Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Jornalista é eleito presidente da ABL

Leia abaixo a seleção de sexta-feira para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Sexta-feira, 7 de dezembro de 2007


LITERATURA
Folha de S. Paulo


ABL elege jornalista Cícero Sandroni como seu novo presidente


‘O jornalista Cícero Sandroni, 72, foi eleito ontem o novo presidente da Academia Brasileira de Letras. Ele recebeu 39 dos 40 votos possíveis -e não quis confirmar se o voto em branco fora dado por ele mesmo, como se afirmava na casa. A posse está marcada para a próxima quinta, às 17h, na academia.


Confirmou-se a chapa única montada em consenso pelos acadêmicos: Ivan Junqueira (secretário-geral); Alberto da Costa e Silva (primeiro secretário); Nelson Pereira dos Santos (segundo secretário) e Evanildo Bechara (tesoureiro). O mandato é de um ano, renovável por mais um.


‘Eu tenho uma missão difícil, que é ser presidente depois da gestão de Marcos Vinicios Vilaça. Ele abriu a casa, fez uma gestão para as humanidades, não só para as letras, e transformou a academia em popular sem ser vulgar’, exaltou Sandroni, que era secretário-geral de Vilaça.


‘Cícero é um administrador testado e um intelectual consagrado. Será o presidente de que a academia precisa’, devolveu Vilaça, que buscou atrair público e mídia para a instituição nos últimos dois anos. Entre os desafios da nova gestão estão dois eventos em 2008 -o centenário da morte de Machado de Assis, fundador da casa, e o bicentenário da chegada da família real portuguesa ao Brasil.


Cícero Sandroni foi genro de Austregésilo de Athayde, que presidiu a ABL durante 34 anos (de 1959 até morrer, em 1993). Escreveu, inclusive, a biografia ‘Austregésilo de Athayde, o Século de um Liberal’ (1998), ao lado da mulher, Laura Sandroni. ‘Mas também conheço a academia por ter feito muitas entrevistas e coberturas, acompanhado a vida da casa. Nem sempre minhas relações com ela foram amorosas’, disse ele.


O paulistano Sandroni se mudou aos 11 anos para o Rio, onde desenvolveu sua carreira jornalística. Atuou, entre outros veículos, em ‘Tribuna da Imprensa’, ‘Correio da Manhã’, ‘Jornal do Brasil’, ‘O Globo’ e ‘Fatos e Fotos’.


Ainda ocupou cargos públicos como a subchefia do gabinete de Franco Montoro quando este era ministro do Trabalho de João Goulart, em 1962.


Da obra de Sandroni constam ficções como ‘O Diabo Só Chega ao Meio-dia’ (1985) e ‘O Peixe de Armana’ (2003) e um perfil biográfico de Carlos Heitor Cony (2003). ‘Cícero é um grande jornalista, intelectual e um homem muito hábil, coisa que eu não sou e que é condição fundamental para um presidente da ABL’, disse Cony, um dos eleitores de ontem.’


 


CRIME
Folha de S. Paulo


‘Serei famoso agora’, disse jovem que matou 8 nos EUA


‘O jovem de 19 anos que matou oito pessoas em um shopping em Omaha (Nebraska, centro dos EUA) havia perdido o emprego e terminado um namoro nos últimos 15 dias.


‘Sou um pedaço de merda’, escreveu em um bilhete Robert Hawkins, que se suicidou após matar cinco mulheres e três homens -além de ferir outras cinco pessoas-, ‘mas serei famoso agora’. A polícia local acredita que a matança era parte de um suicídio premeditado.


O jovem estava morando, desde 2006, com a família de um amigo de 17 anos. Debora Maruca-Kovac, a mãe do amigo, disse à agência Associated Press que Hawkins mostrou à sua família seu rifle russo semi-automático na noite anterior ao crime -ela pensou que a arma era muito velha para funcionar. Segundo a polícia, imagens de câmeras do shopping mostram que Hawkins escondeu o rifle sob uma blusa carregada em seus braços.


Maruca-Kovac disse ainda que havia deixado Hawkins morar consigo depois de ele ter abandonado sua casa. Registros judiciais dão conta de que a guarda do jovem foi, por pelo menos uma vez, tirada dos seus pais -que se divorciaram quando ele tinha 3 anos- e passada ao Estado.


‘Ele era deprimido’, diz Maruca-Kovac. ‘Mas parecia que ele estava melhorando.’


Hawkins abandonou a escola em 2006, quando cursava o último ano do equivalente ao ensino médio brasileiro (‘high school’). Após se mudar para a casa do amigo, passou a trabalhar em um McDonald’s. Nesta semana, porém, foi demitido por supostamente ter furtado US$ 17 (cerca de R$ 30). Na semana anterior, segundo Maruca-Kovac, ele havia terminado um namoro.


Hawkins não tomava medicamentos para distúrbios psiquiátricos, mas já se tratara por depressão, hiperatividade e déficit de atenção. O jovem costumava exagerar na bebida e às vezes fumava maconha em seu quarto, disse Maruca-Kovac. Apesar disso, era gentil e prestativo. Gostava de ouvir música e jogar videogame -’coisas normais de adolescente’.


Maruca-Kovac, enfermeira, contou que estava se preparando para trabalhar quando Hawkins telefonou, dizendo que lhe havia deixado um bilhete. Ela pediu que ele se explicasse, mas o jovem desligou. Maruca-Kovac encontrou o papel no chão de seu quarto e ligou para a mãe de Hawkins, que diz conhecer apenas por ‘Molly’. A mulher foi à sua casa, pegou o bilhete e o levou à polícia.


No bilhete, diz Maruca-Kovac, Hawkins escreveu que amava seus pais e que deixaria de ser um ‘peso’.


O incidente de Nebraska é o mais recente de uma série de massacres cometidos por pessoas armadas nos EUA, que travam um debate há décadas sobre o controle das armas de fogo. A posse de armas é garantida pela Constituição, escrita no século 18, quando milícias civis ajudavam a cuidar da segurança dos cidadãos.’


 


VENEZUELA
Vinicius Mota


Napoleão sem 18 Brumário


‘SÃO PAULO – ‘Vamos agradecer a Chávez por fazer com a palavra ‘merda’ o que fez [o escritor venezuelano] Arturo Ulstar Petri com a palavra ‘pentelho’. Ser -ou ter sido- presidente é bom porque há sempre alguém incumbido de limpar a sujeira produzida pelo chefe.


O esforço notável da frase acima é de Willian Lara, o Franklin Martins de Caracas. Tentou interpretar como libertário o uso que Chávez fez do substantivo concreto, às vezes nem tanto, para depreciar a vitória da oposição no referendo de domingo. Lembrou de ‘Ninguém Escreve ao Coronel’ (logo ao coronel?), de García Márquez, onde o termo aparece à profusão. Disse que Chávez fala a língua ‘do povo’.


Mas o ‘povo’ não falou a língua de Chávez no domingo. Rejeitou o cavalo-de-tróia recheado de (…) arbítrio, oferecido pelo governo. O presidente até tentou comportar-se ao reconhecer a derrota e parabenizar seus adversários -as opções, a trapaça ou um golpe de Estado, seriam bem mais custosas para o candidato a ditador. O ataque de candura, no entanto, já passou.


Chávez é um caso para psicanalistas. Comporta-se como uma criança mimada que comanda a quinta maior reserva de petróleo. Faz beicinho, faz bravata, troca de mal, ameaça levar a bola embora. E arrasta uma legião de crédulos capazes de sustentar que ele faz ‘revolução’ -até na linguagem.


Consta que Ulstar Petri, morto em 2001, alforriou o ‘pentelho’ numa entrevista televisiva. Na Venezuela, chamar alguém de ‘pendejo’ é tachá-lo de otário, e não de chato, mala-sem-alça, como aqui. O peso intelectual de Ulstar era tanto que o vocábulo ganhou status. Vez ou outra vai à rua uma ‘Marcha de los Pendejos’, exigindo que autoridades parem de ludibriar os cidadãos.


O risco é a história se repetir, e o laxativo verbal de Chávez inspirar um novo nome -ou uma forma inovadora- de protesto na Venezuela. Agora que o nosso Napoleão bolivariano ficou sem o seu 18 Brumário, a coisa iria cheirar mal.’


 


‘Merda’ é patrimônio cultural’


‘A palavra ‘merda’, que causou rebuliço ao ser usada anteontem por Hugo Chávez para qualificar a vitória da oposição, é ‘patrimônio cultural venezuelano’, disse o ministro da Comunicação, Willian Lara. Num passeio pela literatura hispano-americana, Lara citou o emprego do vocábulo por Gabriel García Márquez e conclamou todos a agradecer a Chávez por reabilitá-lo. Ele comparou o caso ao uso da palavra ‘pendejo’ (otário) por Arturo Uslar Pietri. Para Uslar, um dos principais intelectuais venezuelano do século 20, ser ‘pendejo’ em seu país era ser ‘honesto’.’


 


LULA E RAUL
Nelson Motta


Metamorfose ou ouro de tolo?


