Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Luis Fernando Verissimo

‘A charge da capa do Le Monde, dias atrás, mostrava Bush sentado nas ruínas do Iraque, rodeado de cadáveres de crianças, dizendo para um Putin sentado nas ruínas da escola de Beslan, rodeado de cadáveres de crianças:

‘Eu faria o mesmo que você.’ E o Putin respondendo: ‘Você fez o mesmo que eu.’ Injusto, até descontando-se a licença tácita dada a chargistas para exagerar. E difícil imaginar outra ação militar parecida, em inépcia e insensibilidade, com a das tropas russas em Beslan. Mas o alvo da charge era o relativismo moral dos que invocam o tamanho do horror em Beslan para justificar o contra-horror no mesmo nível, ou absolver os radicais do outro lado. Enfileire-se todas as crianças mortas no Iraque desde que as primeiras bombas americanas levaram choque e assombro aos habitantes de Bagdá e o resultado será tão pungente quanto o das fotos de Beslan, mitigado apenas pelo fato de que no Iraque ninguém esta contando os civis mortos. Justificar uma só criança morta por qualquer causa ou objetivo é adotar o relativismo moral do monsieur Le Pen – já que estamos falando de opiniões francesas – que chamou o massacre dos judeus pelos nazistas de apenas um detalhe da 2.ª Guerra Mundial. As crianças mortas em Beslan seriam detalhes da luta pela independência dos chechenos. As crianças mortas no Iraque seriam detalhes da luta para instalar a democracia no Oriente Médio – ou assegurar o suprimento de petróleo e bons contratos para os Estados Unidos, dependendo do relativismo moral da sua preferência. ‘O fim justifica os meios’ continua sendo um lema universalmente aceito, apesar de velho e batido, mesmo que às vezes os meios envolvam cenas desagradáveis, como as de crianças sem braço ou mães desesperadas. Só não se diga que ha uma diferença moral entre a criança despedaçada pelo homem bomba e a criança despedaçada pela represália.

A escalada de horrores que chegou a uma espécie de apoteose tétrica em Beslan, estaria levando muitos muçulmanos a reverem sua omissão diante do terror, visto até aqui como lamentável, mas o efeito de uma situação mais lamentável ainda. Banalizou-se a identificação do islã com desumanidade e atraso e estaria se organizando uma reação ao estereotipo, não ao nível dos príncipes e dos magnatas mas ao de intelectuais, políticos moderados e mesmo religiosos, para não dar razão aos que, do outro lado, não querem outra coisa senão uma guerra de civilizações. Fala-se muito nesta reação aqui na França, uma das frentes históricas do confronto – e portanto potencialmente do entendimento – entre as culturas ocidental e muçulmana. A base de um consenso possível, contra toda forma de relativismo moral, deve ser a que o inimigo comum é a estupidez humana, da qual ninguém tem o monopólio.’



Paulo Marqueiro e Rodrigo Taves

‘Justiça Eleitoral tira a TV Record do ar no Rio’, copyright O Globo, 21/09/04

‘A Justiça Eleitoral tirou a TV Record do ar por 22 minutos, a partir das 23h06m de ontem. Atendendo a representação do PT, o juiz Luiz Márcio Victor Alves Pereira, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), entendeu que o programa exibido pela emissora sobre o projeto Fazenda Nova Canaã favorecia o candidato do PL a prefeito do Rio, Marcelo Crivella. A Record é ligada à Igreja Universal do Reino de Deus, da qual o pastor Crivella, sobrinho de Edir Macedo, é um dos principais líderes.

O juiz inicialmente determinou à Record que não veiculasse o programa justamente porque iria, indiretamente, fazer propaganda eleitoral para Crivella.

– O oficial de Justiça chegou na Record às 19h30m e ficou mais de duas horas na sede sem ser recebido por ninguém. Então determinei que fosse para o Sumaré (onde ficam as torres de transmissão) para que a decisão fosse cumprida lá porque, caso contrário, o programa iria todo ao ar e a decisão judicial seria inócua – explicou o juiz.

O advogado do PT, Luiz Paulo Viveiros de Castro, argumentou que a exibição do programa sobre a Fazenda Nova Canaã favoreceria Crivella quando a lei 9.504-97 proíbe que, em período eleitoral, qualquer TV dê tratamento privilegiado a qualquer um dos candidatos.

– Ordem judicial é para ser cumprida – disse o advogado, que representa a campanha do candidato petista a prefeito, Jorge Bittar.

O juiz Luiz Márcio disse que mandou suspender o programa porque era propaganda subliminar do candidato Crivella, já que ele faz toda a sua campanha eleitoral citando a Fazenda Nova Canaã. O programa de ontem da Record enaltecia o projeto, sem apresentar qualquer denúncia ou crítica.

