapuera, em São Paulo.

Senna responsabilizou a Rede Globo pelo atraso em torno da criação da Ancinav. ‘A Globo tentou, através de acusações incríveis, dizer que a Ancinav era uma ameaça para o futuro da liberdade de expressão. Na verdade, era para que se evitasse a discussão, para demonizar a agência. ‘Isso aqui é ditatorial, então é melhor nem discutir.’ Foi uma coisa falaciosa que atrapalhou bastante essa polêmica [o projeto].’

O secretário disse que a TV não aceita a regulação do setor ao qual pertence, mas que insiste pela regulação de empresas telefônicas. ‘O que ela [a Globo] disse foi ‘vamos botar isso [a regulação] mais para frente, porque nós temos que nos adequar aos novos tempos’. Ou seja, a Globo quer, antes da regulação, que ela seja também uma tele ou que se associe a uma tele.’ Senna afirmou que a Globo teme que empresas de telecomunicações passem a atuar na criação de conteúdos.

Em nota à Folha, o diretor da Central Globo de Comunicação, Luis Erlanger, afirmou: ‘Assim como muitos outros setores relevantes, a TV Globo vem defendendo publicamente um debate pela preservação da cultura brasileira, uma questão absolutamente estratégica para o país. Mas a decisão de buscar um caminho mais democrático neste processo coube exclusivamente à decisão pessoal do presidente da República’.’



Patrícia Villalba

‘UNE encerra Bienal com ato pela Ancinav’, copyright O Estado de S. Paulo, 3/03/05

‘Ao som de Soy Loco Por Ti, América, cantada pelo seu próprio autor, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, os estudantes que participaram da 4.ª Bienal de Arte e Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE) manifestaram amplo apoio à criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav). Depois do discurso de Gil, na presença de Aleida Guevara, filha de Che Guevara, os estudantes partiram para uma passeata pela Avenida Paulista.

O projeto da agência reguladora foi discutido na Bienal da UNE, que começou sexta-feira e terminou ontem. ‘Em geral, o tema da passeata é políticas públicas para a Cultura, é quando a UNE torna públicas as suas demandas. A Ancinav foi muito debatida’, disse o coordenador da Bienal, Tiago Alves. ‘A criação de uma agência reguladora do audiovisual é urgente.’

Gil fez um show-discurso. Ele falou a respeito da integração cultural da América Latina – tema da Bienal -, e, além de Soy Loco por Ti, cantou Punk da Periferia.’



Elvira Lobato

‘Lula reabre debate sobre lei das comunicações’, copyright Folha de S. Paulo, 6/03/05

‘O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai reabrir o debate, iniciado no governo Fernando Henrique Cardoso, sobre a legislação dos meios de comunicação. Segundo informação da Casa Civil, já está com o presidente a minuta do decreto que cria o grupo interministerial para redigir o anteprojeto da lei de comunicação eletrônica de massa. A legislação de radiodifusão é de 1962.

Caberá à Casa Civil coordenar o grupo de trabalho, segundo informou à Folha o assessor especial para políticas públicas de comunicação do ministro José Dirceu, André Barbosa Filho.

Para evitar que o projeto tenha destino semelhante ao de criação de Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual), que pretendia regulamentar a produção do setor e naufragou sob um bombardeio de críticas, o grupo terá um conselho consultivo com representantes de todos os segmentos afetados.

‘O objetivo é construir o texto o com a sociedade. Aprendemos com os erros cometidos pelo governo anterior e pelo atual. O projeto da Ancinav foi uma experiência riquíssima, e o presidente pediu que aproveitássemos toda a quilometragem acumulada’, disse o assessor.

O governo avalia que o principal desafio da nova lei é regulamentar as chamadas novas mídias, nascidas da convergência entre a telefonia e a radiodifusão. O tema é considerado árduo porque a tecnologia está em evolução e vem despertando grandes conflitos de interesses.

Há resistência das emissoras de televisão em aceitar que as redes de infra-estrutura de telecomunicações -que foram privatizadas sem limitação à participação do capital estrangeiro- ocupem espaço na produção de conteúdo de informação e entretenimento.

Uma evidência desse conflito é o projeto de emenda constitucional apresentado em novembro do ano passado pelo senador Maguito Vilela (PMDB-GO) para nova mudança no artigo 222 da Constituição Federal, que limita em 30% a participação de capital estrangeiro nas emissoras de rádio e televisão.

O projeto do senador goiano estende a exigência de controle nacional aos provedores de acesso à internet e a todas as empresas de produção e de programação de conteúdo, por qualquer meio de distribuição, como fibras óticas, satélite, sistemas de cabos e de microondas.