‘SALVADOR – Quem diria, o anárquico fanfarrão Raulzito virou lição de filosofia política na boca do presidente da República, que sempre tem opinião formada e categórica sobre tudo. Seria um grande desgosto para ele ouvir a sua libertária ‘Metamorfose ambulante’ a serviço da CPMF e das mudanças de opinião de quem, na luta pelo poder, fez de tudo para passar de pedra a vidraça.


Raul cantava a liberdade da dúvida e da contradição, da inteligência em movimento, em plena ditadura militar, quando a opinião só podia ser radical e estática: contra ou a favor. A ditadura proibia as opiniões contrárias; a oposição proibia mudar de opinião, sob a suspeita de estar servindo à direita ou para levar vantagem pessoal, como sempre.


A esquerda nacionalista sempre desprezou o ‘americanizado’ Raul Seixas: ele era incontrolável, individualista e anárquico, detestava partidos, igrejas, instituições, torcidas, escolas e blocos. E certezas. Mas driblava a censura e ridicularizava os sonhos de felicidade da classe média governista, no ‘milagre brasileiro’ dos anos de chumbo, com ‘Ouro de tolo’, aquela que diz: ‘eu devia estar contente /porque tenho um emprego, /sou um dito cidadão respeitável/…


O baiano Raul, auto-intitulado ‘um magro abusado’, desempenhou com grande coragem, independência e custo pessoal o papel de mosca na sopa dos que têm opinião formada sobre tudo, de esquerda, de direita e de centro, e debochava dos que pensam por slogans e palavras de ordem e mudam de opinião de acordo com os interesses de suas causas, chefes e bolsos.


Quem diria que as palavras de Raul serviriam para legitimar algumas das coisas que ele mais abominava. Coitado, virou camiseta de Che Guevara. O magro abusado não merecia esse abuso.’


 


GREVE DE FOME
João Alves Filho


D. Cappio e o mito da falta d’água


‘COM A retomada da greve de fome de dom Luiz Flávio Cappio, o presidente Lula e seus áulicos tentam passar a imagem de que ele é um fanático religioso. O ministro da Integração, Geddel Vieira Lima, ousa desrespeitosamente associar a imagem do bispo a uma espécie de fundamentalista islâmico.


Na realidade, d. Cappio é um líder religioso profundamente comprometido com sua principal missão, que é divulgar a fé aos sertanejos e levar a eles os eternos ensinamentos de Deus, mas sem desconectá-los do mundo injusto em que habitam.


Daí por que, convencido de que quem convive com a miséria não tem serenidade para cultivar dignamente a religião, se empenha em extirpar a miséria, defendendo os sertanejos daqueles que tentam legitimá-la com demagogia e promessas enganosas.


Trata-se de um sábio, culto, avesso à demagogia, conhecedor do sertão nas suas entranhas e, em especial, do Velho Chico, cujas margens percorreu a pé denunciando sua degradação bem antes de se falar em transposição. Um estudioso das técnicas de convivência com as secas e equacionamento dos recursos hídricos locais -tão simples e baratas que os chineses e os indianos as praticam com sucesso há milênios em regiões de climas bem mais hostis do que o nosso.


D. Cappio tem consciência também de quatro fatos dos quais a nação precisa tomar conhecimento. Primeiro, a transposição não é destinada a salvar os nordestinos da seca, pois apenas uma minoria irrelevante do semi-árido receberá água na porta, mas se destina ao agronegócio, que utilizará uma água caríssima, levada a 700 km, que terá que ser subsidiada a vida inteira. Porém, temos milhões de hectares de terras à beira do rio cuja irrigação, sem subsídio, proporcionaria alimentos baratos e geraria 1 milhão de empregos.


Segundo, o governo, maquiavelicamente, esconde uma realidade que surpreenderia a nação: não há falta de água no Nordeste setentrional, mas, isto sim, ela existe em abundância tal que, teoricamente, daria para abastecer 100% dos nordestinos.


Terceiro, o rio São Francisco está na UTI e a transposição ameaça provocar sua morte, gerando o maior desastre ecológico e socioeconômico da história brasileira. Quarto, Lula mentiu para conseguir a interrupção da primeira greve de fome de d. Cappio, certamente com receio das conseqüências para a reeleição, com promessas enganosas de que iria parar a obra da transposição para discutir com ele, com membros da sociedade civil e ecologistas que têm propostas alternativas, demonstrando tecnicamente projetos racionais para levar água na porta pela metade dos custos para a totalidade dos dez Estados do semi-árido nordestino e mineiro. Por dois anos, o bispo esperou pacientemente a abertura do prometido diálogo, mas a resposta de Lula foi ameaçadoramente mandar o Exército iniciar a obra.


Por falta de espaço, não posso aqui detalhar o gigantesco manancial de água disponível nos Estados do Ceará, do Rio Grande do Norte e da Paraíba, explicando a simplicidade do supracitado projeto alternativo. Faço, contudo, um convite ao ministro Geddel, que executa a obra que tanto combateu, para um debate aberto, para que a nação saiba de toda a verdade sobre essa obra freneticamente aplaudida pelos empreiteiros, seus felizes apaniguados, pelo agronegócio retrógrado, que pleiteia água subsidiada, e pela indústria da seca, que, após sua conclusão, continuaria abastecendo os famigerados carros-pipas e as latas d’água na cabeça da pobre gente dos próprios quatro Estados ‘beneficiários’ da obra da transposição, que, tardiamente, compreenderia que foi a principal enganada pelo governo Lula, que fomenta a cizânia entre irmãos nordestinos.


Finalmente, uma ponderação final para que o presidente Lula, que, do alto de sua autolouvação, costuma ser infenso a conselhos, avalie melhor o artigo de frei Leonardo Boff, que, com a autoridade de ex-professor do então seminarista dom Cappio, com quem ele já se destacava por ‘uma aura de simplicidade e santidade’, advertiu: ‘Entre o povo que não quer a transposição e as pressões de autoridades civis e eclesiásticas, dom Luiz ficará do lado do povo. Irá até o fim. Então a transposição será aquela da maldição, feita à custa da vida de um bispo santo e evangélico. Estará o governo disposto a carregar essa pecha pelo futuro afora?’.


JOÃO ALVES FILHO, 66, é engenheiro civil. Foi governador de Sergipe por três mandatos (1983-87, 1990-94 e 2003-06) e ministro do Interior (gestão Sarney). É autor de, entre outros livros, ‘Transposição de Águas do São Francisco: Agressão à Natureza vs. Solução Ecológica’.


jafsergipe@gmail.com’


 


OPS
Pedro Dias Leite


Erro em tradução faz Mônaco adiar julgamento de Cacciola


‘Erros na tradução dos documentos enviados pelo governo brasileiro à Justiça de Mônaco no processo de extradição de Salvatore Cacciola levaram ontem ao terceiro adiamento seguido da audiência para definir o destino do ex-banqueiro.


A Corte de Apelações (tribunal que vai julgar o pedido de extradição de Cacciola) determinou que seja feita nova tradução do português para o francês, com base nos originais, desta vez paga pelo governo de Mônaco. ‘A tradução não é boa, certas expressões estão confusas’, disse a procuradora-geral do principado, Annie Brunet-Fuster: ‘Isso vai custar caro’.


A defesa de Cacciola, que pediu o novo adiamento, foi bem mais incisiva nas críticas. ‘É como se tivessem colocado numa dessas páginas de tradução da internet. Não se entende nada. É uma tradução incompreensível’, disse Alessandra Mocchi, que faz parte do time de defesa do ex-banqueiro. Seu colega monegasco, Franck Michel, chegou a cogitar que a tradução tivesse sido feita por leigos em assuntos jurídicos.


O secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, declarou que houve ‘discrepância de entendimento’: ‘Aceitamos com naturalidade. Confiamos na Justiça de Mônaco. Quanto à tradução, há discrepância de entendimento dos termos jurídicos, o que não inviabiliza o entendimento dos fatos [relativos ao pedido de extradição]’.


O representante do governo brasileiro em Mônaco ontem, Rafael Favetti, admitiu que a tradução foi feita às pressas, mas reduziu as falhas a possíveis dúvidas técnicas. ‘Não havia tempo hábil, então dividimos as mais de 500 páginas entre equipes’, disse Favetti, consultor jurídico do Ministério da Justiça. Enviado pelo governo para acompanhar a audiência de ontem, o próprio Favetti, que não participou da tradução, não fala bem francês.


Segundo ele, a principal dúvida deve ser em torno da palavra ‘peculato’ -crime de utilizar-se do cargo público para apropriação ilegal de dinheiro. Como Cacciola não era funcionário público, a Justiça de Mônaco não entendeu por que ele é condenado por esse crime. Favetti disse que, no Brasil, a condenação em casos de peculato se estende a todos os envolvidos, como é o caso de Cacciola.