– Em toda a sua propaganda eleitoral, Crivella sempre apresenta o projeto da Fazenda Nova Canaã como um diferencial dele. O programa começou às 22h30m e só foi tirado do ar às 23h06m e, por isso, a Record pode ser multada em R$ 100 mil – explicou o juiz.

Ele disse ainda que encaminhará ao Ministério Público o relato do oficial de Justiça sobre o que aconteceu e que os procuradores vão preparar a ação para que outro juiz arbitre a multa.

Segundo Luiz Márcio, a Record passou o dia inteiro exibindo chamadas para o programa. Mesmo com a decisão da Justiça, o programa ainda foi exibido por 36 minutos até ser tirado do ar. A emissora só pôde voltar a exibir programação depois que a exaltação ao Nova Canaã deixou de ser exibida em São Paulo.

Procurada pelo GLOBO, a assessoria de Crivella disse não ter encontrado o candidato ontem à noite para comentar a decisão da Justiça.’



EUA / OLIGOPOLIZAÇÃO
Frank A. Blethen

‘Fusões põem em risco a democracia’, copyright O Estado de S. Paulo / The Washington Post , 21/09/04

‘A democracia está em crise – não em partes longínquas do mundo, mas nos Estados Unidos.

Como acontece com a maioria das democracias, a maior ameaça à nossa é interna. O perigo que vem de dentro é a perda do nosso Quarto Estado – uma imprensa independente e livre, que é essencial se os americanos quiserem estar informados e engajados no processo democrático.

Walter Lippmann disse que a imprensa livre ‘deve consistir de muitos jornais descentralizados na sua propriedade e na sua administração e dependentes do apoio (…) das comunidades onde são escritos, onde são editados e onde são lidos’.

Dos milhares de veículos de mídia independentes existentes durante o apogeu de Lippman, no meio do século passado, a propriedade de mídia caiu para apenas 50 empresas em 1983. Hoje, o que era uma preocupação se transformou num pesadelo – a maior parte da nossa mídia é controlada por apenas cinco empresas.

Considere a assustadora perda de diversidade nas vozes da mídia. Menos de 20% de nossos jornais são independentes e de propriedade local. Apenas na última década, os dez maiores proprietários de TVs locais triplicaram o número de estações que possuem. Cerca de um terço da população agora ouve estações de rádio pertencentes a apenas uma única empresa.

Coisas ruins acontecem quando conglomerados de mídia engolem vozes independentes: a qualidade é reduzida, o jornalismo investigativo desaparecem; as diferenças de opinião somem; empregos são eliminados. Tudo é sacrificado na incessante marcha na direção de lucros cada vez maiores.

Desde 1988 me manifesto contra a consolidação da propriedade de mídia e a perda de uma imprensa independente. É uma triste ironia que minha família agora lute para preservar os 108 anos de independência do Seattle Times diante de uma tentativa de nosso parceiro no Acordo Operacional Conjunto, o conglomerado Hearst, de conquistar a propriedade.

A marcha implacável das consolidações na mídia passam sem ser notícia.

Afinal, por que empresas jornalísticas que já têm o controle e buscam mais iriam querer que seus veículos publicassem reportagens que contrariam seus interesses?

A Federal Communications Commission (Comissão Federal de Comunicações, na sigla em inglês FCC) começou a atual revisão das normas de difusão em 2001, trabalhando na surdina com as grandes empresas de mídia. Gigantes como a Tribune Co. e a Gannett estavam divulgando um valor mais alto das ações a analistas na suposição de que a FCC possibilitaria mais consolidações desenfreadas. A corrente central da mídia não noticiou isso, e a FCC se recusou a envolver a população.

No pior momento, com a FCC prestes a desencadear a próxima grande onda de uma destrutiva consolidação de jornais e de mídia, um esforço nacional enraizado na população se materializou. Quase 2,3 milhões de pessoas enviaram mensagens à FCC e ao Congresso mostrando sua oposição às mudanças nas normas. Mas a FCC foi em frente e apresentou novas normas, menos restritivas, para ajudar os conglomerados de mídia.

Tanto o clamor dos cidadãos como a vitória na Justiça acordaram o Congresso para a necessidade de agir. É um despertar bipartidário que reflete o amplo e veemente entendimento por parte da população de que a perda de uma imprensa independente e da diversidade de vozes na mídia é prejudicial à democracia.

O Congresso deve começar as audiências para envolver o povo americano na discussão e na busca de soluções para esta questão nacional. A meta deve ser criar um ambiente no qual possamos novamente nos voltar para os jornais e outros veículos da mídia americana em busca de diversidade de propriedade e jornalismo que não seja dirigido às margens de lucro.