Segundo o assessor da Casa Civil, o governo não tem proposta preconcebida nesse campo, mas avalia que será preciso discutir pontos historicamente polêmicos, como a propriedade cruzada de meios de comunicação e a concentração de mercado.

Um dos pontos em pauta será o estabelecimento de limites de concentração no mercado de TV paga com transmissão via satélite. Com a fusão da Sky e da DirecTV, iniciada no exterior, haverá monopólio do serviço no Brasil, uma vez que a empresa que resultar da fusão terá 95% do mercado de TV por satélite no país, segundo o governo. A Casa Civil tem sido procurada por empresários pedindo limite para a concentração nesse setor das TVs por assinatura, que engloba ainda as TVs a cabo.

Vespeiro

Durante o governo FHC, houve três tentativas de criação da lei de comunicação eletrônica de massa, que morreram no nascedouro.

Em 1998, o então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, desenhou um anteprojeto de lei que transferia à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) a competência sobre a radiodifusão. O projeto criava limites para a propriedade cruzada: um mesmo grupo não poderia ter, na mesma localidade, concessão de TV aberta, TV paga e telefonia local. Com a morte de Motta, o projeto parou.

Em 2001, o ex-ministro Pimenta da Veiga propôs outro projeto, que mantinha a radiodifusão sob alçada do Ministério das Comunicações e derrubava os limites para a propriedade de emissoras de televisão.

O projeto foi bombardeado pelos ex-aliados de Sérgio Motta, que qualificaram a texto de ‘mesquinho’ e ‘eleitoreiro’.

A terceira tentativa ocorreu no final de 2002.

O então ministro das Comunicações, Juarez Quadros do Nascimento, escreveu duas versões de anteprojeto de lei, que também ficaram engavetadas.’



Folha de S. Paulo / Financial Times

‘Indústria pode perder controle de filme e TV’, copyright Folha de S. Paulo / Financial Times, 6/03/05

‘Por anos, a saúde financeira das principais empresas de mídia do mundo era definida por um mantra: ‘o conteúdo impera’. No ano passado, essa crença levou a Comcast, maior operadora de TV a cabo dos EUA, a considerar uma proposta ‘hostil’ de US$ 60 bilhões pela aquisição da Walt Disney. E, antes disso, a mesma convicção propeliu a expansão da Vivendi em Hollywood, embasada em pesado endividamento, bem como muitos dos investimentos televisivos de Rupert Murdoch.

A tecnologia agora ameaça alterar esse equilíbrio de poder, e novos sistemas digitais vêm propiciando mais influência aos distribuidores. A luta já prejudicou a indústria da música, que perde um total estimado em US$ 2,4 bilhões ao ano em vendas para os piratas on-line, além de US$ 4,5 bilhões para CDs copiados ilegalmente. A nova geração de distribuidores de conteúdo -da divisão iTunes da Apple ao serviço de música por assinatura Napster- cresce rapidamente. Em contraste, as gravadoras passaram por anos de vendas em queda.

Agora chegou a hora da indústria do entretenimento em vídeo: estúdios, redes de TV aberta, distribuidores de programação via cabo e satélite e produtores de programas.

Gravadores digitais ou pessoais de vídeo oferecem aos assinantes de TV paga um banco de dados de programas aos quais eles podem assistir quando preferirem, e não de acordo com os horários dos canais. Sistemas futuros poderão permitir que espectadores armazenem filmes ou programas em disco rígido, transformando o televisor em um console híbrido semelhante a um PC. As velhas transmissões analógicas de TV vêm sendo trocadas por serviços digitais de múltiplos canais.

As empresas de internet e software ameaçam tanto os grupos de conteúdo quanto os de distribuição com uma nova reacomodação. O acesso de alta velocidade à internet, ou banda larga, permitirá que filmes ou programas de TV sejam transmitidos rapidamente e de maneira confiável via web.

No Fórum Econômico Mundial, neste ano, Bill Gates, da Microsoft, disse que ‘a TV via satélite já era’, de acordo com um delegado. ‘O que Bill queria dizer era que os gravadores pessoais de vídeo e a programação pay-per-view representavam medidas desesperadas’, relembra outro executivo. ‘O futuro é transmissão de vídeo via internet, sem fio ou em linhas de fibra óptica, direto para os domicílios.’

Andy Duncan, presidente-executivo do Channel 4, britânico, resume a mudança: ‘Estamos saindo de um sistema de conteúdo ‘empurrado’, no qual a rede [ou os estúdios] decidia o que você podia assistir e quando, e nos encaminhando a um sistema de conteúdo ‘puxado’, no qual os usuários escolhem ao que assistir, quando e como’.