A Corte considerou a tradução insatisfatória e marcou a próxima audiência para 31 de janeiro. Espera-se que a nova tradução esteja pronta por volta de 20 de janeiro, o que daria dez dias para que os documentos refeitos sejam analisados. Os três juízes da Corte deixaram claro que não vão autorizar novo adiamento. ‘Não são manobras protelatórias. Só queremos que os juízes entendam o caso’, declarou Mocchi.


A realização da audiência para analisar o processo é fundamental para a continuação do caso. Depois disso, será uma questão de dias até a decisão final. Após a decisão do tribunal, o caso vai para a mesa do príncipe, que dá a palavra final sobre o processo. Em geral Albert 2º ratifica a decisão tomada.


O ex-banqueiro foi condenado no Brasil a 13 anos de prisão em 2005 por gestão fraudulenta de instituição financeira no mercado brasileiro e peculato.


O caso deu um prejuízo de R$ 1,6 bilhão ao governo, que interveio sob a justificativa de evitar uma crise generalizada no mercado. Em 2000, quando o processo contra Cacciola ainda estava em andamento, ele aproveitou um habeas corpus do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, e fugiu para a Itália, de onde não podia ser extraditado por ter cidadania italiana.’


 


ABI
Folha de S. Paulo


Deputados criticam atual Lei de Imprensa


‘Deputados federais que participaram de sessão solene em homenagem à ABI (Associação Brasileira de Imprensa) defenderam ontem a revogação ou reformulação da Lei de Imprensa, editada em 1967, durante o regime militar.


Classificada de ‘velha e autoritária’ pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), a lei é alvo freqüente de promessas de mudança por parte de congressistas. ‘É o último entulho do autoritarismo em vigor’, disse Miro Teixeira (PDT-RJ), afirmando que ela serve como intimidação a pequenos órgãos de comunicação que estariam sendo submetidos a pagamento de indenizações enormes.’


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Sexo e imposto


‘Em texto sobre a ‘política brasileira’ que mistura ‘sexo e imposto’, referência à ‘amante de Renan’ e à CPMF, a ‘Economist’ apontou como uma razão do entrave ao imposto o ‘recente sucesso’ da economia. Uma ‘abundância’ de arrecadação que se deve em parte à CPMF, que combate evasão, ironiza a revista. ‘Este ano está especialmente intensa’ a disputa, diz. E a Bloomberg já teme os efeitos sobre a economia, ‘os juros vão subir, porque não há muita alternativa.’


Por aqui, na Folha Online, FHC falava na sabatina que o governo não ‘precisa dos recursos’ que ele, ao criar a CPMF, precisou. Mas José Serra ‘saiu da toca’, postou Ricardo Noblat no Globo Online, e ‘começou a telefonar para senadores do seu partido’, pela CPMF.


SARNEY OU…


O ‘Jornal da Globo’ tratou Garibaldi Alves como eleito. ‘Já é a roupa de presidente?’, perguntou. Mas veio a quinta e, nas agências, os presidentes de DEM e PSDB distribuíam declarações de amor a José Sarney, bem como o líder do governo. Só ele ainda negava, na Folha Online, preferindo reservar seus ‘últimos anos para terminar as memórias’.


NÃO SARNEY


Nos blogs, a mesma coisa. Para Lauro Jardim, ‘a cada hora que passa, Sarney ganha mais força’ e é ‘o favorito’. Para Claudio Humberto, ‘é a única chance de solução consensual’. Para Noblat, ‘nem precisa ser candidato: o Senado que se candidate a tê-lo como presidente’. Mas novos nomes apareceram, Romero Jucá, Pedro Simon.


NÚMEROS VS. NÚMEROS


Em meio a Bali, o WWF fez relatório dizendo que, com aquecimento, ‘metade da Amazônia pode ser destruída’, ecoando em sites tipo ‘Guardian’ e na Globo. Fim do dia e Fátima Bernardes noticia que ‘novos números mostram redução no ritmo de desmatamento da Amazônia’ -que em um ano registrou a ‘segunda menor taxa da história’.


Ao fundo, a questão é se Brasil e outros emergentes vão aceitar a inclusão da redução do desmatamento no acordo pós-Kyoto. É o que cobram ambientalistas como o WWF e, ontem no ‘Financial Times’, o presidente do Banco Mundial -e ex-subsecretário dos EUA- Robert Zoellick.


ETANOL E O ALIMENTO CARO


Na capa da ‘Economist’, as duas razões da ‘agflação’, alta no preço dos alimentos: a demanda de China e Índia e, ‘razão dominante este ano’, o etanol de milho dos EUA -estimulado por ‘200 subsídios do governo e pela tarifa que mantém fora do país o etanol brasileiro, mais verde’.


E em Bali, na coletiva de James Connaughton, enviado dos EUA, perguntaram da ‘tarifa sobre etanol brasileiro’ e ele, após enrolar, não se conteve. Disse que é um de seus ‘assuntos favoritos’ e que ‘não há boa razão’ para a taxa.


INFLAÇÃO BRIC


‘Alimentos sobem’, deu a Reuters Brasil em manchete, ‘e inflação engorda’. E ontem no chinês ‘Diário do Povo’: ‘Brics têm avanço da inflação e adotam medidas similares para deter’. Dos quatro Brics, o Brasil tem a menor taxa.


EUA E OS BRICS


As Bolsas subiram, diz o ‘WSJ’, ‘com a sensação de que EUA saem da crise sem choque maior’. Mas lá mesmo as empresas, diz a Reuters, já cobram de Bush acordos bilaterais ‘com o grupo Bric’.


TECNOLOGIA BRIC


Dow Jones e outras deram um relatório da International Data Corp. que prevê queda no investimento mundial em tecnologia, exceto nos ‘países Bric’, onde vai crescer mais. Sugere investir na ‘Datasul do Brasil, Kingdee da China’ etc.


MULTIBRICS


Depois do ‘Le Monde’, a ‘Economist’ destacou ontem o relatório de consultoria de Boston que apontou as cem ‘multinacionais emergentes’ que ‘têm a força e a ambição de vencer as múltis’ atuais.’


 


CELEBRIDADE
Folha de S. Paulo


Adolescente seqüestrada por 8 anos terá programa de TV


‘A austríaca Natascha Kampusch, 19, que se tornou conhecida mundialmente em 2006, quando escapou de oito anos de cativeiro em um porão vienense, anunciou ontem que vai apresentar um programa de entrevistas. O show será transmitido por um novo canal de TV, que entra no ar em fevereiro.


A menina foi seqüestrada por Wolfgang Priklopil aos dez anos, quando ia para a escola. Priklopil se suicidou após a fuga e a adolescente compareceu ao funeral- única ocasião em que chorou publicamente.


Hoje Natascha vive só, num apartamento em Viena, sob supervisão de psicólogos. Seu patrimônio pessoal é estimado em mais de 1 milhão -fruto de direitos autorais por entrevistas.’


 


TV POR ASSINATURA
Tatiana Resende


Ponto grátis pode elevar preço, dizem TVs


‘As novas regras da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) sobre o ponto extra podem elevar o preço dos pacotes da TV paga para todos os assinantes, diz associação do setor. Atualmente, aqueles que têm ponto extra pagam um adicional na mensalidade, o que fica proibido a partir de junho se a manutenção do equipamento não for feita pela operadora.


Segundo o presidente da ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura), Alexandre Annenberg, para driblar a perda de receita, ‘uma solução seria diluir o custo [dos pontos extras] com todos os assinantes’. No entanto, o executivo disse que não iria se pronunciar sobre as mudanças até entrar em contato com a Anatel, o que não teria sido possível ontem, para ter certeza de que as normas não foram mal redigidas.


A assinatura paga pelo cliente pode ser reajustada uma vez por ano desde que ele seja informado com pelo menos 30 dias de antecedência. Se não concordar com o valor acrescido, o usuário pode rescindir o contrato sem ônus.


Marconi Maya, gerente de regulamentação de TV por assinatura da Anatel, explica que o aumento é possível, desde que o motivo esteja previsto no contrato de forma específica. Cláusulas genéricas, segundo ele, como alta no preço por maior custo de operação, sem detalhar qual, é considerado abusivo pelo Código de Defesa do Consumidor. Contratos novos não teriam esse empecilho.


A ativação do sinal continua a ser feita pela operadora, mas o valor cobrado a quem tiver um ponto extra que terá manutenção da empresa ou de terceiros deve ser o mesmo.


De acordo com o presidente da ABTA, o custo da operação de um ponto extra na TV a cabo chega a ser 20% do ponto principal. Na Net, que tem 46,5% do mercado, são cobrados R$ 25, independentemente do pacote. Segundo os últimos dados da ABTA, há 4,9 milhões de assinantes no Brasil. Procuradas pela reportagem, TVA e Sky não informaram os seus preços.


Sobre a possibilidade de o usuário contratar de terceiros a instalação e a manutenção do ponto extra, Annenberg afirma que ‘jamais poderemos permitir que alguém interfira na nossa rede’. A Anatel prevê que, se houver interferências, a prestadora não pode ser responsabilizada, e o assinante responde por possíveis danos aos equipamentos da empresa, mas o presidente da ABTA ressalta que a interferência vai atingir não só aquele usuário mas ‘os 2.000 pontos que estão ligados na mesma célula’. Para evitar isso, diz Maya, o consumidor só pode adquirir equipamentos com certificação da Anatel.’