As áreas de enfoque devem incluir a exploração de todos os meios legais para garantir a diversidade de propriedade de jornais, incluindo leis antitruste; e a proibição de um grupo possuir no mesmo mercado mais de um tipo de mídia (jornal, TV, rádio), entre outros.

Estamos numa conjuntura crítica. Podemos permitir que os magnatas de mídia continuem agregando mais veículos e deixar que a democracia americana se deteriore. Ou podemos tomar providências para acabar com esta marcha de consolidação e salvar os jornais independentes e outras mídias para os cidadãos deste país.’



ITÁLIA
Richard Owen

‘Linda, esguia, com longas pernas. É a nova porta-voz de Berlusconi’, copyright O Estado de S. Paulo / The Times, 18/09/04

‘O primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, escolheu uma atriz e ex-apresentadora de TV com pouca experiência política para ser a face pública do seu partido Força Itália.

Assessores do chefe do governo disseram que ele nomeou Elisabetta Gardini, de 47 anos, por acreditar que ela vai melhorar a sorte da claudicante agremiação e atrair mais eleitoras.

Mas alguns políticos da Força Itália insistiram com Berlusconi para que não nomeasse Elisabetta. O jornal La Repubblica até citou um deles, que acusa o líder italiano de ter ‘um fraco por mulheres altas, bonitas, esguias e de longas pernas’.

Membros do Força Itália disseram que Elisabetta, famosa apresentadora de um programa de variedades e atriz, irá substituir Sandro Bondi, o atual porta-voz. Il Giornale, de propriedade do irmão de Berlusconi, Paolo, revela que Elisabetta foi escolhida ‘pessoalmente pelo primeiro-ministro’ entre outras candidatas com comprovada experiência política.

Entre elas estavam Isabella Bertolini, porta-voz da Força Itália em Emilia-Romagna; Tiziana Maiola, consultora da Força Itália em Milão; e Elisabetta Alberti Casellati, senadora por Veneto e vice-presidente do grupo Força Itália no Senado.

Bondi, o ex-porta-voz, classificou as críticas de maliciosas e injustas. Ele admitiu que Elisabetta veio do ‘mundo do entretenimento’, mas insistiu: ‘Ela sempre teve verdadeira paixão por política, no seu sentido mais nobre.’

Em setembro do ano passado, Berlusconi virou manchetes dor jornais durante uma visita a Nova York ao aconselhar os empresários americanos a investirem na Itália porque o país tem ‘as mais belas secretárias, garotas soberbas’.

No início do mês, Elisabetta, falando num congresso da Força Itália na Úmbria, culpara a televisão ‘por uma cultura na qual as mulheres são julgadas pela aparência’.’



INGLATERRA
O Estado de S. Paulo

‘Repórter inglês introduz ‘bomba’ no Parlamento’, copyright O Estado de S. Paulo, 18/09/04

‘Um repórter, com documentos falsos, introduziu no Parlamento britânico equipamentos para montar uma bomba sem ser detectado pela segurança, anunciou o tablóide The Sun ontem – dia seguinte à ruidosa invasão do plenário por um grupo pró-caça à raposa. Dois dias antes, um ativista fantasiado de Batman invadira o Palácio de Buckingham.

‘Isso confirma meus temores’, disse o líder do governo, deputado Peter Hain.

‘The Sun acaba de prestar uma inestimável colaboração a esta Casa ao expor o amadorismo e a velha cultura que representam uma ameaça à verdadeira cabine de comando de nossa democracia.’

O repórter Anthony France trabalhou durante três semanas no Palácio de Westminster (sede do Parlamento) sem ser revistado ou interrogado pela guarda responsável pela proteção dos deputados. Ele transportou para o interior do prédio bateria, arame, fios, timer e massa plástica que não se solidifica. ‘Nada disso foi detectado’, ressaltou. France documentou sua façanha com fotos, que estão publicadas na edição de hoje do Sun. Numa delas, ele aparece servindo chá ao vice-primeiro-ministro John Prescott.

O interior do Palácio de Westminster é vigiado desde 1415 por uma corporação, Sargentos em Armas, cujos integrantes estão armados apenas de uma espada. Como nos dias de Henry V, a principal função dessa unidade é distribuir acomodações para os parlamentares e cuidar da limpeza do plenário À polícia, com agentes fortemente armados, cabe vigiar o portão, os visitantes e operar o detector de metais. ‘Estamos na era dos terroristas suicidas, e nossa segurança é arcaica’, lamentou Hain, o líder do governo. (AP)’