Implicações

A transição tem profundas implicações para as redes de televisão e os estúdios, que, no passado, em larga medida, dominavam seus cronogramas de programação ou lançamento, e para os distribuidores. Os pontos tradicionais de locação de varejo, como a Blockbuster, também enfrentam um desafio quanto ao seu modelo de negócios, que pode virar irrelevante se vídeos puderem ser baixados com facilidade via Internet.

Em teoria, os provedores de conteúdo deveriam se beneficiar da demanda mais alta por seus produtos. Mas os distribuidores não se mostram tão dispostos a pagar ágio pelo conteúdo quando têm arcado com o fardo do investimento em novos sistemas e formas de acesso ao mercado.

Obstáculos

Em resposta, os responsáveis por programas e os estúdios esperam oferecer aos consumidores sistemas convincentes que protejam o consumo legítimo de conteúdo. Mas esses esforços são caracterizados por falta de unidade, competição interna e divergências de motivação.

Para empresas como a EchoStar ou a Time Warner Cable, a nova tecnologia oferece a perspectiva de reduzir o ‘desgaste’ do ritmo de perda de assinaturas de consumidores. Ambas testam novos sistemas de armazenagem digital, entre os quais gravadores pessoais de vídeo que podem pular a publicidade, na crença de que se trate de ferramentas convincentes para reter consumidores.

Mas as redes tradicionais de TV aberta se importam mais com a publicidade do que com as receitas de assinatura. Aparelhos que permitam aos consumidores pular comerciais podem encorajar os anunciantes a abandonar as redes. ‘À medida que gravadores pessoais de vídeo comecem a pressionar a receita publicitária, os [grandes conglomerados] publicitários começarão a procurar por veículos alternativos’, dizem analistas de uma empresa de investimentos de Nova York.

As empresas de conteúdo, por sua vez, estão mais interessadas em convencer os consumidores a adquirir seus produtos DVDs. Nos últimos anos, os estúdios de cinema passaram a confiar neles como pedra fundamental de suas receitas. Hoje, as vendas de DVDs representam faturamento duas vezes maior que as bilheterias.

Tentando manter o interesse do consumidor e criar uma nova fonte de receita, os produtores de bens eletrônicos de consumo e os estúdios vêm desenvolvendo DVDs superiores, de definição maior. A esperança é que os consumidores substituam suas videotecas, da mesma forma como abandonaram os videocassetes. Novos sistemas de cifragem também tornam muito mais difícil copiar discos de alta definição.

Tempo a favor

No momento, existe uma vantagem de tempo para as tecnologias de alta definição e os grupos de mídia que as promovem. A penetração da banda larga continua longe de universal. Demora muito mais para baixar um filme, particularmente em formato de alta definição, do que uma canção.

Mas alguns executivos de mídia e tecnologia, entre os quais Gates, acreditam que armazenar vídeo em pedaços de plástico não será o caminho. Argumentam que consumidores já baixam filmes e que essa prática se tornará um desafio para os DVDs e outras mídias físicas no longo prazo.

As operadoras de cabo estão de olho nesse mercado, oferecendo serviços de ‘vídeo a pedido’. Na Comcast, o vídeo a pedido permite que os provedores de conteúdo vendam a proposta de programas que contêm publicidade, ao contrário dos gravadores pessoais de vídeo. O uso mais intenso do vídeo a pedido ampliaria a popularidade de um programa e permitiria que os produtores negociem preços mais altos no futuro.

Espaço para todos

Até agora, os provedores de conteúdo não vêm apoiando uma dada tecnologia e querem explorar todas as chances. Em lugar de disputarem uns contra os outros, o provável é que haja espaço para os DVDs de alta definição, o vídeo por demanda, os gravadores pessoais de vídeo e os downloads.

Para os criadores de conteúdo, o advento do download de vídeos online é um desdobramento preocupante. Mas as empresas que produzem o hardware necessário para desfrutar esse tipo de conteúdo em casa o vêem como importante oportunidade de construir novos mercados.

Os televisores e gravadores de DVDs existentes não estão equipados para receber downloads de vídeo. Se e quando esses serviços se tornarem realidade comercial, os consumidores teriam de adquirir equipamento novo.

Alguns fabricantes estão dando passos iniciais. A Toshiba, por exemplo, desenvolveu um gravador de DVDs que pode ser usado com televisores digitais para baixar e armazenar vídeos online.

Mas, além desses primeiros movimentos, os fabricantes de eletrônicos não correm para desenvolver produtos capazes de baixar vídeos porque esses serviços não devem se generalizar ainda por alguns anos. Enquanto isso, esperam que a TV de alta definição estimule a demanda pela próxima geração de aparelhos de DVD. A qualidade superior da televisão HD ante o conteúdo em vídeo baixado com a tecnologia atual significa que eles não devem competir em curto e médio prazo. Tradução de Paulo Migliacci’