 


TV DIGITAL
Barbara Gancia


A TV como carrinho de compras


‘É o mundo mezzo ‘Minority Report’, mezzo Polishop chegando. Não sei como será, mas quero estar preparada


HOJE É sexta-feira; por definição, dia de pegar leve. Assim sendo, não quero embrulhar o estômago do leitor com o rebaixamento do Coringão ou a história da menor presa com homens no Pará, mesmo porque o caso já foi mais que discutido pela imprensa.


Só faço questão de notar, atrasada que chego ao debate, que a mim o que mais escandaliza nessa tragédia toda -que deve ter arruinado qualquer chance de equilíbrio emocional futuro para a garota envolvida- é o fato de a maioria dos protagonistas do caso paraense serem mulheres.


Ouvimos a governadora, a juíza e a corregedora, ora tentando se livrar da responsabilidade, ora acusando a vítima de ser culpada por sua sorte, ora perdendo ótimas oportunidades de ficar de boca calada. São mulheres evoluídas como elas que costumam educar filhos para não ter limites. Filhos que, na vida adulta, acabam se tornando agressores, corruptos e corruptores. Lá vai o Brasil descendo a ladeira…


Nó tirado da garganta, vamos ao nosso assunto ameno do dia: não, não vou zombar de Hugo Chávez ou da abstenção de votos do eleitor chavista, que enterrou por ora os sonhos de uma ‘revolução socialista’. Chávez disse tudo ao comentar o resultado do plebiscito: a elite venezuelana é uma ‘merda’, a dita ‘revolução bolivariana’ é outra ‘merda’ e o populismo nas Américas, a maior ‘merda’ de todas. E tenho dito.


O tópico de que vamos tratar aqui hoje é dos mais instigantes, mas poucos estão percebendo sua abrangência. Refiro-me à chegada da HDTV, a televisão digital em alta definição. Não sei não, mas não vejo o consumidor tapuia desembolsando R$ 800 por um aparelhinho que irá apenas melhorar a qualidade da imagem. Por que ele faria isso, se as telas planas em LCD ou plasma já oferecem ótima definição?


Ocorre que a TV digital é bem mais do que melhora na imagem.


Veja só: no futuro próximo, o telespectador que estiver assistindo, digamos, ao seriado ‘24 Horas’, poderá dar um zoom na camisa de Jack Bauer e, com um clique do botão do controle-remoto, descobrir que o artigo em questão é vendido pela Gap, custa x dólares e pode ser encontrado nas cores e tamanhos x, y ou z. Com mais um clique, o telespectador poderá colocar a camisa que o personagem de Kiefer Sutherland está vestindo em um carrinho de supermercado, como já faz em qualquer site de compras. E, como em qualquer Amazon da vida, o sistema traçará um perfil do consumidor baseado no seu histórico de compras. Você já adquiriu o DVD de tal filme, a roupa de tal loja e o CD daquele artista? Então irá gostar também deste ou daquele produto.


Trata-se de uma nova fronteira para a publicidade, em que filmes de alcance mundial, como a propaganda da Pepsi com David Beckham ou os anúncios de André Agassi para a Kia, perderão espaço para um marketing mais direcionado. E, como será o telespectador quem irá decidir a que horas e de que forma pretende assistir à programação oferecida, os intervalos comerciais terão de ser repensados e a publicidade, quem sabe, inserida diretamente na programação por meio de merchandising. É o mundo mezzo ‘Minority Report’, mezzo Polishop batendo à porta. Não sei bem como será, mas quero estar preparada.’


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


TVs pedem mais 1 ano para respeitar fusos


‘As redes de TV vão pedir ao secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., em reunião na próxima quarta, o adiamento por um ano do início da vigência da obrigatoriedade do cumprimento dos diferentes fusos horários na classificação indicativa de programas.


Pelas novas normas de classificação indicativa, editadas em julho, as emissoras terão de respeitar os fusos a partir de 9 de janeiro. As TVs das regiões Norte e Centro-Oeste argumentam que seis meses foram insuficientes para adaptação.


Hoje, a novela das oito da Globo, que se inicia às 21h no Sudeste, passa às 18h no Acre. Como ‘Duas Caras’ foi classificada como imprópria para menores de 12 anos, a partir de 9 de janeiro terá de ir ao ar, obrigatoriamente, após as 20h em qualquer canto do país.


As emissoras fora do fuso do Sudeste terão que gravar a programação gerada no Sudeste para exibirem no horário indicado pelo Ministério da Justiça. A rigor, elas não são obrigadas a cumprir a classificação indicativa, mas correm o risco de sofrer ações judiciais.


As TVs dizem que terão de gastar pelo menos US$ 75 mil em equipamentos e que perderão audiência e faturamento, pois seus telespectadores passarão a receber o sinal direto do Sudeste via parabólicas.


A reunião com Tuma Jr. foi pedida pela Abert. A entidade deverá propor a assinatura de um termo de compromisso.


JÁ ERA 1 A Record, que já tinha passado o SBT no Ibope nacional das 7h à 0h, ganhou da concorrente em novembro na média das 24 horas. A rede de Edir Macedo ainda fica atrás da de Silvio Santos de manhã e de madrugada, mas seu desempenho à tarde e à noite faz a diferença.


JÁ ERA 2 Em novembro, a Record teve 5,35 pontos no Ibope nacional das 24 horas, contra 5,10 do SBT e 14,7 da Globo.


CLONAGEM Autora de ‘Amigas e Rivais’, do SBT, Letícia Dornelles agora diz que não é ela quem acusa a Globo e Walcyr Carrasco de copiarem sua novela. Afirma que são internautas que fazem isso. Na Globo, no entanto, não há dúvidas de que Letícia está por trás dos internautas.


JANELA 1 A TV Cultura conseguiu anteontem do governo do Estado R$ 1,370 milhão para cumprir compromisso com 13 produtoras independentes contratadas para realizar documentários no projeto ‘Janela Brasil’.


JANELA 2 Esse dinheiro já havia sido repassado pelo governo, mas a antiga diretoria da Cultura o usou para outros fins.


FECHADURA A proposta de reajuste dos salários da cúpula da TV Cultura (em alguns casos, em mais de 100%) repercutiu mal no Palácio dos Bandeirantes. Conselheiros da emissora já foram avisados de que todo aumento salarial tem de passar pelo Codec (Conselho de Defesa dos Capitais do Estado), ligado à Secretaria da Fazenda.’


 


CINEMA
Mekado Murphy


‘Ignoro regras de como filmar’, revela Herzog


‘DO ‘NEW YORK TIMES’ – Os filmes de Werner Herzog, 64, tendem a colocar o homem frente a frente com a natureza, e a natureza não é uma adversária clemente. Nas selvas sul-americanas (‘Aguirre, a Cólera dos Deuses’ e ‘Fitzcarraldo’) ou na vastidão erma do Alasca (o documentário ‘O Homem-Urso’), os personagens -reais ou imaginários- de Herzog lutam para conservar sua sanidade e suas vidas. Seu filme que estréia hoje no Brasil, ‘O Sobrevivente’, volta a tratar desses temas, acompanhando a dura provação enfrentada pelo piloto americano-alemão Dieter Dengler na selva do Laos depois de ter seu avião abatido pelos vietcongues em 1966, durante um ataque aéreo secreto.


Primeiro roteiro escrito por Herzog em inglês, ‘O Sobrevivente’ é, sob muitos aspectos, uma carta de amor aos EUA. Christian Bale faz o papel de Dengler, que, para Herzog, é o exemplo mais perfeito de americano, repleto de otimismo, coragem e lealdade.


Embora as filmagens, feitas na Tailândia, tenham sido marcadas por vários problemas, o tumulto não se estendeu ao relacionamento do diretor com Bale, que diferiu totalmente das célebres batalhas travadas entre ele e o ator Klaus Kinski.


Em ‘Cobra Verde’, por exemplo, Kinski agrediu Herzog antes de abandonar o filme ainda inacabado, e, em ‘Fitzcarraldo’, Herzog teve de recusar a oferta feita por um chefe indígena de matar Kinski. A seguir, trechos da entrevista dada pelo cineasta.


PERGUNTA – Você já tinha feito em 1997 o documentário ‘Little Dieter Needs to Fly’, sobre o mesmo tema. Por que quis explorar o material também num longa-metragem?


WERNER HERZOG – De certa maneira, ‘O Sobrevivente’, a idéia do longa, sempre esteve em primeiro lugar. Quando conheci Dieter, tive a sensação de que essa era uma história grandiosa, com um personagem de dimensões heróicas. Mas, como foi preciso bastante tempo para juntar o dinheiro para o longa, fizemos o documentário primeiro.


PERGUNTA – A natureza e o mundo natural são temas recorrentes em muitos de seus filmes. Por que a natureza é algo que o fascina com relação ao cinema?


HERZOG – Para mim, as paisagens e a natureza sempre formam uma oposição a nós. Por exemplo, a selva em ‘Fitzcarraldo’ é o lugar dos sonhos febris da imaginação, do mistério, do inacreditável. É como se a selva fosse uma qualidade humana. No caso de ‘O Sobrevivente’, eu diria que o filme é muito físico. Você vê os prisioneiros que escapam abrindo caminho em meio à mata mais cerrada, os cipós mais grossos.


É uma selva que é quase impossível de se atravessar. Você olha para ela e se pergunta como um ser humano conseguirá penetrar nela um metro sequer, mas eles estão entrando, e a câmera está logo atrás. É quase como se nós, como platéia, fôssemos mais um fugitivo, ao lado deles. Então é uma qualidade direta que é muito física, algo do qual gostei muito.


PERGUNTA – Sabe-se que você já improvisou partes de filmes anteriores seus. Isso foi feito em ‘O Sobrevivente’?


HERZOG – Precisamos definir o que é improvisação. Não é algo como no free jazz, em que alguns músicos se encontram e começam a improvisar numa jam session. Improvisações e modificações são sempre possíveis, mas sempre dentro de um quadro muito bem definido na perspectiva do conteúdo de uma seqüência. Por exemplo, há uma cena com Jeremy Davies (que representa o prisioneiro Eugene DeBruin) e Christian Bale em que eu digo a ele ‘você precisa silenciar Christian’, mas não lhe dou uma fala pronta para fazê-lo.


PERGUNTA – Como se comparam sua relação de trabalho com Christian Bale e a que você tinha com Klaus Kinski?


HERZOG – É difícil até mesmo tentar traçar uma comparação. Com Kinski, era sempre: ‘Como posso domesticar esta fera e como poderei sobreviver a seu próximo acesso de fúria em que ele destrói o set inteiro?’. Como tornar sua loucura e irresponsabilidade absolutas produtivas na tela? Não foi assim com Christian. Ele foi o homem mais disciplinado, ótimo. Christian mostrou dedicação profunda ao filme. Ele fez coisas que um ator de seu calibre normalmente não faria, como comer larvas ou capturar uma cobra viva. Diga o que você quiser, e ele o faz. É inacreditável.


PERGUNTA – Houve relatos da filmagem falando de desentendimentos que teriam ocorrido no set. Um artigo publicado na ‘New Yorker’ no ano passado mencionou desavenças com a equipe técnica, que o achava ‘estranho e impulsivo’. Qual é sua reação a essas alegações?


HERZOG – Bom, a ‘New Yorker’ esteve presente nos primeiros dias da filmagem. Era um momento em que a equipe americana, a européia e a tailandesa tinham de se coordenar. É claro que nos primeiros dois ou três dias acontecem os atritos normais da adaptação. E, com a exceção do cinegrafista, ninguém mais tinha trabalhado comigo.


Eu freqüentemente ignoro as regras sobre como se deve fazer um filme. A escola de Hollywood faria um plano mestre e depois acrescentaria alguns detalhes, uma tomada inversa, isso e aquilo. E eu sempre sei que não preciso da tomada inversa.


É perda de tempo. É desperdício de filme. É desperdício de dinheiro. Eles ficaram um pouco perplexos pelo fato de eu não seguir o manual. Assim que a testemunha foi embora, as coisas ficaram bem diferentes.


Tradução de CLARA ALLAIN’


 


Inácio Araujo


Distante do seu melhor, diretor faz cinema íntegro


‘As duas horas de ‘O Sobrevivente’ podem ser divididas em duas partes quase idênticas.


Na primeira, o tenente Dieter Ziegler, piloto da Marinha dos EUA no Vietnã, é designado para missão no Laos.


Estamos em 1965, a guerra no Vietnã ainda não tem a extensão que iria adquirir, e a missão de bombardear alvos estratégicos no Laos é absolutamente confidencial.


Ziegler tem o avião derrubado, é feito prisioneiro pelos vietcongues, dos quais consegue escapar pela selva.


Não há muito segredo sobre o fim deste filme: sendo baseado na autobiografia de Ziegler, é evidente que ele consegue escapar. A questão não é essa, e sim: como? Werner Herzog, que se notabilizou como um dos mais importantes cineastas alemães dos anos 60 e 70, ultimamente tem se destacado como documentarista. E o documentário, como se sabe, exige menos de um cineasta do que a ficção: é questão apenas de saber deixar o mundo vir a si. Não é tão simples quanto parece, mas é mais fácil do que ir ao encontro do mundo, transformá-lo e torná-lo digno de crédito.


Em ‘O Sobrevivente’, a primeira metade é apenas sofrível. Não pela modéstia dos efeitos especiais. É que Herzog não parece se interessar pelos aspectos que precedem a fuga: o encontro com outros prisioneiros, as violências a que são submetidos, a permanente ameaça de morte e a maneira como, aos poucos, Ziegler se impõe como líder aos colegas e comanda os planos de fuga.


A segunda metade é de outra ordem. É questão de dois homens -Ziegler (Christian Bale) e seu colega Duane (Steve Zahn)- e uma selva. A selva e suas adversidades. A natureza com a qual esses homens se defrontam a cada instante para sobreviver, até que, por fim, possamos observar talvez o melhor do filme: a transformação de Ziegler em um homem-natureza -uma espécie de identificação completa, na maneira de se ocultar, se alimentar, se proteger dos perigos.


Nesses momentos, parece que estamos de novo diante do Herzog dos velhos tempos, embora num mundo diferente: em que o controle sobre a produção parece relativo, em que sofre com a iluminação óbvia e mesmo com a necessidade de seguir um roteiro nem sempre favorável. Enfrentando (em selvas da Tailândia) adversidades, Herzog não cede a tentações a que raramente escapam os cineastas, como o sentimentalismo. ‘O Sobrevivente’ não será nunca seu melhor filme, mas é de uma integridade formidável.


O SOBREVIVENTE


Diretor: Werner Herzog


Com: Christian Bale e Steve Zahn


Produção: EUA, 2006


Onde: a partir de hoje, nos cines Bristol, Anália Franco e circuito


Avaliação: bom’


 


Sylvia Colombo


Mostra expõe pesadelos da AL


‘O presidente Hugo Chávez costuma dizer que os acontecimentos trágicos do dia 27 de fevereiro de 1989 o estimularam tanto a comandar um golpe de Estado (fracassado) em 92 como a dar início à sua ‘revolução bolivariana’ na Venezuela.


Conhecido como ‘caracazo’, o episódio foi um massacre perpetrado pelo Exército e a polícia, sob o comando do então presidente do país, Carlos Andrés Pérez, para conter uma onda de manifestações populares em Caracas e cercanias.


Os protestantes, que reclamavam da instabilidade econômica e da inflação, saquearam lojas e incendiaram carros e ônibus na capital. Foram reprimidos brutalmente, e o saldo de mortos hoje varia de 400 a cerca de 3.000 pessoas, segundo estimativas oficiais e de organizações de direitos humanos.


‘El Caracazo’, de Román Chalbaud, é um dos filmes da mostra ‘Cinema e Direitos Humanos na América do Sul’, que reúne 30 filmes políticos latino-americanos recentes e inéditos, a partir de hoje e até 12 de dezembro, em São Paulo.


Assim como a produção venezuelana, eles trazem elementos da história recente que jogam luz à ebulição política atual do continente. ‘Fiquei impressionado com a quantidade de filmes sobre política produzidos hoje na América Latina’, disse o curador, Giba Assis Brasil. ‘Creio que tem a ver com o momento político da região, que leva as pessoas a terem mais vontade de refletir sobre a atualidade, mas também com uma questão tecnológica. Com as câmeras digitais, ficou tudo mais fácil, especialmente para a produção de documentários’, conta à Folha.


A mostra é promovida pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, com produção da Cinemateca e do Sesc. Haverá também debates nas sete cidades em que o evento acontece, além de SP -Rio, Recife, Belém, Brasília, Porto Alegre, Belo Horizonte e Fortaleza.


Neste ano, os filmes estão divididos de modo temático, tomando os artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos como referência. Por exemplo, no item que se refere ao ‘Direito de ir e vir’, será exibido o mexicano ‘Do Outro Lado’, que trata de imigração.


Já o que se refere à ‘Liberdade de Expressão’ é ilustrado por ‘A Cidade dos Fotógrafos’, documentário sobre fotógrafos chilenos que, durante a ditadura, retrataram atrocidades do regime e a agitação das ruas. Seu trabalho ajudou a dar início a processos na Justiça contra o Estado. O grupo, porém, foi infiltrado por agentes do governo e, aos poucos, massacrado. Os relatos dos sobreviventes são o eixo desta película.


Abertura


O filme que abre a programação hoje, em São Paulo, é a ficção ‘Matar a Todos’, uma co-produção Chile/Argentina/Uruguai. Conta a história de uma advogada que investiga a proteção que o Exército uruguaio deu a um químico chileno responsável por produzir gás sarin para Pinochet. A ação se passa durante o processo de redemocratização de parte do Cone Sul, mas evidencia estruturas das ditaduras ainda atuantes.


A advogada em questão é filha de um general, e tem, assim, de enfrentar uma cisão política também dentro da família.


Há ainda algumas produções brasileiras. ‘Eu Vou de Volta’, média-metragem de Claudio Assis e Camilo Cavalcante, reúne relatos de passageiros que viajam de ônibus nos trajetos de ida e volta entre São Paulo e Caruaru. Tão incômodo como essas longas jornadas, o filme expõe não só as histórias de vida e de ilusões dos passageiros, mas também o inchaço dos pés, a sujeira dos banheiros e outros inconvenientes que vão surgindo ao longo do trajeto.


O cineasta veterano Fernando Solanas tem uma retrospectiva de seus trabalhos recentes sobre a Argentina após o colapso neoliberal de 2001. Trata-se de uma trilogia, composta pelos filmes ‘Argentina Latente’, ‘La Dignidad de los Nadies’ e ‘Memoria del Saqueo’.


Por meio deles, dá para sentir como Solanas (de ‘La Hora de los Hornos’ e ‘Tango – O Exílio de Gardel’) foi se tornando obcecado pelas feridas recentes da Argentina. Obsessão esta, inclusive, que o levou a candidatar-se a presidente nas últimas eleições, vencidas por Cristina Kirchner.’


 


BOATOS
Carlos Heitor Cony


O general e eu


‘ALUNO QUE está fazendo doutorado numa universidade do interior de São Paulo mandou-me e-mail perguntando se era verdadeira a informação que recebera de um professor local, segundo a qual, em 1964, logo após o golpe militar de abril, eu escrevera diversas crônicas num jornal carioca apoiando aquele movimento.


Um outro aluno, acho que do mesmo professor, queria saber se eu era amigo do então ministro da Guerra, o ainda general Artur da Costa e Silva, mais tarde marechal e presidente da República. Que eu fora visto entrando certa vez em seu gabinete -havia foto de jornal provando o nosso encontro.


Honestamente, eu poderia esperar tudo de pior da internet, mas desta vez acho que ela exagerou. Limitei-me a enviar ao aluno a mais recente edição de um livro de crônicas que publiquei primeiramente em julho de 1964, poucos meses após o golpe de abril. O livro foi best-seller na época, vendeu diversas edições por ocasião de seu lançamento. Como acontece com outras obras datadas, saiu do catálogo algum tempo depois, mas recebeu recente publicação em 2004, pela editora Objetiva, quando foram lembrados os 40 anos do golpe militar.


Neste volume, estão as crônicas que escrevi a partir de 2 de abril daquele ano, inclusive aquelas que se referiam ao processo que o ministro da Guerra abriu contra mim, baseado na Lei de Segurança Nacional, que poderia me botar na cadeia por 30 anos.


Funcionavam ainda uns escombros da Justiça e meu advogado, Nelson Hungria, recorreu ao Supremo Tribunal Federal, que descaracterizou o feito, livrando-me da LSN mas me enquadrando na Lei de Imprensa então vigente, pela qual seria condenado a apenas três meses de prisão.


Estive realmente no gabinete do ministro Costa e Silva, no dia 8 de setembro de 1964, data marcada pelo juiz encarregado do processo para ouvir o depoimento do autor da ação. No cumprimento de um dispositivo legal, o ministro de Estado não precisaria comparecer à audiência no foro dos demais cidadãos. A audiência é que iria a seu gabinete. A montanha iria a Maomé.


E o réu da ação teria de estar de corpo presente para ouvir as acusações que aquela autoridade faria contra mim.


Escrevi duas crônicas a respeito deste episódio: no próprio dia 8, sob o título de ‘Na Cova do Leão’; e no dia 10, ‘Maomé e a Montanha’, narrando a audiência, na qual registrei não apenas as pesadas acusações que o ministro me fez, mas a sua civilidade tratando-me com respeito em nível pessoal.


‘O General’ – escrevi na ocasião- ‘é um homem mais feio do que parece nas fotografias, mas, quando começa a falar, adquire uma certa simpatia, um calor humano que o torna respeitável e quase bonito. Cruzou seu gabinete para vir falar com o cronista. Estendeu-me a mão, apresentando-se:


– General Costa e Silva!


Respondi no mesmo tom:


– Jornalista Cony!


O ministro recuou um pouco, fez um gesto com a mão acima de sua cabeça, para exprimir altura, e disse:


– Imaginava-o mais alto!


Gostei do pronome corretamente empregado e deixei que o ministro se servisse da minha insignificante altura. (‘O Ato e o Fato’, páginas 152-153, Objetiva, 2004).


Foi esta a primeira e bastante visita que fiz ao prédio do Ministério da Guerra, conduzido por oficiais de Justiça, promotores e advogados das partes.


Sem contar uma outra, na noite de 16 de novembro de 1965, quando, em companhia de Antonio Callado, Glauber Rocha, Márcio Moreira Alves, Joaquim Pedro de Andrade, Flavio Rangel, Mario Carneiro e Jayme Azevedo Rodrigues, fomos presos durante uma manifestação no Hotel Glória e levados para lá provisoriamente, até que nos trancafiaram por uns tempos no sinistro quartel da PE da rua Barão de Mesquita. Dias depois, ali também ficou preso o poeta Thiago de Mello.


Voltando à consulta que me fez o doutorando paulista: não sei de onde o professor que ele cita em seu e-mail tirou a informação que repassou ao seu aluno. Que aliás, pediu que eu mandasse um exemplar do meu livro para o próprio. Desconfio que seria inútil.’


 


MAU EXEMPLO
Folha de S. Paulo


Sutherland cumprirá 48 dias de prisão


‘Astro da série ‘24 Horas’, Kiefer Sutherland, 41, foi condenado na última quarta-feira, em Los Angeles, a 48 dias de prisão por dirigir embriagado.


Sutherland foi detido em setembro, enquanto ainda estava em condicional, por também ter sido flagrado dirigindo embriagado em 2004. No mês seguinte, ele preferiu não recorrer das acusações.


Dos 48 dias aos quais ele foi sentenciado, 30 se referem à detenção de setembro e 18 à reincidência do caso de 2004.


O advogado de Sutherland, Blair Berk, disse que o ator preferiu começar a cumprir sua pena imediatamente após a sentença. Ele ainda terá que cumprir 60 meses de condicional, freqüentar uma programa de alcoolismo por seis meses e realizar trabalhos na lavanderia e na cozinha da prisão de Glendale (Los Angeles), onde cumprirá pena.’


 


LITERATURA


Folha de S. Paulo


Revista ‘Entrelivros’ deixa de circular


‘A editora Duetto deixará de publicar em janeiro a edição mensal da revista literária ‘EntreLivros’. Foram 32 números, desde 2005, que contaram com Milton Hatoum e Umberto Eco como colunistas. A falta de anunciantes e as mudanças no mercado de revistas provocaram seu fim, segundo a editora Josélia Aguiar, 34. A marca ‘EntreLivros’, no entanto, seguirá com as publicações especiais ‘Caderno EntreLivros’, com panoramas da literatura, e ‘Biblioteca EntreLivros’, com abordagens histórico-culturais de temas específicos, de periodicidade ainda não determinada.’


 


ROBERTO CARLOS
Folha de S. Paulo


Palavra trocada reacende briga com o Rei


‘A troca de uma palavra na ação movida em fevereiro passado por Roberto Carlos contra Paulo Cesar de Araújo, autor da biografia não-autorizada do cantor, reativou a beligerância entre as duas partes.


A advogada de Araújo, Deborah Sztajnberg, divulgou que um trecho da página 30 de ‘Roberto Carlos em Detalhes’ foi adulterado na ação: em vez de ‘combinação de sexo, garotas e playboys’, está ‘combinação de sexo, drogas e playboys’.


Em seguida, os advogados do cantor escreveram: ‘…e por aí vai o autor misturando sexo grupal com homicídio, consumo de drogas, corrupção de menores e bestialismo’.


‘Esse fato gravíssimo é tergiversar no processo, ferir a integridade da obra. Isto até permite ao Paulo Cesar danos morais e materiais, pois dizem que ele escreveu o que não escreveu’, afirmou Sztajnberg.


Marco Antônio Campos, advogado do cantor, diz que houve ‘um erro de digitação’ e que os argumentos contra o livro não sofrem abalo.


‘Numa petição de 28 folhas, há uma palavra trocada. Atribuir a decisão judicial a isso é delírio. Existem outras 30 citações do livro’, disse ele, para quem Araújo fez insinuações ao escrever que Roberto freqüentava determinadas festas na época da Jovem Guarda.


O biógrafo pede na 20ª Vara Cível do Rio que uma liminar permita a volta dos livros às ruas, de onde foram retirados após acordo assinado em abril na 20ª Vara Criminal da Barra Funda, em São Paulo, na qual Roberto processava o autor. Araújo diz que foi constrangido a assinar o acordo e quer revê-lo após vencer na cível.


‘[Uma nova audiência] Não tem nenhum amparo jurídico. A ação cível está no Rio para ser arquivada. Só depende de uma questão formal. O acordo da esfera criminal prevê a desistência da ação cível. O assunto estará definitivamente arquivado’, disse Campos.


A advogada de Araújo contesta essa vinculação entre as ações criminal e cível.


O biógrafo não respondeu ao telefonema da Folha.’


 


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O Estado de S. Paulo


Sexta-feira, 7 de dezembro de 2007


VENEZUELA
Ruth Costas


‘Plano B’ de Chávez é ilegal, acusa opositor


‘A oposição venezuelana qualificou de ‘inconstitucional’ a promessa do presidente Hugo Chávez de tentar aprovar a reforma da Constituição novamente, recolhendo assinaturas de milhares de venezuelanos. ‘Isso é só uma bravata, porque o presidente está aturdido com o resultado (do referendo)’, disse o governador do Estado de Zulia, Manuel Rosales, candidato derrotado por Chávez nas eleições de 2006. Para ele, uma nova investida do presidente ‘violaria a Constituição’. ‘Chávez pode até insistir, mas terá de buscar o projeto de reforma no lixo, onde ele foi atirado pelo povo’.


A proposta do presidente para Carta de 1999 foi rejeitada no domingo, num referendo na qual o ‘não’ obteve 50,7%. Ela incluía o fim do limite para as reeleições e a criação de novas formas de propriedade além da privada (como a comunitária). Anteontem, Chávez disse que o triunfo da oposição era ‘uma vitória de merda’ e prometeu buscar assinaturas para voltar a colocar em pauta o projeto.


Pela lei venezuelana, a Carta pode ser reformada por iniciativa da Assembléia Nacional, do presidente ou de ao menos 15% dos eleitores – 2,4 milhões de pessoas. O argumento de Chávez é que, se ele conseguir esse número de assinaturas, poderá reapresentar o projeto. A oposição, porém, diz que isso não é possível porque a Carta vigente estabelece que ‘a reforma não aprovada não poderá ser reapresentada no mesmo período constitucional’. O argumento é confirmado por especialistas, mas Rosales alertou para a possibilidade de o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), formado por chavistas, fazer uma interpretação do artigo que o invalide.


‘Legalmente, Chávez tem apenas três opções’, disse ao Estado o cientista político Herbert Koeneke, da Universidade Simón Bolívar. A primeira seria fazer mudanças como a redução da jornada de trabalho para 6 horas por meio da lei habilitante, que permite ao presidente legislar por decreto em algumas áreas. Para tentar aprovar a reeleição ilimitada, Chávez poderia fazer uma emenda no artigo sobre o tema. ‘Isso seria contestado no STJ, mas a corte decidiria em favor do presidente’, diz Koeneke. A terceira opção seria convocar uma Assembléia Constituinte, mas aí haveria o risco de a oposição obter uma representação maciça.


Num comício, Chávez acusou ontem seus seguidores de serem ‘frouxos e irresponsáveis’, por não terem votado no referendo. ‘Vocês têm uma dívida comigo’, disse. ‘Para mim não tem desculpa. Uma boa parte (dos simpatizantes do governo) não foi votar. Falta consciência, falta coragem.’ O presidente atribuiu a derrota a uma conspiração dos EUA. Ele afirmou que governará até 2013, quando termina seu mandato. ‘Como não se aprovou a reforma terei de ir embora em 2013, mas trabalharei sem descanso até o último dia’, disse.


Ainda ontem, o vice-chanceler, Vladimir Vllegas, se demitiu alegando que Chávez não ouve quem está à sua volta. O ex-ministro da Defesa, Raúl Baduel, advertiu o presidente a não ‘julgar-se Deus’.’


 


Carlos Pérez Llana


Ímpeto do chavismo tende a dissipar-se


‘A derrota de Hugo Chávez num referendo planejado para prolongar seu governo e aumentar seu poder deverá inspirar importantes mudanças, na Venezuela e em toda a América Latina. Até a realização do referendo, no domingo, a América do Sul dividia-se em três blocos.


1) Populista, impulsionado pelo petróleo e gás (Venezuela, Bolívia e Equador), com sociedades de modelo marxista, Nicarágua e Cuba, apoiadas pelos petrodólares de Chávez.


2) Social-democrata (Brasil, Uruguai, Chile e Peru).


3) Moderado, com os pró-americanos Colômbia e Paraguai e a cautelosamente pró-Chávez Argentina.


Depois da vitória do ‘não’, o ímpeto de Chávez na América Latina e a capacidade para impor seu programa político estão destinados a dissipar-se. A derrota, porém, não deve mudar o presidente venezuelano: ele tentará recuperar seu poder, tanto na Venezuela como na região, possivelmente endurecendo sua retórica e suas políticas para que a unidade de seus partidários não se fragmente.


Mas a habitual retórica da luta de classes não vai ser suficiente. O voto dos pobres da Venezuela foi decisivo para a rejeição da aposta de Chávez num governo perpétuo. Muitos pobres não votaram e essa abstenção foi, efetivamente, um voto contra ele. Se pretende manter Chávez acuado, a oposição venezuelana precisará reconhecer esse fato e criar uma frente pluralista, abrangente e democrática, que procure sanar problemas de ordem social, relacionados ao Estado de Direito e ao equilíbrio de poder na sociedade.


Depois de Chávez, o presidente da Bolívia, Evo Morales, é provavelmente o maior perdedor do referendo. A derrota de Chávez prejudica os esforços de Evo para impor uma reforma constitucional similar, que permitiria sua reeleição para um número ilimitado de mandatos. Além disso, a Bolívia hoje está isolada num mundo globalizado, por causa de disputas de gás com seu maior vizinho, o Brasil. Evo pretendia explorar os recursos naturais da Bolívia com a ajuda do controle absoluto de Chávez sobre os fundos estatais venezuelanos, algo que a reforma lhe daria ao abolir a autonomia do Banco Central da Venezuela.


Venezuelanos e cubanos forneceram a Evo as alavancas de seu poder: comunicações, guarda-costas, assistência militar, transporte e redes de inteligência. No entanto, se Evo continuar nessa rota autoritária, poderá dividir a Bolívia não só socialmente, mas também geograficamente – a secessão das províncias ricas e a guerra civil já são uma possibilidade.


O bloco social-democrata da América Latina está aliviado com a derrota de Chávez. O venezuelano entrou publicamente em choque com o peruano Alan García e a chilena Michelle Bachelet. Interferiu em disputas territoriais tanto entre Bolívia e Chile como entre Equador e Peru, e apoiou um rival de García nas eleições presidenciais peruanas.


Quanto ao Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não precisará mais ‘conter’ Chávez, ficando próximo dele. A aliança econômica que Lula criou com Chávez precisará agora ser administrada com inteligência e pragmatismo. Mas tanto Lula como a presidente eleita da Argentina, Cristina Kirchner, são bastante inteligentes para compreender que o chavismo não vai mais determinar o futuro da América Latina.


*Carlos Pérez Llana, ex-embaixador da Argentina na França, é vice-diretor do Departamento de Assuntos Internacionais na Universidade do século 21, em Córdoba, e professor da Universidade Torcuato Di Tella, em Buenos Aires. Artigo distribuído por Project Syndicate’


 


MAU EXEMPLO
O Estado de S. Paulo


Astro da série ‘24 Horas’ vai ficar 48 dias preso


‘O ator inglês Kiefer Sutherland, que interpreta o agente Jack Bauer na série 24 Horas, foi condenado a 48 dias de reclusão na Penitenciária de Glendale, em Los Angeles (EUA), por ter dirigido alcoolizado em setembro. Sutherland, que fará 41 anos no dia 21, terá de freqüentar um curso de 18 meses sobre consumo responsável de álcool, além de se submeter a um tratamento de reabilitação até 30 de março.


O juiz Stuart Rice determinou ainda que Sutherland fique sob liberdade condicional durante 5 anos. O ator, que compareceu à audiência, numa corte de Los Angeles, divulgou um comunicado garantindo que está ‘decepcionado’ por seu comportamento e pela ‘dor e dano’ que causou ‘à família, amigos, companheiros da série e trabalhadores da 20th Century Fox (produtora responsável pelo 24 Horas)’.’


 


LITERATURA
O Estado de S. Paulo


Jornalista assume presidência da ABL


‘Por unanimidade, o jornalista e escritor Cícero Sandroni, de 72 anos, foi eleito ontem presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL). Ele sucede o advogado Marcos Vilaça, de 68 anos. Sandroni comanda a entidade no centenário da morte do escritor Machado de Assis. Já há vários eventos previstos.’


 


CINEMA
Luiz Carlos Merten


Para Werner Herzog, Dieter ainda quer voar


‘Está sendo um ano de grandes interpretações masculinas, o que promete uma disputa renhida para as indicações do Oscar da categoria. Nos filmes já em cartaz nos cinemas brasileiros, podem-se citar atuações como as de Tommy Lee Jones em No Vale das Sombras, Joaquin Phoenix em Os Donos da Noite e Brad Pitt em O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford. A eles vem se somar agora Christian Bale, excepcional em O Sobrevivente, novo filme do alemão Werner Herzog, que estréia hoje nos cinemas do País. Christian Bale constrói seu personagem com rara densidade e sutileza, enfrentando as duras provas físicas que ele lhe exige.


O Sobrevivente pode ser definido como uma dupla raridade na obra do diretor alemão de 65 anos (nasceu em 1942). Nos últimos anos, Herzog tem se dedicado quase exclusivamente ao documentário e o fato de voltar à ficção é tanto mais notável porque O Sobrevivente, como vários de seus grandes filmes, situa-se nas bordas de ambas as tendências. É uma ficção porque é interpretado (recriado) por atores, mas a base da história é real e Herzog vai ao limite para mantê-la como tal. Ao mesmo tempo, o filme é o mais ‘mainstream’ do diretor, que sempre trabalhou num registro mais independente.


A história de O Sobrevivente não é novidade na carreira de Herzog, que, há dez anos, realizou um documentário intitulado O Pequeno Dieter Precisa Voar, justamente contando a experiência do personagem agora interpretado por Christian Bale. Seu nome é Dieter Dengler, um alemão, naturalizado norte-americano, que virou piloto e foi capturado no Laos, durante a Guerra do Vietnã. No documentário, o próprio Dieter Dengler relatava o que o tornou um personagem tão extraordinário – ele não apenas sobreviveu às condições inóspitas, leia-se desumanas, do cativeiro, como planejou uma fuga audaciosa, na qual terminou envolvendo outros colegas prisioneiros. Os filmes sobre fugas de prisioneiros de guerra se constituem numa tendência específica de Hollywood. No cultuado Fugindo do Inferno, John Sturges mostrou o lendário Steve McQueen em fuga de um campo nazista no lombo de uma motocicleta.


Nada mais diferente do que o cenário de O Sobrevivente – a selva do Laos, como se Herzog estivesse voltando aos ambientes de dois pesadelos que filmou nos anos 60 e 80. Aguirre, a Cólera dos Deuses e Fitzcarraldo, ambos com Klaus Kinski, construíram personagens obsessivos em luta por seus sonhos na selva amazônica. Em Aguirre, Kinski busca a mítica cidade de ouro de Eldorado. Em Fitzcarraldo, ele atravessa a selva carregando um barco pelo seco, todo esse esforço servindo ao objetivo de construir um teatro habilitado para o canto lírico. O Sobrevivente narra a saga de outro herói obsessivo, bem dentro do perfil que atrai Herzog, esse construtor de sonhos mais louco, pelos padrões habituais de ‘normalidade’, do que qualquer de seus personagens. O filme possui grandes cenas, grandes atuações – a de Christian Bale -, mas é irregular e termina de forma um tanto decepcionante. Mas tem a marca de Herzog, o que equivale dizer – pode ser um programão para cinéfilos.


Serviço


O Sobrevivente (RescueDawn, EUA/2006, 126 min.) – Drama. Dir. Werner Herzog. 14 anos. Cotação: Bom’


 


Luiz Zanin Oricchio


Atirando em todas as direções


‘Cinema, internet, TV e DVD – é assim, por esses quatro meios, e em todos ao mesmo tempo, que o gaúcho Carlos Gerbase quer mostrar seu novo longa-metragem, 3 Efes, para o maior número possível de espectadores. A partir de hoje, o filme será exibido digitalmente em algumas salas de Porto Alegre, São Paulo, Rio, Brasília e Curitiba. Vai ao ar pelo Canal Brasil e TV Com (nesta, apenas no Rio Grande do Sul). Pode ser visto no Portal Terra e os DVDs serão encontrados nas lojas, com todos os seus extras.


Com essa iniciativa ousada, Gerbase, diretor de longas como Tolerância e Sal de Prata, procura driblar a crônica falta de espaços de exibição para o cinema nacional. Como se sabe, o Brasil produz filmes em quantidade apreciável (cerca de 70 longas ao ano), mas dispõe de poucas janelas de exibição para eles.


Em entrevista ao Estado, Gerbase disse que o projeto é alternativo desde a sua concepção inicial. A história é bem contemporânea e retrata o cotidiano de personagens urbanos e suas dificuldades. Sissi (Cris Kessler) é a estudante que sustenta o pai desempregado e tem uma amiga, Giane (Ana Maria Mainieri), que se vira rodando bolsinha. Prostituta de luxo, com programas marcados pela internet. Há também uma dona de casa entediada, Martina (Carla Cassapo), casada com um publicitário, Rogério (Leonardo Machado), que, para não ser despedido, precisa dormir com a chefe, um bofe. E por aí vai. Mundo urbano, cruel e competitivo, com vidas bailando em torno de sexo e do dinheiro como costuma ser nas grandes cidades. Uma história interessante, divertida, com personagens bem desenhados, e com os quais o público jovem talvez possa se identificar.


E uma história feita com poucos recursos: ‘3 Efes é um filme de baixo custo – o orçamento foi de R$ 100 mil, incluindo comercialização e distribuição’, diz o diretor. Exclusivamente digital, economizou a copiagem em película de 35 mm, o tradicional ‘transfer’, processo que dobraria os gastos. E assim, a solução foi fazer esse lançamento múltiplo, implodindo o conceito de ‘janelas’ de exibição, termo técnico que designa o intervalo de tempo entre o lançamento em cinema, depois em DVD, TV por assinatura e TV aberta. ‘As ‘janelas’ são coisa do passado’, acredita Gerbase. ‘O público decide onde ver e como ver. Se a distribuição tradicional não mudar, a circulação informal continuará a crescer.’ Para lhe dar razão, basta lembrar do caso recente de Tropa de Elite, amplamente pirateado antes do lançamento em sala.


A proposta de baixo orçamento determinou também o processo de filmagem. 3 Efes foi captado por uma pequena câmera mini-DV (‘Se eu tivesse de captar em película, o filme simplesmente não existiria’). Equipe pequena, num total de oito pessoas no set, e filmagem rápida, de 20 dias. Tudo baratinho e prático. Esse modo de produção determina a estética do filme? ‘Sem dúvida’, diz Gerbase. ‘Mas o que o público tem a ver com isso? Ele quer se divertir, se emocionar, acompanhar uma boa história, apenas isso.’


Gerbase também acredita que recursos enxutos não se traduzem necessariamente em produção desleixada – ‘Não fiz um filme trash ou malcuidado. A montagem é do Giba de Assis Brasil (NR.: de fato, um craque da edição), o som é 5.1, a fotografia aproveita a luz da própria cidade e das locações; a revolução está na possibilidade de circular o filme em espaço diferentes, tirá-lo desse ‘tribunal de fim de semana’, que pode ser interessante para os blockbusters, mas é uma armadilha para o cinema brasileiro.’


Sobre a temática de 3 Efes, o Estado quis saber se a idéia de uma ‘naturalização da prostituição’, tratada sem qualquer traço de moralismo, devia alguma coisa ao fenômeno Bruna Surfistinha (que, aliás, também vai virar filme). Gerbase diz que não leu o livro de Raquel Pacheco, nome civil da ex-prostituta de classe média. Mas pesquisou em obras como Psicanálise da Prostituição, de Maryse Choisy, Cliente, o Outro Lado da Prostituição, de Ilnar de Souza, e Mulheres da Vila, de Aparecida Fonseca Moraes, além de visitar vários sites ‘especializados’ no assunto. Que lhe forneceram boas dicas sobre o funcionamento contemporâneo da assim chamada mais antiga das profissões. Gerbase diz que apenas tentou ser realista e que profissionais do ramo, que assistiram ao filme, se identificaram com as personagens. Foram as primeiras críticas de 3 Efes. E, segundo o diretor, aprovaram o que viram.’


 


TELEVISÃO
Keila Jimenez


O Sítio diz adeus


‘No início, a atração foi acusada de ter perdido totalmente o encantamento das obras de Monteiro Lobato e de ter se transformado em uma novelinha teen. Retomada a inspiração nos originais do escritor este ano, o Sítio do Pica Pau Amarelo não conseguiu escapar do fim.


A atração infantil da Globo deve sair de vez da programação ainda este mês. E, apesar de a rede negar, não há perspectivas de retorno.


Reformulado várias vezes desde que foi relançado na programação, em 2001, o Sítio chegou a registrar média de 12 pontos no horário, um ótimo índice. Mas a boa fase não durou. O seriado atualmente não consegue passar da média de 8 pontos de ibope e perde às vezes em audiência para a Record.


A Globo não sabe ainda o que entrará no lugar do infantil na programação, uma vez que outra atração do gênero, TV Xuxa, também corre o risco de sair da grade diária da emissora. Há também a crise de audiência do Mais Você, de Ana Maria Braga.


Esse parece ser o grande dilema da direção de programação do canal atualmente. Faltam opções para o horário, constantemente bombardeado pela concorrência.’


 


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